ED no(a) REl - 0600120-29.2024.6.21.0076 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/10/2024 00:00 a 23:59

VOTO

No que tange ao exame de admissibilidade, o recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, inicialmente, cumpre consignar que os embargos de declaração só podem ser opostos com o objetivo específico de esclarecer obscuridade ou contradição, sanar omissão ou corrigir erro material existente na decisão judicial, conforme expressamente estabelece o art. 1.022 do Código de Processo Civil.

É entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça que “a boa técnica dos embargos declaratórios visa a escoimar o relatório, os fundamentos e o acórdão de incoerências internas, capaz de ameaçarem sua inteireza” e, portanto, não é o meio adequado para o embargante “obter o reexame da matéria versada nos autos, na busca de decisão que lhe seja favorável” (STJ, EDcl no REsp n. 440.106/RJ, 6a Turma, Rel. Min. Celso Limongi, DJe 23.8.2010).

Quanto à argumentação formulada pela embargante nos aclaratórios, destaco:

O r. acórdão embargado, data vênia, sua conclusão, registra obscuridades e e pontos sobre os quais deveria haver pronunciamento.

[…]

A embargante está há mais de ano afastada, o que por si só comprova e caracteriza o afastamento de fato, em total consonância com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral [...]

 

Dessarte, antecipo que falta força probatória à documentação apresentada pela recorrente, pois a candidata não comprovou formalmente a desincompatibilização do cargo de servente de limpeza e copa que exerce na Companhia Municipal de Urbanismo – COMUR, para concorrer às Eleições de 2024, encontrando-se em benefício por incapacidade pelo INSS desde antes de 19.02.2024, sendo que os Acórdãos que junta como paradigma nada modificam a situação fática impeditiva de seu registro de candidatura.

Não há obscuridades nem omissões na decisão embargada.

Com efeito, não consta nos autos que a candidata tenha requerido formalmente a desincompatibilização de seu cargo para concorrer às Eleições deste ano, pois os documentos juntados apenas indicam que se encontrava afastada de fato de suas funções, não podendo-se pressupor a observância dessa situação até a data do pleito, cabendo anotar que o documento juntado em fase recursal tão somente atesta que a candidata está afastada desde 03.7.2023, mas não diz até quando. (ID 45693462)

Outrossim, a mera leitura do acórdão, antecipo, suprime quaisquer dúvidas que remanesçam no relativo aos argumentos da embargante.

Senão, vejamos.

 

(...)

O Juízo a quo indeferiu o pedido de registro de candidatura de BRUNA FRANCIELE DE JESUS para concorrer ao cargo de vereadora, sob o n. 77077, pelo partido SOLIDARIEDADE, no Município de NOVO HAMBURGO, sob o fundamento de que não restou comprovada a efetivação da desincompatibilização do cargo que exerce na COMUR, conforme requer o art. 27, inc. V, da Resolução TSE n. 23.609/19.

Conforme já relatado, no recurso interposto, foram juntados documentos que atestariam seu afastamento de fato, o que cumpriria com sua desincompatibilização tempestiva (IDs 45693462, 45693463 e 456934643).

A Justiça Eleitoral tem admitido a apresentação de documentação faltante em registro de candidatura, enquanto não exaurida a instância ordinária, ainda que tenha sido oportunizada previamente a sua juntada, desde que não fique configurada a desídia pelo candidato.

Anoto que, em matéria de registro de candidatura, o Tribunal Superior Eleitoral entende ser admissível a juntada de documentos em grau recursal enquanto não esgotada a instância ordinária, como forma de privilegiar o direito fundamental à elegibilidade, conforme ilustram as seguintes ementas:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO. REGISTRO DE CANDIDATURA. CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL. INDEFERIMENTO. COMPROVAÇÃO DA DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. PORTARIA MUNICIPAL JUNTADA NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. POSSIBILIDADE. AFASTAMENTO DA CAUSA DE INELEGIBILIDADE. REGISTRO DEFERIDO. AGRAVO DESPROVIDO.1. A prova de desincompatibilização do candidato relaciona-se com a demonstração de afastamento de causa de inelegibilidade que, já detectada, impede o deferimento do registro de candidatura, distinguindo-se das demais condições de registrabilidade. Nesse contexto, o recurso a ser manejado para devolver a questão ao Tribunal Superior Eleitoral é o ordinário, nos termos do art. 57, inciso I da Res. 23.458/2017-TSE .2. A juntada posterior de documentação faltante, em registro de candidatura, é possível enquanto não exaurida a instância ordinária, ainda que oportunizada previamente sua juntada. Precedentes.3. A portaria de desincompatibilização, publicada no Diário Oficial dos Municípios de Roraima (ID 414178), encartada aos autos ainda na instância ordinária, é lícita e permite sua análise nesta Instância e a conclusão da efetiva desincompatibilização do candidato.4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Ordinário n. 060057426, Acórdão, Relator Min. Edson Fachin, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 27.11.2018.) Grifei.

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA INDEFERIDO. DEPUTADO ESTADUAL. AUSÊNCIA DE DOCUMENTO INDISPENSÁVEL. JULGAMENTO CONVERTIDO EM DILIGÊNCIA. IRREGULARIDADE NÃO SANADA. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTO COM O RECURSO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. FUNDAMENTOS NÃO INFIRMADOS. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA.

1. A ausência de certidão criminal da Justiça Estadual de 1º grau "da circunscrição na qual o candidato tenha o seu domicílio eleitoral", exigida no art. 27, inciso II, alínea b, da Res.-TSE nº 23.405/2014, mesmo após a abertura de prazo para a sua apresentação, implica o indeferimento do pedido de registro de candidatura.

2. Admite-se, nos processos de registro de candidatura, a apresentação de documentos até a instância ordinária ainda que tenha sido anteriormente dada oportunidade ao requerente para suprir a omissão, não sendo possível conhecer de documentos apresentados com o recurso especial. Precedentes.

3. O agravante limitou-se a reproduzir os argumentos expostos no recurso especial, razão pela qual a decisão deve ser mantida pelos próprios fundamentos. Incidência na Súmula nº 182/STJ.

4. Agravo regimental desprovido.

(RESPE - Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 45540 - RIO DE JANEIRO - RJ, Acórdão de 30.10.2014, Relator(a) Min. Gilmar Mendes, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 30.10.2014.) Grifei.

Por tais razões, conheço dos documentos apresentados em sede recursal.

A Companhia Municipal de Urbanismo (COMUR) possui natureza jurídica de sociedade de economia mista, e empregados desse tipo de órgão necessitam afastar-se de sua função com a antecedência mínima de 3 (três) meses anteriores ao pleito, conforme previsto no art. 1º, inc. II, al. l, da Lei Complementar n. 64/90.

No caso em análise, verifico que a candidata não comprovou formalmente a desincompatibilização do cargo que ocupa, para concorrer às eleições deste ano. Isso porque os documentos juntados apenas indicam que a recorrente se encontra afastada de suas funções (servente de limpeza e copa) por motivos de saúde desde 03.7.2023, percebendo auxílio-doença.

Com efeito, os documentos trazidos aos autos apenas comprovam sucessivas prorrogações de benefício previdenciário por incapacidade. Dentre esses, o primeiro (ID 45693463) refere que a solicitação de prorrogação, apresentada em 19.02.2024, foi deferida até 27.3.2024; e o último menciona a manutenção do benefício até 25.7.2024. Ou seja, não há prova segura do afastamento da candidata até a data do pleito. Como bem analisado no parecer ministerial, as provas colacionadas apenas confirmam que a recorrente se encontra afastada de fato, atualmente.

Dessa forma, tenho que o acervo probatório não atesta de forma inequívoca o afastamento de fato até a data da eleição, como exigido pela jurisprudência:

"Eleições 2020 [...] Candidata a vereadora. Registro indeferido. Servidora pública. Afastamento das atividades. Requerimento. Exoneração de cargo em comissão. Desincompatibilização no período integral. Falta de demonstração. (Ac. de 15.4.2021 no AgR-REspEl nº 060016898, rel. Min. Edson Fachin.) Grifei.

ELEIÇÕES 2022. REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADA ESTADUAL. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO DE FATO. LICENÇA MÉDICA ANTERIOR AO PEDIDO FORMAL. FORMALIDADES LEGAIS PREENCHIDAS. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO IMPROCEDENTE. PEDIDO DEFERIDO. 1. O pedido de desincompatibilização foi protocolado intempestivamente, mas a candidata estava ininterruptamente afastada do exercício do cargo público desde muito tempo antes do fim do prazo de desincompatibilização. 2. O instituto da desincompatibilização tem por objetivo evitar que o pretenso candidato exerça influência na administração pública durante o período eleitoral, visando proteger a igualdade de condições entre os candidatos. O que importa, em essência, não é o cumprimento da exigência formal de protocolo de requerimento de desincompatibilização, mas o efetivo e ininterrupto afastamento do exercício do cargo público durante todo o período em que a legislação exige a desincompatibilização. 3. A licença médica deferida a servidor público implica afastamento do exercício do cargo público. Se o requerimento de desincompatibilização foi precedido de licença médica sem solução de continuidade, os respectivos tempos de afastamento devem ser contados como um único período para efeito de cumprimento do prazo de desincompatibilização. 4. Ação de Impugnação de Registro de Candidatura julgada improcedente. Deferido o pedido de registro de candidatura.

(TRE-ES - RCAND: 060097488 VITÓRIA - ES, Relator: ROGÉRIO MOREIRA ALVES, Data de Julgamento: 05.09.2022, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão.) Grifei.

Importante ressaltar que a jurisprudência trazida pela recorrente, no sentido de que o Tribunal Superior Eleitoral reconhece o afastamento de fato para comprovar a desincompatibilização do cargo público, considerou também as datas finais indicadas nas provas (ex. atestados médicos), com data posterior ao pleito em disputa, conforme se verifica na decisão transcrita abaixo, o que não ocorreu no presente caso.

"Eleições 2018. Registro de candidatura. Deputado federal. Servidor público civil municipal. Desincompatibilização. Comprovação. Inelegibilidade art. 1º, II, l, da Lei Complementar 64/90. Não incidência. 1. O candidato comprovou o afastamento de fato da função pública, ante a apresentação, ainda na origem, de atestados médicos, os quais lhe garantiram licença para tratamento de saúde até o dia 25.10.2018, fatos que foram corroborados pelos documentos juntados em sede recursal. 2. Na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, o afastamento de fato do cargo no prazo legal é suficiente para demonstrar a desincompatibilização [...]".(Ac. de 23.10.2018 no AgR-REspe nº 060298361, rel. Min. Admar Gonzaga.) Grifei.

Registro, por oportuno, como bem destacado pela diligente Procuradoria Regional Eleitoral, que esta Corte, em processo semelhante, da relatoria deste Magistrado, julgado em 09.9.2024, já manifestou que a ausência de comprovação inequívoca da desincompatibilização de cargo público impede o deferimento do registro de candidatura (TRE-RS RE n. 0600185-72.2024.6.21.0060, Rel. Des. Eleitoral FRANCISCO THOMAZ TELLES).

Note-se que, em verdade, a embargante pretende o revolvimento de matéria fática já analisada – a insuficiência dos argumentos esposados e documentos juntados, por unilaterais que são -de modo que a via adequada, na realidade, vem a ser a interposição de recurso à instância superior, que poderá analisar os argumentos respectivos.

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.