ED no(a) REl - 0600277-52.2024.6.21.0124 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/10/2024 00:00 a 23:59

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

Inicialmente, cumpre consignar que os embargos de declaração só podem ser opostos com o objetivo específico de esclarecer obscuridade ou contradição, sanar omissão ou corrigir erro material existente na decisão judicial, conforme expressamente estabelece o art. 1.022 do Código de Processo Civil.

É entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça que “a boa técnica dos embargos declaratórios visa a escoimar o relatório, os fundamentos e o acórdão de incoerências internas, capaz de ameaçarem sua inteireza” e, portanto, não é o meio adequado para o embargante “obter o reexame da matéria versada nos autos, na busca de decisão que lhe seja favorável” (STJ, EDcl no REsp n. 440.106/RJ, 6a Turma, Rel. Min. Celso Limongi, DJe 23.8.2010).

A argumentação do embargante vem tecida conforme segue:

A contradição encontrada no r. Acórdão reside no fato de os ilustríssimos julgadores haverem considerado a lista de filiação emitida pelo partido NOVO em 06 de abril de 2024 como prova unilateral.

Ora, a vedação de consideração das provas unilaterais como suficientes para a comprovação de filiação se dá pelo fato de serem as provas unilaterais aquelas que podem ser produzidas a qualquer momento, sem que seja possível determinar o momento exato de sua elaboração.

A lista oficial de filiados não pode ser considerada como prova unilateral, uma vez que foi assinada pelo gestor do partido utilizando-se da certificadora digital para o fazer, de forma que resta oficialmente certificado que a lista foi de fato produzida e firmada naquela data.

A firma digital feita por certificadora devidamente autorizada pelos órgãos governamentais responsáveis funciona como uma identidade virtual que permite a identificação segura e inequívoca do autor de mensagem ou transação feita em meios eletrônicos.

Esse documento eletrônico é gerado e assinado por uma terceira parte confiável, a Autoridade Certificadora, que, seguindo regras estabelecidas pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil, associa uma entidade (pessoa, processo, servidor) a um par de chaves criptográficas.

Ele garante autenticidade, confidencialidade e integridade nas operações que são realizadas por meio dele, atribuindo-lhes validade jurídica.

Neste sentido, é possível aferir-se, com a convicção necessária, que a lista oficial de filiados, da qual consta o nome do embargante, foi efetivamente emitida pelo partido aos 52 segundos do dia 07 de abril de 2024.

Assim, em relação à lista de filiados citada, não há falar-se em prova produzida de forma unilateral, uma vez que produzida diante de autoridade certificadora devidamente regularizada, permitindo-se aferir a data e hora da produção do documento, de forma que, por óbvio, tal lista deve ser considerada como produzida de forma bilateral. A lógica da emissão e firma da citada lista é justamente comprovar, de forma cabal e bilateral, quem eram os cidadãos que se encontravam filiados ao partido NOVO na data de 06 de abril de 2024, apurando-se aqueles que estariam aptos a concorrer ao pleito 2024.

 

Inicialmente, cabe salientar ao embargante que este Tribunal possui, forma ciente, a sistemática de certificação digital – utiliza-a, inclusive, para a realização de assinaturas de documentos no sistema do Processo Judicial Eletrônico – PJE.

E, exatamente por isso, é ciente também que a certificação comprova que ocorreu uma assinatura em determinado dia e horário, e não que o conteúdo daquilo que fora assinado seja, de fato, verdadeiro – daí a permanência da unilateralidade, pois a declaração de filiação partiu unicamente da agremiação NOVO - nesse sentido, tem razão o embargante, ao alegar que a certificação digital permite "a identificação segura e inequívoca do autor".

Mas é só.

Portanto, no caso dos autos, percebe-se necessária a correta apreensão do efeito da certificação digital em um documento – qualquer documento.

A certificação (como uma ata notarial, por exemplo) não empresta bilateralidade a um documento; ela empresta fé pública. Dito de outro modo: um documento unilateral com certificação digital transformar-se-á em um documento unilateral dotado de fé pública, ao passo que um documento bilateral, certificado, transformar-se-á em um documento bilateral dotado de fé pública, com o perdão da singeleza do raciocínio.

Ou seja, não se transmuda a natureza do documento – menos ainda torna o seu conteúdo verdadeiro.

Prosaico exemplo: se o sr. José faz uma declaração de próprio punho com os dizeres “Ontem choveu”, e leva tal “documento” à certificação digital, estará apenas comprovado que o Sr. José declarara “Ontem choveu”. Contudo, não significa obviamente que tenha, de fato, chovido no dia anterior, ou que há fé pública de que, no dia anterior, choveu. 

Não há uma concordância com o conteúdo declarado – há apenas uma certificação de que aquele conteúdo fora declarado – no caso, unilateralmente, pelo NOVO, o que consiste em circunstâncias absolutamente diversas.

Grosso modo, esse o caso dos autos, de modo que a lista de filiados levada pelo recorrente à certificação não tem força probatória, por si só, do ponto de vista ontológico – e não seria essa certificação que emprestaria tal mutação.

É preciso que se tenha em mente tal diferenciação.

Em resumo, nas circunstâncias, evidenciado que a pretensão recursal possui o intento de rediscutir a matéria decidida pelo Tribunal, o que é incabível em âmbito de embargos declaratórios. Não há vício no acórdão, e faço constar que o prequestionamento se dá pelos elementos que o embargante suscitara, na forma do art. 1.025 do Código de Processo Civil.

A título de desfecho, defiro o pedido de que as intimações/publicações sejam feitas também em nome dos advogados Lucas Bessoni Coutinho de Magalhães, OAB/MG n. 139.537, e Paulo Augusto Fernandes Fortes, OAB/MG n. 131.667.

 

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.