MSCiv - 0600406-41.2024.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/10/2024 00:00 a 23:59

VOTO

Trata-se de mandado de segurança, com pedido de concessão de medida liminar, impetrado por HÉLIO CARLOS KERKHOFF contra ato praticado pelo Magistrado da 42ª Zona Eleitoral, no exercício do poder de polícia em propaganda eleitoral, ID 45731944. Aduziu, em síntese, ter havido decisão em procedimento administrativo (NIP - Notícia de Irregularidade em Propaganda Eleitoral), autos n. 0600498-87.2024.6.21.0042, em que a autoridade tida como coatora determinara a “cessação imediata da utilização da propaganda irregular, qual seja, a utilização de camisetas contendo propaganda dos candidatos ao cargo majoritário”, inclusive com retirada de imagens das redes sociais utilizando o referido material.

Após a concessão da liminar por este relator, a autoridade coatora prestou informações, e a d. Procuradoria Regional Eleitoral se posiciona pela perda do objeto do writ.

À análise.

1. Perda do objeto.

Com a devida vênia ao respeitável posicionamento exarado pela d. Procuradoria Regional Eleitoral, tenho, na linha de precedentes desta Corte Eleitoral, que o mandado de segurança contra ato de magistrado eleitoral no exercício de poder de polícia na propaganda de eleições não perde objeto, porquanto permanece o interesse do impetrante na manifestação jurisdicional relativa ao provimento definitivo, com a confirmação da tutela provisória concedida - nessa linha, vide os unânimes MSCiv 0603485-96, rel. Des. El. Amadeo Buttelli, julgado em 14.10.2022, e MSCiv n. 0603514-49, Rel. Des. El. Gerson Fischmann, julgado em 18.10.2022.

Com base em tal fundamento - o direito da parte impetrante em receber manifestação jurisdicional definitiva no que diz à existência ou inexistência de direito líquido e certo - entendo pela manutenção do objeto do presente mandado de segurança.

Destaco.

2. Mérito.

No mérito, HÉLIO impetrou o presente mandado de segurança contra a seguinte decisão, em sede do exercício de poder de polícia relativo à propaganda eleitoral, pelo Magistrado titular da 42ª Zona Eleitoral, sediada em Santa Rosa/RS, ID 45731946:

Vistos.

Determino a notificação dos noticiados para a cessação imediata da propaganda irregular, com manifestação nos autos dentro do prazo de 48 (quarenta e oito) horas.

Após, dê-se vista ao Ministério Público Eleitoral.

Após, com a notícia de descumprimento, houve a aplicação de multa no valor de R$ 5.000,00, nos seguintes termos:

Vistos.

Os noticiados foram notificados em 21 de setembro para a cessação imediata da utilização da propaganda irregular, qual seja, a utilização de camisetas contendo propaganda dos candidatos ao cargo majoritário.

Pois bem.

Considerando a petição ID 124322910 que informou a este juízo a utilização do material denunciado em imagens publicadas em redes sociais dos candidatos, determino que os denunciados se abstenham, também, de divulgar imagens utilizando o material irregular, sob pena de multa diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em caso de descumprimento.

Dessa forma, determino nova notificação dos noticiados para a retirada das imagens contendo a propaganda irregular nas redes sociais e em todos os meios em que foram divulgadas, dentro do prazo de 48 (quarenta e oito) horas, com manifestação nos autos comprovando o cumprimento.

Após, dê-se vista ao Ministério Público Eleitoral.

Intime-se. 

Tais decisões ensejaram a impetração.

Relatou, na inicial do writ, ter sido contratada a confecção de 28 camisetas para uso exclusivo de seus candidatos aos cargos de prefeito, vice-prefeita e vereadores, sem benefício a eleitores, sendo 21 candidatos a vereador e mais os candidatos à majoritária, totalizando 23 concorrentes, conforme nota fiscal n. 000.006.070 – série 001, emitida pela empresa Pluma Comércio de Brindes Ltda., sendo as 5 restantes armazenadas para eventual substituição pelo uso dos candidatos à majoritária. Aduziu que a camiseta confeccionada se destinou somente aos candidatos, sem distribuição a eleitores, Sustentou que o objetivo da norma "é coibir a distribuição de bens e vantagens de qualquer espécie como moeda de troca ao voto do eleitor", de forma que não haveria impedimento para a utilização de camisetas por candidatos. Juntou documentos.

Com tais razões de impetração, veio pedido de concessão de medida liminar.

À luz das alegações da parte, e de posse das imagens das camisetas, páginas 2 e 3 do ID 45739144, deferi nos seguintes termos:

(...)

Decido.

A análise é aquela superficial, própria das relativas a pedido de concessão de tutela de urgência. 

Tenho, antecipo, por conceder a ordem. 

1. A medida restritiva foi tomada pelo d. Juízo da 42ª ZE em sede de NIP, procedimento administrativo que veicula poder de polícia, cujo rito é, reconhecidamente, de abreviado contraditório. Friso que, nessas condições, a medida pode ser mesmo considerada adequada naquele tempo e modo - ao menos enquanto não verificáveis maiores esclarecimentos acerca das vestimentas apreendidas - entrega de camisetas a eleitores, por exemplo. De fato, contudo, essa redução de contraditório pode, em alguns casos, resultar no efeito de que aquela medida inicialmente adequada surta efeitos para além do necessário;

2. É certo também que o art. 18, § 2º, da Resolução TSE n. 23.610/2019 admite a “entrega de camisetas a pessoas que exercem a função de cabos eleitorais para utilização durante o trabalho na campanha”, porém, o mesmo dispositivo condiciona a “que não contenham os elementos explícitos de propaganda eleitoral, cingindo-se à logomarca do partido, da federação ou da coligação, ou ainda ao nome da candidata ou do candidato” - nessa linha vida, na jurisprudência deste TRE, o processo n. 0603565-60, rel. Desa. Elaine Maria Canto da Fonseca;

3. Contudo, no caso do presente mandado de segurança, parece incontroverso que as camisetas serão utilizadas somente por candidatos, dada a nota fiscal que indica fabricação de apenas 28 (vinte e oito) unidades, cinco a mais, como quantitativo reserva, para os 23 (vinte e três) candidatos. Tal situação não é vedada pela legislação de regência, art. 39, § 6º, da Lei n. 9.504/1997, que de fato proíbe a distribuição de camisetas a eleitores - aqui, há o qualificado status de candidato, e assim o impetrante há de receber os ônus e bônus da legislação. Dito de outro modo, não há no caso aquela "vantagem ao eleitor" que a lei visa a coibir no que diz respeito ao eleitorado, e tampouco as limitações direcionadas às camisetas de cabos eleitorais. 

Julgo que o princípio da mínima intervenção na propaganda eleitoral não deve reger a atuação da Justiça Eleitoral apenas em relação aos conteúdos divulgados na internet (§ 1º do art. 38 da citada resolução) mas sim ser realizada sempre que possível, de modo que as ordens de remoção (no caso, de apreensão) devem se limitar às hipóteses em que seja constatada violação às regras eleitorais ou ofensa aos direitos das pessoas que participam do processo eleitoral. Odiosa restringenda, favorabilia amplianda.

Resta aqui, apenas, a advertência ao impetrante no sentido de que apenas os candidatos estão autorizados a utilizar o material sob exame, sob pena da configuração de ato de desobediência e atentatório à dignidade da Justiça.

DIANTE DO EXPOSTO, concedo a tutela antecipada, sede liminar, para suspender a decisão que determinou a cessação imediata da utilização de camisetas contendo propaganda dos candidatos ao cargo majoritário, inclusive com retirada de imagens das redes sociais. 

Restitua-se o material aos impetrantes.

Comunique-se com urgência o Juízo da Origem, para o cumprimento imediato da medida, sem necessidade do trânsito em julgado. 

Notifique-se a autoridade tida como coatora para prestar informações no prazo diferido de 3 (três) dias, em concerto da Lei do Mandado de Segurança às circunstâncias do célere processo judicial eleitoral. 

Após, à Procuradoria Regional Eleitoral, para a apresentação de parecer. 

Na sequência, a autoridade coatora prestou informações, ID 45736619 na íntegra:

Eminente Desembargador:

O procedimento adotado por este Magistrado ao determinar a proibição do uso das camisetas denunciadas em Notícia de Irregularidade na Propaganda Eleitoral observou os critérios estabelecidos no art. 18, da Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 18. São vedadas na campanha eleitoral confecção, utilização, distribuição por comitê, candidata, candidato, ou com a sua autorização, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem a eleitora ou eleitor, respondendo a infratora ou o infrator, conforme o caso, pela prática de captação ilícita de sufrágio, emprego de processo de propaganda vedada e, se for o caso, pelo abuso de poder.

§ 1º Observadas as vedações previstas no caput deste artigo e no art. 82 desta Resolução, é permitido a qualquer tempo o uso de bandeiras, broches, dísticos, adesivos, camisetas e outros adornos semelhantes pela eleitora e pelo eleitor, como forma de manifestação de suas preferências por partido político, federação, coligação, candidata ou candidato.

§ 2º É permitida a entrega de camisas a pessoas que exercem a função de cabos eleitorais para utilização durante o trabalho na campanha, desde que não contenham os elementos explícitos de propaganda eleitoral, cingindo-se à logomarca do partido, da federação ou da coligação, ou ainda ao nome da candidata ou do candidato.

Na hipótese, foi identificada a desconformidade do material produzido e distribuído a apoiadores com a norma eleitoral vigente, ensejando a atuação com base no poder de polícia conferido aos juízes eleitorais.

Colegas, tenho por manter os termos da decisão tomada sob forma liminar - e que agora trago ao referendo desta Corte. Com a devida vênia ao magistrado da origem, não se verifica, no caso dos autos, a hipotética qualificadora "possam proporcionar vantagem a eleitora ou eleitor", suporte que seria para a restrição de uso de camisetas. 

As roupas foram, forma comprovada, utilizadas somente por candidatos - candidatos estes que também não podem ser incluídos no conceito de meros "apoiadores", como feito pela autoridade nas informações que prestara, acima. A restrição à confecção e ao uso de camisetas, aliás, deve ser vista em três patamares: eleitor (nenhuma possibilidade, pois caracteriza "brinde"); apoiadores/cabos eleitorais (alguma possibilidade, com as restrições de layout constantes na legislação); e candidatos (ampla possibilidade, sem as restrições impostas aos cabos eleitorais e apoiadores). Ora, os candidatos a vereador integram a competição eleitoral. 

Sigo, dessarte, com a convicção de que houve restrição exacerbada à realização de propaganda eleitoral ao impetrante, pois a regra é a da liberdade, da mínima interferência da Justiça Eleitoral, sobretudo em procedimentos administrativos de exercício de poder de polícia, em que o contraditório é altamente resumido, abreviado.

Deixo de me alongar, aqui, nas razões de decidir pois, repito, submeto às Vossas Excelências a decisão monocraticamente por mim proferida em sede liminar.

Diante do exposto, VOTO para CONCEDER A ORDEM.