REl - 0600033-76.2024.6.21.0172 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/10/2024 às 14:00

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

Mérito

No mérito, cuida-se de examinar se estão presentes os requisitos à configuração de propaganda antecipada.

Sobre o tema, a Resolução TSE n. 23.610/19 dispõe em seu art. 3º-A:

 

Art. 3º-A. Considera-se propaganda antecipada passível de multa aquela divulgada extemporaneamente cuja mensagem contenha pedido explícito de voto, ou que veicule conteúdo eleitoral em local vedado ou por meio, forma ou instrumento proscrito no período de campanha. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)

Parágrafo único. O pedido explícito de voto não se limita ao uso da locução “vote em”, podendo ser inferido de termos e expressões que transmitam o mesmo conteúdo. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

 

No caso, a propaganda considerada extemporânea foi afixada na fachada de imóvel no dia 06 de agosto de 2024, consistindo em uma placa onde consta o número e a sigla do partido, tendo sido retirada, em 30 de agosto de 2024, em cumprimento da decisão proferida nos autos da NIP n. 0600022- 47.2024.6.21.0172.

Ao analisar o conteúdo acima, o magistrado julgou procedente a representação, nos seguintes termos (ID 45700638):

Analisando preliminarmente as questões levantadas pela defesa de reanálise dos mesmos fatos que já foram apreciados na NIP 0600022-47.2024.6.21.0172, e afronta a coisa julgada, realmente o referido processo tratou do mesmo fato, qual seja, a pintura na fachada do imóvel situado na esquina entre as ruas General Osório e Santos Pedroso, Bairro Hamburgo Velho. No entanto, o referido processo não é judicial, mas administrativo. Com efeito, conforme consulta aos autos, a NIP ele teve início a partir de denúncia do MPE, que provocou a a atuação administrativa do Juízo Eleitoral, com fundamento em seu poder de polícia.

O poder de polícia exercido pelos juízes eleitorais, com amparo no art. 35, XVII do Código Eleitoral, limita-se à adoção de medidas estritamente necessárias para fazer cessar a propaganda irregular, sendo uma prerrogativa com limites estreitos, não havendo possibilidade de aplicação de multa eleitoral, conforme a Súmula TSE n. 18, sendo um poder eminentemente administrativo.

Logo, a decisão nele proferida teve natureza administrativa. Como é sabido, o processo administrativo não faz coisa julgada no processo judicial, por força do princípio da inafastabilidade da jurisdição. Em que pese a mesma autoridade tenha atuado em ambos procedimentos, no administrativo, como já afirmado, o Juízo Eleitoral exerceu poder de polícia e não jurisdição. Portanto, não há que se falar em coisa julgada entre a presente demanda e a decidida nos autos do processo NIP 0600022-47.2024.6.21.0172.

O art. 3º- A da Resolução 23.610 do Tribunal Superior Eleitoral define a propaganda antecipada como aquela divulgada extemporaneamente cuja mensagem contenha pedido explícito de voto ou que veicule conteúdo eleitoral em local vedado ou por meio, forma ou instrumento proscrito no período de campanha".

A pintura na fachada do ímóvel, com conteúdo eleitoral, uma vez que traz a sigla e o número do partido,  que é o mesmo do candidato a Prefeito, é de grandes proporções, causando um efeito de outdoor, contendo a sigla, o símbolo e o número do partido, excedendo em muito as medidas permitidas no § 1º do art. 14 da Resolução TSE n. 23.610/2019.

Ademais, verifica-se que o imóvel está desocupado, sendo que os painéis cobrem sua porta, impedindo, assim, a entrada de qualquer pessoa, não sendo, portanto, nem sede de partido, nem de comitê de campanha.

Diligência cumprida por servidor do Ministério Público no dia 14/08 constatou que a pintura no imóvel, data anterior ao início do período permitido para o início da propaganda eleitoral, conforme o art. 36 da Lei n. 9504/97.

Não há que se falar também em desconhecimento da FEDERAÇÃO PSDB CIDADANIA sobre a propaganda colocada no imóvel, uma vez que foi notificada para sua retirada.

III – DISPOSITIVO

Isto posto, pelos fundamentos apresentados, acolho a manifestação do Ministério Público Eleitoral e julgo PROCEDENTE  a presente representação, para aplicar a multa prevista no § 3º do art. 36 da Lei n. 9504/97, no valor de R$ 10.000,00 em razão das dimensões da pintura, de grande efeito visual.
 

A sentença merece reforma.

Necessária a realização de distinção entre propaganda eleitoral, propaganda com conotação eleitoral e propaganda partidária.

Com efeito, em relação a publicidades semelhantes em período vedado (antes de 16 de agosto do ano da eleição), o TSE agasalhou o entendimento de que a divulgação do número e da sigla do partido, desde que inexistente o pedido explícito de voto, não se configura propaganda antecipada:

 

RECURSOS ELEITORAIS. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. ATOS DE PRÉ–CAMPANHA. ADESIVAGEM DE VEÍCULOS CONTENDO O NÚMERO E SIGLA DO PARTIDO. AUSÊNCIA DE NOME DE PRÉ–CANDIDATO E PEDIDO DE VOTOS. QUANTIDADE INSUFICIENTE PARA DESEQUILIBRAR O PLEITO ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA NÃO CONFIGURADA. REFORMA DA SENTENÇA.1. Prevê o artigo 1º, § 1º, IV, da Emenda Constitucional n.º 107/20 que a propaganda eleitoral somente foi permitida a partir do dia 27 de setembro de 2020, redação que vem a ser reprisada na Resolução TSE n.º 23.627/20, certo, portanto, que essa etapa do processo eleitoral ainda não se iniciara ao tempo da propaganda de que cuida as representações.2. As manifestações dos pré–candidatos estão regulamentadas no artigo 36–A da Lei das Eleicoes. A propósito de sua interpretação, o Tribunal Superior Eleitoral estabeleceu a seguinte orientação, destinada ao reconhecimento da manifestação como propaganda eleitoral antecipada: Reconhecido o caráter eleitoral da propaganda, deve–se observar três parâmetros alternativos para concluir pela existência de propaganda eleitoral antecipada ilícita: (i) a presença de pedido explícito de voto; (ii) a utilização de formas proscritas durante o período oficial de propaganda; ou (iii) a violação ao princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos (TSE, AI n.º 060009124, relator o ministro LUÍS ROBERTO BARROSO – DJE de 05 de fevereiro de 2.020, tomo 25) (Grifo nosso)

 

Decorre da interpretação sistemática dos arts. 36 e 36-A da Lei n. 9.504/97, que os meios de propaganda vedados no período permitido, a partir de 15 de agosto do ano eleitoral, também o são no período anterior.

Ademais, conforme entendimento do TSE ainda que não haja pedido explícito de voto, caracteriza–se o ilícito eleitoral quando: i) o veículo de manifestação se dá pela utilização de formas proscritas; ou ii) são utilizadas técnicas de comunicação equivalentes ao pedido explícito "identificado pelo uso de determinadas –palavras mágicas', como, por exemplo, –apoiem' e –elejam', que nos levem a concluir que o emissor está defendendo publicamente a sua vitória" (AgR–AI 29–31, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 03.12.2018).

Assim sendo, o Tribunal Superior Eleitoral evoluiu o entendimento para informar que mensagens de conteúdo eleitoral, mesmo em que não haja pedido expresso de votos, devem ser consideradas propaganda eleitoral extemporânea, se o meio empregado for proscrito em época de campanha oficial.

Ocorre que, no caso em tela, insta observar dois aspectos: a) utilização de meio proscrito, cujas dimensões da placa configurariam o uso de outdoor; e, b) o conteúdo veiculado, o qual deve expressar conotação eleitoral independentemente de pedido explícito de voto.

Este é o cerne da questão.

O conteúdo veiculado não possui pedido explícito de votos, tampouco conteúdo eleitoral, de modo a caracterizar um indiferente eleitoral.

Trata-se de propaganda partidária, que “objetiva à divulgação dos respectivos programas das agremiações, buscando obter simpatia ou engajamento de parte do eleitorado, de modo a cooptar novos filiados”. (Zílio, 2024 – p. 422)

Nesse sentido o entendimento da douta Procuradoria Regional Eleitoral:

Só a identificação da sigla, cores e número de um partido político não podem ser confundidos com conteúdo eleitoral. Para a configuração do “conteúdo eleitoral” é necessário, como se extrai da própria terminologia, algum vínculo indissociável das eleições na conteúdo do material em análise. Supõe a identificação de pessoas que se apresentarão (ou apresentam, após as convenções partidárias) como candidatos aos demais eleitores na expectativa de receber votos para serem eleitos aos cargos em disputa nas eleições. Se não a pessoas, ao menos uma referência ao número com explícito intuito de voto na legenda, pouco difundido entre os brasileiros. Sem esse explícito intuito, o número se caracteriza como divulgação (ou propaganda) partidária, não eleitoral.

 

Destarte, a mera divulgação da sigla e do número do partido na fachada da sede do partido, sem qualquer referência ao pleito eleitoral ou pedido de votos, não caracteriza propaganda eleitoral antecipada, notadamente em quantidade insuficiente para comprometer a igualdade de oportunidades em relação aos demais pré-candidatos.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso, para o fim de reformar a sentença e julgar improcedente a representação eleitoral por propaganda eleitoral antecipada, afastando-se a multa imposta à recorrente.