ED no(a) REl - 0600130-21.2024.6.21.0158 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/10/2024 às 10:00

VOTO

 

Inicialmente, consigno que a alegação de que as razões de decidir não se prestam a fundamentar as conclusões do acórdão não caracteriza os vícios de obscuridade, contradição e omissão, pois o Tribunal enfrentou todos os argumentos apresentados pelo embargante em suas contrarrazões de forma clara e expressa.

A irresignação com o julgamento que lhe foi desfavorável, sob a alegação de que os fundamentos do acórdão são imprestáveis, ou seja, não prestam, deve ser invocada no recurso dirigido a superior instância recursal.

É evidente que tal afirmativa está pautada no inconformismo da parte com a justiça da decisão e não na ausência de enfrentamento de suas teses defensivas, na falta de compreensão da motivação do acórdão ou na existência de premissa contraditória com a conclusão.

A jurisprudência pacífica das Cortes Superiores está sedimentada no sentido de que a decisão judicial deve apresentar o raciocínio e os motivos que conduziram à solução que pareceu mais justa, não sendo cabível forçar um novo julgamento e rediscutir o mérito do recurso tão somente porque os argumentos do embargante foram rejeitados.

Entende o embargante que a única conclusão que se presta à solução da causa é a defendida nas contrarrazões apresentadas, mas o Tribunal, de forma unânime, concluiu de modo diverso, contrário às suas pretensões.

Quanto aos pontos apontados como omissos, obscuros e contraditórios, verifica-se, da mera leitura do julgado, que logo no início das razões de decidir foram enfrentadas e rejeitadas as arguições relativas ao pedido de baixa dos autos à origem e à alegação de cerceamento de defesa.

Segundo o acórdão embargado: “Todavia, não assiste razão ao recorrido, pois o caso dos autos não se trata de impugnação ao pedido de registro, e sim de recurso contra a sentença de deferimento. O rito estabelecido para o processamento dos recursos interpostos contra as sentenças que deferem registros de candidatura consta do art. 64 e seguintes da Resolução TSE n. 23.609/19 e nele não há previsão de que os autos retornem à origem após a interposição do apelo, devendo a matéria ser decidida pelo Tribunal” (ID 45733396).

Se o embargante entende que tal argumentação é imprestável, nula, causa prejuízo e cerceamento de defesa, ofende os princípios do contraditório, da igualdade, da paridade de armas, do juiz natural, do devido processo legal e da impossibilidade de supressão de instância, viola o sistema processual vigente, a melhor interpretação do enunciado das Súmulas n. 11 e 45 do TSE e do art. 57 da Resolução TSE n. 23.609/19, contraria a legislação, a Constituição Federal, a jurisprudência e a doutrina, deve interpor o recurso próprio destinado a reverter o julgamento.

Omissão não há. E sequer basta, para acolhimento do presente recurso integrativo, a mera tese de omissão sobre o argumento da parte, eis que este pode ser rejeitado implicitamente. Ao adotar conclusão pela rejeição das preliminares o Tribunal afastou, ainda que tacitamente, todos os argumentos levantados, diretos e indiretos, com o intuito de que os autos voltassem à origem.

Nesse ponto, importa ter presente que o acórdão expressamente considerou a narrativa do embargante, trazida em contrarrazões, no sentido de “estar alcançado pela exceção contida na parte final do art. 14, § 7º, da Constituição Federa”, e que “o raciocínio exposto na impugnação colide com o que estabelecem os §§ 5° e 6° do referido artigo”.

Os embargos aduzem: “Nenhuma linha vazada a respeito dessa tese”. Entretanto, a íntegra dos dispositivos constitucionais invocados foi reproduzida no acórdão, foi analisada a tese defensiva e o Tribunal alcançou a seguinte conclusão, contrária à pretensão do embargante:

Por fim, por tudo o que dos autos consta e do aprofundado exame que realizei sobre a matéria, não identifico violação aos §§ 5º e 6° do art. 14 da Constituição Federal, a princípios e demais regras invocadas pelo recorrido, em razão desta conclusão. Nem há, a meu ver, necessidade de se apurar a efetiva ocorrência de mecanismo fraudulento, ou prova concreta de desvio de finalidade na assunção do suplente, mas tão somente conclusão de que a ressalva constitucional e o leading case invocado não lhe alcançam.

O embargante igualmente assevera que “linha alguma foi vazada pelo TRE-RS” a respeito de sua tese de que “ao entrar em exercício de mandato eletivo o cidadão que possui um diploma de suplente ou vice recebe todos os poderes e todas as prerrogativas inerentes ao cargo, inclusive as que dizem respeito a (in)elegibilidades”.

Todavia, basta ler o acórdão para verificar que tal construção foi rebatida no seguinte ponto: “A substituição ininterrupta pelo período de 1 ano e 7 meses até o momento do pedido de registro de candidatura, aproximadamente metade do tempo ocorrido no paradigma da Bahia, e inferior à metade do tempo de uma legislatura, não faz com que o recorrido, suplente de vereador, passe a ostentar todas as garantias e prerrogativas parlamentares”.

Também não se identifica obscuridade alguma.

De acordo com a doutrina, a obscuridade pode ser definida como “qualidade do texto que é de difícil (senão impossível) compreensão” e que está, “em regra, presente no recurso dúbio, passível de variante interpretação, em virtude da falta de elementos textuais que o organize e lhe confira harmonia interpretativa” (Mazzei, Rodrigo. Comentário ao art. 1.022 do CPC/2015. In: Teresa Arruda Alvim Wambier et al. (Coord.), Breves comentários ao novo Código de Processo Civil 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. RT, 2016, p. 2375).

Contudo, o embargante demonstra que o acórdão não lhe gerou dificuldade de compreensão semântica.

As razões de embargos reportam-se a percentuais de tempo quanto à contagem do prazo de exercício do mandato de vereador tendo por referência a data do pedido de registro de candidatura, afirmam a existência de obscuridade, e requerem que o Tribunal compare o caso concreto com a situação verificada no precedente do TSE para “esclarecer se há diferença dessemelhança significativa diante de percentuais”.

Como se vê, os embargos não pretendem uma fundamentação mais detalhada sobre as conclusões do acórdão. O propósito do recurso é forçar nova manifestação sobre tema já decidido, à guisa de omissão.

Conforme já decidiu o STJ, decisão judicial “não é peça acadêmica ou doutrinária, tampouco se destina a responder a argumentos, à guisa de quesitos, como se laudo pericial fora” (REsp 209048/RJ, Rel. Ministro Franciulli Netto, Segunda Turma, Julgado em 4.11.2003, DJ 19.12.2003, p. 380).

No acórdão há longa discussão sobre tempo de mandato de vereador e foram devidamente apresentadas as considerações do Tribunal a respeito do tema e acerca da diferença entre o fato analisado nos presentes autos e o precedente do TSE, em judiciosas razões:

(…)

Desde a Eleição de 2020, Pablo passou a substituir os titulares Cezar Augusto Schirmer e Idenir Cecchim em razão de seus afastamentos do exercício do mandato de vereador, conforme certidão do ID 45684644, lavrada pelo Diretor Legislativo da Câmara Municipal de Porto Alegre:

(...)

Ou seja, no precedente em voga o TSE afastou a inelegibilidade por parentesco da suplente de vereadora porque, no momento do pedido de registro de candidatura, já ocupava o cargo há 3 anos e 2 meses, e de forma ininterrupta, do qual estava o titular licenciado para tratar de interesses particulares. Além disso, a referida candidata substituiu, por todo esse tempo, o mesmo vereador titular.

Já Pablo Melo, quando requereu o seu registro de candidatura, exercia a vereança há somente 1 ano e 7 meses de forma ininterrupta, aproximadamente metade do tempo do caso análogo, conforme certidão emitida em 28/08/2024 pela Câmara Municipal de Porto Alegre (ID 45684644).

Seu tempo total de atividade como vereador, com diversas pausas, foi de 2 anos, 10 meses e 12 dias, envolveu a substituição de dois vereadores titulares, e não do mesmo vereador, como ocorrido no precedente Baiano. Além disso, entre 14.05.2022 e 02.01.2023, por 7 meses e 23 dias, Pablo Melo deixou de substituir os vereadores titulares, sendo totalmente irrelevante para o desfecho da questão se o término da substituição ocorreu para disputar o cargo de deputado estadual no pleito de 2022 ou qualquer outro motivo.

Em verdade, penso que a tese defensiva de que deve ser relevada a interrupção da substituição porque o recorrido, nesse período, concorreu a outro cargo eletivo, milita em seu desfavor. O fato de ter deixado de exercer a vereança por longo período de tempo torna mais desafiadora a pretensão de que deve ser adotada a mesma solução do julgado paradigma de Nazaré/Bahia.

Essa interrupção somente reforça que o candidato está a substituir o titular, ou melhor dizendo, os titulares, de forma não duradoura, em clara atuação parlamentar episódica, precária, eventual, limitada, e totalmente distinta da titularidade que se logrou demonstrar nos autos do precedente da Bahia.

De outro lado, considero que a discussão não se relaciona à viabilidade ou inviabilidade política do candidato, matéria interna corporis que deve ser ponderada pelo partido político da filiação, afeta à autonomia partidária, prevista no art. 17, § 1º, da Constituição Federal, e não pela Justiça Eleitoral quando da análise do pedido de registro de candidatura. Se um candidato foi escolhido em convenção é de se pressupor que o partido percebe viabilidade de sua eleição, e isso em nada interfere na verificação da existência de causa de inelegibilidade.

De igual modo, o debate sobre a atuação legislativa do recorrido é de todo desnecessário e insignificante, sendo certo, público e notório, que os titulares Cezar Augusto Schirmer e Idenir Cecchim também foram atuantes na Câmara de Vereadores, conforme se verifica da divulgação de suas ações parlamentares.

O que importa, na hipótese em tela, é que o Ministro Alexandre de Moraes, ao votar pelo deferimento do registro da candidata da Bahia, ressaltou que esta exerceu o cargo de vereadora na legislatura anterior, de fato, por três anos e dois meses – portanto por quase todo o mandato, o que não se verifica no presente processo.

O entendimento do TSE foi para um caso distinto, inédito e isolado. Aqui, neste feito, nada há de isolado ou de diferente daquilo que se vê em substituições parlamentares. Por isso, deve ser aplicado o entendimento firmado pelo STF no Recurso Extraordinário n. 409.459, de que a exceção à inelegibilidade prevista no art. 14, § 7º, da CF não alcança o suplente.

A substituição ininterrupta por parcos 1 ano e 7 meses até o momento do pedido de registro de candidatura, aproximadamente metade do tempo verificado no paradigma da Bahia, não faz com que o candidato suplente de vereador passe a ostentar todas as garantias e prerrogativas parlamentares.

No período de substituição de dois titulares não identifico situação estabilizada de titularidade de mandato. Não houve exercício do cargo parlamentar de forma contínua, estável, duradoura, razão pela qual o candidato não deve estar sujeito à norma excepcional e permissiva do § 7º, do artigo 14 da Constituição Federal, que afasta o impedimento do titular de mandato parlamentar de pleitear a reeleição ao mesmo cargo, dentro da circunscrição de atuação do chefe do Poder Executivo.

 

Se o embargante entende que o desfecho adotado pelo TSE no julgado invocado é o mais justo para este caso concreto, e que “a distinção feita pelo TRE-RS para afastar a similitude fática dos casos parte de um critério não valorizado no precedente original”, deve interpor o recurso próprio visando a modificação da decisão.

Não cabe opor embargos de declaração para que o Tribunal amolde o julgamento ao que defendeu o embargante em suas contrarrazões.

Ao alegar obscuridade e contradição o embargante afirma que: “é obscura a parte do acórdão que assume o fato de que Pablo Melo substituiu dois Vereadores distintos”, e que a decisão “ao mesmo tempo em que contabiliza todo o tempo de mandato do Vereador Pablo Melo, chegando a um número aproximado ao tempo de Mandato da Vereadora de Nazaré em caso análogo, acaba por concluir que aquele exerceu o mandato de forma ‘episódica’, assumindo – sem a devida justificativa – que apenas o período final (1 ano e 7 meses ininterruptos) deveria ser levado em consideração para a apreciação do caso, com o que desprezou os demais períodos de substituição”.

Tais argumentos são mera insurgência ao que fora decidido e ao valor dado pelo Tribunal à prova juntada aos autos.

Ademais, não há contradição alguma em relação à simples constatação de fatos públicos e comprovados nos autos: que o embargante substituiu mais de um vereador titular e que estava exercendo a vereança, quando do requerimento do pedido de registro de candidatura, há somente 1 ano e 7 meses de forma ininterrupta.

Com essas razões, concluo que o recurso não comporta provimento.

O prequestionamento regula-se pelo disposto no art. 1.025 do CPC.

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.