REl - 0600076-51.2024.6.21.0030 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/10/2024 às 14:00

VOTO

Da Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

Do Mérito

Trata-se de recurso eleitoral interposto por MARCIANE MENDONCA LANES contra sentença que acolheu impugnação apresentada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL e indeferiu o pedido de registro de candidatura da ora recorrente para concorrer ao cargo de vereadora.

Na origem, o indeferimento baseou-se na destituição da recorrente do cargo de conselheira tutelar, a bem do serviço público, por infração disciplinar grave, atraindo a incidência da causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. I, al. "o", da Lei Complementar n. 64/90, que assim prevê:

Art. 1º São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

[…].

o) os que forem demitidos do serviço público em decorrência de processo administrativo ou judicial, pelo prazo de 8 (oito) anos, contado da decisão, salvo se o ato houver sido suspenso ou anulado pelo Poder Judiciário; (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)

 

No caso, é incontroverso que a recorrente foi exonerada do cargo de Conselheira Tutelar em virtude de faltas graves e descumprimentos de seus deveres funcionais, apurados no Processo Administrativo n. 015/17 (Sindicância n. 07/17) pela Corregedoria do Conselho Tutelar do Município, sendo formalizada a exoneração pelo Decreto n. 338, de 30.11.2017.

Tal situação enquadra-se na previsão do art. 1º, inc. I, al. "o", da Lei Complementar n. 64/90, aplicando-se a inelegibilidade por oito anos a contar do referido decreto de exoneração.

A recorrente defende que o cargo de conselheira tutelar não se equipara ao “serviço público” e que a sua destituição do mandato no cargo não estaria abarcada no conceito de “demissão” contido na norma.

Entretanto, o TSE pacificou a sua jurisprudência no sentido de que a destituição do mandato de conselheiro tutelar é equiparada à demissão de servidor público para fins de incidência da causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. I, al. “o”, da Lei Complementar n. 64/90:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. VEREADOR. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA. RELATOR. POSSIBILIDADE. ART. 36, § 6º, DO RITSE. DECISÃO AGRAVADA. FUNDAMENTOS. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. INOCORRÊNCIA. VERBETE SUMULAR 26 DO TSE. INCIDÊNCIA. ACÓRDÃO REGIONAL. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. PROVA TESTEMUNHAL. INDEFERIMENTO. IRRELEVÂNCIA. DESNECESSIDADE. NULIDADE. AFASTAMENTO. INELEGIBILIDADE. CONSELHEIRO TUTELAR. PERDA DE MANDATO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. EQUIPARAÇÃO. DEMISSÃO. SERVIDOR PÚBLICO. ART. 1º, INCISO I, ALÍNEA "O", DA LEI COMPLEMENTAR 64/90. AUSÊNCIA DE SUSPENSÃO OU ANULAÇÃO DO ATO PELO PODER JUDICIÁRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. VÍCIOS. EXAME. JUSTIÇA ELEITORAL. INCOMPETÊNCIA. AÇÃO ANULATÓRIA. TRAMITAÇÃO. PROCESSO DE REGISTRO. SOBRESTAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA CELERIDADE PROCESSUAL. RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO.

(…)

9. Este Tribunal Superior já manifestou, por meio de diversas decisões individuais, a compreensão de que a destituição do mandato de conselheiro tutelar é equiparada à demissão de servidor público para fins de incidência da causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, o, da Lei Complementar 64/90. Nesse sentido: REspe 213–84, rel. Min. Luiz Fux, PSESS em 6.12.2016; REspe 180–15, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 14.2.2013; REspe 241–56, rel. Min. Dias Toffoli, DJE de 1º.2.2013; e REspe 181–03, rel. Min. Nancy Andrighi, PSESS em 11.12.2012.

10. Na linha da jurisprudência desta Corte Superior a respeito do disposto no art. 1º, I, o, da Lei Complementar 64/90, "ainda que ‘demissão' e ‘destituição' sejam palavras distintas, para os efeitos legais são como sinônimos, ou seja, significam a extinção do vínculo com a Administração Pública diante da realização de falta funcional grave" (AgR–RO 837–71, rel. Min. Gilmar Mendes, PSESS em 3.10.2014).

(…).

(TSE - Agravo Regimental No Recurso Especial Eleitoral 060031447/SP, Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos, Acórdão de 06/05/2021, Publicado no(a) Diário de Justiça Eletrônico 90, data 19/05/2021) (Grifei.)

 

Em uma segunda ordem de argumentos, a recorrente assevera que, no pleito de 2020, esta Corte Regional deferiu o seu registro de candidatura sob o mesmo contexto fático, nos autos do REl n. 060004655, e, por isso, entende que “a mesma compreensão deve prevalecer em relação ao pleito eleitoral em andamento”.

Ocorre que as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade são aferidas considerando a eleição para a qual o candidato registrou sua candidatura, de acordo com a jurisprudência e a legislação vigentes ao tempo de cada pleito, uma vez que não existe coisa julgada ou direito adquirido entre diferentes eleições.

Nesse sentido, colho a pacífica jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2022. RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL. DEPUTADO ESTADUAL. INELEGIBILIDADE. CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO. POSSE DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO. ALTERAÇÃO INTRODUZIDA PELA LEI 13.964/2019 (PACOTE ANTICRIME) NO TEXTO LEGAL DO ART. 1º, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DA LEI 8.072/1990 (LEI DE CRIMES HEDIONDOS). NATUREZA HEDIONDA CARACTERIZADA. INDEFERIMENTO DO REGISTRO DE CANDIDATURA. AGRAVO DESPROVIDO. [...]. 2. É pacífico nesta Corte o entendimento de que "as causas de inelegibilidade e as condições de elegibilidade devem ser aferidas a cada eleição, sem que se possa falar em coisa julgada ou direito adquirido". [...].

(Agravo Regimental no Recurso Ordinário Eleitoral nº060051116, Acórdão, Min. Ricardo Lewandowski, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 11/05/2023) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA DEFERIDO NA ORIGEM. PREFEITA NÃO ELEITA. ART. 224, CAPUT E § 3º, DO CÓDIGO ELEITORAL. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. PREJUDICIALIDADE. DESPROVIMENTO. [...]. 4. Nos termos da iterativa jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, "as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas a cada pleito, de modo que o reconhecimento ou não de determinada hipótese de inelegibilidade em uma eleição não produz os efeitos da coisa julgada para as posteriores" (REspe nº 670-36/PE, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 19.12.2019). 5. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº060016614, Acórdão, Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 09/04/2021) (Grifei.)

 

Julgamentos favoráveis ao registro de candidatura em pleitos anteriores não vinculam o exame das causas de inelegibilidade em eleições subsequentes, uma vez que se deve ter em conta a evolução legislativa e jurisprudência ocorrida em cada época.

Nesses termos, quanto à situação fática em análise, este Tribunal já adequou a sua jurisprudência à orientação então sedimentada na Corte Superior, passando a entender, desde pleitos anteriores, que a destituição de conselheiro tutelar é equiparada à demissão do serviço público para fins de inelegibilidade, conforme ilustra o seguinte julgado:

REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2022. IMPUGNAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL. INELEGIBILIDADE. CONSELHEIRO TUTELAR. DEMISSÃO. INÍCIO DA CONTAGEM. JULGAMENTO PELO ÓRGÃO COLEGIADO. ART. 1º, INC. I, AL. #O#, DA LEI COMPLEMENTAR N. 64/90. CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE E CAUSAS DE INELEGIBILIDADE. AFERIÇÃO NO MOMENTO DA FORMALIZAÇÃO DO PEDIDO DE REGISTRO. PROCEDENTE. INDEFERIMENTO DO REGISTRO.

1. Impugnação a pedido de registro de candidatura ao cargo de deputado estadual, sob o fundamento de que o candidato é inelegível por força do art. 1º, inc. I, al. “o”, da Lei Complementar n. 64/90.

2. Sentença transitada em julgado em ação civil pública determinando a destituição definitiva do demandado de suas funções junto a Conselho Tutelar, bem como sua inelegibilidade para qualquer cargo pelo período de 08 (oito) anos. As condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas no momento da formalização do pedido de registro da candidatura, ressalvadas as alterações, fáticas ou jurídicas, supervenientes ao registro (art. 52 da Resolução TSE n. 23.609/19).

3. Reconhecida a inelegibilidade pelo período de oito anos, a contar da data do julgamento da apelação pelo órgão colegiado, nos termos do art. 14, § 9º, da Constituição Federal, c/c art. 1º, inc. I, al. “o”, da LC n. 64/90. 4. Procedente. Indeferimento do pedido.

(TRE-RS - Acórdão: 060135536 PORTO ALEGRE - RS, Relator: Des. AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, Data de Julgamento: 09/09/2022, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 12/09/2022 ) (Grifei.)

 

Assim, diante da comprovação da destituição do mandato de conselheira tutelar por infrações funcionais e da ausência de decisão judicial que suspenda ou anule o ato administrativo, resta configurada a causa de inelegibilidade da recorrente, nos termos expostos na sentença.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.