REl - 0600252-58.2024.6.21.0053 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/10/2024 às 14:00

VOTO

ADMISSIBILIDADE

No que tange ao exame de admissibilidade, verifica-se que a sentença foi prolatada e publicada em 04.9.2024 e a interposição recursal deu-se na data de 06.9.2024. Portanto, presente o pressuposto da tempestividade.

Além, verificam-se os demais requisitos válidos à interposição do recurso.

Assim, conheço do recurso interposto e passo à análise de mérito.

MÉRITO

Conforme relatado nos presentes autos, o recorrente teve indeferido seu registro de candidatura para concorrer a vereador nas próximas eleições de 06.10.2024, no município de Lagoão, tendo em vista faltar-lhe a comprovação de filiação partidária em prazo hábil definido pela legislação de regência.

A fim de obter o reconhecimento da filiação, juntou ficha de filiação ao Partido dos Trabalhadores e ata notarial, lavrada em cartório de notas no Município de Sobradinho.

Todavia, entendo ser insuficiente a documentação apresentada, consoante passo a expor.

Porquanto cediço, a filiação partidária é uma das condições de elegibilidade previstas no art. 14, § 3o, da Constituição Federal, indispensável àquele que pretende concorrer a cargo eletivo.

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: (...) § 3o São condições de elegibilidade, na forma da lei:

I - a nacionalidade brasileira; II - o pleno exercício dos direitos políticos; III - o alistamento eleitoral; IV - o domicílio eleitoral na circunscrição; V - a filiação partidária; (...)

Ademais, a Lei n. 9.504/97, em seu art. 9º, estabeleceu que, para concorrer às eleições, o candidato deverá estar com a filiação deferida pelo menos seis meses antes do pleito.

Art. 9º Para concorrer às eleições, o candidato deverá possuir domicílio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de seis meses e estar com a filiação deferida pelo partido no mesmo prazo.

Trata-se, assim, de requisito temporal que, no corrente exercício, encerrou-se em 06.04.2024.

Em termos procedimentais, a atual redação do art. 19 da Lei n. 9.096/95, definida pela Lei n. 13.877/19, estatuiu que, deferida internamente a filiação, a agremiação deve inserir os dados no sistema FILIA que, automaticamente, encaminhará a relação de todos os filiados aos juízes eleitorais, com vistas a aferir o cumprimento do prazo de filiação.

Art. 19. Deferido internamente o pedido de filiação, o partido político, por seus órgãos de direção municipais, regionais ou nacional, deverá inserir os dados do filiado no sistema eletrônico da Justiça Eleitoral, que automaticamente enviará aos juízes eleitorais, para arquivamento, publicação e cumprimento dos prazos de filiação partidária para efeito de candidatura a cargos eletivos, a relação dos nomes de todos os seus filiados, da qual constará a data de filiação, o número dos títulos eleitorais e das seções em que estão inscritos.

Por sua vez, o Tribunal Superior Eleitoral, na Resolução TSE n. 23.609/19, que trata sobre a escolha e o registro de candidatos e candidatas para as eleições, em seu art. 28, acerca dos requisitos para as filiações, estabeleceu:

Art. 28. Os requisitos legais referentes à filiação partidária, ao domicílio eleitoral, à quitação eleitoral e à inexistência de crimes eleitorais são aferidos com base nas informações constantes dos bancos de dados da Justiça Eleitoral, sendo dispensada a apresentação de documentos comprobatórios pelos requerentes (Lei nº 9.504/1997, art. 11, § 1º, III, V, VI e VII).

§ 1º A prova de filiação partidária da candidata ou do candidato cujo nome não constar dos dados oficiais extraídos do Sistema FILIA pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública(Lei nº 9.096/1995, art. 19;Súmula nº 20/TSE).

[…]

Nesta senda, à luz do normativo daquela Corte, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem reconhecido que, em situações em que há falha ou omissão do partido político na atualização do sistema Filia, a responsabilidade não pode ser imputada ao candidato, desde que este apresente outros documentos hábeis que comprovem sua filiação dentro do prazo legal.

Em tal sentido, assim a atual redação da Súmula TSE n. 20:

A prova de filiação partidária daquele cujo nome não constou da lista de filiados de que trata o art. 19 da Lei nº 9.096/1995, pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública.

Por outro lado, o Procurador Regional Eleitoral reportando-se ao lastro documental probatório produzido pelo recorrente, observa que:

"dentre os documentos juntados, destacam-se dois: a) ficha de filiação preenchida pelo requerente (ID 45694813); e ata notarial. Nessa ata (ID 45694817), por meio de acesso a URL referente a sítio eletrônico do PT, o tabelião relata ter entrado em ambiente que guarda o registro de filiados; e lá viu o nome de VILMAR DA COSTA, filiado desde 06/04/2024."

Assim, conclui o ilustre membro do Parquet em seu parecer:

"nota-se um conjunto probatório seguro, harmônico e apto a evidenciar a efetiva filiação no prazo legal, razão pela qual deve prosperar a irresignação."

Todavia, concessa maxima venia, divirjo dos argumentos lançados no parecer do ilustre procurador Regional Eleitoral.

Destaque-se, a ata notarial inserta ao processo é documento que atende às formalidades legais, é dotada de fé pública, estando devidamente lavrada pelo tabelião substituto no Tabelionato de Notas de Sobradinho, nela constam todos os procedimentos realizados pelo tabelião no sentido de pesquisar e certificar as informações acerca de VILMAR DA COSTA obtidas no sítio eletrônico do Partido dos Trabalhadores, extraindo do sistema próprio de filiados do PT as datas atinentes ao histórico de filiação de VILMAR no Partido “Pedido de 18.10.2023 - Data de Divulgação19.10.2023 - Data de Filiação 06.4.2024”.

Entretanto, cabe ressaltar que a ata notarial em questão, com efeito, consubstancia-se documento unilateral, uma vez que, no caso concreto, não atende, fática e juridicamente, à bilateralidade que ressaem das disposições da Resolução TSE n. 23.609/19 e da Súmula TSE n. 20, acima transcritas.

Efetivamente, reitere-se, a ata notarial em tela atesta o acesso aos dados constantes na página do Partido dos Trabalhadores. Porém, na prática, não tem o condão de comprovar, em seu texto, com fidedignidade, o momento da efetiva formação do vínculo partidário do recorrente com a grei partidária, limitando-se a registrar as informações ali localizadas, constantes no sítio eletrônico visitado, na medida do requerido.

No ponto, trazendo a este Voto contribuição doutrinária colacionada por Nelson Nery Júnior (Curso de Direito Civil, 2019), “Tudo o que concerne à formação do ato (ao desempenho do oficial, portanto), bem como tudo quanto o oficial certifica haver-se passado em sua presença, fica coberto pela fé pública que lhe é inerente. É preciso distinguir, porém entre o que o oficial declara e o que ao oficial é declarado. A fé pública cobre a declaração formulada pelo interessado ao oficial, mas não atribui veracidade ao conteúdo da declaração formulada pelo interessado ao oficial. Quanto a esta, só ficará atestada como veraz sua existência, isto é, haver sido formulada tal e qual; não a sua veracidade, ou seja, a atestação do oficial não confere veracidade ao conteúdo do que lhe é declarado”.

Nesta linha, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, prevalece entendimento no sentido de que a ata notarial prova a declaração do fato, mas não necessariamente o fato declarado, com isso, a ata notarial é instrumento que só poderá comprovar a alegada e efetiva filiação partidária se contiver em seu texto dados seguros e conclusivos quanto à sua ocorrência contemporânea à alegada filiação.

Destarte, vale trazer a lume precedentes jurisprudenciais exarados em diferentes acórdãos pelo TSE, que assim tem se pronunciado:

“Eleições 2022 [...] Filiação partidária. Comprovação. Ata notarial. Fé pública. Precedente. Conjunto probatório suficiente [...] 2. Este Tribunal já admitiu como prova de filiação partidária ata notarial, por esta constituir documento dotado de fé pública [...] 3. Conforme firmou o Tribunal a quo , as atas notariais se prestam especialmente a atribuir fé pública ao objeto que transcrevem e são meio de prova hábil e utilizável em processos judiciais, mas só comprovam a alegada filiação se contiverem em seu texto dados seguros e conclusivos a respeito da efetivação do vínculo partidário, como no presente caso […]”. (Ac. de 27.10.2022 no REspEl nº 060107965, rel. Min. Carlos Horbach.)

“[...] Eleições 2020. Vereador. Registro de candidatura. Condição de elegibilidade. Filiação partidária. Prova. Documento unilateral. Inadmissibilidade. Súmula 20/TSE. [...] 2. Nos termos da Súmula 20/TSE, ‘[a] prova de filiação partidária daquele cujo nome não constou da lista de filiados de que trata o art. 19 da Lei nº 9.096/1995, pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública’. 3. No caso, conforme a moldura fática do aresto a quo , a candidata apresentou ficha de filiação partidária, documento, contudo, insuficiente para comprovar o tempestivo ingresso nos quadros da grei. Precedentes. 4. De outra parte, extrai–se do acórdão que ‘a ata notarial só comprova a alegada filiação se contiver em seu texto dados seguros e conclusivos a respeito da efetivação do vínculo partidário, o que não se vê nos autos’, sem detalhes sobre o seu teor. [...] 5. Ainda de acordo com o TRE/CE, quanto ‘aos comprovantes de contribuições apresentados, [...] os períodos não demonstram com a clareza necessária sua filiação tempestiva (datas de pagamento em 05/08/2016 e 16/09/2020)’. Assim, o longo espaço de tempo – de mais de quatro anos – nesses documentos não permite demonstrar com segurança a filiação. [...]” (Ac. de 11.2.2021 no AgR-REspEl nº 060058330, rel. Min. Luis Felipe Salomão.)

Concluindo-se, por não ter o recorrente trazido elementos de prova hábeis a comprovar o vínculo partidário no tempo mínimo exigido, a manutenção da sentença que indeferiu o registro de candidatura de VILMAR DA COSTA para o cargo de vereador nas Eleições Municipais de 2024 é medida que se impõe.

Ante o exposto, VOTO pelo DESPROVIMENTO do recurso de VILMAR DA COSTA e FEDERAÇÃO BRASIL DA ESPERANÇA - FE BRASIL - (PT/PC DO B/PV.)