REl - 0600249-59.2024.6.21.0100 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/09/2024 às 14:00

VOTO

O recurso busca a reversão do direito de resposta concedido nos termos do art. 58 da Lei n. 9.504/97, regulamentado pelo art. 31 da Resolução TSE n. 23.608/19:

Art. 31. A partir da escolha de candidatas ou candidatos em convenção, é assegurado o exercício do direito de resposta à candidata, ao candidato, ao partido político, à federação de partidos ou à coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social, inclusive provedores de aplicativos de internet e redes sociais ( Lei nº 9.504/1997, arts. 6º-A e 58, caput e Lei nº 9.096/1995, art. 11-A, caput e § 8º ). (Redação dada pela Resolução nº 23.672/2021)

Parágrafo único. Se o pedido versar sobre a utilização, na propaganda eleitoral, de conteúdo reputado sabidamente inverídico, inclusive veiculado originariamente por pessoa terceira, caberá à representada ou ao representado demonstrar que procedeu à verificação prévia de elementos que permitam concluir, com razoável segurança, pela fidedignidade da informação.

 

De acordo com a sentença, no vídeo questionado há a afirmação claramente falsa de que a falta de recursos na área da saúde é causada pelos cargos em comissão e funções gratificadas, sendo essa alegação mera suposição. Além disso, frisou a magistrada ter sido afirmado que “vários crimes são cometidos pela Administração”, e que o gestor público atual determinou que fizessem um “pente fino para saber quais pessoas que estavam sendo atendidas em fisioterapia, se eram da situação ou da oposição”.

Da análise dos autos, verifico que o material impugnado não foi juntado aos autos. Conforme aponta a Procuradoria Regional Eleitoral: “as postagens já foram removidas e a representante não transcreveu o que foi dito por RUDIMAR”.

De qualquer modo, verifica-se, do exame do feito, que a gravação continha veemente adjetivação negativa à administração municipal.

No entanto, conforme entende o TSE “No debate democrático, a veiculação de críticas incisivas, vigorosas e ácidas, mesmo sendo desagradáveis, não autoriza o cerceamento automático ao exercício do direito à liberdade de expressão” (TSE - DR: 060159085 BRASÍLIA - DF, Relator: Min. Cármen Lúcia, Data de Julgamento: 28.10.2022, Data de Publicação: 28.10.2022).

Segundo a Corte Superior Eleitoral, apenas veiculação, ainda que indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica autoriza o direito de resposta, o que verifico presente somente em pequeno trecho da mensagem, tal qual concluiu a Procuradoria Regional Eleitoral.

Isso porque a narrativa de que o gestor da saúde teria pedido que se fizesse um “pente fino” para se saber o viés político das pessoas atendidas pela equipe de fisioterapia, reconhecida como tendo sido efetivamente realizada nas próprias razões recursais do recorrente, não foi minimamente comprovada e se reveste notoriamente como uma afirmação difamatória, na medida em que consiste na atribuição de fato ofensivo à reputação de alguém.

Considerando que a atual administração municipal tem como candidatos à reeleição os atuais prefeito e vice-prefeito de Tapejara que concorrem na coligação recorrida, é manifesto o seu interesse na supressão do conteúdo da internet.

E para reverter o direito de resposta concedido, ter-se-ia que se afastar a caracterização de afirmação “sabidamente inverídica”, ou seja, a assertiva que deliberadamente falseia a verdade, ou seu conteúdo difamatório, o que não foi realizado pelo recorrente. O recorrente tão somente reconhece a fala de que trabalhou na Secretaria da Saúde “quando o gestor público determinou que fizessem um pente fino para saber quais pessoas que estavam sendo atendidas em fisioterapia, se eram da situação ou da oposição”. Afirma, sem provas, que se trata de uma verdade.

Assim, somente nesse ponto, a sentença merece ser mantida.

Quanto à alegação de existência de crime ambiental, foi suficientemente demonstrado pelo recorrente que se tratou de questão isolada relativa à existência de trator abandonado. Nesse sentido, o parecer ministerial nesta instância:

(…)

Contudo, na sentença, a frase vários crimes são cometidos foi posta entre aspas, como se ela fosse uma transcrição, o que aparentemente não é: há elementos para a procedência da demanda, mormente com relação as alegações nas quais afirmou que os Vereadores de Tapejara não exercem a função de fiscalizadores, referindo que “vários crimes são cometidos pela Administração” e “ninguém fala nada”.

Por sua vez, o recorrente, juntando vídeo, alega ter se referido tão somente quanto à existência de crime ambiental. Na filmagem, supostamente realizada “no pátio da garagem da prefeitura”, de fato vê-se um trator enterrando vários objetos, inclusive pneus. E em tom de indignação, RUDIMAR refere-se a isso como algo “irregular”.

Deve-se destacar que o fato sabidamente inverídico, conforme definição do e. TSE, “é aquele que não demanda investigação, ou seja, perceptível de plano” (AgR-AREspE nº 060040043, Relator Min. Raul Araujo Filho, publicado em 28/08/2023).

Ora, para saber se houve crime ambiental ou não no caso, seria preciso uma investigação, o que, pela definição jurisprudencial acima, fica afastada eventual caracterização de divulgação de fato sabidamente inverídico.

(...)

As demais críticas quanto à gestão da saúde no município igualmente não transbordam daquilo que se verifica no embate político acirrado entre candidatos de partidos antagônicos. A esse respeito, é valiosa a lição de José Jairo Gomes:

Afirmações e apreciações desairosas, que, na vida privada, poderiam ofender a honra objetiva e subjetiva de pessoas, chegando até mesmo a caracterizar crime, perdem esse matiz quando empregadas no debate político-eleitoral. Assim, não são de estranhar assertivas apimentadas, críticas contundentes, denúncias constrangedoras, cobranças e questionamentos agudos. Tudo isso insere-se na dialética democrática.

(Direito Eleitoral, 10a ed., São Paulo: Atlas, 2014, p. 471)

Desse modo, merece ser reformada em parte a sentença para que seja mantida a determinação de remoção dos conteúdos impugnados, mas deferido o direito de resposta tão somente quanto ao ponto do vídeo impugnado em que se afirma que o gestor público determinou que fizessem um pente fino na Secretaria da Saúde para saber quais pessoas que estavam sendo atendidas em fisioterapia, se eram da situação ou da oposição. Aqui houve extrapolação do limite da liberdade de crítica política.

A ordem de abstenção de divulgação deve ficar limitada a conteúdo idêntico, ou seja, o mesmo vídeo.

Em razão da impossibilidade de se estabelecer censura prévia sobre o teor dos programas e das matérias jornalísticas ou de caráter meramente informativo a serem exibidos na televisão, na rádio, na internet e na imprensa escrita, reforma-se a sentença no trecho em que determinou, ao recorrente, a abstenção quanto a fatos futuros e o impedimento “de disseminar notícias falsas a respeito dos candidatos opositores, bem como de atribuir-lhes, de modo público, por meio de suas plataformas digitais, a prática de condutas ilícitas ou questionáveis, dos quais prescinda de elemento de prova, sob pena da aplicação de multa astreinte, no valor de R$ 1.000,00 por dia de descumprimento, que fixo com fulcro nos arts. 536 e § 1º e 537, caput, ambos do CPC”.

A abstenção de divulgação, neste caso concreto, deve restringir-se a vídeo idêntico ao já removido da internet, devido à impossibilidade de se delimitar corte ou recorte, e ao ponto considerado caracterizador da procedência do direito de resposta. É certo que o § 2º do art. 54 da Resolução TSE n. 23.608/19 estabelece ser vedado à magistrada ou ao magistrado aplicar sanções pecuniárias no exercício do poder de polícia, ou adotar medidas coercitivas tipicamente jurisdicionais, como a imposição de astreintes. O dispositivo disciplina que eventuais infringências à legislação eleitoral devem ser realizadas em ação própria, devendo cada conteúdo veiculado ser objeto de representação específica em razão dos prazos decadenciais de que trata o art. 32 da Resolução TSE n. 23.608/19.

Por esses motivos, não conheço do pedido de direito de resposta quanto à postagem noticiada pela recorrida no ID 45720598, pois se trata de novo conteúdo e deve ser analisado pelo juízo a quo em nova representação.

Devido à necessidade de readequação do texto da resposta, resta prejudicada a alegação de descumprimento vertida na petição do ID 45708333. Ademais, observo claro abuso de direito no texto da resposta apresentado junto aos documentos do ID 45708326. A recorrida apresentou card contendo um texto, o qual quer que seja reputado de autoria do recorrente, e nele afirma que este vem “RECONHECER QUE PRODUZI E ESPALHEI FAKE NEWS EM LIVE” e “QUE TODAS AS MINHAS REFERÊNCIAS SOBRE A MÁ CONDUTA DOS GESTORES, BEM COMO DO SECRETÁRIO DA SAÚDE SÃO FALSAS”, além de diversos outros trechos demasiadamente ofensivos e que ultrapassam, de longe, a razoabilidade e a proporcionalidade.

O teor da resposta caracterizou ataque à dignidade da pessoa do recorrente e é desproporcional ao agravo, sequer esclarecendo o contexto em que inserida e ensejando nova ofensa. Segundo o TSE “O texto da resposta deve ser proporcional à ofensa e não deve conter provocações” nem apresentar promoção pessoal ou propaganda eleitoral (Ac. de 2.8.2010 na Rp n. 197505, rel. Min. Henrique Neves da Silva).

Contudo, “o direito de resposta acobertado pela Constituição Federal e pela legislação eleitoral não se confunde com a obrigatoriedade de retratação pelo ofensor” (TRE-PR - REC: 0603811-94.2022.6.16.0000 CURITIBA - PR 060381194, Relator: Roberto Aurichio Junior, Data de Julgamento: 28/09/2022, Data de Publicação: PSESS-297, data 30/09/2022). A retratação do autor do texto originário é faculdade conferida ao ofensor, na forma do § 3º do art. 2° da Lei n. 13.188/15, enquanto no direito de resposta o ofendido busca obter a veiculação de um conteúdo em nome próprio, em efetiva liberdade de expressão, de veicular uma contramensagem, uma contrainformação.

Assim, após a intimação da presente decisão, a recorrida deverá apresentar nos autos, em até 24h, vídeo de até um minuto contendo mensagem de texto, em seu nome e de sua autoria, e não em nome do recorrente, na qual apresente texto de resposta proporcional ao agravo quanto à afirmação sobre a ocorrência de pente fino na Secretaria da Saúde para saber quais pessoas estavam sendo atendidas em fisioterapia, se eram da situação ou da oposição. Ficará a critério da recorrida a utilização da totalidade do tempo na elaboração do vídeo com o texto da resposta.

Eventual excesso ficará sujeito a direito de resposta equivalente à ofensa, conforme disciplina do art. 30, § 3º, da Resolução TSE n. 23.610/19.

A postagem foi realizada em 28.8.2024 (ID 45708291) no perfil do recorrente no Facebook, e a prova de remoção é do dia 30.8.2024 (ID 45708309), totalizando 2 (dois) dias de divulgação, ausente demonstração de que a publicação durou aproximadamente 2 horas e sendo irrelevante o número de reações, comentários, interações ou a potencialidade de impacto no pleito.

Portanto, na forma da al. “e” do inc. IV do art. 32 da Resolução n. 23.608/19, o vídeo de 1 (um) minuto com o texto da resposta deve ficar disponível pelo período de 4 (quatro) dias, na mesma forma de alcance da publicação, e a veiculação deve ocorrer em até 2 (dois) dias da intimação do recorrente da juntada aos autos da resposta.

Necessário ser observado, pelo recorrente, o disposto na al. “d” do inc. IV do art. 32 da Resolução n. 23.608/19, segundo o qual o usuário ofensor deve “empregar nessa divulgação o mesmo impulsionamento de conteúdo eventualmente contratado nos termos referidos no art. 57-C da Lei n. 9.504/97 e o mesmo veículo, espaço, local, horário, página eletrônica, tamanho, caracteres e outros elementos de realce usados na ofensa”.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo parcial provimento do recurso, para o fim de reformar em parte a sentença e julgar parcialmente procedente o pedido de direito de resposta nos seguintes termos:

a) manter a determinação de remoção dos conteúdos impugnados e a abstenção de divulgação afeta a conteúdo idêntico, ou seja, o mesmo vídeo;

b) deferir o direito de resposta tão somente quanto ao ponto do vídeo impugnado em que se afirma que o gestor público determinou que fizessem um pente fino na Secretaria da Saúde para saber quais pessoas que estavam sendo atendidas em fisioterapia, se eram da situação ou da oposição;

c) determinar a readequação do texto da resposta, devendo a recorrida, após a intimação da presente decisão, juntar aos autos, em até 24h, vídeo de até um minuto contendo mensagem de texto, em seu nome e de sua autoria, com texto de resposta proporcional ao agravo quanto à afirmação sobre a ocorrência de pente fino na Secretaria da Saúde para saber quais pessoas estavam sendo atendidas em fisioterapia, se eram da situação ou da oposição. Ficará a seu critério a utilização da totalidade do tempo na elaboração do vídeo com o texto da resposta e eventual excesso ficará sujeito a direito de resposta equivalente à ofensa, conforme disciplina do art. 30, § 3º, da Resolução TSE n. 23.610/19;

d) determinar que a postagem permaneça veiculada pelo período de 4 (quatro) dias, na mesma forma e alcance da publicação, com início da divulgação em até 2 (dois) dias da intimação do recorrente da juntada aos autos da resposta, devendo ser observado pelo recorrente, o disposto na al. “d” do inc. IV do art. 32 da Resolução n. 23.608/19, para utilização do mesmo veículo, espaço, local, horário, página eletrônica, tamanho, caracteres e outros elementos de realce usados na ofensa;

e) não conhecer do pedido de direito de resposta quanto à postagem noticiada pela recorrida no ID 45720598 e julgar prejudicada a alegação de descumprimento da sentença aduzida na petição do ID 45708333.

Cumpra-se imediatamente, independentemente do trânsito em julgado, devendo ser realizada imediatamente a comunicação à zona eleitoral, tão logo publicado o acórdão.

É como voto.