REl - 0600382-93.2024.6.21.0135 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/09/2024 às 16:00

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo e atende aos demais pressupostos de admissibilidade. Por isso, dele conheço e passo a analisar o mérito do apelo.

 

MÉRITO

Preliminarmente, em face do julgamento de mérito, resta prejudicado o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso, visto tratar-se de efeito ope legis.

No mérito, é incontroverso que o PARTIDO RENOVAÇÃO DEMOCRÁTICA teve origem a partir da fusão do Partido Trabalhista Brasileiro e do Patriota. A fusão foi aprovada pelo Tribunal Superior Eleitoral em 09.11.2023.

A controvérsia reside no eventual impedimento da agremiação em participar do pleito, uma vez que o órgão partidário foi suspenso por ter as contas que o originaram julgadas não prestadas, o que resultou no indeferimento do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) apresentado.

A matéria está disciplinada pelo art. 2º da Res. TSE n. 23.609/19:

Art. 2º Poderão participar das eleições: (Redação dada pela Resolução nº 23.675/2021)

I - o partido político que, até 6 (seis) meses antes da data do pleito, tenha registrado seu estatuto no TSE e tenha, até a data da convenção, órgão de direção definitivo ou provisório constituído na circunscrição, devidamente anotado no tribunal eleitoral competente, de acordo com o respectivo estatuto partidário ( Lei nº 9.504/1997, art. 4º ; Lei nº 9.096/1995, art. 10, § 1º, I e II ; e Res.-TSE nº 23.571/2018, arts. 35 e 43 ); e (Incluído pela Resolução nº 23.675/2021)

II - a federação que, até 6 (seis) meses antes da data do pleito, tenha registrado seu estatuto no TSE e conte, em sua composição, com ao menos um partido político que tenha, até a data da convenção, órgão de direção que atenda ao disposto na segunda parte do inciso I deste artigo. ( Lei nº 9.504/1997, art. 6º-A ) (Incluído pela Resolução nº 23.675/2021)

§ 1º Transitada em julgado a decisão que, em processo regular no qual assegurada ampla defesa, suspender a anotação do órgão partidário em decorrência do julgamento de contas anuais como não prestadas, o partido político ficará impedido de participar das eleições na circunscrição respectiva, salvo se regularizada a situação até a data da convenção.

§ 1º-A Se a suspensão a que se refere o § 1º deste artigo recair sobre órgão partidário de qualquer dos partidos que integre uma federação, esta ficará impedida de participar das eleições na circunscrição respectiva. (Incluído pela Resolução nº 23.675/2021) (Grifei.)

Como previsto no dispositivo acima transcrito, após o trânsito em julgado de decisão proferida em processo regular que determine a suspensão do órgão partidário fica esse impedido de participar do pleito.

A exigência de processo regular específico, no qual seja observada a ampla defesa e o contraditório para o reconhecimento da suspensão de órgão partidário, decorre da decisão da ADI 6030 pelo Supremo Tribunal Federal que -  afastando qualquer interpretação que permita que a sanção de suspensão do registro ou da anotação do órgão partidário regional ou municipal seja aplicada de forma automática, como consequência da decisão que julga as contas não prestadas - assegurou que tal penalidade somente pode ser aplicada após decisão com trânsito em julgado decorrente de procedimento específico de suspensão de registro, conforme o art. 28 da Lei n. 9.096/95.

Feita a ressalva inicial, resta saber se houve a efetiva suspensão do órgão partidário a partir de processo próprio para tal finalidade (Suspensão de Órgão Partidário – SuspOp), instaurado a partir de decisão transitada em julgado em processo de prestação de contas.

Pois bem. Verificando-se o Sistema de Gerenciamento de Informações Partidária (SGIP) e o Sistema de Informação de Contas (SICO), ambos desta Justiça Especializada, verifica-se que o Diretório Municipal do PRD de Santa Maria/RS encontra-se SUSPENSO em razão dos seguintes motivos:

- CONTAS NÃO PRESTADAS - EXERCÍCIO FINANCEIRO 2020 REFERENTE AO PTB - SUSPOP N. 0600014-46.2022.6.21.0041 - SEI N. 0006286-64.2022.6.21.8041

- CONTAS NÃO PRESTADAS - ELEIÇÕES 2022 REFERENTE AO PTB - SUSPOP 0600033- 18.2023.6.21.0041 - SEI 0007679-87.2023.6.21.8041

Constam, ainda, levantadas as suspensões relativas ao PTB de Santa Maria (Exercício Financeiro de 2019 - SUSPOP n. 0600062-14.2022.6.21.0135 - SEI N. 0003232-65.2023.6.21.8135 - REGULARIZA JE - PORTARIA TSE Nº 346/2024 - RROPCO 0603697-34.2024.6.00.0000 - SEI 0011680-90.2024.6.21.8135).

Na espécie, o PTB não apresentou as contas relativas ao exercício financeiro de 2020 (PCE 0600228-71.2021.6.21.0041, com trânsito em julgado em 23.11.2021, que originou a suspensão do órgão no processo SuspOP 0600014-46.2022.6.21.0041, trânsito em julgado em 09.5.2022); e às Eleições de 2022 (PCE 0600133-07.2022.6.21.0041, com trânsito em 02.3.2023, que originou nova suspensão ao órgão no processo SuspOP 0600033-18.2023.6.21.0041, trânsito em julgado em 23.5.2023).

Desse modo, de acordo com os entendimentos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a sanção consistente na suspensão da anotação do órgão de direção do partido deve ser imposta diretamente à agremiação resultante da fusão, persistindo a responsabilidade do partido resultante da fusão pelas sanções aplicadas à agremiação originária, como a seguir transcrevo:

CONSULTA. PARTIDO POLÍTICO. FUSÃO. LEI 9.096/1995. RES.-TSE 23.604/2019. DEVER DE PRESTAR CONTAS. EXIGÊNCIA REPUBLICANA DE TRANSPARÊNCIA. PERMANÊNCIA DA RESPONSABILIDADE DO PARTIDO RESULTANTE DA FUSÃO. 1. Trata–se de Consulta formulada, com base no art. 23, XII, do Código Eleitoral, por autoridade com jurisdição federal, objetivando esclarecer dúvidas relacionadas à permanência da responsabilidade do Partido resultante da fusão. 2. O Consulente submete as seguintes indagações ao TSE: “Ocorrendo a criação de partido político por meio da fusão entre dois ou mais partidos políticos, as eventuais sanções aplicadas às agremiações originárias, em decorrência da desaprovação de suas contas, se estenderiam ao novo partido recém-criado?” e “Se positiva a resposta à indagação supra, a eventual sanção de suspensão da distribuição ou do repasse dos recursos provenientes do Fundo Partidário imposta a um dos partidos extintos pela fusão afetará a integralidade do montante devido ao novo partido criado ou tão somente à quota parte do partido político originário que sofreu a sanção?” 3. A responsabilização da agremiação resultante da fusão de partidos deve persistir quanto às eventuais sanções aplicadas às agremiações originárias, em decorrência da desaprovação de suas contas, sendo essa a resposta apresentada ao primeiro questionamento ínsito à Consulta. 4. A sanção de suspensão da distribuição ou do repasse dos recursos provenientes do Fundo Partidário imposta a um dos partidos extintos pela fusão afetará tão somente a cota-parte da agremiação que originariamente foi objeto da sanção imposta em razão de julgamento de suas prestações de contas. 5. CONSULTA CONHECIDA E RESPONDIDA AFIRMATIVAMENTE QUANTO AO ITEM 1 E QUANTO AO ITEM 2: Pela aplicação proporcional à cota parte do partido originário objeto da sanção. (TSE, Cta 060024147/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE de 23/08/2022).

De tal julgado, destaco, inclusive, o excerto do voto do Relator, Ministro Alexandre de Moraes:

Verifica-se, portanto, que a fusão de partidos não é matéria estranha à normativa legal.

No plano dos efeitos, vale destacar que o partido incorporador e o novo ente partidário resultante da fusão sucedem em todos os direitos e obrigações, ativos e passivos, os partidos extintos e têm direito ao cômputo dos votos recebidos da última eleição pelas entidades extintas, para fins de participação na distribuição dos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas e do acesso gratuito ao rádio e televisão.

Quanto à necessidade de se prestar contas à Justiça eleitoral, tal dever é uma decorrência dos preceitos constitucionais que orientam a criação, o funcionamento e a extinção dos partidos políticos previstos no art. 17 da Constituição. A prestação de contas dá transparência ao funcionamento do sistema eleitoral e permite a fiscalização das normas constitucionais e legais que orientam o jogo político democrático.

(…)

Por isso, eventuais débitos ou sanções aplicadas às agremiações originárias, em decorrência da desaprovação de suas contas, devem ser suportados pela nova agremiação resultado da fusão daquelas, sob pena de verdadeira anistia, não prevista em legislação.

Ainda, o texto do art. 3º da Emenda Constitucional n. 111/2021 é objetivo ao afastar a incidência de responsabilização apenas no caso de incorporação de partidos, não havendo a mesma previsão para situação de fusão, visto que são institutos tratados distintamente pela Lei n. 9.096/95. Vejamos:

Emenda Constitucional n. 111/2021

Art. 3º Até que entre em vigor lei que discipline cada uma das seguintes matérias, observar-se-ão os seguintes procedimentos:

I - nos processos de incorporação de partidos políticos, as sanções eventualmente aplicadas aos órgãos partidários regionais e municipais do partido incorporado, inclusive as decorrentes de prestações de contas, bem como as de responsabilização de seus antigos dirigentes, não serão aplicadas ao partido incorporador nem aos seus novos dirigentes, exceto aos que já integravam o partido incorporado;

Lei n. 9.096/95

Art. 2º É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos cujos programas respeitem a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais da pessoa humana.

Por fim, observo que até a presente data não foi identificado pedido de regularização da situação de inadimplência decorrente da não prestação das contas do exercício de 2020 ou das contas eleitorais de 2022, permanecendo, portanto, hígidas as decisões que ordenaram a suspensão do órgão.

No caso, o impedimento de participar das eleições de 2024 está embasado no texto regulamentar do art. 2º, § 1º, Resolução TSE n. 23.609/19, no qual prevista tal consequência jurídica diante da decisão transitada em julgado, pela qual determinada a suspensão da anotação do órgão partidário por inércia no cumprimento do dever de prestar contas anuais à Justiça Eleitoral.

Logo, demonstrada a responsabilidade do partido resultante da fusão, havendo sido cumpridas as determinações constantes da Resolução TSE n. 23.571/2018 para suspensão do órgão partidário e não existindo requerimento de regularização das contas anuais, não há como afastar a anotação de suspensão da agremiação partidária ora recorrente, devendo ser mantida a sentença que indeferiu o DRAP.

Por força do disposto do art. 48 da Resolução TSE n. 23.609/19, o indeferimento do DRAP é fundamento suficiente para indeferimento os pedidos de registro a ele vinculados. Por tal razão, caso o indeferimento do DRAP for o único fundamento para indeferimento das candidaturas a prefeito e vice-prefeito a ele vinculados (processos 0600383-78.2024.6.21.0135 e 0600391-55.2024.6.21.0135), e em eventual recurso contra a presente decisão refletirá nos processos a este vinculados, sendo-lhes atribuída a situação “indeferido com recurso” no Sistema de Candidaturas (CAND) até a decisão final acerca deste feito.

Por fim, ante a petição juntada pela parte recorrente no ID 45729380, relativamente ao resultado do julgamento do processo 0600400-17.2024.6.21.0135, após o julgamento do presente feito, dê-se vista da petição à Procuradoria Regional Eleitoral para que adote as providências que entender pertinentes.

Diante do exposto, VOTO pelo DESPROVIMENTO do recurso interposto pelo PARTIDO RENOVAÇÃO DEMOCRÁTICA - PRD de Santa Maria.