REl - 0600048-89.2024.6.21.0028 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/09/2024 às 16:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, cuida-se de recurso interposto pelo PARTIDO REPUBLICANOS DE LAGOA VERMELHA/RS contra a sentença que indeferiu seu Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) para o pleito proporcional, por descumprimento da reserva de gênero prevista no art. 10. § 3º, da Lei n. 9.504/97 e no art. 17, §3º-A, da Resolução TSE n. 23.609/19, considerando-se a indicação de única candidata do gênero feminino.

De acordo com os dados fornecidos pelo Cartório Eleitoral (ID 45703565), dentre as 12 (doze) candidaturas que poderiam ser apresentadas, o partido recorrente solicitou apenas 1 (uma) delas, que é a candidatura de VERA LUCIA OLIVEIRA PEREIRA, do gênero feminino, resultando na não observância dos percentuais referentes à reserva de cada gênero.

Apesar de intimado para sanar a irregularidade verificada (ID 45703563), o partido quedou-se inerte, conforme certidão de ID 45703564.

Seguramente, não se ignora que as cotas de gênero consistem em ação afirmativa concebida, originariamente, para incrementar a participação feminina na política.

Nesta senda, a lição de José Jairo Gomes (Direito eleitoral. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2020, edição digital):

Conquanto se aplique indistintamente a ambos os gêneros, a enfocada ação afirmativa foi pensada para resguardar a posição das mulheres que, sobretudo por razões históricas ligadas a uma cultura de exclusão, não desfrutam de espaço relevante no cenário político brasileiro, em geral controlado por homens. Nesse âmbito, a discriminação contra a mulher constitui desafio a ser superado. Ainda nos dias de hoje, é flagrante o baixo número de mulheres na disputa pelo poder político em todas as esferas do Estado; ainda menor é o número de mulheres que efetivamente ocupam os postos público-eletivos. Tais constatações são de todo lamentáveis em um país em que o gênero feminino forma a maioria da população.

 

Da mesma forma, é possível localizar julgados relativos a pleitos anteriores que admitiram o lançamento de candidatura única, do gênero feminino, para o cargo de vereador, a exemplo da decisão colacionada pelo recorrido: TSE - REspEl: 060035443 NATAL - RN, Relator: Min. Benedito Gonçalves, Data de Julgamento: 13/9/2022, Data de Publicação: 13/9/2022.

Também este Tribunal Regional já decidiu neste sentido:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. DEMONSTRATIVO DE REGULARIDADE DOS ATOS PARTIDÁRIOS. INDEFERIMENTO. CANDIDATURA ÚNICA. COTA DE GÊNERO. ART. 10, § 3º, LEI N. 9.504/97. MITIGAÇÃO DA REGRA. AUTONOMIA PARTIDÁRIA. REFORMA DA SENTENÇA. PROVIMENTO. 1. Irresignação contra sentença que indeferiu o Demonstrativo de Regularidade dos Atos Partidários, em razão do pedido de registro de candidatura única para eleição proporcional, o que teria desrespeitado o disposto no art. 10, § 3º, da Lei das Eleicoes # a cota de gênero. 2. A candidatura única, por não ser vedada pelas normas de regência, não fere o estabelecimento dos percentuais mínimos de cota de gênero. Na hipótese, a exigência do art. 10, § 3º, da Lei das Eleicoes deve ser mitigada, uma vez que não seria razoável exigir do partido a desistência de sua única candidatura ou o requerimento de mais uma candidatura do sexo oposto. Jurisprudência no sentido de que feriria o preceito constitucional da autonomia partidária a imposição de cotas, independente de que gênero fosse, no caso de apresentação de candidatura única. 3. Provimento. Homologação do demonstrativo de regularidade dos atos partidários da agremiação para o lançamento de candidatura única para o cargo de vereador.

(TRE-RS - RE: 060004982 BARRACÃO - RS, Relator: GUSTAVO ALBERTO GASTAL DIEFENTHÄLER, Data de Julgamento: 22/10/2020, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 23/10/2020)

 

Entretanto, a Resolução TSE n. 23.729/24, de 27 de fevereiro de 2024, incluiu o § 3º-A no art. 17 da Resolução TSE n. 23609/19, passando a exigir, de forma expressa, pelo menos uma candidatura feminina e uma masculina para atender à obrigatoriedade legal do percentual mínimo de candidaturas por gênero, litteris:

Art. 17. Cada partido político ou federação poderá registrar candidatas e candidatos para a Câmara dos Deputados, a Câmara Legislativa, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais no total de até 100% (cem por cento) do número de lugares a preencher mais 1 (um) ( Lei nº 9.504/1997, art. 10, caput ). (Redação dada pela Resolução nº 23.675/2021)

[…].

§ 3º-A O partido ou a federação que disputar eleição proporcional deverá apresentar lista com ao menos uma candidatura feminina e uma masculina para cumprimento da obrigação legal do percentual mínimo de candidatura por gênero. (Incluído pela Resolução nº 23.729/2024)

(Grifei.)

 

Portanto, a edição da mencionada norma pelo Tribunal Superior Eleitoral demonstra, de maneira inequívoca, o propósito de vedar a candidatura única nas eleições proporcionais, seja feminina ou masculina, para fins de garantir a representatividade mínima de ambos os gêneros no rol de candidaturas lançadas pelo partido político.

Portanto, a jurisprudência utilizada para subsidiar o inconformismo do recorrente está superada por modificação normativa posterior.

Assim, considerando o descumprimento das normas de regência relativas às cotas de gênero pela grei partidária e a inércia da agremiação quanto intimada para o saneamento da falha, não merece reparos a sentença recorrida.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.