REl - 0600130-21.2024.6.21.0158 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/09/2024 às 16:00

VOTO

Inicialmente, faço a análise da admissibilidade recursal do pedido de baixa dos autos à origem e da alegação de cerceamento de defesa suscitadas em contrarrazões.

O recorrido alega que, para evitar cerceamento de defesa, supressão de instância e violação ao devido processo legal, devem os autos retornar à origem, com abertura do prazo de 7 dias para defesa, a exemplo do que ocorre no procedimento de impugnação ao pedido de registro de candidatura.

Todavia, não assiste razão ao recorrido, pois o caso dos autos não se trata de impugnação ao pedido de registro, e sim de recurso contra a sentença de deferimento.

O rito estabelecido para o processamento dos recursos interpostos contra as sentenças que deferem registros de candidatura consta do art. 64 e seguintes da Resolução TSE n. 23.609/19 e nele não há previsão de que os autos retornem à origem após a interposição do apelo, devendo a matéria ser decidida pelo Tribunal.

Consigno que o art. 57 da Resolução TSE n. 23.609/19 é expresso ao dispor que partidos, federações, coligações, candidatas ou candidatos que não tenham oferecido impugnação ao pedido de registro têm legitimidade para recorrer da decisão que o deferiu na hipótese de matéria constitucional.

Essa é a disciplina do enunciado da Súmula n. 11 do TSE: “No processo de registro de candidatos, o partido que não o impugnou não tem legitimidade para recorrer da sentença que o deferiu, salvo se cuidar de matéria constitucional”.

Desse modo, rejeito a preliminar e indefiro o pedido de baixa dos autos à origem para a realização de instrução.

No mérito, alega o recorrente que o candidato Pablo Sebastian Andrade de Melo está alcançado pela causa de inelegibilidade reflexa, por parentesco, disposta no art. 14, § 7º, da Constituição Federal, cujo teor segue:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

(…)

§ 5º O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subsequente. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 16, de 1997)

§ 6º Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito.

§ 7º São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.

(...)

As razões recursais afirmam que o recorrido não se enquadra na posição de titular de mandato, sendo tão somente um suplente em substituição do titular.

Pablo é filho do Prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, Sebastião de Araújo Melo, e na Eleição Municipal de 2020 classificou-se como suplente de vereador pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), mesmo pleito em que seu pai foi eleito Prefeito de Porto Alegre/RS.

Foi comprovado que o recorrido está atualmente no exercício do mandato de vereador em substituição ao titular Cezar Schirmer, estando este licenciado para exercer o cargo de Secretário Municipal de Planejamento e Assuntos Estratégicos de Porto Alegre.

Desde a Eleição de 2020, Pablo passou a substituir os titulares Cezar Augusto Schirmer e Idenir Cecchim em razão de seus afastamentos do exercício do mandato de vereador, conforme certidão do ID 45684644, lavrada pelo Diretor Legislativo da Câmara Municipal de Porto Alegre:

CERTIFICO, a pedido da parte interessada, que o Suplente Pablo Sebastian Andrade Melo exerceu a vereança junto à Câmara Municipal de Porto Alegre nos seguintes períodos: de 1º de janeiro de 2021 a 31 de março de 2022, em substituição ao titular Cezar Augusto Schirmer, licenciado para exercer desempenhar o Cargo Público de Secretário Municipal de Planejamento e Gestão; do dia 25 ao dia 29 de abril de 2022, em substituição ao titular Cezar Augusto Schirmer, em Licença para Tratamento de Saúde; do dia 09 ao dia 14 de maio de 2022, em substituição ao titular Idenir Cecchim, licenciado para exercer o cargo público de Prefeito Municipal de Porto Alegre, em substituição; e se encontra exercendo a vereança desde o dia 02 de janeiro de 2023, em substituição ao titular Cezar Augusto Schirmer, licenciado para exercer o cargo público de Secretário Municipal de Planejamento e Assuntos Estratégicos. Para constar, foi lavrada a presente certidão, que vai assinada pelo Diretor Legislativo da Câmara Municipal de Porto Alegre.

Cezar Augusto Schirmer foi eleito vereador titular pelo MDB em 2020, ano da eleição de Sebastião de Araújo Melo como prefeito de Porto Alegre, alcançando o 30° lugar da lista das 36 cadeiras até então existentes na Câmara Municipal de Porto Alegre, e 3.484 votos. Em 34° lugar, também pelo MDB, Idenir Cecchim elegeu-se vereador, com 3.110 votos. Pablo obteve 2.413 votos.

Logo no início do ano legislativo e da gestão de Sebastião Melo, em 01.01.2021, Cezar Augusto Schirmer licenciou-se para assumir a pasta da Secretaria Municipal de Planejamento e Gestão. A partir deste dia, 01.01.2021, o primeiro suplente da bancada de três vereadores do MDB, Pablo Melo, passou a exercer a vereança até 31.3.2022, totalizando 1 ano, 2 meses e 29 dias nesse período. Em 04.4.2022, Cezar Augusto Schirmer reassumiu o mandato de vereador e, posteriormente, necessitou afastar-se para licença para tratamento de saúde, razão pela qual Pablo substituiu o titular por mais 05 dias, de 25.4.2022 a 29.4.2022.

Após, Pablo Sebastian Andrade de Melo, em típica atuação como suplente de vereador, substituiu por 06 dias outro titular, o Vereador Idenir Cecchim, então presidente da Câmara de Vereadores, entre 09.5.2022 e 14.5.2022, uma vez que este se licenciou para exercer o cargo público de Prefeito Municipal de Porto Alegre devido a uma viagem do prefeito para o exterior.

Depois de 14.5.2022 o recorrido somente voltou a exercer o mandato de vereador no ano seguinte, na condição de suplente, a partir de 02.01.2023, novamente em substituição ao vereador titular Cezar Augusto Schirmer, que licenciou-se para exercer o cargo público de Secretário Municipal de Planejamento e Assuntos Estratégicos. Desde esse dia Pablo permaneceu no exercício da vereança, ocupando o cargo de vereador inclusive quando do seu pedido de registro de candidatura para as Eleições de 2024, ocorrido em 01.8.2024, intervalo que totalizou 1 ano, 7 meses e 02 dias desde 02.01.2023.

A soma desses interregnos de tempo de 1 ano, 2 meses e 29 dias + 05 dias + 06 dias + 1 ano,  7 meses e 02 dias resulta em 2 anos, 10 meses e 12 dias intercalados. Esse é o período total em que Pablo Sebastian Andrade de Melo substituiu, na condição de suplente, dois vereadores titulares, sendo que a maior parte do tempo foi em substituição ao Vereador Cezar Augusto Schirmer e por 06 dias em  substituição ao Vereador Idenir Cecchim, ambos do MDB.

Segundo o recurso, a exceção do art. 14, § 7º, da Constituição Federal não se aplica aos suplentes, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário n. 409.459-/BA, da relatoria do Min. Gilmar Mendes, segundo o qual a ressalva é específica para titulares:

Recurso Extraordinário. 2. Matéria eleitoral. 3. Artigo 14, § 7º, parte final, da CF. Cláusula de inelegibilidade. Exceção. Interpretação restritiva que alcança, tão-somente, os titulares de mandato eletivo e não beneficia os suplentes. 4. Recurso Extraordinário que se nega provimento

(STF - RE: 409459 BA, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 20/04/2004, Segunda Turma, Data de Publicação: DJ 04-06-2004 PP-00060 EMENT VOL-02154-03 PP-00597) (Grifei.)

 

O TSE, de igual modo, tem diversos julgamentos concluindo que a exceção à inelegibilidade por parentesco deve ser interpretada de forma restritiva, não bastando o exercício do cargo em substituição para afastar a inelegibilidade. A propósito:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PEDIDO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPUGNAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO POR PROMOTOR ELEITORAL. ILEGITIMIDADE. INELEGIBILIDADE REFLEXA. RESSALVA. ART. 14, § 7º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SUPLENTE. TITULAR DE MANDATO ELETIVO. DISTINÇÃO.

(...)

2. No que se refere ao agravo regimental interposto pela Coligação A Volta do Progresso, registro que os suplentes, enquanto ostentarem esta condição, não são titulares de mandato eletivo e, por essa razão, não se lhes aplica a exceção prevista no § 7º do art. 14 da Constituição Federal (Cta nº 1.485/DF, Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJ de 15.5.2008; REspe nº 19.422/BA, Rel. Min. Fernando Neves, DJ de 19.4.2002; STF, RE 409.459/BA, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 4.6.2004).

3. In casu, o suplente ora agravado assumiu o cargo apenas temporariamente, razão pela qual a ressalva final do § 7º do art. 14 da Carta Magna não lhe é aplicável, estando ele, pois, inelegível para o pleito de 2008.

4. Nego seguimento ao primeiro agravo regimental e dou provimento ao segundo agravo regimental para reconsiderar a decisão monocrática e negar provimento ao recurso especial eleitoral.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 35154, Acórdão de 18/12/2008, Relator(a) Min. FELIX FISCHER, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data 10/2/2009, Página 52 RJTSE - Revista de jurisprudência do TSE, Volume 20, Tomo 3, Data 18/12/2008, Página 174) (Grifei.)

O entendimento do TSE sempre foi no sentido de que “Suplente é aquele que, tendo sido candidato, não se elegeu”, razão pela qual não está atingido pela exceção à inelegibilidade do § 7º do art. 14 da Constituição Federal. Para a Corte Superior Eleitoral: “A parte final do art. 14, § 7º, da Carta Magna constitui exceção à regra geral da cláusula de inelegibilidade, devendo ser interpretada restritivamente” (REspe 172-10, rel. Min. Gilmar Mendes, DJE de 10.3.2016).

O suplente de vereador somente assume a titularidade em caso de renúncia, morte ou cassação do titular (TSE, REspe 1549820166150044, rel. Min. Rosa Maria Weber Candiota da Rosa, Publicação Mural de 04/11/2016).

Segundo a Corte Superior Eleitoral: “É a Constituição da República que veda tornar-se perene o poder de membros da mesma família, conforme expresso no § 7° do seu art. 14” (Res. n. 21645 na Cta n. 995, de 2.3.2004, rel. Min. Luiz Carlos Madeira). Para o TSE, o § 7º do art. 14 da Constituição “busca impedir a formação de oligarquias, ou seja, evitar a tomada de poder por grupos familiares” (Ac. de 31/5/2024 na CtaEl n. 060044205, rel. Min. André Ramos Tavares).

Todavia, há um precedente em sentido contrário que não é similar ao caso em tela.

Senão, vejamos.

No acórdão do Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral n. 0600441-91.2020.6.05.0030, cujo redator foi o Ministro Alexandre de Moraes, o TSE por maioria, vencidos os Ministros Sérgio Banhos, Carlos Horbach e Edson Fachin, deferiu o registro de candidatura de vereadora que era cunhada da então prefeita de Nazaré/BA.

Ocorre que o TSE somente afastou a inelegibilidade por parentesco de suplente de vereador quando se deparou com situação peculiar e inédita de candidata que requereu o registro de candidatura e ocupava o cargo de vereador há 3 anos e 2 meses de forma ininterrupta, do qual estava o titular licenciado para tratar de interesses particulares. Além disso, naquele caso todo o tempo de substituição foi do mesmo vereador titular. Prazo considerado, no entendimento da maioria, um longo período de tempo por abranger quase a totalidade da legislatura até a data do pedido de registro.

Ao abrir a divergência, ponderou o voto vencedor que “faz-se necessário distinguir a suplência de mandato parlamentar com o efetivo exercício do mandato, mesmo que em substituição do titular, durante quase toda a legislatura”. Transcrevo o seguinte trecho do seu voto, o qual ressalta, que em razão do prazo de substituição de 3 anos e dois meses verificado no momento do pedido de registro, chegou-se à conclusão de que aquela hipótese “realmente, é diferenciada”:

(…)

Na verdade, e essa é a questão importante, a ora candidata e a Chefe do Executivo local disputaram inicialmente a mesma eleição, porque nessa condição podiam fazê-lo. Ocorre que a prefeita ganhou e a Agravante ficou na suplência. Passados poucos meses do início do mandato, esta já assumiu, ou seja, durante toda a legislatura exerceu de forma autônoma a vereança, sem qualquer uso da máquina administrativa.

No momento do registro, ela estava exercendo efetivamente o cargo – repito, dos 43 (quarenta e três) meses naquele momento de legislatura, estava a exercer 38 (trinta e oito) meses. Então, a hipótese nos autos, me parece aqui, com todas as vênias aos precedentes e ao eminente Ministro Sérgio Banhos, ser diferenciada. Não se vislumbra a existência de qualquer mecanismo fraudulento simplesmente para afastar a inelegibilidade reflexa.

Muito ao contrário, em que pese não tenha havido vacância do cargo, o titular esteve afastado praticamente pelo prazo integral do mandado. A realidade jurídica (ausência de vacância definitiva) sucumbiu à realidade fática (exercício quase integral do mandato de forma contínua).

Nesse contexto, da mesma forma que ao excepcionar a possibilidade de reeleição o § 7º do art. 14 da CF presume que a relação de parentesco não proporciona o benefício que a norma consagradora da inelegibilidade reflexa pretende coibir, no caso específico, muito particular, também me parece que a razão normativa da vedação está afastada.

A interpretação defensiva e restritiva do exercício da capacidade eleitoral passiva pelo Tribunal Superior Eleitoral, no tocante à suplência e o § 7º do art. 14, busca obstar a prática de fraudes no sistema eleitoral, proibindo corretamente que o exercício efêmero, fugaz de um mandato, possibilite o afastamento da inelegibilidade reflexa. Mas não é o que se deu no caso, como dito.

(...)

Como se vê da leitura das razões de decidir, o tempo de exercício de suplência considerado determinante para o TSE foi o constatado no momento do pedido de registro de candidatura.

No caso dos autos o recorrido defende que este Tribunal considere o período de tempo que alcançará caso eventualmente permaneça substituindo titulares até o dia da eleição ou até a data do término da legislatura. Esse raciocínio visa incrementar o seu tempo como substituto de vereadores titulares, mas é inequívoco que, em face da precariedade da situação de substituição, não há como se estabelecer juízo de certeza quanto à manutenção da substituição de titulares pelo candidato recorrido.

De se salientar que, na forma do § 10 do art. 11 da Lei das Eleições, "as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas no momento da formalização do pedido de registro da candidatura, ressalvadas as alterações, fáticas ou jurídicas, supervenientes ao registro que afastem a inelegibilidade”.

Outra questão extremamente relevante e que impede a analogia da hipótese dos autos com o precedente trazido à baila pelas partes é que, no presente feito, as substituições dos titulares foram pulverizadas, intercaladas, e inclusive deixaram de ocorrer por 7 meses e 23 dias da legislatura. Além disso, se deram por motivo de licença para ocupar cargo público junto ao Poder Executivo ou tratamento de saúde. O julgado tratado pelo TSE, por sua vez, analisou situação de suplente convocada em virtude de licença concedida ao titular do mandato para tratar de interesse particular e a substituição foi ininterrupta. Ao acompanhar a divergência, o então presidente do TSE, Ministro Luís Roberto Barroso, foi categórico ao referir que o motivo do afastamento do titular era extremamente relevante para o deslinde da causa.

O Min. Barroso acompanhou a divergência citando o artigo 56 da Constituição Federal, que determina, no inciso II, a perda de mandato do deputado federal ou senador que tenha se afastado do exercício da legislatura, numa mesma sessão, por um período superior a 120 dias para tratar de interesses particulares. Ele propôs a aplicação desse dispositivo, por analogia, ao caso do vereador titular da vaga ocupada pela candidata, de maneira que o tempo em que exerceu a vereança continuamente teria, de fato, efetivado a titularidade do mandato da política.

Esse ponto é importante porque foi um dos argumentos que penderam para o deferimento daquele registro de candidatura. Ora, cediço que são institutos diferentes as licenças de vereadores para tratar de interesses particulares, para investidura em cargo de secretário municipal e para tratamento de saúde, na forma do art. 68 da Lei Orgânica do Município de Porto Alegre/RS.

E, ao final do julgamento, ponderou a decisão da maioria do TSE que a substituição compreendeu, até o momento do dia do pedido de registro de candidatura, a quase toda a legislatura, e que essas peculiaridades mereciam uma distinção do resultado do julgamento em relação aos demais casos analisados pelo TSE:

ELEIÇÕES 2020. REGISTRO DE CANDIDATURA. INELEGIBILIDADE REFLEXA. VEREADOR. SUPLENTE. PARENTESCO COM PREFEITO. INCIDÊNCIA DA RESSALVA CONSTANTE DO ART. 14, § 7º, DA CF. EXCEPCIONALIDADE. PROVIMENTO. 1. Nos termos do art. 14, § 7º, da Constituição Federal, são inelegíveis, no território de circunscrição do titular, o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição. É a denominada inelegibilidade reflexa, cuja finalidade é “impedir o monopólio do poder político por grupos hegemônicos ligados por laços familiares” 2. Com o compromisso e posse no cargo parlamentar, – ainda que temporariamente –, os suplentes passarão a ostentar todas as garantias e prerrogativas parlamentares, em virtude de estarem substituindo o titular do cargo, inclusive estarão sujeitos a norma excepcional e permissiva do § 7º, do artigo 14 da Constituição Federal, que afasta o impedimento do exercente de mandato parlamentar de pleitear a reeleição ao mesmo cargo, dentro da circunscrição de atuação do chefe do Poder Executivo, ressalvada situação fática a apontar mecanismo fraudulento, com desvio de finalidade na assunção do suplente. 3. A Corte Regional afastou a inelegibilidade reflexa porque entendeu que a candidata - cunhada da Prefeita de Nazaré/BA, inicialmente suplente, mas no pleno exercício do mandato de vereadora quase desde o início da legislatura e no momento de registro de sua candidatura, inclusive - enquadrava–se na norma excepcional e permissiva prevista na parte final do § 7º do art. 14 da CF. 4. Tem–se no caso específico dos autos um claro distinguishing em relação às hipóteses analisadas pelo TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL em relação à inaplicabilidade da ressalva contida na referida norma constitucional aos suplentes, pois a candidata, embora eleita nessa condição, quando do pedido de registro de candidatura já ocupava o cargo de vereadora do município de Nazaré/BA há 3 anos e 2 meses. 5. No caso concreto, portanto, não se cogita a incidência da norma geral e proibitiva contida no art. 14, § 7º, da Constituição Federal, mas da norma excepcional e permissiva consagrada neste mesmo dispositivo, dada a situação peculiar da candidata, que já exercia o mandato por tão longo período de tempo, compreendendo quase toda a legislatura, afastando–se qualquer desrespeito à ratio da norma constitucional. 6. Agravo Regimental provido para restabelecer o acórdão regional e deferir o registro de candidatura de Carla Domini Peixoto Santos ao cargo de vereador do Município de Nazaré/BA nas Eleições 2020, por entender não configurada a inelegibilidade prevista no art. 14, § 7º, da Constituição Federal.

(TSE - REspEl: 0600441-91.2020.6.05.0030 NAZARÉ - BA, Relator: Min. Alexandre de Moraes, Data de Julgamento: 10/08/2021, Data de Publicação: 18/10/2021) (Grifei.)

 

Ou seja, no precedente em voga o TSE afastou a inelegibilidade por parentesco da suplente de vereador porque, no momento do pedido de registro de candidatura, já ocupava o cargo há 3 anos e 2 meses, e de forma ininterrupta, do qual estava o titular licenciado para tratar de interesses particulares. Além disso, a referida candidata substituiu, por todo esse tempo, o mesmo vereador titular.

Já Pablo Melo, quando requereu o seu registro de candidatura, exercia a vereança há somente 1 ano e 7 meses de forma ininterrupta, aproximadamente metade do tempo do caso análogo, conforme certidão emitida em 28.8.2024 pela Câmara Municipal de Porto Alegre (ID 45684644).

Seu tempo total de atividade como vereador, com diversas pausas, foi de 2 anos, 10 meses e 12 dias, envolveu a substituição de dois vereadores titulares, e não do mesmo vereador, como ocorrido no precedente Baiano. Além disso, entre 14.5.2022 e 02.01.2023, por 7 meses e 23 dias, Pablo Melo deixou de substituir os vereadores titulares, sendo totalmente irrelevante para o desfecho da questão se o término da substituição ocorreu para disputar o cargo de deputado estadual no pleito de 2022 ou qualquer outro motivo.

Em verdade, penso que a tese defensiva de que deve ser relevada a interrupção da substituição porque o recorrido, nesse período, concorreu a outro cargo eletivo, milita em seu desfavor. O fato de ter deixado de exercer a vereança por longo período de tempo torna mais desafiadora a pretensão de que deve ser adotada a mesma solução do julgado paradigma de Nazaré/Bahia.

Essa interrupção somente reforça que o candidato está a substituir o titular, ou melhor dizendo, os titulares, de forma não duradoura, em clara atuação parlamentar episódica, precária, eventual, limitada e totalmente distinta da titularidade que se logrou demonstrar nos autos do precedente da Bahia.

De outro lado, considero que a discussão não se relaciona à viabilidade ou inviabilidade política do candidato, matéria interna corporis que deve ser ponderada pelo partido político da filiação, afeta à autonomia partidária, prevista no art. 17, § 1º, da Constituição Federal, e não pela Justiça Eleitoral quando da análise do pedido de registro de candidatura. Se um candidato foi escolhido em convenção, é de se pressupor que o partido percebe viabilidade de sua eleição, e isso em nada interfere na verificação da existência de causa de inelegibilidade.

De igual modo, o debate sobre a atuação legislativa do recorrido é de todo desnecessário e insignificante, sendo certo, público e notório, que os titulares Cezar Augusto Schirmer e Idenir Cecchim também foram atuantes na Câmara de Vereadores, conforme se verifica da divulgação de suas ações parlamentares.

O que diferencia o julgado da Bahia para o presente caso é que o TSE, ao decidir pelo deferimento do registro da candidata de Nazaré ressaltou que ela exerceu o cargo de vereadora na legislatura anterior, de fato, por três anos e dois meses ininterruptamente – portanto por quase todo o mandato, o que não se verifica no presente processo.

O entendimento do TSE foi para um caso distinto, inédito e isolado. Aqui, neste feito, nada há de isolado ou de diferente daquilo que se vê em substituições parlamentares. Por isso, deve ser aplicado o entendimento firmado pelo STF no Recurso Extraordinário n. 409.459, de que a exceção à inelegibilidade prevista no art. 14, § 7º, da CF não alcança o suplente.

A substituição ininterrupta pelo período de 1 ano e 7 meses até o momento do pedido de registro de candidatura, aproximadamente metade do tempo ocorrido no paradigma da Bahia, e inferior à metade do tempo de uma legislatura, não faz com que o recorrido, suplente de vereador, passe a ostentar todas as garantias e prerrogativas parlamentares.

No período de substituição de dois titulares não identifico situação estabilizada de titularidade de mandato. Não houve exercício do cargo parlamentar de forma contínua, estável, duradoura, destoando do paradigma invocado, razão pela qual o candidato não deve estar sujeito à norma excepcional e permissiva do § 7º, do art. 14 da Constituição Federal, que afasta o impedimento do titular de mandato parlamentar de pleitear a reeleição ao mesmo cargo, dentro da circunscrição de atuação do chefe do Poder Executivo.

Por fim, por tudo o que dos autos consta e do aprofundado exame que realizei sobre a matéria, não identifico violação aos §§ 5º e 6° do art. 14 da Constituição Federal, a princípios e demais regras invocadas pelo recorrido, em razão desta conclusão. Nem há, a meu ver, necessidade de se apurar a efetiva ocorrência de mecanismo fraudulento, ou prova concreta de desvio de finalidade na assunção do suplente, mas tão somente conclusão de que a ressalva constitucional e o leading case invocado não lhe alcançam.

A leitura que faço é a de que a partir da mais recente interpretação do TSE a inelegibilidade estaria afastada havendo titularidade, podendo o suplente assumir esta condição na hipótese de renúncia, morte ou cassação do titular, ou na hipótese de o candidato, no momento do pedido de registro de candidatura, já ocupar o cargo de vereador por longo período de tempo, compreendendo quase toda a legislatura.

Contudo, neste feito não há comprovação de exercício duradouro do mandato que permita equiparar o recorrido ao titular ou à situação retratada no RespEl n. 0600441-91.2020.6.05.0030 do TSE, originário de Nazaré – BA.

Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar e VOTO pelo provimento do recurso para reformar a sentença e indeferir o requerimento de registro de candidatura de PABLO SEBASTIAN ANDRADE DE MELO para concorrer ao cargo de vereador nas Eleições Municipais de 2024 pelo MDB.