ED no(a) REl - 0600331-39.2024.6.21.0020 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/09/2024 00:00 a 23:59

 

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

Inicialmente, cumpre consignar que os embargos de declaração só podem ser opostos com o objetivo específico de esclarecer obscuridade ou contradição, sanar omissão ou corrigir erro material existente na decisão judicial, conforme expressamente estabelece o art. 1.022 do Código de Processo Civil.

É entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça que “a boa técnica dos embargos declaratórios visa a escoimar o relatório, os fundamentos e o acórdão de incoerências internas, capaz de ameaçarem sua inteireza” e, portanto, não é o meio adequado para o embargante “obter o reexame da matéria versada nos autos, na busca de decisão que lhe seja favorável” (STJ, EDcl no REsp 440.106/RJ, 6a Turma, Rel. Min. Celso Limongi, DJe 23.8.2010).

No caso dos autos, percebe-se que, para aquém da questão da alegada omissão da hierarquia dos tratados internacionais sobre a legislação doméstica, há a necessidade prévia de esclarecimento de ordem lógica.

O embargante olvida que não há, logicamente, controle de convencionalidade fora da Constituição Federal – ou seja, uma norma da legislação complementar, ou da legislação ordinária, será considerada inconstitucional se desobedecer a Tratados e Convenções Internacionais sobre direitos humanos em que o Brasil seja parte, e não "inconvencional".

Pois a Constituição assim determina.

Explico.

Após o decidido, pelo Supremo Tribunal Federal, na ADI n. 3392, o Congresso Nacional promoveu mudanças na redação da Carta Magna – Emenda Constitucional n. 45/04, no sentido de que “os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais” (art. 5º, inc. LXXIX, § 3º), redação que veio se juntar à já existente “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

Ou seja, a desobediência a um tratado ou convenção será antes uma desobediência à própria Constituição Federal - art. 5º, inc. LXXIX, § 2º, ou art. 5º, inc. LXXIX, § 3º, a depender do caso. Logicamente não existiria, no Brasil, controle de convencionalidade acaso não existissem os comandos citados na Carta Magna, de modo que sob o prisma da melhor técnica constitucionalista, o controle de convencionalidade tem utilidade maior como instituto de caráter acadêmico, para fins didáticos, pois ao fim e ao cabo a desobediência a tratado ou convenção, pelo poder judiciário, forçosamente haverá de ocorrer à luz da Constituição da República – exatamente em virtude da existência dos dispositivos acima citados.

A técnica a ser utilizada será, no mais das vezes, a interpretação conforme a Constituição.

Sem omissão, portanto. Os dispositivos objeto de irresignação do embargante já foram, há muito, objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal, à luz de toda a Constituição Federal, inclusive o art. 5º, inc. LXXIX, §2º, ou o art. 5º, inc. LXXIX, §3º.

Transcrevo trecho da decisão – que, aliás, ao contrário do que os embargos afirmam, cita também a questão da convencionalidade, com grifos meus:

 

Ademais, com tranquilidade se pode apontar que o Supremo Tribunal Federal (a mesma Corte que, de fato, indica a prevalência dos Tratados que versem sobre direitos humanos sobre disposições da lei doméstica, em caso de conflito) examinou por mais de uma vez a aplicabilidade e a constitucionalidade da Lei Complementar n. 135/10 – por exemplo o Recurso Extraordinário n. 630147, com repercussão geral (Tema 367), o Recurso Extraordinário n. 633.703, bem como as Ações Declaratórias de Constitucionalidade n. 29 e n. 30 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4578.

E, em todos os casos, a oportunidade fora, também, de exame da referida legislação sob o prisma da convencionalidade – pois são aplicáveis de ofício também os Tratados que o Brasil seja signatário, por integrarem, forma indubitável, o ordenamento jurídico pátrio.

E em momento algum a Excelsa Corte entendeu pela inconvencionalidade dos dispositivos da LC n. 135/10 – e não porque tenha se olvidado de abordar tal enfoque. Ao contrário, colho do Ministro Gilmar Mendes o seguinte trecho, que expressamente indica diversos diplomas de legislação internacional, por ocasião do julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade n. 29 e n. 30 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4578:

 

Nas circunstâncias, resta evidenciado que a pretensão recursal possui o intento de rediscutir a matéria decidida pelo Tribunal, o que é incabível em âmbito de embargos declaratórios, vez que "a omissão apta a ser suprida pelos declaratórios é aquela advinda do próprio julgamento e prejudicial à compreensão da causa, não aquela deduzida com o fito de provocar o rejulgamento da demanda ou modificar o entendimento manifestado pelo julgador" (TSE, ED-AgR-AI 10.804, Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJE de 01.02.2011).

 

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.