REl - 0600462-41.2024.6.21.0011 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/09/2024 00:00 a 23:59

 

VOTO

O recurso é adequado e tempestivo. Atende a todos os pressupostos recursais atinentes à espécie e, portanto, merece conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso interposto contra sentença que indeferiu o pedido de registro de candidatura de JOÃO FRANCISCO PERRUDE, pretenso concorrente ao cargo de vereador de Bom Princípio nas Eleições de 2024, em razão de ausência de desincompatibilização do cargo de servidor público estadual, declarado no requerimento.

Cabe esclarecer que JOÃO FRANCISCO ocupa o cargo de professor municipal em Bom Princípio – município no qual pretende concorrer, e de professor estadual no município vizinho, cidade de Feliz.

Alega ter se desincompatibilizado de ambos os vínculos, ainda que não haja, segundo o recorrente, exigência de afastamento quando o cargo é em circunscrição diversa daquela na qual pretende lançar nome ao escrutínio do eleitorado.

No que diz respeito à prova, o candidato apresentou a Portaria n. 490/24, firmada pelo Prefeito de Bom Princípio, na qual há a concessão de licença para afastamento a fim de concorrer a cargo eletivo a contar de 05.7.2024 (ID 45704388), de modo que tenho como incontroversa a ocorrência de desincompatibilização.

Por seu turno, no relativo ao cargo de professor estadual exercido na cidade de Feliz, JOÃO FRANCISCO trouxe aos autos, ainda no grau de origem e em fase de aclaratórios, declaração firmada pelo vice-diretor da escola estadual, na qual há a confirmação do afastamento. O documento veio acompanhado de prints de tela, retratando o sistema informatizado da instituição, a demonstrar a efetividade da licença alegada.

Ao decidir os embargos de declaração a d. Magistrada da origem entendeu que “os documentos produzidos unilateralmente são despidos da formalidade necessária à comprovação da desincompatibilização, não havendo ato administrativo próprio da instituições competentes na esfera estadual que tenha deferido o pedido de afastamento.”.

Todavia, aliás na linha do entendimento já manifestado pelo d. Procurador Regional Eleitoral, tenho que assiste razão ao recorrente, de modo que o recurso merece provimento.

Explico.

O instituto da desincompatibilização visa, em linhas breves, impedir que a utilização do cargo ou da função exercida pelo candidato, no âmbito da circunscrição, produza desequilíbrio no pleito. A partir de tal premissa, o e. Tribunal Superior Eleitoral estabeleceu pacífica jurisprudência no sentido de que “se o servidor exerce suas atividades em outro município, não se opera a regra de incompatibilidade, de modo que a natureza da atividade desenvolvida pelo servidor público é indiferente para a determinação do afastamento” (TSE. Recurso Especial Eleitoral 060009051/MG, Relator Min. Edson Fachin, Acórdão de 11/11/2021, Publicado no(a) Diário de Justiça Eletrônico 216, data 23/11/2021).

A decisão não é isolada. Veja-se:

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. VEREADOR. DEFERIMENTO NA ORIGEM. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 1.022 DO CPC E 275 DO CÓDIGO ELEITORAL NÃO DEMONSTRADA. CONDENAÇÃO POR ABUSO DE PODER E CONDUTA VEDADA EM ÓRGÃO COLEGIADO. SANÇÕES DE CASSAÇÃO DO MANDATO E DE MULTA. DECLARAÇÃO DE INELEGIBILIDADE. INCIDÊNCIA IMEDIATA. CONFIGURAÇÃO DAS CAUSAS DE INELEGIBILIDADE PREVISTAS NO ART. 1º, I, d E j, DA LC Nº 64/1990. REFORMA DO ACÓRDÃO REGIONAL QUANTO AO PONTO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. ATUAÇÃO EM MUNICÍPIO DIVERSO DO QUAL CONCORRE AO PLEITO. IMPOSSIBILIDADE DE INFLUÊNCIA NA DISPUTA ELEITORAL. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 24/TSE. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO DESPICIENDA. PRECEDENTES. SÚMULA Nº 30/TSE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO PARA INDEFERIR O REGISTRO DE CANDIDATURA DE FERNANDO JOSÉ CASTRO CABRAL, COM FULCRO NAS INELEGIBILIDADES PREVISTAS NO ART. 1º, I, d E j, DA LC Nº 64/1990. 1. As questões relevantes para o deslinde da controvérsia foram suficientemente examinadas, ainda que em sentido diverso da pretensão do ora recorrente, não havendo falar em violação dos arts. 275 do CE e 1.022 do CPC. 2. Na hipótese, a Corte regional manteve o deferimento do registro de candidatura de Fernando José Castro Cabral ao cargo de vereador pelo Município de Bom Despacho/MG nas eleições de 2020, por entender não configuradas as inelegibilidades do art. 1º, I, d e j, da LC nº 64/1990, bem como desnecessária a desincompatibilização do candidato do cargo ocupado de auditor federal de controle externo. 3. Consta dos autos que o então candidato fora condenado, pelo TRE/MG, em ação de investigação judicial eleitoral, por abuso dos meios de comunicação social, concessão de vantagens a servidores municipais e repasse de verbas públicas em período vedado, na qual restou determinada a cassação do mandato e declarada a inelegibilidade do investigado. 4. Os fatos supervenientes que tenham repercussão na elegibilidade de candidato podem ser conhecidos e apreciados em sede extraordinária, desde que constituídos até a data da diplomação. Precedentes. 5. Presentes todos os requisitos exigidos pela jurisprudência desta Corte Superior para a caracterização das causas de inelegibilidade previstas no art. 1º, I, d e j, da LC nº 64/1990, conclui-se pela reforma do acórdão regional quanto ao ponto, impondo-se o indeferimento do registro de candidatura do recorrido. 6. Nos termos do que restou consignado pela Corte regional, o exercício, pelo candidato, das funções referentes ao cargo de auditor federal de controle externo ocorria em circunscrição diversa da qual concorreu a vereador, sendo despicienda a desincompatibilização. 7. Entender que o servidor público tem competência funcional para afetar a igualdade de condições no pleito, como pretende o recorrente, encontra óbice na Súmula nº 24/TSE.  8. Se o servidor exerce suas atividades em outro município, não se opera a regra de incompatibilidade, de modo que a natureza da atividade desenvolvida pelo servidor público é indiferente para a determinação do afastamento. Precedentes. 9. Recurso especial parcialmente provido, para indeferir o registro de candidatura de Fernando José Castro Cabral, com fulcro nas inelegibilidades previstas no art. 1º, I, d e j, da LC nº 64/1990.10. Determinação de expedição de ofício ao Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais para que proceda à retotalização dos votos, na forma do art. 196, § 2º, da Res. nº 23.611/2019-TSE, e determinação do afastamento imediato de Fernando José Castro Cabral do cargo de Vereador do Município de Bom Despacho/MG. Recurso Especial Eleitoral nº060009051, Acórdão, Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 23/11/2021.

Julgo despiciendo, assim, o afastamento do cargo ocupado no magistério estadual.

Pelo exposto, voto para dar PROVIMENTO ao recurso e DEFERIR o registro de candidatura de JOÃO FRANCISCO PERRUDE, para concorrer ao cargo de vereador no Município de Bom Princípio, nas Eleições de 2024.