REl - 0600242-67.2024.6.21.0100 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/09/2024 00:00 a 23:59

VOTO

Falta de observância do princípio da dialeticidade recursal.

Inicialmente, observo que a recorrente, em seu apelo (ID 45679941), teceu os seguintes argumentos: “...que a empresa WHATSAPP INC não possui sede no Brasil e, apesar de prestar serviços em solo nacional, não consta na base de dados da receita ou qualquer outro cadastro. Desta forma, resta citar a empresa ao qual notoriamente faz parte e que responde solidariamente em face de responsabilização legal, logo, a FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA, pois pertencem ao mesmo grupo econômico.” Ainda, refere que: “Atualmente, é de conhecimento público e notório a relação intrínseca entre as duas empresas, iniciada em 2014, que comprova relação jurídica na composição de grupo econômico. Logo, não há de se falar em eventual ilegitimidade da parte, pois uma vasta gama jurisprudencial já consolida hoje o entendimento de que o FACEBOOK responde legalmente pelas atividades empregadas pelo WHATSAPP em território nacional. Sobre a TELEFONICA BRASIL S.A., o número telefônico que vem disseminando informações falsas sobre os candidatos a Majoritária do Município, através de uma rápida pesquisa por ferramentas na internet é possível averiguar que o número (54) 999216359 é cadastrado como pertencente a esta rede de telefonia móvel, logo, cabe a ela conceder as informações pretendidas a se colher na contenda.”

Contudo, o fundamento da sentença de extinção do feito foi a ilegitimidade passiva de pessoas jurídicas para figurar como demandadas em Ação de Investigação Judicial Eleitoral (ID 45679936).

No caso em tela, não foi apresentado qualquer argumento fático ou jurídico para afastar esse fundamento, circunstância que inviabiliza o conhecimento do recurso, por inobservância da necessária dialeticidade do recurso, consagrada no art. 1.010 do CPC, aplicável supletivamente ao processo eleitoral:

Art. 1.010. A apelação, interposta por petição dirigida ao juízo de primeiro grau, conterá:

I - os nomes e a qualificação das partes;

II - a exposição do fato e do direito;

III - as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade;

IV - o pedido de nova decisão.

§ 1º O apelado será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias.

§ 2º Se o apelado interpuser apelação adesiva, o juiz intimará o apelante para apresentar contrarrazões.

§ 3º Após as formalidades previstas nos §§ 1º e 2º, os autos serão remetidos ao tribunal pelo juiz, independentemente de juízo de admissibilidade.

 

Não por outra razão o art. 932, inc. III, do CPC estabelece:

Art. 932. Incumbe ao relator:

(...)

III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida.

(...)

 

Com esse entendimento, colho na jurisprudência do TSE:

Agravo regimental. [...] Fundamentos não infirmados. [...] Princípio da dialeticidade. [...]

1. À luz do princípio da dialeticidade, incumbe ao recorrente impugnar, de maneira precisa e específica, todos os fundamentos da decisão recorrida, de modo a demonstrar o seu desacerto. A mera insatisfação com o quanto decidido não tem o condão de possibilitar o conhecimento do recurso, no qual se exige motivação pertinente.

2. Na espécie, observa–se que o recorrente optou pela reiteração das teses veiculadas na exordial do Mandado de Segurança para justificar o inconformismo com a solução dada pelo Tribunal, sem se contrapor aos fundamentos adotados no voto condutor, em descumprimento à dialeticidade. Incidência da Súmula nº 26/TSE. [...]

(Ac. de 11.2.2021 no AgR-RMS nº 060037147, rel. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto.)

[...] 1. Não se conhece do agravo interno interposto pela parte que não apresentou agravo em recurso especial, tendo em vista a formação da coisa julgada em relação a sua pessoa. [...] 4. O princípio da dialeticidade recursal impõe ao recorrente o ônus de evidenciar os motivos de fato e de direito capazes de afastar todos os fundamentos da decisão que se pretende modificar, sob pena de vê–la mantida por seus próprios fundamentos [...], como no caso dos autos. 5. É inadmissível a inovação de teses no agravo interno, ante a ocorrência de preclusão [...]

(Ac. de 16.4.2020 no AgR-AI nº 060089759, rel. Min. Og Fernandes.)

 

Forte nessas razões, VOTO pelo não conhecimento do recurso.

Destaco.

Acaso vencido, passo ao exame de mérito.

 

 

MÉRITO

No mérito, a sentença merece ser confirmada diante do pacífico entendimento jurisprudencial no sentido da ilegitimidade passiva de pessoas jurídicas serem demandadas em Ação de Investigação Judicial Eleitoral.

Nesse sentido, inúmeros julgados do TSE:

Eleições 2022. Deputado estadual. [...] Prática de abuso de poder e fraude na cota de gênero. Art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/1997. Candidaturas fictícias. Nulidade dos votos dados ao partido para o respectivo cargo. Recontagem dos quocientes eleitoral e partidário. Retotalização das respectivas vagas. [...] 5. É pacífico o entendimento desta Corte pela impossibilidade de pessoas jurídicas figurarem no polo passivo da AIJE, tendo em vista que não podem suportar as sanções impostas pela LC nº 64 /1990, quais sejam, cassação de mandato e inelegibilidade. Precedentes. 5.1. De ofício, deve ser reconhecida a ilegitimidade do partido para figurar no polo passivo da AIJE, devendo ser excluído da lide [...]”.

(Ac. de 6.2.2024 no RO-El nº 060182264, rel. Min. Raul Araújo.)

 

Eleições 2020 [...] Ilegitimidade passiva de pessoa jurídica figurar em AIJE. [...] 3. Esta Corte Superior já se manifestou sobre a ilegitimidade passiva, no âmbito da ação de investigação judicial eleitoral (AIJE), de pessoa jurídica, a exemplo de partido político, para figurar como parte na ação, uma vez que sanções de inelegibilidade e de cassação de registro ou de diploma podem apenas ser suportadas por pessoas naturais. [...]

(Ac. de 30.3.2023 no AgR-REspEl nº 060017063, rel. Min. Sérgio Banhos.)

 

Eleições 2012 [...] Inequívoca a legitimidade passiva ad causam da empresa, pois, embora não imputáveis às pessoas jurídicas a perda de diploma e a inelegibilidade, decorrente da procedência da AIJE (art. 22, XIV, da LC nº 64/1990), restou configurada também a propaganda extemporânea, sancionada com multa (art. 36 da Lei nº 9.504/1997). [...](Ac. de 18.12.2018 no REspe nº 41395, rel. Min. Herman Benjamin, red. designada Min. Rosa Weber.)

Ação de investigação judicial eleitoral. Abuso do poder econômico. Uso indevido dos meios de comunicação social. Pesquisa eleitoral. [...] - A condenação de terceiro que não integrou a relação processual e, por isso mesmo, não foi sequer citado para apresentar defesa, constitui ofensa aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. [...]. NE : O Tribunal a quo aplicou, de ofício, multa por veiculação de pesquisa eleitoral à pessoa jurídica que não figurou no polo passivo da investigação judicial.

(Ac. de 31.5.2012 no RO nº 171568, rel. Min. Arnaldo Versiani.)

[...] Eleições 2010 [...] 2. É entendimento pacífico deste Tribunal a impossibilidade de pessoas jurídicas figurarem no pólo passivo de ações de investigações judiciais eleitorais fundadas no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. Precedentes.[...]

(Ac. de 7.10.2010 no AgR-Rp nº 321796, rel. Min. Aldir Passarinho Junior.)

Representação. Investigação judicial. Arrecadação irregular. Recursos de campanha eleitoral. [...] As pessoas jurídicas são partes ilegítimas para figurar no pólo passivo de representações com pedido de abertura de investigação judicial eleitoral, nos termos do art. 22 da Lei Complementar n º 64/90, tendo em vista o fato de a sanção imposta pela referida norma não as alcançar. [...]”. NE : Representação proposta contra candidato, coligação partidária, comitê financeiro de coligação e entidades privadas.

(Ac. de 9.11.2006 no AgRgRp nº 1229, rel. Min. Cesar Asfor Rocha; no mesmo sentido o Ac. de 7.11.2006 na Rp n º 1033, rel. Min. Cesar Asfor Rocha.)

Representação. Investigação judicial. Abuso do poder de autoridade e utilização indevida dos meios de comunicação. Programa televisivo. [...] Pessoas jurídicas. Ilegitimidade passiva. [...] Pessoas jurídicas não podem figurar no pólo passivo de investigação judicial eleitoral, de cujo julgamento, quando procedente a representação, decorre declaração de inelegibilidade ou cassação do registro do candidato diretamente beneficiado, consoante firme jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral. [...]”. NE : Representação proposta contra pré-candidato, partido político e emissora de televisão.

(Ac. de 7.4.2005 na Rp nº 373, rel. Min. Francisco Peçanha Martins; no mesmo sentido o Ac. de 17.5.2005 na Rp nº 720, rel. Min. Humberto Gomes de Barros.)

Investigação judicial. Candidatos a deputado estadual e federal. Médicos integrantes do Conselho Regional de Medicina. Jornal da categoria. Matéria. Notícia. Candidatura. Abuso do poder econômico. [...] 7. Pessoa jurídica não pode figurar no pólo passivo de investigação judicial, na medida em que não poderá ela sofrer as sanções previstas na Lei Complementar n º 64/90. [...]”

(Ac. de 8.6.2004 no RO nº 782, rel. Min. Fernando Neves.)

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.