REl - 0600388-44.2024.6.21.0089 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/09/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado e tempestivo. Atende a todos os pressupostos recursais atinentes à espécie e, portanto, merece conhecimento.

Quanto às razões de recurso, antecipo que a sentença é irretocável. É evidente, salta aos olhos a atecnia no manejo autônomo da AIRC – Ação de Impugnação ao Registro de Candidatura, de parte do partido recorrente, de modo que não seria possível outra solução que não a de extinção do feito sem resolução do mérito, por inépcia da petição inicial.

Explico.

Como referido na sentença, a AIRC possui um rito próprio a ser observado, constante na Seção V da Resolução TSE n. 23.609/19:

Seção V

Da Impugnação ao Registro de Candidatura

Art. 40. Cabe a qualquer candidata ou candidato, partido político, federação, coligação ou ao Ministério Público, no prazo de 5 (cinco) dias, contados da publicação do edital relativo ao pedido de registro, impugná-lo em petição fundamentada ( LC nº 64/1990, art. 3º, caput ). (Redação dada pela Resolução nº 23.675/2021)

§ 1º A impugnação ao registro de candidatura exige representação processual por advogada ou advogado devidamente constituída(o) por procuração nos autos e será peticionada diretamente no PJe, nos mesmos autos do pedido de registro respectivo.

§ 1º-A Constatada ausência ou irregularidade na representação processual da parte impugnante, o cartório ou a secretaria a intimará, de ofício, para que, no prazo de 3 (dias), regularize a falha. (Incluído pela Resolução nº 23.675/2021)

§ 1º-B Desatendida a intimação de que trata o § 1º-A deste artigo, a impugnação será conhecida como notícia de inelegibilidade, passando a candidata, o candidato, o partido político, a federação ou a coligação que a apresentou à condição de mera(o) noticiante. (Incluído pela Resolução nº 23.675/2021)

§ 2º A impugnação, por parte da candidata, do candidato, do partido político, da federação ou da coligação, não impede a ação do Ministério Público no mesmo sentido ( LC nº 64/1990, art. 3º, § 1º ). (Redação dada pela Resolução nº 23.675/2021)

§ 3º Não pode impugnar o registro a(o) representante do Ministério Público que, nos 2 (dois) anos anteriores, tenha disputado cargo eletivo, integrado diretório de partido político ou exercido atividade político-partidária (Lei Complementar nº 64/1990, art. 3º, § 2º , c/c Lei Complementar nº 75/1993, art. 80) .

§ 4º A(O) impugnante deve especificar, desde logo, os meios de prova com que pretende demonstrar a veracidade do alegado, arrolando testemunhas, se for o caso, no máximo de 6 (seis) (Lei Complementar nº 64/1990, art. 3º, § 3º) .

Art. 41. Terminado o prazo para impugnação, a candidata, o candidato, o partido político, a federação ou a coligação devem ser citadas ou citados, na forma do art. 38 desta Resolução, para, no prazo de 7 (sete) dias, contestá-la ou se manifestar sobre a notícia de inelegibilidade, juntar documentos, indicar rol de testemunhas e requerer a produção de outras provas, inclusive documentais, que se encontrarem em poder de terceiras ou de terceiros ou de repartições públicas ou em procedimentos judiciais ou administrativos, salvo os processos que estiverem tramitando em segredo de justiça ( LC nº 64/1990, art. 4º ). (Redação dada pela Resolução nº 23.675/2021)

Parágrafo único. A contestação, subscrita por advogada ou advogado, deve ser apresentada diretamente no PJe, nos mesmos autos do pedido de registro respectivo.

Art. 42. Decorrido o prazo para contestação, caso não se trate apenas de matéria de direito e a prova protestada for relevante, a juíza ou o juiz ou a relatora ou o relator deve designar os 4 (quatro) dias seguintes para inquirição das testemunhas da(o) impugnante e da pessoa impugnada, as quais comparecerão por iniciativa das partes que as tiverem arrolado, após notificação judicial realizada pelas advogadas ou pelos advogados (Lei Complementar nº 64/1990, art. 5º, caput) .

§ 1º As testemunhas da(a) impugnante e da pessoa impugnada devem ser ouvidas em uma só assentada (Lei Complementar nº 64/1990, art. 5º, § 1º) .

§ 2º Nos 5 (cinco) dias subsequentes, o órgão julgador deve proceder a todas as diligências que determinar, de ofício ou a requerimento das partes (Lei Complementar nº 64/1990, art. 5º, § 2º) .

§ 3º No prazo de que trata o § 2º, o órgão julgador pode ouvir terceiras pessoas, referidas pelas partes ou testemunhas, como conhecedoras dos fatos e das circunstâncias que possam influir na decisão da causa (Lei Complementar nº 64/1990, art. 5º, § 3º) .

§ 4º Quando qualquer documento necessário à formação da prova se achar em poder de outrem, o órgão julgador pode, ainda, no mesmo prazo de 5 (cinco) dias, ordenar o respectivo depósito (Lei Complementar nº 64/1990, art. 5º, § 4º) .

§ 5º Se a terceira pessoa, sem justa causa, não exibir o documento, ou não comparecer a juízo, pode a juíza ou o juiz ou a relatora ou o relator expedir mandado de prisão e instaurar processo por crime de desobediência (Lei Complementar nº 64/1990, art. 5º, § 5º) .

Art. 43. Encerrada a fase probatória pela juíza ou pelo juiz ou pela relatora ou pelo relator, as partes serão intimadas para apresentar alegações finais no PJe, no prazo comum de 5 (cinco) dias (Lei Complementar nº 64/1990, art. 6º) .

§ 1º Se o Ministério Público for parte, os autos serão imediatamente conclusos após a apresentação das alegações finais, ainda que protocolizadas antes do 5º dia, ou o decurso do prazo.

§ 2º Se não for parte, o Ministério Público disporá de 2 (dois) dias para manifestação após a apresentação ou decurso do prazo das alegações finais, cabendo ao Cartório ou Secretaria proceder, de ofício, à abertura da vista, antes da conclusão dos autos.

§ 3º A apresentação das alegações finais será dispensada nos feitos em que não houver sido aberta a fase probatória.

§ 4º Na hipótese do § 3º deste artigo, ficam assegurados, antes do julgamento, o prazo de 3 (três) dias para manifestação da(o) impugnante, caso juntados documentos e suscitadas questões de direito na contestação, bem como o prazo de 2 (dois) dias ao Ministério Público Eleitoral, em qualquer caso, para apresentar parecer.

 

Este o conjunto de normas que a agremiação recorrente deveria ter observado.

E no campo doutrinário não é diferente. É pacífica a opinião de que a AIRC tem natureza jurídica de incidente processual. Ainda que veicule pretensão autônoma, na qual haverá a presença do contraditório, a AIRC forçosamente há de tramitar no bojo dos autos da candidatura (RRC) ou candidaturas (DRAP) que pretende impugnar. Nessa linha, a doutrina de JOSÉ JAIRO GOMES, em nível de manual:

(...)

Diferentemente do processo de registro de candidatura – RCAN, em que não há lide a ser solvida, a AIRC apresente natureza contenciosa. Sua finalidade é impedir que determinado registro seja deferido quer em razão da ausência de condição de elegibilidade, quer em virtude da incidência de uma ou mais causas de inelegibilidade, quer, finalmente, em consequência de não ter cumprido formalidade legal. Assim, necessariamente, há de ser observado o due process of law, oportunizando-se ao impugnado o contraditório e ampla defesa, de sorte que possa discutir amplamente a imputação que lhe foi feita.

No que concerne à sua natureza, a AIRC constitui um incidente no processo de registro de candidato, que é principal em relação a ela. Daí ambas as relações se desenvolverem nos mesmos autos. (…) o que não pode ocorrer é ser instaurado processo autônomo em relação a ela face à sua irrecusável natureza incidental, acessória. (Direito Eleitoral. SP, Atlas, 12ª Ed., p. 277.) (Grifos meus).

 

Finalmente, a jurisprudência:

ELEIÇÕES 2020. REGISTRO DE CANDIDATURA. DRAP. COLIGAÇÃO MAJORITÁRIA. REGISTRO DEFERIDO. AIRC. PETIÇÃO AUTÔNOMA. VIA INADEQUADA. ART. 40, § 1.º, DA RESOLUÇÃO TSE N.º 23.609/2019. AÇÃO PROPOSTA POR FILIADO A PARTIDO POLÍTICO, PORÉM NÃO CANDIDATO. ILEGITIMIDADE ATIVA AS CAUSAM. IMPOSSIBILIDADE. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. AIRC EXTINTA. RECURSO NÃO PROVIDO. REGISTRO DEFERIDO. 1. As regras eleitorais, inclusive as processuais, não são meras recomendações legislativas, mas um verdadeiro receituário normativo a ser devidamente seguido por quem deseja discutir matéria eleitoral em juízo. 2. A impugnação ao registro de candidatura exige representação processual por advogado devidamente constituído por procuração nos autos e será peticionada diretamente no PJe, nos mesmos autos do pedido de registro respectivo. Inteligência do art. 40, § 1.º, da Resolução TSE n.º 23.609/2019. 3. Deve-se rejeitar a via processual eleita quando utilizada na tentativa de se declarar a inelegibilidade de um DRAP e, assim, atingir direito fundamental como o é a capacidade eleitoral passiva. 4. Caberá a qualquer candidato, a partido político, coligação ou ao Ministério Público, no prazo de 5 (cinco) dias, contados da publicação do pedido de registro do candidato, impugná-lo em petição fundamentada. (art. 3º,"caput", LC nº 64/90). 5. No caso específico dos autos, o autor da ação não é candidato, tampouco presidente de agremiação ou representante de alguma coligação, logo, não há dúvidas de que o Sr JOSÉ DILSON SOUZA não possui legitimidade para figurar, isoladamente, no polo ativo da Ação de Impugnação de Registro de Candidatura proposta nos presentes autos 6. Recurso não provido. AIRC julgada extinta e registro deferido. (TRE-SE - RE: 060014110 SÃO FRANCISCO - SE, Relator: GILTON BATISTA BRITO, Data de Julgamento: 04/11/2020, Data de Publicação: PSESS - Sessão Plenária, Data 04/11/2020) (Grifei.)

 

Ou seja, seria estéril a abertura de prazo de emenda à inicial, porque o defeito não é intrínseco à peça inaugural, mas sim relativo à via escolhida para veiculação da demanda, irremediavelmente inadequada, circunstância que torna inviável, obviamente e por derivação, qualquer análise da questão de fundo de causa trazida pelo recorrente.

Nestes termos, e na linha do entendimento da sentença e do d. Procurador Regional Eleitoral, cuida-se de demanda que não merece análise do mérito. O recurso não merece provimento.

 

Diante do exposto, voto para negar provimento ao recurso.