REl - 0600329-36.2024.6.21.0031 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/09/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a causa de inelegibilidade em debate está fundada na cassação do mandato eletivo do ora recorrente, então prefeito do Município de Montenegro/RS, pela respectiva Câmara de Vereadores, em razão da prática de infrações político-administrativas previstas no art. 4º, incs. VII e VIII, do Decreto-Lei n. 201/67.

Assim, o ato legislativo atrai a inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. I, al. “c”, da Lei Complementar n. 64/90, in verbis:

Art. 1º São inelegíveis:

I – para qualquer cargo:

(…)

c) o Governador e o Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal e o Prefeito e o Vice-Prefeito que perderem seus cargos eletivos por infringência a dispositivo da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente e nos 8 (oito) anos subsequentes ao término do mandato para o qual tenham sido eleitos;

 

Em suas razões, o recorrente sustenta que “o atual Vereador Paulo Azeredo foi condenado em processo de impeachment por infração do Decreto-Lei n. 201/67, e não pela Lei Orgânica Municipal, não estando preenchidos, portanto, os requisitos da al. “c” da Lei n. 64/90”.

Contudo, o Tribunal Superior Eleitoral, a partir do julgamento do RO n. 0600519-54, da relatoria do Ministro Edson Fachin, em 03.10.2018, fixou o entendimento de que, para a incidência da alínea “c” em questão, basta a menção pela Câmara Municipal a artigos do Decreto-Lei n. 201/67 que se amoldem a preceitos estampados na Lei Orgânica Municipal, na medida em que tais disposições se afiguram como extensões das Constituições estaduais e das Leis Orgânicas, distrital ou municipal, em temas de crimes de responsabilidade, haja vista a impossibilidade de esses Entes Federativos legislarem sobre a matéria.

Nessa linha, colaciono os seguintes julgados:

ELEIÇÕES 2020. PEDIDO DE INTERVENÇÃO DE TERCEIROS INDEFERIDO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NÃO CONHECIDOS. AGRAVO REGIMENTAL DO CANDIDATO. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. INCIDÊNCIA DO ART. 1º, I, "c", da LC 64/1990. FATO SUPERVENIENTE. SÚMULAS 24 E 47/TSE. DESPROVIMENTO.1. Pedido de ingresso nos autos na qualidade de terceiro interessado indeferido por ausência de interesse jurídico. Embargos de Declaração não conhecidos. 2. A violação das disposições contidas no Decreto-Lei nº 201/1967 atrai a inelegibilidade prevista pelo art. 1º, I, c, da LC 64/1990. 3. A inelegibilidade noticiada após o pedido de registro, mas anterior à sentença e à data da eleição, pode ser conhecida imediatamente, ainda mais quando resguardados aos Recorrentes o devido processo legal. Incidência da Súmula 47 do TSE.4. Embargos de Declaração de Marcelo Soares Abdo NÃO CONHECIDOS. Agravo Regimental DESPROVIDO, prejudicada a liminar.

(TSE; Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº060018544, Acórdão, Min. Alexandre de Moraes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 13/09/2021) (Grifei.)

 

RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2020. PREFEITO. REGISTRO DE CANDIDATURA. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, C, DA LC 64/90. CASSAÇÃO. MANDATO. CÂMARA MUNICIPAL. CONFIGURAÇÃO. NEGATIVA DE PROVIMENTO. […]. 3. Consoante o art. 1º, I, C, da LC 64/90, são inelegíveis "o Governador e o Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal e o Prefeito e o Vice-Prefeito que perderem seus cargos eletivos por infringência a dispositivo da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente e nos 8 (oito) anos subsequentes ao término do mandato para o qual tenham sido eleitos". 4. A inelegibilidade da alínea c incide "sempre que houver a violação das disposições contidas no Decreto-Lei 201/1967 na medida em que se afiguram extensões das Constituições estaduais e nas Leis Orgânicas, distrital ou municipal, em temas de crimes de responsabilidade" (RO 0600519-54/MS, redator para acórdão Min. Edson Fachin, publicado em sessão em 3/10/2018). […].

(TSE; Recurso Especial Eleitoral nº 060033972, Acórdão, Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 07/12/2020) (Grifei.)

 

Logo, é prescindível a menção expressa no decreto legislativo condenatório a dispositivo da Constituição Federal, Estadual ou da Lei Orgânica Municipal, quando assentada a subsunção do fato a um dos tipos previsto do Decreto-Lei n. 201/67.

Na hipótese, a Câmara Municipal de Montenegro/RS, por meio do Decreto Legislativo n. 269/15, decretou a cassação do mandado de PAULO EUCLIDES GARCIA DE AZEREDO “pela prática de infrações político-administrativas previstas no inc. VII (infrações 1, 2 e 4) e prática de infrações político-administrativas previstas no inc. VIII (infração 5), ambos do art. 4o do Decreto-Lei n. 201/67” (ID 45698101).

Em uma segunda ordem de argumentos, o recorrente assevera que “a sentença proferida não levou em consideração que, em situações idênticas, o registro de candidatura do recorrente foi deferido em eleições anteriores (2016 e 2020), sob o mesmo fundamento fático”.

Ocorre que as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade são aferidas considerando a eleição para a qual o candidato registrou sua candidatura, de acordo com a jurisprudência e a legislação vigentes ao tempo de cada pleito, uma vez que não existe coisa julgada ou direito adquirido entre diferentes eleições.

Nesse sentido, colho a pacífica jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2022. RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL. DEPUTADO ESTADUAL. INELEGIBILIDADE. CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO. POSSE DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO. ALTERAÇÃO INTRODUZIDA PELA LEI 13.964/2019 (PACOTE ANTICRIME) NO TEXTO LEGAL DO ART. 1º, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DA LEI 8.072/1990 (LEI DE CRIMES HEDIONDOS). NATUREZA HEDIONDA CARACTERIZADA. INDEFERIMENTO DO REGISTRO DE CANDIDATURA. AGRAVO DESPROVIDO. [...]. 2. É pacífico nesta Corte o entendimento de que "as causas de inelegibilidade e as condições de elegibilidade devem ser aferidas a cada eleição, sem que se possa falar em coisa julgada ou direito adquirido". [...].

(Agravo Regimental no Recurso Ordinário Eleitoral nº060051116, Acórdão, Min. Ricardo Lewandowski, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 11/05/2023) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA DEFERIDO NA ORIGEM. PREFEITA NÃO ELEITA. ART. 224, CAPUT E § 3º, DO CÓDIGO ELEITORAL. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. PREJUDICIALIDADE. DESPROVIMENTO. [...]. 4. Nos termos da iterativa jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, "as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas a cada pleito, de modo que o reconhecimento ou não de determinada hipótese de inelegibilidade em uma eleição não produz os efeitos da coisa julgada para as posteriores" (REspe nº 670-36/PE, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 19.12.2019). 5. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº060016614, Acórdão, Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 09/04/2021) (Grifei.)

 

Assim, julgamentos favoráveis ao registro de candidatura em pleitos anteriores não vinculam o exame das causas de inelegibilidade em eleições subsequentes, uma vez que se deve ter em conta a evolução legislativa e jurisprudência ocorrida em cada época.

Nada obstante, a situação fática ensejadora da inelegibilidade já foi apreciada por este Tribunal, sob os mesmos critérios legais e jurisprudenciais ora aplicados, nos autos do RCand n. 0601349-29, da relatoria do eminente Desembargador Eleitoral Amadeo Henrique Ramella Buttelli, ocasião em que se indeferiu o registro de candidatura do ora recorrente para o cargo de deputado estadual nas Eleições de 2022, em julgado com a seguinte ementa:

REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÃO 2022. DEPUTADO ESTADUAL IMPUGNAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL. INELEGIBILIDADE. LEI COMPLEMENTAR N. 64/90. DECRETADA CASSAÇÃO DO MANDATO DE PREFEITO. VIOLAÇÃO AO ART. 4º DO DECRETO-LEI N. 201/67.RECONHECIDA A INCIDÊNCIA DE INELEGIBILIDADE. PROCEDÊNCIA DA IMPUGNAÇÃO. INDEFERIMENTO DA CANDIDATURA.1. Impugnação ao pedido de registro de candidatura para o cargo de deputado estadual, sob o fundamento de que o candidato se enquadra na hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. I, al. “c”, da Lei Complementar n. 64/90.Perda do mandato eletivo de prefeito decretada pela Câmara de Vereadores respectiva, em razão da prática de ilícitos previstos no Decreto-Lei n. 201/67 e, por correspondência, na Lei Orgânica do Município.2. Da análise do art. 1°, inc. I, al. “c”, da LC n. 64/90, à luz da jurisprudência vinculante do STF, tem-se que a aludida causa de inelegibilidade incidirá sempre que houver a violação das disposições contidas no Decreto-Lei n.201/67 na medida em que se afiguram extensões das Constituições Estaduais e das Leis Orgânicas em temas de crimes de responsabilidade, haja vista a impossibilidade de esses Entes Federativos legislarem sobre a matéria. Prescindível a menção expressa, no decreto legislativo condenatório, ao dispositivo da Lei Orgânica, quando assentada a subsunção do fato a um dos tipos previsto do Decreto-Lei n. 201/67.3. Da prova carreada aos autos, verifica-se que a Câmara Municipal, por meio do Decreto Legislativo n. 269/15, determinou a cassação do mandato de prefeito do pretenso candidato, por violação ao art. 4º do Decreto-Lei n. 201/67, quedispõe sobre os crimes de responsabilidade do Chefe de Executivo Municipal, impondo o reconhecimento da inelegibilidade prevista na al. “c” do inc. I do art. 1º da LC n. 64/90. A contagem do prazo de 8 (oito) anos da inelegibilidade a partir do final do período remanescente do mandato cassado, qual seja, 31.12.2016, perdurará até 31.12.2024.4. Procedência da impugnação. Indeferimento do registro de candidatura.

(REGISTRO DE CANDIDATURA nº060134929, Acórdão, Des. AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 13/09/2022)

 

Para a inelegibilidade prevista na al. “c” do inc. I do art. 1º da LC n. 64/90 é suficiente a decisão pela cassação do mandato tomada pela Câmara Municipal, sendo desnecessária a menção expressa de tal consequência jurídica no ato legislativo para a sua incidência.

Assim, a contagem do prazo de 8 (oito) anos da inelegibilidade, a partir do final do período remanescente do mandato cassado, qual seja, 31.12.2016, perdurará até 31.12.2024, inviabilizando a candidatura pretendida no pleito de 06.10.2024.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.