REl - 0600067-14.2024.6.21.0055 - Divirjo do(a) relator(a) - Sessão: 19/09/2024 às 14:00

Pedi vista para melhor apreciar a matéria e porque fui relator de feito semelhante, originário do Município de Riozinho, envolvendo a coexistência de filiações.

Naqueles autos (0600079-28.2024.6.21.0055), a solução da controvérsia foi no seguinte sentido:

 

Direito eleitoral. Eleições 2024. Recurso. Filiação partidária. Coexistência de filiações. Cancelamento de ambos os vínculos. Preliminar de nulidade por ausência de intimação. Superada. Processo maduro para julgamento. Impossibilidade de reconhecimento da filiação mais recente. Prevalência da vontade do eleitor. Provimento.

I. Caso em exame

1.1. Insurgência contra decisão que cancelou ambas as filiações partidárias do recorrente, realizadas no mesmo dia, com fundamento no art. 23, § 4º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.596/19.

1.2. Arguição de nulidade da decisão por ausência de intimação. No mérito, alegado reconhecimento de sua filiação a um dos partidos.

II. Questões em discussão

2.1. A validade do cancelamento de filiações partidárias devido à coexistência de registros na mesma data.

2.2. A nulidade da decisão de cancelamento das filiações em razão da ausência de intimação prévia ao eleitor.

III. Razões de decidir

3.1. A alegação de nulidade pela ausência de intimação é procedente, pois não houve comprovação da notificação válida ao recorrente e aos partidos envolvidos, conforme determinado pelo art. 23 da Resolução TSE n. 23.596/19.

3.2. Processo maduro para julgamento, pois os partidos foram devidamente intimados após a sentença, conforme determina o art. 9º da Instrução Normativa TRE-RS P N. 65/20, e o eleitor, embora sem comprovante juntado aos autos, manifestou-se em sede de embargos por meio de procurador constituído.

3.3. O sistema jurídico veda a duplicidade de filiação partidária, prevalecendo a filiação mais recente, nos termos do art. 22, parágrafo único, da Lei n. 9.096/95 e art. 22 da Resolução TSE n. 23.596/19. O cancelamento de ambos os vínculos representaria sacrifício dos direitos políticos de eleitor que declarou sua vontade de participar do processo eleitoral, inclusive tendo se filiado tempestivamente ao partido pelo qual pretende concorrer.

3.4. Na impossibilidade de apuração do vínculo mais recente, deve prevalecer a vontade do eleitor, em respeito à voluntariedade do ato e à liberdade de associação. No caso, a documentação apresentada demonstra expressamente a opção da filiação partidária pretendida.

IV. Dispositivo e

. Dado provimento ao recurso para superar a preliminar de nulidade e, no mérito, reconhecer a filiação do recorrente ao partido Republicanos.

Tese de julgamento: "1. Coexistindo mais de uma filiação partidária, deve prevalecer a mais recente, nos termos do art. 22, parágrafo único, da Lei n. 9.096/95 e art. 22 da Resolução TSE n. 23.596/19. 2. Na impossibilidade de apuração do vínculo mais recente, prestigia-se a vontade do eleitor, em respeito à voluntariedade do ato e à liberdade de associação."

Dispositivos relevantes citados: Art. 1.013, § 3º, inc. I, do CPC; Lei n. 9.096/95, art. 22; Resolução TSE n. 23.596/19, arts. 22 e 23.

Jurisprudência relevante citada: REspEl n. 060002209, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto; REspEl n. 060000503, rel. Min. Sérgio Banhos.

 

Penso que nos presentes autos deva ser adotada a mesma solução, notadamente no que que diz com a matéria de fundo.

No que toca à preliminar, observo que a parte recorrente alega nulidade pela ausência de intimação ou de divulgação no Diário Oficial acerca de ação de coexistência de filiações.

O Ministério Público Eleitoral com atuação na 55ª Zona Eleitoral de Taquara manifestou-se para que a parte fosse pessoalmente notificada para esclarecer a qual partido político efetivamente deseja permanecer filiada, forte na norma do art. 23, inc. I, da Resolução n. 23.596, de 20 de agosto de 2019, do Colendo Tribunal Superior Eleitoral (ID 45661855).

Na sequência, foi certificado pelo cartório eleitoral uma tentativa frustrada de intimação por meio do telefone constante no cadastro eleitoral da filiada, cuja última atualização remonta ao ano de 2011 (ID 45661856).

Ato contínuo, houve prolação de sentença com o cancelamento das filiações da recorrente (ID 45661857).

Compulsando os autos, verifica-se que não consta nenhum documento que comprove a notificação legítima dos interessados, nos moldes do art. 23 da Resolução TSE n. 23.596/19, que disciplina os atos de comunicação referentes aos procedimentos de filiações sub judice:

Art. 23. Detectados, no processamento, registros com idêntica data de filiação, o TSE deverá: (Redação dada pela Resolução nº 23.668/2021)

I - notificar o eleitor filiado, por meio de aplicativo da Justiça Eleitoral, se se tratar de usuário cadastrado e desde que disponível a funcionalidade, ou por via postal, no endereço constante do Cadastro Eleitoral; (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

II - notificar os partidos envolvidos por meio de disponibilização de relatório específico no módulo externo do FILIA. (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

 

Observo que não foram acostados nem o comprovante de recebimento da notificação supostamente enviada por via postal pelo TSE à recorrente, nem a comprovação de notificação via internet aos partidos políticos envolvidos.

Desse modo, não há prova da citação válida, requisito essencial de existência do processo, oportunizando tanto à eleitora quanto às agremiações partidárias envolvidas apresentar suas manifestações no prazo estabelecido acerca da duplicidade de filiação.

Tentativa de citação por telefone constante em cadastro cuja última atualização remonta ao ano de 2011 não é suficiente para cumprir os ditames dos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Ademais, pode ocasionar sérios prejuízos aos eleitores, na medida em que a filiação partidária é uma condição de elegibilidade para futuras candidaturas.

Assim, inexistindo nos autos certeza quanto à efetiva citação das partes, em claro prejuízo à defesa dos interessados, vislumbro nulidade na sentença.

De todo modo, considerando que, após a decisão, houve a intimação da sentença aos partidos envolvidos (ID 45661861), e a eleitora manifestou-se em sede de embargos por meio de procurador constituído, entendo por maduro o processo para julgamento, nos termos do art. 1.013, § 3º, inc. I, do CPC.

Assim, conquanto por fundamentos diversos, no ponto acompanho o eminente Relator.

 

Quanto ao mérito, peço vênia para divergir.

Cuida-se de recurso interposto em face de sentença (ID 45661857) em processo de duplicidade de filiação partidária que culminou no cancelamento das filiações da recorrente ao MDB e PSDB de Riozinho.

Conforme se depreende das razões recursais, a recorrente busca o reconhecimento de sua filiação partidária ao PSDB de RIOZINHO no prazo de seis meses anteriores às eleições, "para concorrer no próximo pleito eleitoral" (ID 45662028).

A coexistência de filiações partidárias encontra-se regulamentada no art. 22 e art. 23 da Resolução TSE n. 23.596/19, nos seguintes termos:

Art. 22. Havendo coexistência de filiações partidárias, prevalecerá a mais recente, devendo as demais serem canceladas automaticamente durante o processamento de que trata o § 2º do art. 12 desta Resolução ( Lei nº 9.096/1995, parágrafo único do art. 22 ). (Redação dada pela Resolução nº 23.668/2021)

Parágrafo único. Em caso de múltiplos registros de filiações partidárias no mesmo partido, prevalecerá o mais antigo. (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

 

O sistema jurídico vigente veda a duplicidade de filiação partidária. Nas hipóteses em que o critério cronológico possa ser aplicado, a regra é a subsistência da filiação mais recente, conforme inteligência do art. 22 da Lei n. 9.096/95.

Entretanto, nos casos em que as filiações ocorreram na mesma data, a norma torna automaticamente os vínculos partidários sub judice, determinando a abertura de processo para que o eleitor apresente justificativas plausíveis, bem como documentação suficiente para afastar o suposto equívoco da duplicidade de filiação apontada.

No caso dos autos, há informação referente à duplicidade de filiação partidária de Gisele Rodrigues Batista, acusando ter a eleitora se filiado em 06.4.2024 ao MDB e PSDB, ambos do Município de Riozinho/RS.

Verifico, ainda, que a recorrente, ao ser intimada da sentença, em sede de aclaratórios, externou sua vontade de permanecer filiada ao PSDB DE RIOZINHO e, a fim de corroborar sua intenção, juntou vasta documentação.

Na espécie, tenho pela prevalência da vontade da eleitora, pois, em caso de duplicidade de filiação partidária nosso ordenamento jurídico optou por preservar uma filiação, a mais recente, logo, cancelar as duas filiações não se afigura consentâneo ao sistema.

Ademais, cancelar as duas filiações representa sacrificar os direitos políticos de eleitora que declarou sua vontade em participar do processo eleitoral, inclusive tendo se filiado tempestivamente ao partido pelo qual pretende concorrer.

Nesse sentido, recentes decisões do Tribunal Superior Eleitoral debateram sobre a coexistência de filiação partidária realizada na mesma data. Seguem as ementas:

Eleições 2020 [...] Coexistência de filiação partidária. Mesma data. Impossibilidade de apuração do vínculo mais recente. [...] 1. Na espécie, o Tribunal Regional Eleitoral [...] diante da coexistência de filiações partidárias com a mesma data, reconheceu o vínculo com a agremiação indicada pela filiada e cancelou as demais. 2. No julgamento do REspe nº 0600005-03/GO, Rel. Min. Sérgio Banhos, em 13.10.2020, esta Corte, por unanimidade, entendeu que, diante da coexistência de filiações partidárias com a mesma data, somente será lícito o cancelamento de todas as filiações se: (i) não houver nenhuma informação, nem mesmo a manifestação do eleitor, que permita aferir qual é a filiação mais recente; e (ii) existirem elementos robustos, incontestes e que afastem qualquer dúvida razoável, obtidos sem maior pesquisa probatória, de que as filiações foram maculadas por ilícitos como fraude, simulação e abuso de direito. Em todas as outras hipóteses, inclusive quando houver apenas a manifestação do eleitor, deve ser aproveitada a filiação, seja ela a mais recente, seja aquela escolhida pelo eleitor. 3. Tal providência é a que mais se harmoniza com a atual redação do art. 22, parágrafo único, da Lei nº 9.096/95, prestigiando a um só tempo o postulado constitucional da autonomia partidária (art. 17, § 1º, CF/88) e o direito à cidadania (art. 1º, II) e à liberdade de associação (art. 5º, XX), de modo que negar validade à filiação partidária, à míngua da demonstração de fraude ou má-fé, seria obstaculizar, de forma indevida, o exercício da capacidade eleitoral passiva do ora recorrido. […]

(Ac. de 26.11.2020 no REspEl nº 060002209, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto.) (Grifo nosso)

 

[...] Filiação partidária. Coexistência. Inviabilidade concreta de apuração do vínculo mais recente. [...] 5. Segundo o parágrafo único do art. 22 da Lei 9.096/95, com a redação conferida pela Lei 12.891/2013, 'havendo coexistência de filiações partidárias, prevalecerá a mais recente, devendo a Justiça Eleitoral determinar o cancelamento das demais'. 6. A evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial aponta para a necessidade de aproveitamento da filiação partidária sempre que possível, observando-se o critério cronológico e independentemente de ter ocorrido comunicação de desfiliação nos termos do art. 21 da Lei 9.096/95. 7. Na hipótese de coexistência de filiações partidárias com a mesma data, o art. 23 da Res.-TSE 23.594 determina a notificação do filiado e das agremiações envolvidas, além da adoção de um conjunto de providências tendentes a apurar qual a filiação deve ser mantida, não fazendo referência à possibilidade, já expungida do texto legal, de cancelamento de todos os vínculos partidários. [...] 9. Entre muitos outros cenários, caso a notificação expedida resulte a concordância dos interessados, o Estado deve respeitar, tanto quanto possível, a manifestação de vontade dos envolvidos, em homenagem à autonomia partidária e à liberdade de associação. 10. A mera possibilidade de fraude no procedimento de apuração da filiação mais recente não justifica que se repristine sanção superada, írrita, sendo inviável, ademais, que se presuma a má-fé apenas em face de múltiplas fichas de filiação a partidos diversos. 11. No caso, segundo consta da moldura fática do acórdão regional, após intimação dos envolvidos, apenas o filiado se manifestou, no sentido de manter a sua filiação ao Podemos, manifestação de vontade que deve prevalecer. […]

(Ac. de 13.10.2020 no REspEl nº 060000503, rel. Min. Sérgio Banhos.) (Grifo nosso)

 

Desse modo, em linha com a jurisprudência do TSE, na impossibilidade de se aferir qual filiação é a mais recente, bem como quando inexistente manifestação dos partidos ou provas capazes de detectar o horário do processamento de registros com idênticas datas de filiação, deve prevalecer a vontade manifestada pela eleitora, em consonância com a voluntariedade do ato e a liberdade de associação do cidadão.

Portanto, entendo que a decisão mais razoável e condizente com os princípios do sistema eleitoral é prestigiar a documentação apresentada pela recorrente e prevalecer a sua vontade de ser mantida a filiação ao PSDB DE RIOZINHO, com data de 06.4.2024.

Com esses fundamentos, VOTO pelo CONHECIMENTO e PROVIMENTO do recurso para superar a prefacial e reformar a sentença, a fim de reconhecer a filiação da recorrente ao PSDB DE RIOZINHO desde 06.4.2024.