REl - 0600535-80.2024.6.21.0021 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/09/2025 00:00 a 05/09/2025 23:59

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

Inicialmente, cumpre ressaltar que, em matéria de prestação de contas, se admite, de forma excepcional, a juntada de documentos em sede recursal, desde que se trate de documentos simples, aptos a sanar irregularidade, não sendo necessária a reabertura de instrução ou nova análise técnica aprofundada, mesmo nos casos em que o interessado tenha sido previamente intimado a se manifestar.

Nesse sentido:

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. PARTIDO POLÍTICO . DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. CONHECIDOS OS DOCUMENTOS JUNTADOS NA FASE RECURSAL. DOAÇÃO ESTIMÁVEL DE SERVIÇOS CONTÁBEIS . AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUITAÇÃO. DIVERGÊNCIA DE VALORES ENVOLVENDO TARIFAS BANCÁRIAS. MERAS IMPROPRIEDADES. REFORMA DA SENTENÇA . AFASTADA A MULTA E A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1 . Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de diretório municipal de partido político, referente ao exercício financeiro de 2020, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada. Determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, acrescido de multa.

2 . Conhecidos os documentos juntados na fase recursal . No âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, ainda que o interessado tenha sido intimado para se manifestar, quando sua simples leitura, ictu primo oculi, pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica. Na hipótese, juntadas fotografias de cheques, de simples constatação e com aptidão para, em tese, conduzirem ao saneamento das irregularidades.

3. Ausência de comprovação de quitação de despesa. Apresentação de recibo de pagamento para comprovação de doação estimável de serviços contábeis, em desacordo com o prescrito pelo art. 9º da Resolução TSE n. 23 .604/19. Entretanto, sendo inequívoco que o serviço doado se origina da atividade laboral da própria doadora e que o valor arbitrado não destoa de outros praticados para trabalhos semelhantes no município de origem, a falha é meramente formal, pois não prejudica a fiscalização sobre os contornos essenciais da doação estimável em questão, sendo suficiente a aposição de ressalvas. Inexistência de fundamento legal para a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da doação estimável de serviço, fruto do trabalho da doadora, declarada em valor razoável relativamente aos parâmetros do mercado local e não envolvendo recursos públicos ou de origem não identificada.

4 . Divergência detectada entre o valor registrado como despesas com tarifas bancárias e o valor realmente apurado em análise. Reduzido montante da falha. Mera impropriedade, ensejadora de ressalvas às contas.

5. Reforma da sentença. As falhas identificadas constituem meras impropriedades, pois, alcançando montante módico, não impediram o exame técnico das contas e não resultam em dano ao erário, possibilitando a aprovação com ressalvas da contabilidade, na esteira de julgados desta Corte e do TSE (TRE-RS - PC 060028875, Relator.: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, Data de Julgamento: 15/06/2020, DJE de 23/06/2020).

6 . Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Afastada a multa e a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS - REl: 0600045-83 .2021.6.21.0079 MANOEL VIANA - RS 060004583, Relator: CAETANO CUERVO LO PUMO, Data de Julgamento: 31/10/2023, Data de Publicação: DJE-202, data 07/11/2023) (grifo nosso)

 

Conheço, portanto, do documento de ID 45874829.

No mérito, LUIS FERNANDO KALSING, candidato eleito vereador nas Eleições de 2024 no Município de Estrela, recorre contra a sentença da 021ª Zona Eleitoral de Estrela, que desaprovou suas contas, em razão da ausência da comprovação de gasto realizado com recurso do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC, e determinou o recolhimento no valor de R$ 8.250,00 ao Tesouro Nacional (ID 45874822).

Relativamente à questão da ausência de contratação de material de campanha, no parecer conclusivo (ID 45874819) no item 1 constou: "Ao responder o parecer conclusivo, o candidato apresentou prestação de contas retificadora em que declarou o recebimento de materiais impressos pagos pela candidatura majoritária (despesa comum - propaganda em conjunto) no total de R$ 1.137,25. Assim sendo, considera-se sanado tal apontamento."

Assim, em prestação de contas retificadora foi declarada a percepção, a título de recursos estimáveis em dinheiro, de material de campanha.

A questão central diz respeito à contratação do serviço de militantes, apresentados pelo prestador entre os gastos com pessoal, em afronta ao art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19:

 

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…)

VII - remuneração ou gratificação de qualquer espécie paga a quem preste serviço a candidatas ou candidatos e a partidos políticos;

(…)

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

 

O recorrente alega que os elementos dos autos comprovam plenamente as despesas.

Nomeadamente, os contratos considerados irregulares pela sentença foram formalizados com: ANDRÉ LUIZ GUEDES FIRMO (R$ 2.000,00); PIERRE LUIS LAWALL (R$ 2.000,00); ANTONIO ADRIANO DUTRA (RS 2.000,00); TAÍS SCHEIBEL (R$ 1.250,00) e VANDERCI FERNANDES DE OLIVEIRA (R$ 1.000,00).

Não há uniformidade entre eles. Verificam-se remunerações bastante distintas quando se cotejam os valores totais de cada contratado com sua específica carga horária.

Vejamos as cargas horárias:

 

Considerando tais elementos, vê-se que os dias trabalhados são os mesmos: todos os contratos dizem respeito aos dias 24/09 a 05/10. Mas a remuneração e as cargas horárias são diferentes e desproporcionais entre si. 

Para André e para Pierre, é verdade, a carga horária diária foi de 8h, o que, nos 11 dias contratados (excluído domingo), ambos receberam remuneração total de R$ 2.000,00, implicando valor de R$ 22,72 por hora. Além disso, em relação à contratada Taís, como sua jornada era de 2h30min por dia, o valor de sua hora foi de R$ 45,45. Em relação a Antonio, cujo horário seria das 17h30min às 20h de segunda a sexta-feira e nos sábados das 8h às 11h30min, tem-se que em 9 dias, de segunda a sexta, trabalhou 22h30min e 7h nos sábados (28.09 e 05.10), sendo remunerado pela importância de R$ 2.000,00, equivale a R$ 67,79 por hora (R$ 2.000,00 /29h30min).

Por fim, quanto a Vanderci, a descrição do horário está equivocada, porquanto há sobreposições, de modo que não é possível saber qual foi efetivamente a carga. Mas, se considerarmos a primeira informação constante, das 19h às 20h30min, teríamos apenas 1h30 diária, totalizando 16h30min que, pela remuneração de R$ 1.000,00, corresponde a R$ 60,60 por hora; se considerarmos a carga de 8h diárias, totalizando 88 horas, teremos remuneração de apenas R$ 11,36, o que parece irrazoável.

Enfim, as remunerações horárias variam entre R$ 11,36 ou R$ 22,72 a R$ 60,60, inexistindo coerência na tabela trazida.

Dessa forma, tenho por considerar irregulares as contratações havidas, pois a justificativa apresentada é por demais inconsistente, porquanto o recorrente afirma que se deve à distância entre os bairros em que realizadas as atividades.

Assim, seriam necessários maiores esclarecimentos e comprovação a respeito, porquanto não se infere, de antemão, razoabilidade no argumento.

Nesse sentido, o entendimento recente desta Corte:

 

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO ELEITO. USO DO Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) PARA CONTRATAÇÃO DE PESSOAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DAS DESPESAS. RECURSO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1.1. Recurso interposto por candidato eleito ao cargo de vereador contra sentença que desaprovou suas contas de campanha, relativas às Eleições Municipais de 2024, determinando o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, diante de irregularidades no uso de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para contratação de atividades de militância e mobilização de rua.

1.2. Os gastos em questão seriam irregulares em razão da falta de descrição da carga horária e do local de execução do trabalho, resultando na deficiente comprovação dos gastos com pessoal, em desconformidade com o previsto no § 12 do art. 35 e no art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

1.3. O recorrente alegou regularidade das contratações e apresentou documentos diversos, como contratos, recibos e declarações dos prestadores, requerendo a reforma da sentença para aprovação das contas, com ou sem ressalvas.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1. Saber se a contratação de pessoal com recursos do FEFC foi adequadamente comprovada, conforme exigências legais e regulamentares.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. A Resolução TSE n. 23.607/19 exige que as despesas com pessoal sejam detalhadas com identificação completa dos prestadores, locais de trabalho, horas trabalhadas, atividades executadas e justificativa para os valores contratados (art. 35, § 12).

3.2. A ausência de detalhamento mínimo nos contratos de prestação de serviço com recursos do FEFC, nos termos do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, configura irregularidade que não pode ser suprida por declarações unilaterais e extemporâneas.

3.3. Na hipótese, a documentação apresentada mostrou-se insuficiente para comprovar a regularidade das despesas, consistindo, em grande parte, por planilhas e declarações unilaterais ou extemporâneas, desprovidas de elementos que atestem sua autenticidade e contemporaneidade.

3.4. Observadas rasuras em contratos e ausência de justificativa para discrepâncias nos valores pagos a prestadores com funções e períodos equivalentes, o que fragiliza ainda mais a comprovação da despesa.

3.5. A comprovação da efetiva prestação dos serviços demandaria a apresentação de relatórios de atividades, folhas de controle de ponto, RPAs ou aditamentos contratuais, dotados de elementos que atestassem a autenticidade e a contemporaneidade em relação à campanha, o que não ocorreu no caso em tela.

3.6. A falha detectada corresponde a 65% dos recursos recebidos pelo candidato, o que afasta a possibilidade de aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovação das contas com ressalvas.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso desprovido.

Tese de julgamento: "A contratação de pessoal com recursos do FEFC exige documentação idônea, detalhada e tempestiva, sendo insuficiente, para fins de comprovação, a apresentação de planilhas unilaterais ou declarações extemporâneas que não demonstrem a efetiva prestação dos serviços nos termos do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19."

Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, arts. 35, § 12; 60; 79, § 1º.

Jurisprudência relevante citada: PCE n. 0602091-54/RS, Rel. Des. Patricia Da Silveira Oliveira, DJe n. 197, de 09.9.2024; Recurso Eleitoral n. 0600212-26/RS, Rel. Des. Volnei dos Santos Coelho, DJe n. 108, de 16.6.2025; TSE - REspEl: 060116394/MS, Rel. Min. Sergio Silveira Banhos, DJe de 27.10.2020.

(TRE-RS, REL 0600619-81.2024.6.21.0021, Relatora: Desa. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez, julgado em 15.08.2025)

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso de LUIS FERNANDO KALSING, ao efeito de manter a determinação de recolhimento da importância de R$ 8.250,00.