REl - 0600284-73.2024.6.21.0082 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/09/2025 00:00 a 05/09/2025 23:59

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos processuais, razão pela qual dele conheço.

Mérito

Como relatado, RENATO GIULIANI interpõe recurso em face de sentença que desaprovou sua prestação de contas relativa ao pleito de 2024, porquanto extrapolado o limite permitido para autofinanciamento e utilizados recursos de origem não identificada.

Em apertada síntese, o recorrente alega que excesso de recursos próprios se deu em quantia inexpressiva (R$ 363,49) e que o valor da cifra tida como sem identificação de origem se limita ao numerário que ultrapassou a baliza legal de R$ 1.064,10, no caso, apenas R$ 97,90, de sorte que o reduzido montante indevido autoriza a aprovação das contas com ressalvas.

À luz dos elementos que informam os autos, rogando a máxima vênia ao entendimento proferido pela douta Procuradoria Regional Eleitoral, tenho que assiste parcial razão ao recorrente no que atina ao valor tido como excedente de recursos próprios, mantido, ao fim e ao cabo, o alinhamento relativo à manutenção do juízo de reprovação das contas.

Com efeito.

Como sabido, o limite para o uso de recursos próprios em campanha é de 10% do teto de gastos definido para o cargo a que concorreu o recorrente. Em específico, para o pleito proporcional em Vila Nova do Sul/RS, o termo para despesas foi de R$ 15.985,08, com limitador de autofinanciamento em R$ 1.598,51, conforme dispõe o art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e a Portaria TSE n. 593/24.

No caso dos autos, o recorrente não recebeu verbas públicas durante sua campanha, de sorte que suas despesas foram quitadas integralmente com recursos próprios, na ordem de R$ 1.962,00, a indicar a superação do limite de aportes pessoais em R$ 363,49. E nelas foram inclusos os gastos com assessoria jurídica, com honorários definidos em R$ 800,00, conforme Extrato de Prestação de Contas de ID 45913129.

Ora, conforme reiteradamente vem decidindo este Tribunal, gastos advocatícios e de contabilidade não estão sujeitos a limites que possam obstar ou limitar o exercício da ampla defesa, de sorte que devem ser subtraídos do cômputo geral de gastos, posição que encontra eco nos  arts. 4º, § 5º, 35, § 3º, e 43, § 3º, todos da Resolução TSE n. 23.607/19 (TRE-RS - REl n. 0600178-96.2024.6.21.0087, Rel. Des. Fed. Leandro Paulsen, julgado em 07.8.2025)

E não é outro o entendimento da Corte Superior Eleitoral sobre o tema autofinanciamento, ao apontar que "as despesas com contador e advogado não estão sujeitas ao limite de gastos, devendo, portanto, serem excluídas da aferição do total de recursos próprios aplicados na campanha" (TSE - AREspEl: n. 0600337-03.2020.6.24.0085 ÁGUA DOCE - SC n. 060033703, Relator: Sergio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 02.5.2023, Data de Publicação: Diário de Justiça Eletrônico - DJe n. 81, data 03.5.2023).

Com essa concepção, tais dispêndios devem ser abatidos do total de despesas, restando, após sua subtração, o uso de apenas R$ 1.162,00 para fins de cálculo de ingresso de recursos próprios (R$ 1.962,00 - R$ 800,00).

E com essa singela aritmética, o limite de autofinanciamento resultou respeitado, motivo pelo qual há de ser afastada a multa ao recorrente imposta.

Entretanto, malgrado afastado o vício relativo ao excesso de autofinanciamento, persiste a falha relativa ao ingresso de recursos de origem não identificada, mediante depósitos sucessivos em espécie identificados com o CNPJ do próprio candidato, ora recorrente, em soma além do permissivo legal.

No intuito de garantir a rastreabilidade dos valores movimentados em campanha, o art. 21, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 estabelece que as doações financeiras de valor igual ou superior a R$1.064,10 só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal, limite este que deve ser observado, inclusive quando da hipótese de contribuições sucessivas efetuadas pelo mesmo doador em um mesmo dia.

Do exame dos autos, consta o ingresso sucessivo de 2 depósitos em espécie, oriundos do mesmo doador, no caso, o próprio recorrente, antes candidato, no dia 25.9.2024, os quais superaram o indigitado limite nominal totalizando R$ 1.162,00.

A reiterada jurisprudência desta Corte, em situação análoga, entende tais valores como sem demonstração de origem, devendo ser integralmente recolhido ao erário.

À guisa de exemplo, transcrevo lapidar precedente deste Colegiado Eleitoral Regional, cujo v. acórdão, da lavra do eminente Desembargador Eleitoral FRANCISCO THOMAZ TELLES, restou assim ementado:

DIREITO ELEITORAL. RECURSO. ELEIÇÃO 2024. PRESTAÇÃO DE CONTAS . AUTOFINANCIAMENTO. DOAÇÃO EM ESPÉCIE SUPERIOR AO LIMITE LEGAL. DEPÓSITOS BANCÁRIOS SUCESSIVOS E EM ESPÉCIE. RECURSO DESPROVIDO . I. CASO EM EXAME 1.1. Recurso eleitoral interposto por candidato ao cargo de vereador contra sentença que desaprovou suas contas de campanha, referentes às eleições municipais de 2024, e determinou o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, em razão do recebimento de recursos considerados de origem não identificada, decorrentes de três depósitos bancários em espécie, sucessivos e realizados na mesma data, todos identificados com o CPF do candidato . II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.1. Verificar se a realização de depósitos sucessivos em espécie, identificados com o CPF do candidato, configura irregularidade capaz de ensejar a desaprovação das contas . 2.2. Determinar se a restituição dos valores ao Tesouro Nacional é medida obrigatória diante da inobservância das normas eleitorais sobre doações. III . RAZÕES DE DECIDIR 3.1. O art. 21, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n . 23.607/19 estabelece que doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias da doadora ou do doador e da beneficiária ou do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal. 3 .2. A interpretação equivocada do candidato quanto ao limite global das transações não afasta a irregularidade, uma vez que a norma estabelece que tal restrição se aplica também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia. Descumprimento de norma expressa de contabilidade eleitoral, com impacto direto na confiabilidade das contas. 3 .3. A observância da norma não constitui mero rigorismo formal. O trânsito dos valores de forma integral pelo sistema bancário dá maior rastreabilidade quanto ao doador e mostra–se requisito fundamental de transparência, que deve permear todo o processo de prestação de contas eleitorais. 3 .4. As falhas correspondem a 76,46% dos valores manejados, o que não comporta a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovação das contas com ressalvas. Mantidas a desaprovação e a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. IV . DISPOSITIVO E TESE 4.1. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “A inobservância da exigência legal de transferência eletrônica para doações superiores a R$ 1 .064,10, incluída a hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia, compromete a transparência das contas e impõe a devolução dos valores ao Tesouro Nacional.” Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, arts . 21, §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º; 32, caput; e 79, caput. Jurisprudência relevante citada: TSE, AgR–REspEl n. 0600257–22.2020 .6.25.0017/SE, Rel. Min . Alexandre de Moraes, DJe 21.3.2022. (TRE-RS - REl: 06005106420246210022 MONTAURI - RS 060051064, Relator.: Francisco Thomaz Telles, Data de Julgamento: 18/02/2025, Data de Publicação: DJE-34, data 21/02/2025)

 

A partir desta intelecção, tenho como caracterizado o ingresso de valores sem demonstração de origem, os quais, em consequência, devem ser integralmente recolhidos ao erário, por força do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Outrossim, não há falar em boa-fé do recorrente a infirmar a decisão de piso, pois trata-se de falha de caráter objetivo e atestada pelos extratos bancários, não havendo elementos a afastá-la.

Desse modo, remanesce apenas a falha relativa ao aporte de recursos sem identificação de sua fonte, no valor de R$ 1.162,00, montante que perfaz 59,22% do total auferido em campanha e supera a baliza nominal de R$ 1.064,10, não autorizando a mitigação do juízo de reprovação da contabilidade.

Concluo, assim, que, não ultrapassado o delimitador legal, há ser acolhida a irresignação quanto à necessidade de afastamento da multa aplicada, mantida, entretanto, a desaprovação do caderno contábil, porque não superada mácula atinente ao uso de recursos de origem não identificada.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso para tornar insubsistente a multa na origem imposta ao recorrente, mantido, todavia, o juízo de desaprovação das contas e a determinação de recolhimento de R$ 1.162,00 ao Tesouro Nacional, a título de recursos de origem não identificada.

É o voto.