REl - 0600736-74.2024.6.21.0085 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/09/2025 00:00 a 05/09/2025 23:59

VOTO

1. Admissibilidade.

O recurso é tempestivo e tem presentes os demais pressupostos de admissibilidade, de forma que merece conhecimento.

2. Documentos juntados ao recurso.

Destaco que o recorrente acostou documentação em fase recursal.

Conforme pacífica jurisprudência deste Tribunal, a apresentação de novos documentos com o recurso não traz prejuízo à tramitação do processo de prestação de contas, sobretudo quando os documentos são simples, capazes de esclarecer, primo ictu oculi, as irregularidades apontadas sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. O posicionamento visa, sobretudo, a salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha, buscar celeridade processual e afastar excessivo formalismo.

Assim, conheço dos novos documentos.

3. Mérito.

No mérito, PIO LEONARDO WIEDERKEHR recorre da sentença que desaprovou suas contas de candidato a vereador de Torres, nas Eleições 2024, e determinou o recolhimento de R$ 612,87 (seiscentos e doze reais e oitenta e sete centavos).

As irregularidades dizem respeito (i) ao atraso na abertura de conta bancária; (ii) à utilização de recurso de origem não identificada - RONI; e (iii) à utilização de recurso do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC sem comprovação.

Passo à análise.

3.1. Atraso na abertura de conta bancária.

O exame das contas verificou que o candidato procedeu à abertura de conta bancária destinada ao recebimento de doações para campanha no dia 16.8.2024, extrapolando o prazo estabelecido na Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 8º É obrigatória para os partidos políticos e para as candidatas ou os candidatos a abertura de conta bancária específica, na Caixa Econômica Federal, no Banco do Brasil ou em outra instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil e que atendam à obrigação prevista no art. 13 desta Resolução.

§ 1º A conta bancária deve ser aberta em agências bancárias, postos de atendimento bancário ou por meios eletrônicos, sendo permitida, a critério da instituição financeira, abertura da conta também por meios eletrônicos, com a utilização de: (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

[...]

I - pela candidata ou pelo candidato, no prazo de 10 (dez) dias contados da concessão do CNPJ pela Secretaria da Receita Federal do Brasil;

O recorrente invoca os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e cita precedentes a amparar o argumento de que o atraso de abertura de conta bancário é mera falha formal que não comprometem o exame do procedimento e a regularidade/aprovação da prestação de contas.

Assiste-lhe razão, ainda que parcial.

O candidato extrapolou em apenas 1 (um) dia o prazo de 10 (dez) dias, contados da concessão da CNPJ para a abertura de conta bancária. Assim, inobstante a inobservância do prazo legal, o atraso não impediu a regular identificação das receitas e despesas da campanha - ou impediu em grau extremamente diminuto. Este Tribunal tem firmado entendimento na linha de que o atraso na abertura da conta bancária destinada à movimentação financeira de campanha, quando não compromete a regularidade da prestação de contas e a identificação das receitas e despesas, enseja a aposição da ressalva na prestação de contas (REl n. 060094735, Acórdão, Relator Des. Federa; Cândido Alfredo Silva Leal Junior, Publicação: DJe - Diário de Justiça Eletrônico, 22.4.2025).

Desta forma, dou provimento ao recurso, no presente tópico.

3.2. Utilização de recurso de origem não identificada – RONI.

Foi identificada a Nota Fiscal n. 94629104, no valor de R$ 42,87 (quarenta e dois reais e oitenta e sete centavos), não declarada na prestação de contas, emitida por FACEBOOK SERVICOS ONLINE DO BRASIL LTDA contra o CNPJ da campanha do recorrente, na data de 02.10.2024.

A sentença reconheceu configurado o recurso de origem não identificada, pois não consta na prestação de contas a identificação do doador dos recursos que quitaram o débito, e determinou o recolhimento de valor equivalente ao erário.

Após a interposição do recurso, com os autos já nesta instância, o prestador acostou a Guia de Recolhimento da União – GRU e o comprovante de pagamento, forma espontânea.

Em consequência, afasto a ordem de recolhimento.

Contudo, observo que este Tribunal tem entendimento consolidado no sentido de que o recolhimento antecipado é inapto a afastar a irregularidade, pois se trata de mero consectário da prática imprópria: por todos, REl n. 0600818-08, minha relatoria.

Assim, ainda que não haja recolhimento a ser mantido, a quantia irregular se mantém no cômputo do total das irregularidades e é considerada para fins de juízo de aprovação e desaprovação.

3.3. Utilização de recurso do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC sem comprovação.

A sentença aponta despesa no valor de R$ 570,00 (quinhentos e setenta reais) com verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, cuja respectiva nota fiscal não foi trazida ao processo. No campo normativo, a Resolução TSE n. 23.607/19 estabelece os meios de comprovação dos gastos eleitorais:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

§ 1º Além do documento fiscal idôneo, a que se refere o caput, a Justiça Eleitoral poderá admitir, para fins de comprovação de gastos, qualquer meio idôneo de prova, inclusive outros documentos, tais como:

I - contrato;

II - comprovante de entrega de material ou da prestação efetiva do serviço;

III - comprovante bancário de pagamento; ou

IV - Guia de Recolhimento do FGTS e de Informações da Previdência Social (GFIP).

IV - Guia de Recolhimento do FGTS, informações do Sistema de Escrituração Digital de Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial), da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais Previdenciários e de Outras Entidades e Fundos (DCTFWeb) e da Escrituração Fiscal Digital de Retenções e Outras Informações Fiscais (EFD-Reinf). (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

 

Ou seja, incumbe à parte prestadora comprovar as operações por meio de documentos fiscais idôneos, de fidedigna correspondência com as transações financeiras havidas.

Entendo, no caso, que o candidato lograra comprovar a regularidade do gasto por meio dos documentos apresentados na prestação. Na declaração das despesas entregues com a contabilidade, há (i) contrato de prestação de serviços; (ii) recibo de prestação de serviços; e (iii) comprovante bancário de pagamento (ID 45921100, fls 1, 2 e 3). Todos os documentos demonstram, com segurança, a contratação da empresa Alpha Business Ltda. para a prestação de serviços referentes a tráfego pago eleitoral (serviço de gerenciamento da campanha na internet), pelo preço de R$ 570,00 (quinhentos e setenta reais). O contrato fora assinado pelo representante contratual, que também firma o recibo e é o beneficiário constante do comprovante de pagamento - André Lopes Freitas. Ademais, o extrato bancário do DivulgaCandContas confirma a operação com contraparte beneficiada “André Lopes de Freitas CNPJ n. 41.945.508/0001-87”, e há, nas razões recursais, prints das mídias sociais do candidato. Igualmente, entendo o valor adequado ao operado no mercado.

Nessa linha, julgo comprovada a despesa com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e entendo por afastar a ordem de recolhimento de R$ 570,00, na linha de julgados desta Corte:

Recurso. Prestação de contas. Eleições 2008. Não comprovação de despesa efetuada com combustíveis. Desaprovação no juízo de origem. Ausência de nota fiscal específica do gasto impugnado suprida pelo correspondente recibo eleitoral. Falha que não compromete a fiscalização e a regularidade das contas como um todo. Aprovação com ressalvas. Provimento parcial. Recurso Eleitoral nº40624352, Acórdão, Relator(a) Des. DR. EDUARDO KOTHE WERLANG, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, 07/07/2011.

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS PÚBLICOS. FUNDO PARTIDÁRIO.DESCUMPRIMENTODO ART. 40 DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.553/17. FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). FALHAS QUE REPRESENTAM PERCENTUAL SIGNIFICATIVO DIANTE DA TOTALIDADE DAS RECEITAS ARRECADADAS. RECOLHIMENTO DA QUANTIA IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. 1. Omissão de despesa. Emitida nota fiscal contra o CNPJ do candidato, cujo gasto correspondente não constou registrado na sua contabilidade. Infringência ao disposto no art. 56, inc. I, al “g”, da Resolução TSE n. 23.553/17. Caracterizado recurso de origem não identificada, pois inexistente discriminação da fonte de receita, nos termos do art. 34, § 1º, inc. I, da Resolução TSE N. 23.553/17. 2. Efetuados gastos eleitorais com recursos oriundos do Fundo Partidário, os quais foram atestados através da juntada de recibos, em conformidade ao disposto nos parágrafos 1º e 2º do artigo 63 da Resolução TSE n. 23.553/17. Todavia, assinalada falha relativa à forma de pagamento da referida verba pública, em desacordo ao disposto no art. 40, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17. Diante da demonstração da aplicação dos recursos do Fundo Partidário, com o adequado recibo de quitação da despesa, é indevida a imposição de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, embora subsista a mácula relativa à ausência de prova da regularidade do meio de pagamento utilizado.  3. Irregularidade na comprovação de despesas realizadas com verbas do FEFC, gerando a obrigação de recolhimento do valor impugnado ao Tesouro Nacional, conforme disposto no art. 82, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17. 4. Falhas que totalizam o montante de 77% das receitas auferidas pela candidata durante a campanha, ensejando o juízo de reprovação das contas. Recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional. 5. Desaprovação. (TRE/RS,  PCE n. 0602623-67, Rel. Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Ac. de 04/11/2019).

 

CONCLUSÃO

Tanto o atraso na abertura da conta quanto a irregularidade relativa à utilização de recurso de origem não identificada, com valor módico já recolhido, admitem a aplicação dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar com ressalvas as contas, conforme pacífica jurisprudência deste Tribunal.

Diante do exposto, VOTO para dar parcial provimento ao recurso de PIO LEONARDO WIEDERKEHR, ao efeito de aprovar as contas com ressalvas e entender cumprida a obrigação de recolhimento ao Tesouro Nacional.