REl - 0600395-20.2024.6.21.0062 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/09/2025 00:00 a 05/09/2025 23:59

VOTO

1. Admissibilidade.

O recurso é tempestivo e tem presentes os demais pressupostos de admissibilidade, de forma que merece conhecimento.

2. Documentos juntados ao recurso.

A recorrente apresentou documentação em dois momentos após a sentença: junto à irresignação e antes do parecer ministerial (já perante este Tribunal).

Conforme pacífica jurisprudência desta Corte, a apresentação de novos documentos com o recurso, sobretudo na classe processual das prestações de contas, não apresenta prejuízo à tramitação do processo quando os documentos forem simples e capazes de esclarecer, primo ictu oculi, as irregularidades apontadas (sem a necessidade, portanto, de nova análise técnica ou diligências complementares). O posicionamento visa, sobretudo, salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha, buscar celeridade processual e afastar excessivo formalismo.

No caso posto, indico que a documentação juntada, quer sob o aspecto quantitativo, quer sob o aspecto qualitativo (complexidade), dispensa qualquer olhar técnico de maior profundidade, de modo que admito a juntada.

3. Mérito.

No mérito, ZILAH TEREZINHA FIORAVANSO recorre da sentença que desaprovou suas contas de candidata a vereadora do Município de Camargo, nas Eleições 2024, e determinou o recolhimento de R$ 5.497,84 (cinco mil, quatrocentos e noventa e sete reais e oitenta e quatro centavos) ao Tesouro Nacional. A irregularidade diz respeito à ausência de devolução, ao Tesouro Nacional, dos recursos recebidos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC e não utilizados, conforme o § 3º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19:

§ 3º Os recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) que não forem utilizados nas campanhas eleitorais deverão ser devolvidos ao Tesouro Nacional, integralmente, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), no momento da apresentação da respectiva prestação de contas.

A sentença aponta as irregularidades nesses termos:

Após análise dos documentos, percebe-se que não foi juntado nota fiscal, recibo ou contrato de pagamento dos serviços jurídicos, doação estimada está sem movimentação, e o relatório de despesas referente a advogado ID 125191080 consta sem movimentação, ou seja, tecnicamente, não foram capazes de sanar a irregularidade apontada.

A discussão, portanto, cinge-se à aplicação de forma regular ou não da quantia de R$5.497,84 (cinco mil, quatrocentos e noventa e sete reais e oitenta e quatro centavos) dos recursos do Fundo Especial do Financiamento de Campanha. O valor de R$1.002,16 foi utilizado para a publicidade por meio de materiais impressos e pagamento de despesas de contabilidade.

Não há dúvidas que despesas com consultoria, assessoria e pagamento de honorários de advogado e contador para as campanhas eleitorais são considerados gastos eleitorais, nos termos do §3º do art. 35 da Resolução TSE nº 23.607/2019.

Não obstante, da análise dos autos, a referida despesa, embora alegada, não foi declarada na prestação de contas da candidata. Nos termos do art. 26, §6º, da Lei 9.504/97 e §5º do art. 35 da Resolução TSE nº 23.607/2019, os recursos originados do Fundo Especial de Financiamento de Campanha utilizados para pagamento das despesas "serão informados na prestação de contas das candidatas ou dos candidatos, diretamente no SPCE" (grifei). Trata-se de obrigação da prestadora de contas declarar os referidos gastos na sua integralidade.

[...]

A alegação de que os valores foram transferidos "para a a conta FEFC do partido União Brasil" e posterior "devolução do montante remanescente à União", não foi comprovada, não sendo juntado os referidos documentos hábeis. Houve apenas a juntada de Guia com devolução de valor superior ao Erário, mas não de forma individualizada e nem demonstrando o quanto foi utilizado em favor da candidata.

Não houve a juntada da GRU de recolhimento, a tramitação dos valores não obedeceu os dispositivos da lei eleitoral e não houve demonstração da correta destinação dos valores.

Em síntese, a decisão destaca a falta de comprovação com despesa em assessoria jurídica - não declarada na prestação de contas. Ainda, há a falta de comprovação das transferências alegadas pela candidata.

Nas suas razões, a candidata sustenta ter transferido ao Diretório Municipal do Partido Liberal - PL de Camargo a quantia não utilizada dos recursos públicos, e que o ente municipal teria, após descontar gastos relativos à assessoria jurídica (cota-parte da candidata), repassado o restante à União.

Considerando que as alegações recursais da candidata implicam esclarecimentos ocorridos no âmbito da prestação de contas do ente partidário municipal, imperioso referir o julgamento daquelas contas. Por pertinente, reproduzo excerto da decisão que julgou as contas do Diretório Municipal do Partido Liberal de Camargo, Processo n. 0600397-87.2024.6.21.0062:

O relatório técnico constatou, ainda, irregularidades na comprovação da aplicação dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). Segundo apontamento da equipe técnica, o partido político recebeu o valor de R$11.991,36 proveniente de recursos FEFC não utilizados pelos candidatos, sendo que desse valor, 91,69% (R$10.995,68) foi oriundo de FEFC de candidaturas femininas e, portanto, deveria ter sido aplicado exclusivamente nestas campanhas, em consonância com o §6º do art. 17 da Resolução 23.607/2019.

A análise dos documentos constantes dos autos permite aferir que, do total recebido pelo partido proveniente do FEFC, o valor de R$5.700,00 foi utilizado para despesas com serviços advocatícios e de contabilidade, tendo sido devolvido ao Tesouro Nacional, em 05/11/2025, o valor de R$ 6.291,36 (ID 125908960).

(Grifei.)

Dito de outro modo, a sentença reconheceu o recebimento, por parte do partido, de valores não utilizados por candidatos, bem como o pagamento de suas despesa advocatícias. A sentença da presente demanda precedeu àquela do partido, de modo que é compreensível que o juízo da origem tenha decidido como decidiu.

Observo, ademais, que a previsão legal para transferência de valores percebidos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha por candidatos ao partido refere-se a verbas destinadas ao custeio da sua cota-parte em despesas coletivas, desde que haja benefício para campanhas femininas e de pessoas negras, e, no caso de eventual repasse irregular a determinação é que o valor repassado irregularmente [deva] ser recolhido ao Tesouro Nacional pelo órgão ou candidata ou candidato que realizou o repasse tido por irregular (§ 7º e § 9º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19).

No caso, a candidata transferiu a totalidade do valor não utilizado, e anexou o comprovante bancário de transferência de valores (da sua conta de campanha) ao Partido Liberal de Camargo (ID 45917602): a operação, no valor de R$ 5.497,84, pode ser confirmada no extrato bancário da candidata disponível no DivulgaCandContas.

Além disso, apresentou (i) o contrato de prestação de serviços profissionais de assessoria jurídica, firmado entre o diretório da agremiação e os procuradores da prestadora (ID 45917635); (ii) os recibos de pagamentos da despesa com advogados, realizada pelo partido (ID 45917636 e ID 45917637); e (iii) Guia de Recolhimento da União referente à transferência de valores determinada na sentença que julgou as contas do Partido Liberal, com os respectivos comprovantes de pagamento.

Nessa linha de raciocínio, julgo comprovada a transferência da candidata à agremiação e, por sua vez, da agremiação ao Tesouro Nacional, de forma que afasto a ordem de recolhimento de valores imposta na sentença aqui recorrida. A previsão legal foi atendida - recolhimento ao Tesouro Nacional das verbas públicas não utilizadas na campanha.

Diante do exposto, VOTO para dar provimento parcial ao recurso de ZILAH TEREZINHA FIORAVANSO, para aprovar as contas e afastar a ordem de recolhimento.