REl - 0600439-34.2024.6.21.0096 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/09/2025 00:00 a 05/09/2025 23:59

VOTO

1. Admissibilidade.

O recurso é tempestivo e tem presentes os demais pressupostos de admissibilidade, de modo que merece conhecimento.

2. Da prestação retificadora apresentada após a sentença.

O recorrente apresentara prestação de contas retificadora após a prolação da sentença. Nítido está, dessarte, que a parte pretendeu remeter a análise da documentação retificadora a este grau recursal - ainda que a tenha apresentado antes da interposição. De fato, o conhecimento de documentos em fase recursal é prática geralmente aceita por este Tribunal nas prestações de contas, notadamente nos casos em que os documentos sejam simples, capazes de trazer esclarecimento sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares.

No caso concreto, nítido está que, em decorrência do volume e da complexidade, a documentação exigiria a remessa dos autos à Secretaria de Auditoria Interna deste Tribunal para análise técnica de cunho contábil. A reabertura da instrução resultaria em tratamento privilegiado do ora recorrente em relação aos demais candidatos da eleição para a qual concorrera, sobretudo aqueles que, forma diligente, apresentaram tempestivamente toda a documentação exigida.

O argumento central do recorrente repousa em "falha/equívoco" da contabilidade na apresentação documental, nos seguintes termos, litteris:

(...)

Cumpre salientar Nobres Julgadores que, houve uma falha\equívoco da contabilidade na prestação de contas do recorrente ao deixar de anexar os devidos comprovantes de despesas e pagamento quando da apresentação de contas nos eventos anteriores, causando a desaprovação das contas e recolhimento do valor apontado ao Tesouro Nacional.

O presente recurso tem por objetivo que seja assegurado ao recorrente a possibilidade de comprovar através dos comprovantes juntados, sua boa-fé e transparência para que seja devidamente apreciadas as provas e as razões de fato e de direito apresentadas para a devida justiça, proporcionalidade e razoabilidade do julgamento da prestação de contas, assegurando o reconhecimento da comprovação das despesas e pagamentos e reforma da sentença para a aprovação das contas com ressalvas.

 

Nesse norte, o pedido de conhecimento da prestação de contas retificadora não pode ser acolhido, pois se trata do próprio objeto do processo, e não de mero documento esclarecedor ao primeiro olhar. A situação consubstanciaria inclusive supressão de instância, pois, como dito, a diligência ocorrera após a prolação da sentença.

Cabe salientar que ao candidato a cargo eletivo, que pretende submeter seu nome à aferição do eleitorado, é defeso atribuir responsabilidade sua - prestar contas de campanha - a outrem (no caso, a "contabilidade"). E tal responsabilidade é, em essência, de prestar contas à sociedade (pois com frequência há o manejo de verbas de origem pública) da qual a Justiça Eleitoral é mero instrumento.  

Não conheço dos documentos.

3. Mérito.

No mérito, RONILSON DOS SANTOS RAMOS recorre da sentença que desaprovou suas contas de candidato a vereador de Guarani das Missões, nas Eleições 2024, em razão de (i) dívida de campanha não assumida pelo partido; (ii) utilização de recurso de origem não identificada – RONI; e (iii) gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC sem comprovação. A decisão hostilizada determinou o recolhimento de R$ 13.947,50 (treze mil, novecentos e quarenta e sete reais e cinquenta centavos) ao Tesouro Nacional, ID 45933475.

E, adianto, o recurso não merece provimento. Note-se que, para além da pretensa - e extemporânea - prestação de contas retificadora (não conhecida nos termos do item supra), o recorrente não enfrenta as causas que ensejaram a desaprovação. Deixou de trazer, nas razões do recurso, qualquer justificativa a amparar a reforma da sentença.

3.1. Dívida de campanha.

Destaco que a dívida de campanha não assumida pelo partido está configurada, pois o candidato deixara de adotar as providências determinadas no art. 33, §§ 2° e 3°, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 33. [...]

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo partido político (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 3º ; e Código Civil, art. 299) .

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência da pessoa credora;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

Sublinho ademais que esta Corte, de modo alinhado ao e. Tribunal Superior Eleitoral, entende não haver respaldo normativo para determinar o recolhimento da dívida de campanha ao Tesouro Nacional como se de recursos de origem não identificada se tratasse (REspEl n. 0601205–46/MS, rel. designado Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 08.02.2022, DJe de 30.3.2022).

Circunstância devidamente observada pela decisão recorrida, irretocável no ponto.

3.2. Utilização de Recurso de Origem Não Identificada.

No concernente à utilização de recurso de origem não identificada – RONI, houve omissão de gasto verificado por meio de nota fiscal (detectada pela circularização de informações) no valor de R$ 347,50 (trezentos e quarenta e sete reais e cinquenta centavos).

No presente tópico, a sentença acompanha o posicionamento adotado por este Tribunal. O art. 32, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19 determina que:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatas ou candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta da doadora ou do doador;

Igualmente irretocável a sentença. Cuida-se, aqui, de irregularidade que comporta submissão à ordem de recolhimento do valor ao Tesouro Nacional, no caso, R$ 347,50.

3.3. Ausência de comprovação das verbas oriundas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC.

Trata-se da irregularidade mais grave. O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) é um fundo público destinado ao financiamento das campanhas eleitorais dos candidatos, previsto nos arts. 16-C e 16-D da Lei n. 9.504/97. Fora criado no ano de 2017. É verba pública que, por sua natureza, exige redobrado cuidado de parte do candidato que a recebe. 

A legislação regulamentar, especialmente a Resolução TSE n. 23.607/19, da qual transcrevo os comandos pertinentes ao caso posto, art. 60 e art. 79, § 1º:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

Art. 79. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma prevista nos arts. 31 e 32 desta Resolução.

(...)

§ 1º Ausente a comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário (FP) e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou comprovada a utilização indevida, a execução da decisão que julgar as contas, após o seu trânsito em julgado, determinará a devolução do valor correspondente na forma estabelecida pela Res.-TSE nº 23.709/2022. (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

Ou seja, irretocável a decisão terminativa de primeiro grau, ao fazer constar que "o candidato captou R$ 13.600,00 do FEFC, efetuou gastos em benefício de sua campanha com tais valores, porém não juntou aos autos os documentos comprobatórios das despesas, violando art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, o que impõe o recolhimento de tais valores em benefício do Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, §1º, da Resolução TSE n. 23.607/19", pois os gastos não foram comprovados por meio de documentação pertinente (notas fiscais, recibos, contratos, et cetera).

Conclusão.

O juízo de desaprovação das contas deve ser mantido, uma vez que a soma das irregularidades alcança a importância de R$ 13.947,50 (treze mil, novecentos e quarenta e sete reais e cinquenta centavos) e representa a totalidade das receitas da campanha. É inadmissível, sob tais termos, a aplicação dos princípios constitucionais da proporcionalidade e razoabilidade para aprovar com ressalvas, conforme pacífica jurisprudência deste Tribunal.

Diante do exposto, VOTO para negar provimento ao recurso de RONILSON DOS SANTOS RAMOS.