REl - 0600233-84.2024.6.21.0010 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/09/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado e tempestivo e atende a todos os pressupostos recursais atinentes à espécie e, portanto, merece conhecimento.

Pedido de efeito suspensivo. Desnecessidade. Norma expressa de lei.

De início, consigno quanto ao pedido de efeito suspensivo realizado pela recorrente - muito embora cediço aos atuantes na Justiça Eleitoral que por regra expressa de lei aos concorrentes do pleito é assegurada a prática de todos os atos atinentes à campanha eleitoral, inclusive estando sub judice:

Lei n. 9.504/97

Art. 16-A O candidato cujo registro esteja sub judice poderá efetuar todos os atos relativos à campanha eleitoral.

 

Mérito.

No mérito, trata-se de recurso interposto contra sentença que indeferiu o requerimento de registro de candidatura de VALDIVA MACHADO DIAS, em razão da ausência de quitação eleitoral. Houve julgamento das contas relativas ao pleito de 2012 como não prestadas.

As questões recursais são simples, adianto.

É pacífico que o e. Tribunal Superior Eleitoral se posiciona no sentido de que em registro de candidatura não cabe a esta Justiça especializada verificar o acerto ou desacerto da decisão que julgou não prestadas as suas contas de campanha, tampouco é meio hábil a afastar eventuais vícios. Inteligência da Súmula nº 51/TSE (REspEl nº060110095, Acórdão, Min. Carlos Horbach, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 27/10/2022).

Tal posicionamento seria suficiente para exaurir a questão e confirmar a sentença - como visto, trata-se de matéria objeto de verbete de  Súmula jurisprudencial.

Contudo, considerada a agudeza - e alguma hostilidade, até - das colocações feitas a título de razões de recurso, necessário adentrar no procedimento do processo de regularização, a fim de não permanecerem dúvidas sobre a lisura da prestação jurisdicional desta Justiça, a qual ocorre, ao cabo, por atos de seus servidores.

A candidata alega, peremptoriamente, no recurso eleitoral:

(…) a ora recorrente APRESENTOU SIM sua Prestação de Constas referente a Eleição de 2012, CONFORME RECIBO DE ENTREGA, devidamente assinado por LENADRO MARTINS MORAES, Analista Judiciário, Área Judiciária, Chefe do Cartório Eleitoral da cidade de Cachoeira do Sul/RS, na data de 03.05.2021, documento em anexo.

E acrescenta, na manifestação que fez ingressar nos autos diretamente nesta instância - em "substituição à sustentação oral":

No PRESENTE CASO HOUVE SIM A APRESENTAÇÃO = PRESTAÇÃO DE CONTAS! Pois foi entregue para a Justiça Eleitoral, para o seu representante legal, a Prestação de Constas referente ao pleito de 2012, aliás, tal prova consta dos autos, através do RECIBO DE ENTREGA, devidamente assinado por LEANDRO MARTINS MORAES, Analista Judiciário, Área Judiciária, Chefe do Cartório Eleitoral da cidade de Cachoeira do Sul/RS, que ainda encontra-se lotado e exercendo suas atividades neste MM. Juízo(…)

Onde se houve perda ou extravio de tal documento A RESPONSABILIDADE É EXCLUSIVA DO SERVIDOR, QUE, ALIÁS, DEVE RESPONDER POR TAL ATO, não sendo obrigada a recorrente a manter cópia de tal mídia para apresentação de tantas quantas vezes o servidor perder ou jogar fora a então recebida e contendo os dados e informações necessárias a sua regularização eleitoral, pois no caso a recorrente não possui cópia de tais dados, pois já se passaram mais de 12 anos da eleição de 2012!

Ademais, o servidor “relapso” ou “desidioso” ainda atua junto a esse MM. Juízo, sendo o Chefe do Cartório Eleitoral, cargo de confiança da magistrada, onde poderia a magistrada muito bem ter questionado do mesmo sobre onde foi parar a mídia entregue a ele, conforme documento de recebimento assinado pelo servidor, devendo tal servidor apresentar a mídia ou explicar porque a mesma sumiu, qual motivo ou interesse do sumiço, ou onde a depositou?

A Justiça Eleitoral é a fiel depositária da mídia entregue, portanto não pode ela exigir da candidata recorrente que a reapresente, mídia essa que se diga de passagem a recorrente não tem cópia, pois se não confiarmos na justiça com referência a documentos e petições entregues poderemos confiar em quem então?! Será que temos de ter arquivados em nossos domínios particulares por mais de 10 (dez) anos, como neste caso, tudo que enviarmos e protocolarmos na justiça? Qual a responsabilidade da justiça e de um servidor de dar sumiço a documentos que lhes são confiados a guarda? Como fica a situação de quem entregou tal documento e não possui cópia do mesmo?

O referido servidor deveria e deve ser questionado pela magistrada ou por esta Colenda Corte a fim de que explique onde foi parar a mídia entregue a ele, ou qual destinação deu a mesma, e qual motivo ou interesse no seu desparecimento. (Negritos meus.)

As acusações são graves: de extravio de documento por parte de servidor, de desenvolvimento das atividades de modo “relapso” ou “desidioso”, e da manutenção (errônea, no entender da candidata) deste servidor no cargo de chefe do cartório, pela Juíza Eleitoral.

À análise.

A começar pelo referido recibo na entrega da prestação de contas, atestado pelo servidor do cartório, que reproduzo:

Necessário contextualizar: a recorrente ingressou com requerimento de regularização de contas julgadas não prestadas relativas ao ano de 2012 apenas nove anos depois – RROPCE, em 22.4.2021, autuado sob o número 0600091-85.2021.6.21.0010 - (e aponta o servidor como "relapso", ou "desidioso").

O pedido foi recebido pela magistrada competente, que determinou a intimação da requerente para apresentação das mídias, conforme previsto na normativa reguladora do pleito de 2012 (Res. TSE n. 23.376/2012, art. 45).

É de conhecimento dos operadores cartorários da Justiça Eleitoral (de todas as esferas, mas especialmente junto ao 1º grau) as dificuldades na leitura das mídias entregues aos cartórios - de regra pela gravação indevida dos dados.

Foi o que ocorreu naqueles autos, conforme certidão do servidor Leandro Martins Moraes, o qual atestou que o arquivo constante da mídia não pôde ser enviado ao TSE em função de erro na leitura, e em segunda oportunidade conferida à prestadora, que decorreu in albis o prazo de 05 (cinco) dias para reapresentação da mídia, em pen-drive, com o arquivo das contas de campanha da Eleição de 2012 (ID 88027372 e ID 89717349 do RROPCE nº 0600091-85.2021.6.21.0010).

Intimada a reapresentar as mídias, a recorrente deixou transcorrer o prazo sem aproveitamento: e, repito, imputa agora, em 2024, ao servidor cartorário a pecha de desidioso e relapso. Inviável. A situação atual é de responsabilidade única e exclusiva da própria recorrente.

Retorno ao tema central do registro de candidatura.

Quanto à ausência de quitação eleitoral, a destacar o art. 11, § 7º, da Lei n. 9.504/97:

Art. 11 (…)

§ 7o A certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a apresentação de contas de campanha eleitoral.

(Grifei.)

O Tribunal Superior Eleitoral consagrou o entendimento por meio da Súmula n. 42:

A decisão que julga não prestadas as contas de campanha impede o candidato de obter a certidão de quitação eleitoral durante o curso do mandato ao qual concorreu, persistindo esses efeitos, após esse período, até a efetiva apresentação das contas.

Desse modo, resta não atendida a condição de registrabilidade relativa à quitação eleitoral.

Por fim, a candidata, em tese alternativa e subsidiária, alega prescrição da prestação de contas julgada como não prestada, que ensejou o indeferimento do registro, por ser relativa a pleito de 2012, há mais de dez anos.

Novamente, de inviável acolhimento.

É consabido, cediço até, que a legislação de regência estende o impedimento de obter a certidão de quitação eleitoral pelo candidato que tiver o julgamento das contas eleitorais como não prestadas até o final da legislatura, persistindo os efeitos da restrição após esse período até a efetiva apresentação das contas, em razão de redação expressa do art. 80, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. 

Logo, inaplicável a regra suscitada do art. 205 do Código Civil.

Diante o exposto, voto para negar provimento ao recurso.