REl - 0600059-94.2023.6.21.0015 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/09/2024 às 14:00

VOTO

Inicialmente, consigno ser desnecessária a conversão do julgamento em diligência, pois todos os documentos juntados aos autos foram analisados pelo juízo a quo, são de fácil cognição e serão a seguir examinados no âmbito do pleno efeito devolutivo da matéria, não se verificando a presença do vício de que trata o art. 938 do CPC.

No mérito, ao julgar desaprovadas as contas do exercício financeiro de 2022 do Diretório Municipal do Progressistas (PP) de Coqueiros do Sul/RS, a sentença determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 16.945,00, devido aos apontamentos de recebimento irregular de: a) R$ 16.780,00 referentes a 159 créditos em conta-corrente sem indicação do CPF do doador originário, considerados como recursos de origem não identificada, e de b) R$ 165,00 provenientes de fontes vedadas, relativos a quatro contribuições efetuadas por detentores de cargos públicos municipais demissíveis ad nutum, sem filiação partidária ao PP, ocupantes das funções de diretor de departamento, chefe de setor, assessora de imprensa e assessor jurídico da Câmara Municipal de Vereadores.

A decisão recorrida considerou violados o art. 12, inc. IV e § 1º, e art. 13 da Resolução TSE n. 23.604/19, fixou multa de 10% sobre o valor apontado como irregular e suspendeu os repasses do Fundo Partidário pelo período de 1 (um) ano (sentença, ID 456459 o77).

As razões recursais insurgem-se quanto à falha relativa à conclusão de que o partido recebeu recursos de origem não identificada na ordem de R$ 16.780,00, pois quanto à determinação de recolhimento de contribuições de fontes vedadas, no valor de R$ 165,00, não houve irresignação, tendo sido apontado até mesmo que as contribuições de fontes vedadas superariam o valor apurado em primeiro grau em R$ 1.535,00.

Além disso, pretende-se o afastamento da multa e da suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário ou, supletivamente, a redução do quantum e do prazo de tais sanções, respectivamente, em atenção ao princípio da proporcionalidade.

O recurso está fundado no argumento de que houve comprovação da origem dos recursos recebidos pela agremiação a partir de documentos produzidos pelo partido e dados fornecidos pelo banco Caixa Econômica Federal.

Quanto à conclusão de recebimento de recursos de origem não identificada no total de R$ 16.780,00, referente a 159 créditos em conta bancária sem identificação do CPF do doador originário, a decisão recorrida aponta que, "do total arrecadado pela agremiação (R$ 20.605,00 - vinte mil, seiscentos e cinco reais), R$ 16.780,00 (dezesseis mil, setecentos e oitenta reais) correspondem às receitas constantes do extrato eletrônico sem identificação da contraparte".

Durante a instrução, a falha foi justificada pelos prestadores com fundamento no recebimento de contribuições por intermédio de boletos bancários, tendo sido atribuída à instituição financeira a responsabilidade pelo acompanhamento da correta indicação do CPF do doador do recurso quando do repasse do valor ao partido. Nesses termos é a manifestação partidária assim sintetizada no parecer conclusivo do ID 45645954:

(...)

A agremiação partidária emitiu, a pedido de filiados, boletos bancários para que estes realizassem a contribuição voluntária ao Partido.

Desta forma, identificou todas as doações nos extratos eletrônicos emitidos do Sistema de Prestação de Contas Anual (SPCA), tanto que o examinador, conforme item anterior identificou pessoas que, nos termos do inciso IV do Art. 12 da Resolução TSE nº 23.604/2019, não poderiam ter realizado a doação de valores a Partido Político.

Efetivamente no extrato bancário não consta o nome e nem o CPF do doador, quando da liquidação do boleto bancário.

Porém, a Agremiação Partidária identificou cada doação/contribuição de filiado nos extratos eletrônicos emitidos do Sistema de Prestação de Contas Anual (SPCA), razão pela qual nada há de irregular.

Veja-se que, com o objetivo de dar maior transparência, inclusive fez Boletos Bancários relativo a cada contribuição e os identificou em sua prestação de contas (SPCA) e esperava, frente ao sistema adotado, que no extrato bancário também identificasse os contribuintes.

Assim, surpreendida com o apontamento do ilustre examinador, o Partido buscou perante a Caixa Econômica Federal - local onde movimenta seus recursos financeiros - um esclarecimento, sendo que a referida instituição disse que referidas informações somente são disponibilizadas em relatório auxiliar, sendo que somente é disponibilizado dos últimos 3 (três) meses, conforme relatórios em anexo.

Todavia, conforme referido alhures, apesar do Banco não registrar o nome e CPF do doador/contribuinte, nada há de irregular, eis que o Partido registrou individualmente cada doação/contribuição no SPCA, razão pela qual requer seja afastado o apontamento de Receita Sem Identificação, tendo em vista que a agremiação partidária registrou e identificou corretamente os doadores/contribuintes nos extratos eletrônicos emitidos do Sistema de Prestação de Contas Anual (SPCA).

Essa narrativa foi afastada na sentença, concluindo o julgador por acolher o parecer técnico no sentido de que, mesmo nas hipóteses de contribuições efetuadas por boleto bancário, "permanece a obrigatoriedade quanto à identificação de cada doação com o respectivo número do CPF/CNPJ do doador no extrato bancário impresso, conforme reza o art. 8º, § 2º, sob pena de serem considerados recursos de origem não identificada (art. 13, parágrafo único, inc. I, al. "a' da Resolução ora mencionada)" .

Em suas razões, os recorrentes referem que o "demonstrativo de contribuições recebidas" e demais documentos elaborados pelo partido, aliados aos relatórios bancários produzidos pela Caixa Econômica Federal, seriam suficientes para comprovar a origem da totalidade dos recursos arrecadados, incluindo-se o recebimento de R$ 16.780,00 apontados como irregulares, pois decorrentes de boletos bancários liquidados em 2021 (R$ 1.390,00) e 2022 (R$ 14.690,00) - (razões recursais, ID 45645981, p. 4).

Para corroborar essa tese, afirmam terem sido tão transparentes ao prestar as contas que culminaram por apresentar documentação demonstrando que os créditos em conta nos valores de R$ 240,00, R$ 495,00, R$ 500,00 e R$ 300,00, no montante total de R$ 1.535,00, não tratam de recursos de origem não identificada, e sim de contribuições de fontes vedadas efetuadas pelos servidores públicos Ana Rodrigues da Silva (R$ 240,00), Dione Charles Wentz (R$ 495,00), Cloir Papke (R$ 500,00) e Diane Kemmerich da Silva (R$ 300,00), todos detentores de cargos demissíveis ad nutum.

Nesse ponto, comparam o extrato bancário de ID 45645934 com o demonstrativo de contribuições recebidas de ID 45645906 e o relatório de títulos bancários de ID 45645973, asseverando ter sido realizado o rigoroso cumprimento do art. 39, § 3º, inc. III, da Lei n. 9.096/95 e do art. 7º, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Quanto à falta de indicação do CPF nos extratos bancários, atribuem à instituição financeira que compensou os boletos a responsabilidade pela ausência de identificação dos doadores originários.

A Procuradoria Regional Eleitoral, atentamente, destaca que os dados financeiros apresentados pelo partido não são de simples leitura nem se apresentam sequenciados por data, avaliando que não se encontram provadas as alegações de correta identificação das receitas neste momento processual (ID 45652972).

Pois bem.

Noto, primeiramente, que, conforme a legislação citada no corpo do recurso, a opção pela arrecadação por boleto bancário gera dupla obrigação para a grei - emissão de recibo eleitoral e identificação do doador pelo seu CPF -, de acordo com o art. 39, § 3º, inc. III, als. "a" e "b", da Lei n. 9.096/95 e o art. 7º, § 1º, incs. I e II e § 4°, inc. I, da Resolução TSE n. 23.604/19:

Lei n. 9.096/1995

Art. 39. Ressalvado o disposto no art. 31, o partido político pode receber doações de pessoas físicas e jurídicas para constituição de seus fundos.

(...)

§ 3° As doações de recursos financeiros somente poderão ser efetuadas na conta do partido político por meio de: (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

III - mecanismo disponível em sítio do partido na internet que permita o uso de cartão de crédito, cartão de débito, emissão on-line de boleto bancário ou, ainda, convênios de débitos em conta, no formato único e no formato recorrente, e outras modalidades, e que atenda aos seguintes requisitos:(Redação dada pela Lei nº 13.877, de 2019)

a) identificação do doador; (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

b) emissão obrigatória de recibo eleitoral para cada doação realizada. (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

 

Resolução TSE n. 23.604/2019

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou do contribuinte ou no CNPJ, no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

§ 1º Para arrecadar recursos pela internet, o partido político deve tornar disponível mecanismo em página eletrônica que permita o uso de cartão de crédito, cartão de débito, emissão on-line de boleto bancário ou, ainda, convênios de débitos em conta, observados os seguintes requisitos:

I - identificação do doador pelo nome e pelo CPF;

II - emissão de recibo para cada doação auferida, dispensada a assinatura do doador;

(…)

§ 4º A emissão de boleto on-line deverá observar os seguintes requisitos:

I - somente o doador poderá figurar como pagador do boleto, devendo constar do boleto a identificação do seu nome e número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou, quando se tratar de partido político ou candidato, no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ);

Contudo, o "demonstrativo de contribuições recebidas" é um documento unilateral produzido pela própria agremiação, não servindo como base para atestar a origem dos valores, uma vez que desprovido de fé pública.

Não se encontram presentes nos autos os recibos gerados no sistema próprio (SPCA), para que fossem firmados pelos supostos contribuintes, nem restaram identificados os doadores pelo nome e pelo CPF no extrato bancário de ID 45645934 ou no relatório de títulos bancários de ID 45645973, fornecido pela instituição financeira.

O CPF (Cadastro de Pessoas Físicas) é um documento essencial no Brasil, desempenhando um papel crucial na identificação de cada cidadão especialmente por evitar o cometimento de equívocos quanto à operações realizadas por pessoas homônimas, ou seja, que possuem o mesmo nome que outra pessoa. Cada CPF é composto por uma combinação única de 11 dígitos, garantindo que cada pessoa tenha um número exclusivo. Com base nesse dado, durante o exame técnico diversas conferências são realizadas por intermédio de cruzamento de dados com um considerável número de sistemas disponibilizados à Justiça Eleitoral de modo a conferir a regularidade da arrecadação partidária.

A decisão recorrida, com razão, concluiu que "não há, no processo, documento hábil a viabilizar o cotejamento entre os dados constantes do extrato bancário e aqueles declarados pelo partido. Isso, porque as informações concernentes a datas e valores contidos dos relatórios (...) não guardam correspondência com aquelas verificadas nos extratos eletrônicos." (ID 45645977).

A exigência legal de identificação dos doadores pelo CPF e de emissão de recibos eleitorais, por sua vez, garante a inexistência de financiamento vedado aos partidos políticos de forma simulada. Destaco, por oportuno, que o recorrente informa, com gravidade, que parcela dos recursos aferidos sem a observância das regras de contabilidade eleitoral eram provenientes de fontes vedadas, mas sequer essa alegação pode ser comprovada com segurança.

Isso porque, da documentação fornecida pela Caixa Econômica Federal, o documento "valores recebidos por boleto 2022" (ID 45645973) não possui o CPF dos alegados doadores de recursos, enquanto que o documento "relação nomes contribuintes por boleto" (ID 45645971) não possui valores ou datas. Diante da inconsistência das informações bancárias fornecidas, há inegável fragilidade na listagem elaborada pelo partido em seu "relatório boletos" (ID 45645972), o qual igualmente não aponta o CPF dos supostos contribuintes.

A ausência de dados sobre a origem da arrecadação financeira é grave e insanável, comprometendo de forma inarredável a confiabilidade das contas.

Dessa maneira, sequer há condições de realizar qualquer análise contábil e a pretendida reclassificação de receitas de origem vedada para recebimento de recursos de fontes vedadas, pois omitidas informações relevantes sobre a real origem dos recursos percebidos pela agremiação.

A responsabilidade pela irregularidade não pode ser imputada ao banco emissor ou compensador dos boletos bancários, porque o § 1º do art. 32 da Resolução TSE n. 23.604/19 prevê que "consideram-se responsáveis pelas contas prestadas, solidariamente com o órgão partidário, o seu presidente, o seu tesoureiro ou aqueles que desempenharam funções equivalentes, bem como aqueles que os tenham efetivamente substituído no exercício da prestação de contas".

Já o art. 8° da Resolução TSE n. 23.604/19 estabelece expressamente que compete aos responsáveis pelas contas o controle da movimentação bancária, devendo atentar para o recebimento de doações com identificação do CPF em qualquer modalidade de arrecadação. O § 10 do referido dispositivo é claro ao dispor que as doações financeiras recebidas em desacordo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas, até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito, ou, se não for possível identificá-lo, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 14 desta resolução:

Art. 8º As doações realizadas ao partido político podem ser feitas diretamente aos órgãos de direção nacional, estadual ou distrital, municipal e zonal, que devem remeter à Justiça Eleitoral e aos órgãos hierarquicamente superiores do partido o demonstrativo de seu recebimento e da respectiva destinação, acompanhado do balanço contábil (art. 39, § 1º, da Lei nº 9.096/95) .

§ 1º As doações em recursos financeiros devem ser, obrigatoriamente, efetuadas por cheque cruzado em nome do partido político, transferência eletrônica, depósito bancário diretamente na conta do partido político, mecanismo disponível em sítio do partido na internet que permita o uso de cartão de crédito, cartão de débito, emissão on-line de boleto bancário ou, ainda, convênios de débitos em conta e outras modalidades, desde que atenda aos requisitos previstos no art. 7º, § 1º, desta Resolução, devendo ser registradas na prestação de contas de forma concomitante à sua realização com a inclusão da respectiva documentação comprobatória.

§ 2º O depósito bancário previsto no § 1º deve ser realizado na conta "Doações para Campanha" ou na conta "Outros Recursos", conforme sua destinação, sendo admitida a efetivação por qualquer meio de transação bancária no qual o CPF do doador ou do contribuinte ou o CNPJ, no caso de partidos políticos ou candidatos, seja obrigatoriamente identificado.

(…)

§ 10. As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas, até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito, ou, se não for possível identificá-lo, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 14 desta resolução.

Portanto, a falta de emissão dos recibos eleitorais e de identificação dos doadores com o respectivo CPF no mesmo documento viola a transparência das contas, reduzindo o devido controle a ser realizado por esta Justiça Especializada da origem e da licitude das receitas da agremiação. A questão já foi enfrentada por esta Corte:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DUPLA OPOSIÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. ALEGADA EXISTÊNCIA DE OMISSÃO E CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO. PARCIAL PROVIMENTO DE AMBOS OS EMBARGOS TÃO SOMENTE PARA AGREGAR FUNDAMENTAÇÃO E ESCLARECIMENTOS AO JULGADO. (…) 1.2. O embargante invoca a tese de que o recebimento de recursos mediante boleto bancário atende aos requisitos da norma de regência, e que haveria contradição no que tange aos fundamentos legais que embasaram a necessidade de recolhimento de valores considerados de origem não identificada. Sem razão. O recebimento de doações por boleto bancário é perfeitamente viável, desde que a agremiação não se descuide em verificar se os créditos estão identificados com o CPF ou CNPJ dos doadores. Na hipótese, a falha consistiu exatamente em não ser possível constatar na transação bancária a identificação dos doadores, tal qual exige o § 2º do art. 18 da Resolução TSE n. 23.432/14. Ainda que o art. 48, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14 autorize o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional através de desconto de futuros repasses do Fundo Partidário, o § 3º do mesmo dispositivo restringe a aplicabilidade da permissão aos órgãos partidários nacionais, hipótese estranha ao caso concreto. (…) 3. Conforme disposto no art. 1.025 do Código de Processo Civil, considera-se incluídos no acórdão os elementos que os embargantes suscitaram para fins de prequestionamento.

(TRE-RS - Prestação de Contas: 6290 PORTO ALEGRE - RS, Relator: ROBERTO CARVALHO FRAGA, Data de Julgamento: 09/03/2020, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 40, Data 11/03/2020, Página 2) (Grifei.)

Dessa forma, não procede o recurso quanto a este ponto, tendo sido violado o art. 13, da Resolução TSE n. 23.604/19 quanto ao recebimento de recursos de origem não identificada no total de R$ 16.780,00, devendo o valor ser recolhido ao Tesouro Nacional na forma do art. 14 da citada resolução.

Restando mantida, igualmente, a determinação de recolhimento de contribuições de fontes vedadas no valor de R$ 165,00, que sequer foi objeto do recurso, é incabível o afastamento das sanções de multa e de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, pois são consequências legais da condenação prevista nos arts. 36, incs. I e II, e 37, caput, da Lei n. 9.096/95, regulamentados pelos arts. 46, incs. I e II, e 47, da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 46. Constatada a violação de normas legais ou estatutárias, o órgão partidário fica sujeito às seguintes sanções:

I - no caso de recebimento de recursos das fontes vedadas de que trata o art. 12, sem que tenham sido adotadas as providências de devolução à origem ou recolhimento ao Tesouro Nacional na forma do art. 14, o órgão partidário fica sujeito à suspensão da distribuição ou do repasse dos recursos provenientes do Fundo Partidário pelo período de 1 (um) ano (art. 36, inciso II, da Lei nº 9.096/95) ; e

II - no caso de não recolhimento ao Tesouro Nacional dos recursos de origem não identificada de que trata o art. 13, deve ser suspensa a distribuição ou o repasse dos recursos provenientes do Fundo Partidário até que o esclarecimento da origem do recurso seja aceito pela Justiça Eleitoral (art. 36, inciso I, da Lei nº 9.096/95) .

Art. 47. A decisão que julgar a prestação de contas não prestada acarreta ao órgão partidário:

I - a perda do direito ao recebimento da quota do Fundo Partidário, do Fundo Especial de Financiamento de Campanha; e

II - a suspensão do registro ou da anotação do órgão partidário, após decisão, com trânsito em julgado, precedida de processo regular que assegure ampla defesa (STF ADI nº 6.032, julgada em 5.12.2019).

No que se refere à alegação de desproporcionalidade da multa fixada em 10% e do prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário em um ano, tem-se que a condenação alcança o total de R$ 16.945,00 e que a multa de 10% equivale ao valor de R$ 1.694.50.

Para fundamentar o pedido de redimensionamento, foram colacionadas ao recurso ementas de dois precedentes desta Corte que envolveram irregularidades atinentes ao recebimento de contribuições de fontes vedadas de 9,6% e de 32,47% sobre a arrecadação, com readequação do prazo de suspensão do Fundo Partidário para o período de 3 meses e 4 meses, respectivamente (razões recursais, ID 45645981, p. 11).

Observo que, para o fim de fixar as penalidades, a sentença considerou a soma das irregularidades (R$ 16.945,00), equivalente ao percentual de 82,24% em relação ao valor arrecadado pelo diretório municipal do PP de Coqueiros do Sul no exercício de 2022 (R$ 20.605,00), estabelecendo sanção de 10% sobre o montante das falhas e suspensão de 01 ano de recebimento de recursos do Fundo Partidário (ID 45645977).

A Procuradoria Regional Eleitoral, quanto à multa, entendeu que a sanção foi fixada em patamar adequado, representando metade do valor máximo permitido (20%, art. 48, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19) quando comparada com o total das irregularidades que atingem elevado percentual (82,24%), raciocínio que igualmente acompanho.

A mera alegação de que o valor é exorbitante ou desproporcional não tem o condão de elidir a condenação, e o quantum afigura-se adequado, razoável e proporcional diante das falhas constatadas.

Por outro lado, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo afastamento da penalidade de suspensão do Fundo Partidário, concluindo que a sanção estaria limitada à condenação por recebimento de R$ 165,00 procedentes de fonte vedada. Citou, no parecer ofertado, julgado deste Tribunal, da relatoria do Ilustre Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, que tratou de irregularidade quanto ao recebimento de recursos de fontes vedadas com percentual de 0,51% da arrecadação (ID 45652972):

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2021. RECURSOS DE FONTE VEDADA. PESSOA FÍSICA EXERCENTE DE FUNÇÃO OU CARGO PÚBLICO. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECEITA IDENTIFICADA COM O CNPJ DE DIRETÓRIO MUNICIPAL. IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR ORIGINÁRIO. PERCENTUAL BAIXO. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO APLICADA SANÇÃO DE SUSPENSÃO DE REPASSE DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas de diretório estadual de partido político, referente ao exercício financeiro do ano de 2021, disciplinado quanto ao mérito pela Resolução TSE n. 23.604/19.

(…)

7. A existência de contas bancárias não declaradas e a inconsistência em relação às doações examinadas constituem impropriedades de natureza formal que, a teor do disposto no inc. II do art. 45 da Resolução TSE n. 23.604/19, devem determinar a aposição de ressalvas na contabilidade. A suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário é consequência específica do recebimento de recursos de fonte vedada, nos termos do art. 36, inc. II, da Lei n. 9.096/95. Considerando que a receita de fontes vedadas representa apenas 0,51% da movimentação em exame, deixa-se de aplicar a penalidade de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário.

8. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE/RS - PC-PP n. 0600205- 20, Relator Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Publicação: DJE, 08/08/2023).

De fato, relativamente ao recebimento de recursos de origem não identificada não deve ser mantida a determinação de suspensão do repasse de quotas, pois a jurisprudência do TRE-RS é firme no sentido de que a penalidade prevista no inc. II do supracitado art. 46 da Resolução TSE n. 23.604/19 "é incompatível com os institutos da preclusão e da coisa julgada, podendo ensejar longos períodos de suspensão ou uma interminável pesquisa sobre a origem do recurso, contrariando o primado constitucional da duração razoável do processo (art. 5º, inc. LXXVIII, da Constituição Federal)":

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. DESAPROVAÇÃO. NÃO CONHECIDA A DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA COM O APELO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. TRANSFERÊNCIA DE VALORES DO DIRETÓRIO NACIONAL SEM IDENTIFICAÇÃO DOS DOADORES ORIGINÁRIOS. AFASTADA A SUSPENSÃO DO REPASSE DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. SUBSTITUIÇÃO DA PENALIDADE PELA TRANSFERÊNCIA DOS RESPECTIVOS RECURSOS AO TESOURO NACIONAL. MULTA. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de diretório municipal de partido político, relativas ao exercício financeiro de 2020, determinando o recolhimento da quantia irregular, acrescida de multa, e a suspensão do recebimento de recursos do Fundo Partidário. Não conhecida a documentação apresentada com o recurso, pois necessária nova análise técnica.

2. Recebimento de recursos de origem não identificada. Repasses de valores do diretório nacional ao diretório municipal da agremiação sem a devida identificação dos doadores originários, hipótese prevista no art. 13, inc. I, al. "a", da Resolução TSE n. 23.604/19. Mantida a determinação de recolhimento do montante irregular ao Tesouro Nacional, conforme o art. 58, § 2º, da mesma resolução.

3. Afastada a suspensão de recebimento de recursos do Fundo Partidário. Tal penalidade, "até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral" (art. 46, inc. II, da Resolução TSE n. 23.604/19), é incompatível com os institutos da preclusão e da coisa julgada, podendo ensejar longos períodos de suspensão ou uma interminável pesquisa sobre a origem do recurso, contrariando o primado constitucional da duração razoável do processo (art. 5º, inc. LXXVIII, da Constituição Federal). O regramento aplica-se somente durante a instrução do feito, não se admitindo esclarecimentos após prolatada a sentença. Eventual ordem de suspensão do Fundo Partidário até o recolhimento do valor ao Tesouro Nacional representaria penalidade desarrazoada, que não encontra respaldo legal e jurisprudencial. Conforme entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, impõe-se a substituição da penalidade pela transferência dos respectivos recursos ao Tesouro Nacional, os quais devem ser acrescidos de multa de até 20%, com amparo no disposto no art. 37, caput, da Lei n. 9.096/95, c/c o art. 48, caput , da Resolução TSE n. 23.604/19.

4. Provimento parcial. Afastada a imposição de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário, mantidos os demais termos da sentença.

(TRE-RS, REl PC 0600065-63.2021.6.21.0115, Rel. Nilton Tavares Da Silva, DJe 21.6.2024)

Remanesce, portanto, o sancionamento à suspensão de recebimento de repasse de quotas do Fundo Partidário somente devido ao recebimento de recursos de fontes vedadas na quantia de R$ 165,00, a qual representa o reduzido percentual equivalente a apenas 0,8% dos recursos recebidos pela agremiação no exercício financeiro (R$ 20.605,00), podendo ser afastada a condenação em atendimento ao princípio da proporcionalidade, em sua vertente proporcionalidade em sentido estrito, na forma requerida nas razões recursais.

Assim, o recurso comporta parcial provimento, e a sentença deve ser reformada unicamente para afastar a penalidade de suspensão de recebimento de repasses de quotas do Fundo Partidário.

CONCLUSÕES

Ante o exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso, para manter a sentença de desaprovação das contas apresentadas pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PROGRESSISTAS (PP) de COQUEIROS DO SUL/RS relativas ao exercício financeiro de 2022, bem como as determinações de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor total de R$ 16.945,00, com juros e correção monetária, acrescidos de multa de 10% sobre as irregularidades, e excluir a sanção imposta de suspensão de recebimento de repasses de quota do Fundo Partidário pelo prazo de 1 (um) ano, nos termos da fundamentação.