REl - 0600074-05.2024.6.21.0023 - Acompanho a divergência - Sessão: 16/09/2024 às 14:00

Ouvi atentamente o voto do eminente Relator e a divergência inaugurada pelo Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira e, em face do empate, cabe à Presidência o desempate.

Inicialmente, consigno que em relação à correspondência enviada pelos correios, no sentido de que se afigura “como uma comunicação intrapartidária objetivando ao anúncio e ao chamamento interno em prol do projeto político da sigla, a qual não viola o art. 36 da Lei n. 9.504/97, quando ausentes provas conclusivas de que tenha ultrapassado o âmbito dos filiados”, não há controvérsia, sendo o julgamento unânime.

O dissenso está na caracterização do material denominado “Bira News”, contendo a expressão “Vem com Bira” como propaganda antecipada, porque carregaria “a mesma carga semântica do pedido explícito de voto, o que não é permitido pela norma de regência antes do início da campanha eleitoral.”

De um lado, o relator votou no sentido de considerar que “a difusão de material impresso destacando o apelido e nome de urna do pré-candidato, acompanhado da expressão “vem com”, dentre outros elementos gráficos com apelo publicitário, evidencia propaganda eleitoral antecipada em razão de “palavras mágicas” equivalentes ao pedido explícito de voto.”

De outro, a divergência votou no sentido de que, “apesar de reconhecer que a expressão “vem com” efetivamente tem a intenção de convidar o cidadão a estar com ele no mandato, o que só pode ser feito mediante depósito de voto na urna, é conduta permitida pela atual legislação eleitoral, não sancionável com multa.”

Com efeito, a compreensão do histórico do regime jurídico da propaganda eleitoral traz elementos importantes à solução da controvérsia entre os seguintes dispositivos legais:

Art. 36. A propaganda eleitoral somente é permitida após o dia 15 de agosto do ano da eleição.

(...)

§ 3o A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado o seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), ou ao equivalente ao custo da propaganda, se este for maior.

(...)

Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet:

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, discussão de políticas públicas, planos de governo ou alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária;

III - a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos;

IV - a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos;

V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais;

 VI - a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias.

 VII - campanha de arrecadação prévia de recursos na modalidade prevista no inciso IV do § 4o do art. 23 desta Lei.

(...)

 § 2o Nas hipóteses dos incisos I a VI do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver.

 § 3o O disposto no § 2o não se aplica aos profissionais de comunicação social no exercício da profissão.

(grifo nosso)

 

Ao mesmo tempo, o art. 3º-A da Resolução TSE n. 23.610/19.

Art. 3º-A. Considera-se propaganda antecipada passível de multa aquela divulgada extemporaneamente cuja mensagem contenha pedido explícito de voto, ou que veicule conteúdo eleitoral em local vedado ou por meio, forma ou instrumento proscrito no período de campanha. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)

Parágrafo único. O pedido explícito de voto não se limita ao uso da locução “vote em”, podendo ser inferido de termos e expressões que transmitam o mesmo conteúdo. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024) (grifo nosso)

 

 

O conceito de propaganda eleitoral antecipada, sujeita à multa, até o advento da Lei 13.165/15, na jurisprudência do TSE, era dado pelo célebre julgado do Min. Eduardo Alckmin:

[...] Entende-se como ato de propaganda eleitoral aquele que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que apenas postulada, a ação política que se pretende desenvolver ou razões que induzam a concluir que o beneficiário é o mais apto ao exercício de função pública. Sem tais características, poderá haver mera promoção pessoal, apta, em determinadas circunstâncias a configurar abuso de poder econômico, mas não propaganda eleitoral.

[...].

 

(Ac. de 17.2.2000 no REspe nº 16183, rel. Min. Eduardo Alckmin)

 

Entretanto, para as Eleições de 2016, a pré-campanha foi consideravelmente ampliada, pois a Lei n. 13.165/15 disciplinou NÃO SER propaganda eleitoral a menção à pretensa candidatura e a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e as condutas previstas nos incs. I a VI do art. 36-A da Lei 9.504/97. Ainda, permitiu expressamente o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver.

Então, pergunta-se: A lei teve o condão de alterar o conceito de propaganda eleitoral por consignar NÃO SER propaganda eleitoral o que outrora era?

A resposta ao questionamento é negativa e revela unicamente que o legislador optou por excluir o sancionamento das condutas que em dado momento eram sancionáveis.

Dessa forma, concluo nos mesmos termos do voto divergente, no seguinte sentido:

Assim, compreendo que, nos moldes do que foi permitido no art. 36-A da Lei 9.504/97, com a Lei 13.165/15 – a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos, as condutas dos incisos I a VI e ainda a expressa permissão do pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver – todos esses atos de pré-campanha são na verdade propaganda eleitoral antecipada, porém, o legislador optou por excluir o sancionamento. Nas palavras do Min. Edson Fachin, o que houve foi a alteração do modal deôntico de proibido ou permitido, ou seja, aquilo que outrora o TSE concebeu como propaganda subliminar e vedada, o legislador estabeleceu que é permitido, embora seja efetivamente uma propaganda eleitoral subliminar. Não houve modificação do conceito do que é ou não propaganda, mas sim houve a permissão legislativa para o pré-candidato realizar os atos até então proibidos, com exceção do pedido explícito de voto.

 

 

Na espécie, portanto, o informativo "Bira News", em que o recorrido faz menção à história do Parque da Pedreira, destacando que tudo começou em 2008, quando era vice-prefeito e em 2010 assumiu a coordenação do projeto e relatando o que foi feito e o que há por fazer, são condutas permitidas e a expressão "Vem com Bira" não é pedido explícito de voto.

E, em situações limítrofes, no conflito entre a liberdade de expressão daqueles que pretendam disputar mandato eletivo e a igualdade de chances entre os pré-candidatos, tenho que a opção preferencial deve ser o da liberdade de manifestação, por ser um dos pilares fundamentais de um Estado Democrático de Direito, no qual deve prevalecer o livre trânsito de ideias, projetos, propostas, nos termos do louvável voto do Min. Jorge Mussi, exarado no REspe n. 0600227-31.2018.6.17.0000, mencionado no voto divergente apresentado pelo Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira.

Ante o exposto, com a mais respeitosa vênia do entendimento exarado no voto do eminente Relator e dos que o acompanharam, VOTO no sentido de negar provimento ao recurso, mantendo íntegra a sentença que julgou improcedente a representação.