REl - 0600066-28.2024.6.21.0023 - Divirjo do(a) relator(a) - Sessão: 16/09/2024 às 14:00

VOTO-VISTA

Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira

Pedi vista dos autos para melhor examinar a matéria que trata da caracterização ou não de propaganda extemporânea.

E, com a mais respeitosa vênia do entendimento esposado pelo nobre Relator, apresento divergência, conforme os argumentos adiante alinhados.

A Lei das Eleições, de acordo com a redação dada pela Lei n. 13.165, de 2015, assim disciplina:

Art. 36. A propaganda eleitoral somente é permitida após o dia 15 de agosto do ano da eleição.

(...)

§ 3o A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado o seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), ou ao equivalente ao custo da propaganda, se este for maior.

(...)

Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet:

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, discussão de políticas públicas, planos de governo ou alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária;

III - a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos;

IV - a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos;

V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais;

VI - a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias.

VII - campanha de arrecadação prévia de recursos na modalidade prevista no inciso IV do § 4o do art. 23 desta Lei.

(...)

§ 2o Nas hipóteses dos incisos I a VI do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver.

§ 3o O disposto no § 2o não se aplica aos profissionais de comunicação social no exercício da profissão.

(Grifo nosso)

 

Ao mesmo tempo, estabelece o art. 3º-A da Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 3º-A. Considera-se propaganda antecipada passível de multa aquela divulgada extemporaneamente cuja mensagem contenha pedido explícito de voto, ou que veicule conteúdo eleitoral em local vedado ou por meio, forma ou instrumento proscrito no período de campanha. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)

Parágrafo único. O pedido explícito de voto não se limita ao uso da locução "vote em", podendo ser inferido de termos e expressões que transmitam o mesmo conteúdo. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

(Grifo nosso)

 

Na espécie, a publicidade em questão tem o seguinte teor:

Transcrição de vídeo postado no Instagram e Facebook:

- Tomamos uma decisão, uma decisão importante né, de colocar nosso nome à disposição do partido como pré-candidato a Vereador... Provavelmente você já me conhece: eu sou o Bira. De 2009 a 2016 fui Vice-Prefeito do Balim, ou as pessoas me conhecem por ser advogado, de uma atuação profissional intensa nos últimos 24 anos, ou ainda tem aqueles que me conhecem lá do tempo da pastoral da juventude, do Bairro Glória, do Tancredo Neves, quando a gente construía ainda nossos primeiros passos, as nossas primeiras caminhadas. [Legenda de vídeo: Muito fizemos...] - E no Parque da Pedreira, aqui era um verdadeiro lixão quando nós encontramos esse local, nós idealizamos e realizamos esse projeto que hoje é uma grande realidade.

Mas além daqui, da Pedreira, você sabe pela minha luta pela habitação, pra tirar pessoas de situações difíceis né, de moradias desumanas, subhumanas né, onde nós trouxemos mais de 2000 unidades habitacionais pra Ijuí. Era um tempo de muita força, de muito trabalho e de muita esperança. Entregar a chave de um apartamento ou de uma casa na mão de uma família era a coisa mais significativa, porque ali poderia estar o início da mudança de vida daquela pessoa. Então nós trabalhamos muito, fizemos bastante por toda nossa comunidade, trouxemos recursos na área de infraestrutura; só pra citar o exemplo da perimetral norte, a principal obra viária da região norte da cidade, que mudou a realidade de toda aquela região. E assim obras espalhadas por toda a nossa cidade. O Bira não cansa nunca. Faz 8 anos que eu não tenho nenhum tipo de mandato, mas mesmo assim eu continuo trabalhando intensamente pela nossa comunidade. Sempre foi assim, o Bira inquieto, o Bira impaciente, né, buscando recurso pra Ijuí. Nos últimos anos, mesmo não tendo o tal do cargo público, eu trouxe muito recurso pra Ijuí, usando toda a força política que nós construímos ao longo dos anos. Somente com o Deputado Marcon, recentemente liberamos dois milhões de reais pro HCI, pra fazer o centro obstétrico pra tratar das nossas gestantes de alto risco, um dinheiro muito importante que está sendo e será aplicado ali no HCI. Trouxemos recursos para o Bom Pastor, recursos para diferentes obras de infraestrutura espalhadas por toda a cidade e também dos postos de saúde, com a Deputada Reginete Bispo. A nossa relação importantíssima com o Ministro Pimenta tem auxiliado muito o Estado do Rio Grande do Sul e que sempre nos deu uma porta aberta em Brasília pra ajudar a trazer recursos pra cá. [Legenda do vídeo: E quero fazer muito mais!] - Pessoal, eu tô colocando meu nome à disposição da sociedade de Ijuí como pré-candidato a vereador. GOSTARIA MUITO DE PODER CONTAR COM TEU APOIO, SE VOCÊ ACREDITA QUE ESSE TRABALHO QUE REALIZAMOS E TUDO AQUILO QUE AINDA PODEMOS REALIZAR É IMPORTANTE PRA NOSSA CIDADE.

 

Entrevista concedida à Rádio Repórter de Ijuí:

[Bira, 2:09:22] [...] Eu quero dizer que eu tô colocando meu nome à disposição pra ser candidato à vereador, pra fazer a relação com o governo federal, nós precisamos ter uma relação com o governo federal, importante, né. Nós já temos trazido muitos recursos pra Ijuí. Recentemente trouxemos 2 milhões pro HCI de uma emenda do Marcom pra questão das gestantes, né? Nós articulamos junto com o vereador Beto a questão dos 10 milhões que já está liberado lá pro HCI pra comprar o equipamento, certo? Nós já trouxemos dinheiro pro Bom Pastor, trouxemos dinheiro pra Apae, trouxemos dinheiro pra fazendo obras em diferentes pontos da comunidade. Ou seja, eu não sou vereador e a gente já tem feito bastante, mas eu quero continuar fazendo essa relação política com o governo federal. Tem aí o nosso deputado Marcom. Fizemos uma reunião importante com os Correios no sábado, que eles têm uma relação forte com pimenta, e debatemos questões dos Correios importantes. Ou seja, Zalmir, eu sou pré-candidato a vereador, e o que eu quero nesse momento, pra quem tá me ouvindo, pra quem tá me ouvindo, o senhor e a senhora que me conhece. O senhor, ah, eu conheço o Bira. Ah, eu conheço o Bira porque foi viceprefeito. Ah, eu conheço o Bira porque ele foi vereador. Conheço o Bira porque ele é advogado. Ah, eu conheço o Bira porque ele morava ali no Glória, morava lá no Tancredo. Eu conheço o Bira de tantos outros lugares, ou da universidade, enfim. Eu conheço o Bira. Então, as pessoas que me conhecem, que sabem quem eu sou, sabem da minha luta, sabem que eu não sou uma pessoa de me entregar, o que eu quero pedir pra vocês agora, eu quero pedir o apoio de vocês. Eu quero pedir o apoio de vocês, né? Porque nós temos que escolher bons pré-candidatos. Nós temos que escolher bons pré-candidatos. Então, se o senhor e a senhora acreditam que eu fiz um bom trabalho, que eu faço um bom trabalho, que eu sou uma boa pessoa, eu gostaria de contar com o seu apoio pra minha pré-candidatura. O senhor pode entrar em contato comigo, a senhora pode entrar em contato comigo. Podemos sentar, discutir ideias, debater projetos, porque isso é o meu papel agora. O meu papel é conversar com a comunidade, né, pra pedir apoio e, ali na frente, se eu for aprovado na convenção do partido, ser candidato e sendo candidato querendo estar lá na Câmara dos Vereadores.

[Pergunta do entrevistador:] Muito bem. Pra concluir, Bira, na majoritária, como é que você vê essa discussão hoje? Como você disse, você foi viceprefeito por oito anos, você é do PT, e o PDT era o ex-prefeito Balim. Hoje, ainda não confirmados, até porque não saiu das convenções ainda, mas tem précandidatos. Beto Noronha, pré-candidato do Partido dos Trabalhadores, o PDT ainda não tem uma definição, tem dois pré-candidatos, Bombeiro Cossetim, Delmar Livinski, enfim. Como é que você vê essa articulação e possibilidade de coligar hoje PT e PDT ainda nas eleições deste ano?

[Bira] Nós estamos com a expectativa boa, né? Uma que nós temos candidato já desde novembro, que é o Beto. O Beto Noronha é o nosso candidato. Pré-candidato, né? Nosso pré-candidato a prefeito, já definido lá no mês de novembro, foi definido por consenso dentro do partido. Ele tem articulado desde lá pra cá a sua pré-candidatura, e agora nós estamos na expectativa da formação de alianças. A gente percebe aí que o PDT tem uma situação difícil, historicamente falando, uma situação momentaneamente difícil. A gente não sabe muito bem como que está o debate lá interno, mas nós temos uma expectativa muito grande de que o PDT possa estar conosco nesta eleição, porque nós precisamos juntar forças pra que nós possamos apresentar um projeto alternativo pra Ijuí a partir desta eleição. A gente tem que apresentar uma alternativa. Eu acredito que a expectativa é muito boa pra que o PDT venha conosco, né? Venha conosco. Agora, claro que isso é uma decisão que cabe ao PDT. Eles têm uma pré-convenção no sábado, tem duas précandidaturas colocadas. Não sabemos se surgirá uma terceira ou não, mas o fato é que nós estamos ansiosos, esperando a confirmação do PDT, caso possível, sendo nosso vice. E se não for possível, nós vamos concorrer e o Beto está já em pré-campanha pra consolidar o seu nome. [Entrevistador:] Obrigado, advogado Bira Teixeira, aqui conosco. Précandidato, então, ao Legislativo Municipal, pelo Partido dos Trabalhadores. Um abraço, um bom dia. Bira, estamos sempre à disposição. [Bira] Obrigado, um bom dia a todos e, mais uma vez, peço o apoio daqueles que quiserem me apoiar.

 

As expressões consideradas como "palavras mágicas" referem-se ao pedido de apoio - "conto com seu apoio", "peço o apoio" -, que seriam suficientes a inferir o pedido explícito de voto.

Antes de adentrar no caso concreto, peço vênia para colacionar breve histórico sobre o regime jurídico da propaganda eleitoral, e o faço com a transcrição de trecho do voto do Min. Edson Fachin, proferido no REspe n. 0600227-31.2018.6.17.0000 (DJE -Diário de justiça eletrônico, Número123, Data 01.07.2019, Página214).

A interpretação do art. 36-A da Lei nº 9.504/97 exige uma compreensão do regime jurídico da propaganda eleitoral sem as alterações promovidas pela Lei nº 12.034/2009, especialmente no período anterior à campanha.

Nas eleições anteriores a 2010, havia total proibição de propaganda eleitoral antes do dia 5 de julho (posteriormente modificado para o dia 15 de agosto), de modo que nenhuma referência à pretensão a um cargo eletivo poderia ser manifestada, à exceção da propaganda intrapartidária, com vistas à escolha em convenção.

A jurisprudência do TSE alcançava, também, a divulgação de fatos que levassem o eleitor a não votar em determinada pessoa, provável candidato, caracterizando-se o ato como propaganda eleitoral antecipada, negativa. Da mesma forma, era coibida a mensagem propagandística subliminar ou implícita que veiculasse eventual pré-candidatura, como a referência de que determinada pessoa fosse a mais bem preparada para o exercício de mandato eletivo.

A partir das eleições de 2010, porém, criou-se a figura do pré-candidato, sendo lícita a sua participação em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, desde que não houvesse pedido de votos, exigindo-se das emissoras de rádio e de televisão apenas o dever de conferir tratamento isonômico.

Nas eleições de 2014, a Lei nº 12.891/2013 ampliou a possibilidade do debate político-eleitoral, permitindo a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar de planos de governo ou alianças partidárias visando às eleições. Além disso, tornou lícita a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, retirou a proibição de menção a possível candidatura, vedando apenas o pedido de votos.

Nas eleições de 2016, a pré-campanha foi consideravelmente ampliada, pois a Lei nº 13.165 /2015 permitiu a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos, além de diversos atos que podem ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet, com a única restrição de não haver pedido explícito de voto. Ou seja, à exceção dessa proibição, não há, atualmente, uma diferença substancial para os atos de propaganda antes e depois do chamado "período eleitoral" que se inicia com as convenções dos partidos políticos.

Essa mudança legislativa gerou muito debate na doutrina, relativamente ao seu alcance e limites, projetando-se sobre a compreensão interpretativa conferida pela jurisprudência.

Aliás, minha posição inicial, manifestada no julgamento do AgR-AI nº 9-24/SP, se orientava pela imposição de limites mais estreitos, de modo que o contexto em que são veiculadas as mensagens da propaganda seria relevante para caracterizar o pedido explícito de voto que não estaria circunscrito às expressões clássicas, tangenciando o "vote em mim". Naquele julgado, porém, o TSE decidiu, em sentido contrário e por maioria apertada, que o pedido explícito de votos somente restaria caracterizado quando houvesse o emprego, na expressão do Ministro relator Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, tomada de empréstimo de Aline Osório (Direito eleitoral e liberdade de expressão. Belo Horizonte: Fórum, 2017) de "palavras mágicas" como "vote em", "vote contra", "eleja" etc., restando descartada a utilização do "contexto conceitual explícito", como pretendia o Ministro Admar Gonzaga.

A principal razão do dissenso doutrinário e jurisprudencial tem origem no efeito derrogatório operado pela Lei nº 13.165/2015 sobre a consolidada jurisprudência que se formou no passado que vedava a propaganda extemporânea subliminar, aliado à própria falta de tecnicismo do art. 36-A.

Com efeito, apesar de a lei permitir a realização de propaganda antes do período eleitoral, com a vedação apenas do pedido explícito de voto, o caput do artigo inicia sua dicção com a cláusula de que esses atos típicos de campanha "não configuram propaganda eleitoral antecipada".

Revela-se, aqui, de forma evidente, que a destacada expressão tem apenas a pretensão de afastar a ilicitude reconhecida no passado que sancionava a "propaganda eleitoral antecipada". Antes da modificação legislativa, era comum a identificação do ilícito de "propaganda eleitoral antecipada", havendo grande debate sobre sua caracterização, nas hipóteses de "propaganda negativa". Havia, portanto, uma compreensão de que todo ato de divulgação de candidatura, anterior ao período crítico, era ilícito, daí a manifesta intenção do legislador em deixar evidente sua ampla permissão, a partir da reforma eleitoral de 2015.

O art. 36-A, portanto, não objetiva modificar o conceito de "propaganda", já amplamente aceito pelo TSE, como o ato que "leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que apenas postulada, a ação política que se pretende desenvolver ou razões que induzam a concluir que o beneficiário é o mais apto ao exercício de função pública" (Recurso Especial Eleitoral nº 161-83, Relator Ministro Eduardo Alckmin, DJ de 31.3.2000, p. 126).

Sua intenção é alterar o modal deôntico de proibido para permitido, por meio do afastamento da ilicitude verificada anteriormente.

Assim, aquele que, a título de exemplo, no período de pré-campanha, exalta suas qualidades pessoais, sem pedido explícito de voto, está realizando atos de propaganda eleitoral. No entanto, por força do novo art. 36-A da Lei das Eleições, não está mais sujeito a qualquer tipo de sanção, haja vista a superveniência do permissivo legal. Ainda que se possa admitir tratar-se de ato "pré-eleitoral", não há como negar que seja um ato típico de propaganda.

Portanto, na quadra atual, há ampla permissão à realização de atos de propaganda, com indicação da intenção de concorrer a algum cargo eletivo e exaltação das qualidades do respectivo candidato. É patente que o legislador não teve a intenção de mudar o conceito de propaganda, por meio de uma ficção jurídica, negando este caráter àquele que, prematuramente, indica sua intenção de disputar um cargo eletivo. O objetivo foi apenas retirar a sanção que alcançava aqueles que levavam ao conhecimento geral a intenção de concorrer.

Em resumo, os atos de pré-campanha constituem propaganda eleitoral antecipada, agora, porém, sem sancionamento, desde que não sejam acompanhados de pedido explícito de votos.

Porém, a ampliação do período de discussão das alternativas para o eleitor não esgota os problemas de ordem jurídica, pois o Direito Eleitoral é informado por outros princípios e limites que também devem ser observados no período de pré-campanha. Aliás, como tenho afirmado, a inexistência de limites importa na supressão da própria liberdade e na consagração do abuso.

(Grifo nosso)

 

Dessa forma, tenho que, nos moldes do que foi permitido no art. 36-A da Lei n. 9.504/97, com a Lei 13.165/15 - a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos, as condutas dos incisos I a VI e, ainda, a expressa permissão do pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver - todos esses atos de pré-campanha são na verdade propaganda eleitoral antecipada, porém, o legislador optou por excluir o sancionamento. Nas palavras do Min. Edson Fachin, o que houve foi a alteração do modal deôntico de proibido ou permitido, ou seja, aquilo que outrora o TSE concebeu como propaganda subliminar e vedada, o legislador estabeleceu que é permitido, embora seja efetivamente uma propaganda eleitoral subliminar. Não houve modificação do conceito do que é ou não propaganda, mas sim houve a permissão legislativa para o pré-candidato realizar os atos até então proibidos, com exceção do pedido explícito de voto.

E, como bem apontado na sentença que julgou improcedente a representação proposta pelo PARTIDO PROGRESSISTAS DE IJUÍ, a conduta enquadra-se no permissivo contido no § 2º do art. 36-A da Lei n. 9.504/97, que EXPRESSAMENTE admite o "pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver".

A propósito, no julgado utilizado como paradigma para considerar caracterizada a propaganda (TSE - Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral n. 060006381, Acórdão, Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 01.9.2021), o Min. Carlos Horbach proferiu voto divergente (vencido, bem verdade), nos seguintes termos:

Com efeito, após a reforma eleitoral de 2015, realizada por meio da Lei nº 13.165, houve uma expansão considerável das balizas dentro das quais é lícito aos cidadãos, na qualidade de pré-candidatos, expressar suas aspirações políticas, inserindo-se de modo mais amplo no debate público de ideias.

A atual redação do art. 36-A da Lei das Eleições, de modo expresso, assevera que "não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos", bem como uma série de atos que são - de modo exemplificativo - mencionados nos incisos de seu caput, sendo relevante para o deslinde da controvérsia dos autos o disposto no inciso V, que se refere à "divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais".

O preceito constante do caput é complementado pelo § 2º do dispositivo em questão, que tem a seguinte redação:

§ 2o Nas hipóteses dos incisos I a VI do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da précandidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver.

Do padrão normativo acima explicitado, exsurge uma linha clara de compreensão do que se revela lícito no contexto da chamada pré-campanha: o cidadão pode expressar nas redes sociais sua pretensa candidatura, pode explicitar as qualidades que o habilitam para o exercício do cargo futuro, pode enfatizar sua experiência prévia na política, pode fazer promessas políticas e - mais importante para o exame da presente demanda - pode ainda pedir apoio político.

Tais possibilidades de ação se revelam na conduta imputada aos recorrentes, que divulgaram em suas redes sociais - Facebook e Instagram - vídeo com conteúdo assim sintetizado pelo aresto do Tribunal a quo, in verbis:

Sabe-se que a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral admite a divulgação de pré-candidatura, contendo número e sigla dos partidos políticos por meio dos quais os pré-candidatos pretendem concorrer ao pleito.

No entanto, os recorrentes, durante o vídeo, ao informar sua pré-candidata, mencionam frases como "conto com o seu apoio, e conte comigo", "conto com seu apoio, quero lutar por uma Dom Cavati ainda melhor e acredito nessa possibilidade, muito obrigado", "contando com o apoio de todos vocês", "quero pedir o apoio de todos vocês", "estou pleiteando mais uma vez uma vaga a vereador, e creio que com o apoio de todos vocês e de seus familiares, conseguirei atingir esse objetivo", "conto com seu apoio nessa próxima eleição", "conto com o apoio de todos vocês para darmos sequência aos nossos projetos sociais e de crescimento para Dom Cavati."

[...]

Diversamente do que sustentam os recorrentes, não se pode extrair que o vídeo apresentado contenha apenas menção à pré-candidatura, com manifestação espontânea de apoio ao pré-candidato a Prefeito, sem qualquer pedido explícito de voto, mas, como sustentou a sentença a quo, "as propagandas apresentadas com a inicial contêm não apenas a menção à pré-candidatura, como autoriza a lei, mas uma verdadeira campanha, com os representados se identificando como pré-candidatos." (sem destaque no original)

Do que se tem no acórdão recorrido, observa-se (i) menção à pretensa candidatura - "estou pleiteando mais uma vez a vaga de vereador" -, (ii) divulgação das ações políticas desenvolvidas - "darmos sequência aos nossos projetos sociais e de crescimento para Dom Cavati" -, (iii) enunciação das ações políticas que pretende desenvolver - "lutar por uma Dom Cavati ainda melhor" - e (iv) pedido de apoio político - "conto com seu apoio", "creio que com o apoio de todos vocês", "conto com o apoio de todos vocês".

Destarte, nada do discurso em questão, tal como divulgado nas redes sociais, discrepa da moldura normativa dentro da qual é lícita a pré-campanha, sem caracterização de propaganda eleitoral antecipada e sem que se tenha possibilidade de aplicação da multa prevista no § 3º do art. 36 da Lei nº 9.504/97.

Não se pode enxergar na mensagem veiculada no vídeo postado pelos agravantes no Facebook e no Instagram, ao contrário do asseverado pela Corte de origem e pelo eminente Relator em seu voto, a utilização das chamadas "palavras mágicas", configuradoras do pedido explícito de voto vedado pelo art. 36-A da Lei das Eleições. Até mesmo porque o vocábulo mais utilizado no mencionado vídeo, qual seja, a palavra "apoio", consta expressamente dos comandos permissivos do § 2º acima transcrito, o qual autoriza, antes do período oficial de campanha, o "pedido de apoio político". Concluir, no caso dos autos, pela ocorrência de propaganda eleitoral antecipada seria negar vigência aos expressos termos do art. 36-A e desprezar a teleologia da reforma realizada em 2015, voltada à ampliação do debate político na fase de pré-campanha, diminuindo assim o impacto da considerável redução do período de campanha, operada pela alteração introduzida no caput do art. 36 da Lei das Eleições pela referida Lei nº 13.165/2015.

 

Registro que, a partir de consulta sobre o tema da propaganda antecipada na jurisprudência do TSE, é possível verificar inúmeros julgados que não consideram propaganda antecipada diversas expressões, como ementa que abaixo colaciono, referente ao seguinte trecho de publicidade: "O povo disse e pediu que de novo quer ele lá, agora como prefeito e o seu melhor lugar. Tinha muita gente boa, como manda o gibi, só um podia escolher e esse apresenta aqui: Adriano Sarmento Barbosa, sua vitória é logo ali.":

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSOS ESPECIAIS. PROVIMENTO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. ART. 36-A DA LEI Nº 9.504/97. PEDIDO EXPLÍCITO DE VOTOS. INOCORRÊNCIA. CONDUTA AMPARADA PELA REFERIDA NORMA LEGAL. MANUTENÇÃO DOS FUNDAMENTOS. DESPROVIMENTO. 1. O conjunto fático-probatório que exsurge do aresto recorrido permite concluir pela inexistência de propaganda antecipada. 2. Consideradas as balizas normativas identificadas a partir da exegese do art. 36-A da Lei nº 9.504/97, é possível afirmar que é lícita - e, portanto, não caracteriza propaganda eleitoral antecipada - a realização de postagem em rede social que anuncie uma pré-candidatura, exalte as qualidades pessoais de pré-candidato e externe pedido de apoio político, tudo de acordo com a literal dicção do texto legal. 3. Os argumentos recursais não são suficientes para afastar a conclusão da decisão agravada, devendo esta ser mantida. 4. Agravo regimental desprovido.

(TSE - REspEl: 06001735620206150063 SÃO FRANCISCO - PB 060017356, Relator: Min. Carlos Horbach, Data de Julgamento: 26,08,2021, Data de Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 169)

 

Não há dúvida de que a intenção de todo pré-candidato, ao falar que "conto com seu apoio", é para adesão na campanha futura, o que será feito mediante voto. Mas a questão é que essa conduta está expressamente permitida, o que é vedado é o pedido explícito de voto e algumas expressões equivalentes, que inexistem no caso concreto.

Acrescento, por fim, que há uma particularidade nestes autos no sentido de que a publicidade foi transmitida em rede social de emissora de rádio, circunstância que põe em dúvida inclusive o cabimento da representação em análise.

Desse modo, reiterando o pedido de vênia, tenho por negar provimento ao recurso, mantendo íntegra a sentença que julgou improcedente a representação.