REl - 0600090-30.2024.6.21.0064 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/09/2024 às 14:00

VOTO

A sentença indeferiu o pedido de reconhecimento da filiação do recorrente, com base nos seguintes argumentos:

(...)

Fixadas essas premissas, imperioso destacar de início que, conforme muito bem ressaltado pelo Ministério Público Eleitoral, a responsabilidade pela inclusão dos filiados nos sistemas eletrônicos da Justiça Eleitoral, inclusive para fins de observância do prazo do artigo 9º da Lei 9.504/97, é do partido político e dos pretensos candidatos que almejam concorrer a mandatos eletivos nos pleitos eleitorais.

No caso em apreço, além da omissão do partido político, houve a omissão do próprio requerente que somente procurou se informar e adotar providências quanto a sua filiação partidária no período de convenções partidárias, ou seja, muito após o prazo legal mínimo estabelecido pelo artigo 9º da Lei das Eleições.

Assim, mostra-se incabível a pretensão de inclusão do nome do requerente na lista de filiados do REPUBLICANOS, com data retroativa a 19/03/2024.

No que tange ao reconhecimento do prazo mínimo de filiação partidária, para fins de deferimento de eventual requerimento de registro de candidatura a ser apresentado por Gelson, destaco não ser esse o momento oportuno para realizar tal análise, a qual deverá ocorrer somente em eventual processo de registro de candidatura a ser distribuído a este juízo eleitoral.

Destaco que a Súmula nº 20 do TSE permite que a prova de filiação partidária daquele que não constou na relação de filiados do partido político seja realizada por outros elementos de convicção, desde que estes não sejam produzidos unilateralmente e destituídos de fé pública.

No caso em apreço, visando comprovar a alegada filiação anterior, o requerente juntou aos autos a lista de presença na convenção de fundação do partido de ID 122503061 (documento que foi repetido ao ID 122503118), a ficha de filiação partidária de ID 122503117 e as fotografias de ID 122503116, todos documentos produzidos unilateralmente pela agremiação partidária, com a participação de pessoas que, conforme é de conhecimento deste juízo eleitoral, são filiadas a outras agremiações partidárias, a exemplo da Sra. Márcia Beatriz Vedana, atual vice-prefeita de Rodeio Bonito/RS e Presidente do Diretório Municipal do União Brasil deste município, o que evidencia que tal reunião era aberta inclusive para não filiados ao REPUBLICANOS.

No que tange aos documentos de IDs 122503112 e 122503114, extraídos do sistema SGIP, que informam que o requerente Gelson Antonio Possamai ocupa o cargo de Segundo Tesoureiro do REPUBLICANOS de Rodeio Bonito, com mandato de 19/03/2024 a 31/12/2025, o mérito quanto a sua aceitação para fins da Súmula nº 20 do TSE deverá ocorrer apenas em eventual requerimento de registro de candidatura a ser apresentado, restando destacar, contudo, que sua validação pelo Diretório Estadual nos sistemas eletrônicos da Justiça Eleitoral ocorreu somente em 11/04/2024, ou seja, após o prazo elencado no artigo 9º da Lei 9.504/97.

Diante do exposto, INDEFIRO o requerimento apresentado pelo requerente GELSON ANTÔNIO POSSAMAI, pelos motivos acima elencados.

(...)

 

Como se vê, o magistrado consignou que o pedido foi apresentado intempestivamente, que a discussão sobre a existência da filiação deve ocorrer no pedido de registro de candidatura, e destaco, quanto aos documentos apresentados, que a certidão extraída do Sistema de Gerenciamento de Informações Partidárias (SGIP), apontando o recorrente como integrante da comissão executiva do Republicanos de Rodeio Bonito, foi validada pelo Justiça Eleitoral após o prazo limite para a filiação partidária quanto ao pleito de 2024.

A Procuradoria Regional Eleitoral, por sua vez, apontou nulidade do feito por ofensa ao devido processo legal, uma vez que não houve intimação do Republicanos para manifestação, conforme prevê o art. 11 da Resolução TSE n. 23.596/19.

Relativamente à matéria preliminar, assiste razão à Procuradoria Regional Eleitoral ao apontar que, recentemente, esta Corte firmou entendimento de que a ausência de citação do partido, em processos que questionam a desídia no ato de filiação partidária, é causa de nulidade processual. Colaciono o precedente:

Direito Eleitoral. Eleições 2024. Recurso. Filiação Partidária. Inclusão na lista de filiados. Ausência de citação do partido. Retorno dos autos à origem. Citação do partido político interessado. Nulidade da sentença.

I. Caso em exame

1.1 Cuida-se de recurso interposto contra sentença que indeferiu pedido de inclusão retroativa na lista de filiados do partido Republicanos, com data de 19.3.2024.

1.2 O recorrente alega que foi filiado ao partido Republicanos em 19.3.2024, conforme documentação apresentada, mas que sua filiação não foi registrada no sistema Filia dentro do prazo. Requereu a reforma da decisão para reconhecimento de sua filiação desde a data mencionada e inclusão retroativa no sistema.

II. Questões em discussão

2.1 A principal questão em debate é a nulidade da sentença em razão da ausência de citação do partido político ao qual o recorrente alega estar filiado, conforme exigência da Resolução TSE n. 23.668/21, que alterou a Resolução TSE n. 23.596/19.

III. Razões de decidir

3.1 O art. 19, § 2º, da Lei n. 9.096/95, regulamentado pelo art. 11 da Resolução TSE n. 23.596/19, estabelece que eleitores prejudicados por desídia ou má-fé dos partidos quanto ao registro de filiação podem requerer a inclusão na lista de filiados. A Resolução TSE n. 23.668/21, ao incluir o § 3º no art. 11 da Resolução TSE n. 23.596/19, determinou expressamente a necessidade de citação do partido político para manifestação nos autos.

3.2 Considerando que o partido político não foi citado no presente processo, houve violação ao devido processo legal, o que justifica a anulação da sentença.

3.3 Entendimento jurisprudencial no sentido de que a ausência de citação do partido na ação de filiação partidária acarreta a nulidade dos atos processuais subsequentes.

3.4 A questão da filiação partidária poderá também ser objeto de análise em eventual pedido de registro de candidatura, conforme previsto no art. 20, § 2º, da Resolução TSE n. 23.596/19.

IV. Dispositivo e tese

4.1 Reconhecimento da nulidade da sentença e retorno dos autos à origem para citação do partido político interessado, nos termos do art. 11, § 3º, da Resolução TSE n. 23.596/19, com a renovação dos atos processuais subsequentes.

Dispositivos relevantes citados: Lei n. 9.096/95, art. 19, § 2º; Resolução TSE n. 23.596/19, art. 11, §§ 2º e  3º, e art. 20, § 2º; Resolução TSE n. 23.668/21.

Jurisprudência relevante citada: TRE-RN, Recurso Eleitoral n. 060002449, Acórdão, Des. Fabio Luiz De Oliveira Bezerra, Publicação: DJE, 25/07/2024; TRE-RR, Recurso Eleitoral n. 060092967, Acórdão, Des. Felipe Bouzada Flores Viana, Publicação: DJE, 09/03/2023; TRE-MG, Recurso Eleitoral n. 060003568, Rel. Luiz Carlos Rezende e Santos, Julgamento: 05/07/2022, Publicação: DJEMG, 11/07/2022.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 0600089-45.2024.6.21.006, Rel. Des. Mário Crespo Brum, Acórdão, Publicação em Sessão, 27.08.2024)

 

Assim, a anulação do feito para a citação do partido é medida impositiva.

Quanto aos demais argumentos invocados na sentença, anoto que este Tribunal igualmente firmou posicionamento jurisprudencial pela possibilidade de discussão da ausência de inclusão de nome de eleitor em lista de filiados em ação autônoma, sem prejuízo da verificação das condições de elegibilidade e causas de inelegibilidade no âmbito do registro de candidatura, e que não há preclusão para a propositura da ação. Transcrevo:

Direito eleitoral. Eleições 2024. Recurso. Filiação partidária. Requisito de elegibilidade. Registro no sistema de gerenciamento de informações partidárias (SGIP). Filiação reconhecida com base em certidão emitida pelo sistema da justiça eleitoral. Filiação mais recente. Cancelamento dos demais vínculos. Parcial provimento.

I. CASO EM EXAME

1.1. Insurgência contra decisão que julgou improcedente pedido de inclusão de filiação a partido, sob o fundamento de preclusão do direito de alegar a desídia da agremiação, bem como a inexistência de documento com fé pública capaz de atestar a filiação pretendida, motivo pelo qual manteve o vínculo da recorrente a outra agremiação no sistema FILIA.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1. A possibilidade de inclusão da recorrente no sistema FILIA como filiada ao partido de sua preferência, considerando sua alegação de desídia desta agremiação.

2.2. A validade dos documentos apresentados pela recorrente como prova de filiação partidária.

2.3. A aplicação da regra da prevalência da filiação mais recente, conforme disposto na legislação eleitoral.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. Conforme a redação atual do art. 11 da Resolução TSE n. 23.596/19, alterada pela Resolução TSE n. 23.668/21, há presunção favorável à filiação partidária, a partir da alegação de desídia pelo filiado e do reconhecimento da tempestividade da filiação pelo partido.

3.2. O atestado da condição de membro de órgão diretivo da agremiação política, fornecido pela Justiça Eleitoral por meio do Sistema de Gerenciamento de Informações Partidárias (SGIP), possui fé pública e, portanto, representa documento hábil a comprovar a filiação partidária. Tal certidão não se trata de documento unilateral e pode ser conhecida como prova idônea, na forma do enunciado da Súmula n. 20 do TSE, conforme jurisprudência pacífica das Cortes Eleitorais.

3.3. A manifestação expressa de pré-candidata no sentido de permanecer filiada ao partido pretendido deve ser considerada a partir da ponderação dos princípios constitucionais da autonomia partidária (art. 17, § 1º, CF/88) e dos direitos fundamentais à cidadania (art. 1º, inc. II, CF/88) e à liberdade de associação (art. 5º, inc. XX, CF/88). Solução que deve preservar ao máximo o exercício da capacidade eleitoral passiva da recorrente.

3.4. Ausente preponderância entre os sistemas SGIP e FILIA, aplica-se a regra da prevalência da filiação mais recente, com o cancelamento das demais filiações partidárias existentes, conforme disposto no art. 22, parágrafo único, da Lei n. 9.096/95.

3.5. Inviável o deferimento do pedido recursal de que seja provido o recurso para que seja deferido o pedido de registro de candidatura da recorrente, porquanto tão requerimento deve ser apresentado em processo próprio e dirigido ao juízo da respectiva zona eleitoral.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso parcialmente provido, para deferir o requerimento de anotação da filiação da recorrente ao Partido dos Trabalhadores (PT), com data de 13.12.2023, cancelando-se as demais filiações partidárias existentes.

4.2. Determinação de comunicação urgente à Zona Eleitoral de origem para cumprimento imediato da decisão e promoção do lançamento no sistema FILIA, bem como da intimação às agremiações envolvidas.

Tese de julgamento: “1. Há presunção favorável à filiação partidária a partir da alegação de desídia pelo filiado e do reconhecimento da tempestividade da filiação pelo partido. 2. O atestado da condição de membro de órgão diretivo da agremiação política fornecido pela Justiça Eleitoral, por meio do Sistema de Gerenciamento de Informações Partidárias (SGIP), possui fé pública e representa documento hábil a comprovar a filiação partidária. Ausente preponderância entre os sistemas SGIP e FILIA, aplica-se a regra da prevalência da filiação mais recente, com o cancelamento das demais filiações partidárias existentes, conforme disposto no art. 22, parágrafo único, da Lei n. 9.096/95.”

Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.596/19, art. 11; Súmula n. 20 do TSE; CF/88, arts. 1º, inc. II, 5º, inc. XX, e 17, § 1º; Lei n. 9.096/95, art. 22, parágrafo único.

Jurisprudência relevante citada: TRE/PR – FP n. 0600011-98, Des. El. José Rodrigo Sade, Publicação: DJE - DJE, 12/08/2024; TSE – AgR em REspEl n. 0600240-25, Relator Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 13/11/2018; TRE/RS – REl n. 0600136- 25, Relator Des. El. Miguel Antônio Silveira Ramos, Publicação: em sessão, 09/11/2020.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 0600083-12.2024.6.21.0008, Rela. Desa. Patrícia da Silveira Oliveira, Acórdão, Publicação em Sessão, 27.08.2024.)

 

No julgado acima citado, de minha relatoria, concluiu-se que “houve significativa mudança no sistema FILIA, deixando de existir o marco temporal do processamento por lista especial a partir da adoção do processamento dos registros de filiação partidária  automático e diário, revogando-se expressamente o art. 16 da Resolução 23.596/19 e dando nova redação aos arts. 11, caput, e seus parágrafos, e 12, § 2º, da Resolução 23.596/19, a partir da edição da Resolução TSE n. 23.668 de 09 de dezembro de 2021”.

Desse modo, conforme a redação atual do art. 11 da Resolução TSE n. 23.596/19, com as alterações da Resolução TSE n. 23.668/21, instituiu-se aparente presunção favorável à filiação, a partir da alegação de desídia pelo filiado e do reconhecimento da tempestividade da filiação pelo partido.

Portanto, não há preclusão nem impossibilidade de análise da filiação partidária em ação autônoma.

Quanto ao raciocínio da sentença de que, no SGIP, a validação da nominata ocorreu fora do prazo limite para a filiação partidária, anoto que, no processo supra referido, esta Corte entendeu viável a comprovação da filiação a partir da certidão emitida pelo SGIP, mas que não houve discussão sobre a data a ser considerada quando há divergência entre a indicada pela legenda partidária e o dia em que houve a validação pela Justiça Eleitoral.

Sem antecipar futura decisão sobre o tema, merece ser considerado que esta Justiça Especializada, para fins de responsabilização de dirigentes partidários e demais imputações afetas aos processos eleitorais, entende como legítima a data indicada pelas legendas e não somente a da validação, e que o procedimento, na hipótese dos autos, ocorreu dentro do prazo do art. 35 da Resolução TSE n. 23.571/18.

Ante o exposto, acolho a preliminar suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral e VOTO pela anulação da sentença recorrida, devendo os autos retornarem à origem para que o partido político interessado seja citado, nos termos do art. 11, § 3º, da Resolução TSE n. 23.596/19, com renovação dos atos processuais subsequentes.