PCE - 0603259-91.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/09/2024 às 14:00

VOTO

Ao examinar as contas de JORGE LUIS DRUMM, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, referentes à arrecadação e ao dispêndio de recursos nas Eleições Gerais de 2022, a unidade técnica verificou apenas duas impropriedades, sem manifestação pelo recolhimento, consistentes em:

a) crédito de R$ 370,95 com recursos do próprio candidato para pagamento de despesas contratadas, com movimentação financeira por meio da conta bancária destinada ao Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), conforme item 1.2 do parecer técnico, ID 45573328;

b) excesso de R$ 23.987,10, equivalente a 18,88% acima do limite de R$ 127.062,90 para autofinanciamento, ficando o candidato sujeito à multa de até 100% do valor excedente, conforme previsão do art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Considerando-se todos os documentos apresentados e as respectivas retificações de contas, em especial a justificativa do ID 45512826, passo à análise das impropriedades remanescentes na contabilidade em exame:

a) Crédito de recursos próprios do candidato na conta destinada à movimentação financeira de valores do FEFC (apontamento técnico do item 1.2, ID 45573328)

A impropriedade, neste ponto, está descrita pela unidade técnica como “um crédito realizado na conta destinada ao FEFC, feita pelo próprio candidato (CPF 455.447.270-15), no valor de R$ 370,95”, sem recomendação de recolhimento do valor ao erário (item 1.2; ID 45573328, p 2).

O candidato, em sua defesa, refere que efetivamente depositou o valor na conta FEFC para cobrir um cheque pendente de pagamento (petição, ID 45512826, p. 1).

A Procuradoria Regional Eleitoral, por sua vez, opina pelo recolhimento desse recurso privado, que transitou na conta FEFC, ao Tesouro Nacional (ID 45608927).

Entretanto, embora se reconheça a impropriedade, conforme expressamente admitida pelo candidato, divirjo da Procuradoria Eleitoral quanto ao dever de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia.

O apontamento técnico facilmente identifica a origem do recurso como sendo do próprio candidato, distinguindo claramente os recursos públicos daqueles eminentemente privados pela conta bancária em questão, demonstrando que o equívoco se trata de mera falha formal.

Consoante precedente desta Corte, quando há trânsito de valores privados em contas bancárias destinadas à movimentação de verbas públicas, mas está identificada a origem do recurso com segurança, preserva-se a confiabilidade e a transparência dos registros contábeis, sem necessidade de recolhimento do valor ao Tesouro Nacional:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. AUTOFINANCIAMENTO SEM A DEMONSTRAÇÃO DA CAPACIDADE FINANCEIRA. AFASTADO O APONTAMENTO. DEPÓSITO DE RECURSOS PRIVADOS NA CONTA DO FEFC. AUSENTE RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO DAS SOBRAS DE CAMPANHA DAS VERBAS ADVINDAS DO FEFC. IMPROPRIEDADES ESCLARECIDAS. AFASTADA A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas relativas ao pleito de 2020 e determinou o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

2. Aplicação de recursos próprios na campanha, sem a demonstração da capacidade financeira, diante da declaração de ausência de bens no registro de candidatura. Considerando que no processo de registro de candidatura a recorrente declarou ser aposentada, não há que se falar em irregularidade. Afastado o apontamento.

3. Realizado depósito de recursos privados, na conta bancária do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. Conforme apontou o exame técnico, trata-se de depósitos realizados pela própria candidata, tendo sido identificada a origem das doações, não havendo prejuízo à confiabilidade e à transparência dos registros contábeis.

4. Ausente restituição ao erário das sobras de campanha das verbas do FEFC não utilizadas. Do exame dos extratos publicados no DivulgaCandContas do TSE, constata-se depósito e débito de mesmo valor, tendo em ambos os casos a própria candidata como contraparte (constando nos depósitos seu CNPJ de campanha e no débito, o seu CPF). Plausível a tese recursal de que a quantia foi destinada ao pagamento de tarifa bancária e que o depósito foi realizado por engano.

5. Persistência de falhas que caracterizam mera impropriedade ensejadora de ressalva nas contas. Afastada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional, uma vez que não verificado o uso de recursos de origem não identificada.

6. Parcial provimento.

(TRE-RS – REl n. 0600509-27, ERECHIM - RS, Relator Desembargador Eleitoral Gerson Fischmann. Data de Julgamento: 24/03/2022, Publicação: DJE, em 28/03/2022.) (Grifou-se.)

Com esses fundamentos, reconheço a irregularidade em questão, a qual deve ser considerada para o julgamento de aprovação ou rejeição das contas, mas deixo de determinar o recolhimento da importância de R$ 370,95 ao Tesouro Nacional.

 

b) Excesso do limite para autofinanciamento (apontamento técnico do item 1.3 do parecer conclusivo, ID 45573328)

Conforme parecer técnico, o candidato extrapolou o limite de R$ 127.062,90 para autofinanciamento em 18,9%, correspondente à quantia de R$ 23.987,10, totalizando a doação com recursos próprios no valor de R$ 151.050,00. Consequentemente, sujeitou-se ao arbitramento de multa em até 100% do valor excedente de R$ 23.987,10, conforme art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 (item 1.3 do parecer técnico, ID 45573328):

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pela doadora ou pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º) .

§ 1º A candidata ou o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A) .

(...)

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita a infratora ou o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de a candidata ou o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º) .

(...)

O candidato, a seu turno, alega que o “limite foi extrapolado para honrar os compromissos assumidos durante a campanha”, evitando-se a constituição de dívida de campanha, com depósitos de recursos próprios no montante total de R$ 83.270,95 após 02.10.2022, conforme tabela constante da petição de ID 45512826.

De outro lado, a Procuradoria Regional Eleitoral requer o arbitramento da multa no grau máximo possível de 100% do valor excedente, com o recolhimento integral de R$ 23.987,10 ao Tesouro Nacional.

Primeiramente, consigno que muito embora o candidato apresente justificativa para a doação excedente com recursos próprios, a regra limitadora tem caráter objetivo definido em lei, correspondendo a 10% do limite total de gastos para o cargo em disputa, na forma do art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Por essa razão, a justificativa não tem o condão de elidir a penalidade prevista na norma. Nesse sentido, perfila-se o entendimento deste Tribunal, conforme ementa abaixo transcrita:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. EXCEDIDO LIMITE DE AUTOFINANCIAMENTO DE CAMPANHA. BEM ESTIMÁVEL EM DINHEIRO. CESSÃO DE AUTOMÓVEL. VALOR REDUZIDO DO EXCESSO. MANTIDO O JUÍZO DE APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DESPROVIMENTO. 1. Recurso contra sentença que aprovou com ressalvas prestação de contas de candidato, tendo como fundamento a extrapolação do limite legal de doações com recursos próprios. Não foi fixada multa correspondente a 30% da quantia em excesso, disciplinada no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19. 2. Excedido o limite de autofinanciamento de campanha, em discordância ao disposto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que estabelece que o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer. Regra é objetiva. O limite previsto para gastos nas campanhas dos diversos cargos é deduzido do disposto no art. 18-C da Lei das Eleições. 3. Embora a receita tipificada como bem estimável em dinheiro seja de natureza gratuita, ela possui valor econômico e, assim sendo, o valor estimado deve refletir o valor de mercado. A cessão de automóvel de propriedade do candidato para seu uso durante a campanha eleitoral deve ser registrada na prestação de contas justamente para viabilizar a observância do limite para o autofinanciamento, segundo disciplina o art. 60, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19. 4. O valor do excesso é reduzido, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeitos à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), devendo ser mantido o juízo de aprovação com ressalvas. 5. Não havendo cominação de multa no âmbito da decisão de origem, não há como rediscutir este ponto em grau de recurso, seja por falta de interesse recursal do recorrente, seja em respeito ao princípio do non reformatio in pejus. 6. Provimento negado.

(TRE-RS - REL: 060048146 ALEGRIA - RS, Relator: ROGERIO FAVRETO, Data de Julgamento: 02/05/2022, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 76, Data: 04/05/2022, Página 4)

Mesmo não sendo verificada má-fé, em razão do caráter cogente da regra aplicável a todos os candidatos, superado o teto de R$ 127.062,90 de doações com recursos para o cargo de deputado estadual, impõe-se o arbitramento de multa em até 100% sobre a doação excedente de R$ 23.978,10, consoante art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Contudo, faz-se necessário indagar se a fixação da pena de multa no máximo de 100% do valor excedente, como defende a Procuradoria Regional Eleitoral, encontra-se adequada, razoável e proporcional à infração praticada.

É indiscutível que a reprimenda deve ser aplicada a partir de critério justo e objetivo, a fim de manter a igualdade de condições financeiras entre os concorrentes aos cargos eletivos e a observância das regras de autofinanciamento de campanha. Porém, deve-se ter presente que a norma refere “multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso”, demandando arbitramento que respeite os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, este último, em sentido estrito.

E, conforme parecer conclusivo, o limite de doações com recursos próprios era de R$ 127.062,90, equivalente ao percentual de 10% do teto de gastos para o cargo de deputado estadual (R$ 1.270.629,01), mas o candidato utilizou valores pessoais de R$ 151.050,00, que equivalem ao percentual de 11,89% sobre R$ 1.270.629,01, superando em R$ 23.987,10 a quantia própria que poderia aplicar na campanha, que era de R$ 127.062,90.

Matematicamente, o excesso de R$ 23.987,10 representa um distanciamento de 18,9% do limite de gastos com recursos próprios para o cargo de deputado estadual no Rio Grande do Sul (R$ 127.062,90), e reflete em 1,89% do limite de gastos para o cargo de deputado estadual no Rio Grande do Sul (R$ 1.270.629,01). 

Assim, não parece razoável fixar o patamar máximo de sancionamento de multa de 100% da quantia em excesso considerando que a infração praticada é de 1,89%.  Entendo que o percentual da multa deve ter proporcionalidade entre o percentual indevido que foi utilizado na campanha e o valor máximo que poderia ser aplicado de R$ 127.062,90, ou seja, proporcional à infração.

Penso que calcular o percentual da multa com base na infração real de 18,9% sobre o montante pelo qual o candidato excedeu o limite permitido, R$ 23.987,10, seja a mais correta interpretação da exegese do § 4º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19. A porcentagem de 18,9% relativamente ao excesso de gastos de R$ 23.987,10 resulta em multa no valor de R$ 4.533,56 e afigura-se um critério objetivo, adequado e suficiente para reprovação e prevenção da infração ao teto legal do autofinanciamento em disputas eletivas.

Se o candidato superasse em 100% o limite de autofinanciamento de R$ 127.062,90, a multa, seguindo o critério proposto, seria calculada com base nesse percentual de excesso e resultaria em R$ 127.062,90.

Portanto, aplicando a multa de forma proporcional ao percentual da infração de 18,9% sobre o excesso do limite de autofinanciamento de R$ 23.987,10, o valor da sanção é de R$ 4.533,56, e este método é mais justo e alinhado com os princípios de razoabilidade e proporcionalidade, pois penaliza o candidato de maneira equivalente ao grau da infração cometida.

O raciocínio garante ao mesmo tempo segurança jurídica para o candidato e solução justa para graduação de penalidades de multa em questões fáticas semelhantes analisadas por esta Corte.

Dessarte, muito embora reconheça a irregularidade em questão no valor de R$ 23.987,10 para o julgamento de aprovação ou rejeição das contas, acolhendo a proporção entre o teto de gasto e o excesso praticado como paradigma, divirjo da conclusão da Procuradoria Regional Eleitoral e fixo a multa, a partir de um juízo de proporcionalidade e razoabilidade, em R$ 4.533,56, com base no art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e no art. 23, §§ 2º–A e 3º, da Lei n. 9.504/97.
 

c) Conclusão

As irregularidades passíveis de ressalva nessa contabilidade, no valor total de R$ 24.358,05, representam 6,58% do total das receitas declaradas na campanha (R$ 370.130,94), e enquadram-se no parâmetro (inferior a 10% da arrecadação financeira) fixado, na jurisprudência desta Justiça especializada, de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade, para aprovar com ressalvas estas contas, na forma do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Todavia, divirjo da Procuradoria Regional Eleitoral, para afastar o recolhimento ao erário da falha formal de R$ 370,95 e arbitrar a multa em R$ 4.533,56, a ser recolhida ao Fundo Partidário, como previsto no art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

 

Em face do exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas relativas ao pleito de 2022 apresentadas por JORGE LUIS DRUMM, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, condenando-o ao pagamento de multa de R$ 4.533,56, a ser recolhida ao Fundo Partidário com juros e com correção monetária, nos termos da fundamentação.

Com o trânsito em julgado, anotações de estilo e satisfação de obrigações, arquivem-se os autos com baixa na instância pertinente.