REl - 0600065-94.2024.6.21.0006 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/09/2024 às 14:00

VOTO

 

Admissibilidade

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Da Preliminar de Nulidade da Sentença

Na hipótese, a recorrente teve indeferido o seu pedido de registro de candidatura para concorrer ao cargo de vereadora no pleito de 2024 em razão da ausência de prova de tempestiva filiação partidária.

Com efeito, é incontroverso que a recorrente não constou nas relações interna ou oficial de filiados da agremiação pela qual pretende concorrer. Alega, porém, que houve equívoco ou desídia da direção partidária, a qual não procedeu aos devidos registros no sistema da Justiça Eleitoral (Filia).

Diante da alegação atribuindo negligência ou falha do órgão partidário, a Procuradoria Regional Eleitoral suscita a nulidade da sentença e o retorno dos autos à origem, a fim de que se proceda à citação do PL para manifestação.

Com efeito, os eleitores prejudicados por desídia ou má-fé dos partidos políticos em relação aos registros de filiação possuem a faculdade de requerer ao Juiz a inclusão na lista de filiados, deflagrando procedimento específico, sob a classe de Filiação Partidária (FP), com base no art. 19, § 2º, da Lei 9.096 /95, disciplinado pelo art. 11 da Resolução TSE n. 23.596/19, in verbis:

Art. 11. (…).

[…].

§ 2º Os prejudicados por desídia ou má-fé poderão requerer, diretamente ao juízo da zona eleitoral em que forem inscritos, a inclusão de seu nome nos registros oficiais do partido, devendo instruir o pedido com documentos e informações que possam auxiliar no exame. (Redação dada pela Resolução nº 23.668/2021)

§ 3º Autuado o requerimento a que se refere o § 2º deste artigo na classe Filiação Partidária (FP), o juiz realizará a citação do partido político para que se manifeste no prazo de 10 (dez) dias e, se existente ficha de filiação assinada pelo requerente, apresente-a em juízo. (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

 

Contudo, na hipótese, não houve a oportuna instauração do procedimento próprio para discussão das questões relacionadas ao encaminhamento de dados de filiados à Justiça Eleitoral, não sendo aplicável o art. 11, § 3º, da Resolução TSE n. 23.596/19 aos processos de registros de candidaturas, cuja normatização não prevê tal integração dialética.

Além disso, a referida intimação não resultaria em qualquer acréscimo probatório em relação ao que já consta nos autos, uma vez que a ficha de filiação da recorrente ao PL se encontra juntada sob o ID 45684942.

Nesses termos, rejeito a preliminar de nulidade da sentença suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral.

Do Mérito

No mérito, a prova do tempestivo vínculo partidário pode ser realizada por documentos oferecidos no processo de registro de candidatura, desde que não tenham sido produzidos de forma unilateral pela eleitora e pelo partido político, nos termos da Súmula n. 20 do Tribunal Superior Eleitoral:

A prova de filiação partidária daquele cujo nome não constou da lista de filiados de que trata o art. 19 da Lei nº 9.096/95, pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública.

 

A questão é regulamentada pelo art. 28, § 1º, da Resolução TSE n. 23.609/19, que dispõe:

Art. 28. Os requisitos legais referentes à filiação partidária, ao domicílio eleitoral, à quitação eleitoral e à inexistência de crimes eleitorais são aferidos com base nas informações constantes dos bancos de dados da Justiça Eleitoral, sendo dispensada a apresentação de documentos comprobatórios pelos requerentes (Lei nº 9.504/1997, art. 11, § 1º, III, V, VI e VII).

§ 1º A prova de filiação partidária da candidata ou do candidato cujo nome não constar dos dados oficiais extraídos do Sistema FILIA pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública (Lei nº 9.096/1995, art. 19; Súmula nº 20/TSE). (Redação dada pela Resolução nº 23.675/2021)

 

No caso concreto, a candidata afirma que assinou a sua ficha de filiação em uma reunião/jantar do PL, ocorrida em 6.12.2023, no qual houve o ingresso de vários novos filiados, com ampla divulgação em redes sociais.

Para comprovar suas alegações, acostou os seguintes documentos:

a) ficha de filiação partidária ao PL, assinada em 6.12.2023 (ID 45684942);

b) print de conversa em grupo do Whatsapp denominado “PL Filiados”, do dia 9.12.2023 (ID 45684940);

c) fotografia em que a recorrente figura segurando a ficha de filiação partidária em mãos, em reunião do partido (ID 45684941), e outras imagens do evento (ID 45684959, 45684960 e 45684961); e

d) relação de URLs com postagens na internet sobre o encontro para novas filiações:

https://www.instagram.com/p/C0m5ClLss0/?igsh=MW1vNzBxbDVsbmRteA,

https://www.instagram.com/p/C0kP71gLbZK/?igsh=NDR4cmsza2Jhdnpl, e

https://www.instagram.com/p/C0iObU1rx-G/?igsh=MXYzYzhta2hycnh1bQ.

 

Em relação ao acervo probatório, o Tribunal Superior Eleitoral consolidou sua jurisprudência no sentido de que a mera ficha de filiação não serve como prova de filiação partidária, uma vez que se trata de documento produzido de forma unilateral e destituído de fé pública. Nesse sentido, o seguinte julgado:

RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2022. DEPUTADO ESTADUAL. RRC. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. ENUNCIADOS SUMULARES NºS 20, 24 E 30 DO TSE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO E DE SIMILITUDE FÁTICA. ÓBICE SUMULAR Nº 28 DO TSE. NEGATIVA DE PROVIMENTO. […]. 2. Nos termos da Súmula nº 20 do TSE, "a prova de filiação partidária daquele cujo nome não constou da lista de filiados de que trata o art. 19 da Lei nº 9.096/1995, pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública". […]. No caso, o candidato apresentou diversos documentos, quais sejam, ficha de filiação, declarações de dirigentes partidários, requerimento de desincompatibilização, ata de reunião, os quais, na linha da jurisprudência desta Corte, não são hábeis para comprovar a filiação partidária, por serem considerados documentos unilaterais. […].

(TSE, Recurso Especial Eleitoral nº 060088021, Acórdão, Min. Raul Araujo Filho, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 03/11/2022) (Grifei.)

 

Da mesma forma, a jurisprudência tem se posicionado no sentido de que meras fotografias retratando a presença do eleitor ou eleitora em reuniões partidárias são também provas destituídas de fé pública, conforme precedente deste Tribunal Regional:

RECURSO. REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÃO 2020. VEREADOR. INDEFERIDO. AUSENTE CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. INDEFERIDO PEDIDO DE PROVAS. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. ART. 9º, CAPUT, DA LEI N. 9.504/97. DOCUMENTOS DESTITUÍDOS DE FÉ PÚBLICA. NÃO COMPROVADO VÍNCULO TEMPESTIVO COM A AGREMIAÇÃO. DESPROVIMENTO. [...]. 4. Apresentação de fotografias de pessoas reunidas, atas de reuniões partidárias contendo a assinatura e ficha de filiação do candidato, todos documentos unilaterais, destituídos de fé pública e incapazes de comprovar o vínculo partidário dentro do prazo estabelecido para o pleito de 2020. Desatendido o requisito dos arts. 9º da Lei n. 9.504/97 e 10, caput, da Resolução TSE n. 23.609/19.5. Desprovimento.

(TRE-RS; Recurso Eleitoral nº 060016016, Acórdão, Des. MIGUEL ANTÔNIO SILVEIRA RAMOS, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 06/11/2020) (Grifei.)

 

Entretanto, agregam-se a tais elementos as postagens realizadas no Instagram, entre os dias 6 e 7 de dezembro de 2023, que confirmam a realização de reunião para o recebimento de novas filiações em 6.12.2023, quando a recorrente formalizou sua integração à sigla partidária.

Não se trata de simples prints de publicações, uma vez que as URLs referidas estão atualmente disponíveis para acesso e conferência na internet.

Destaca-se entre as postagens relacionadas, a publicação de um vídeo no perfil da própria recorrente, no mesmo dia 6.12.2023, no qual efetua a assinatura do formulário de filiação partidária, então juntado aos autos, nas mesmas circunstâncias das demais fotografias e postagens acostadas (https://www.instagram.com/p/C0iObU1rx-G/?igsh=MXYzYzhta2hycnh1bQ&img_index=1):

 

As publicações em redes sociais, associadas às demais provas ofertadas, demonstram que a cerimônia para novas filiações efetivamente ocorreu antes de seis meses das eleições de 2024 e que a recorrente subscreveu sua ficha de filiação naquela oportunidade.

Os Tribunais Eleitorais têm admitido postagens de redes sociais como elemento probatório hábil a comprovar a tempestiva filiação quando é possível extrair a certeza sobre a situação de filiação e o tempo em que realizada, com corroboração de outros elementos de prova, ainda que unilaterais, como, por exemplo, a ficha de filiação e fotografias, tal como no presente caso.

Com essa linha de entendimento, colaciono os seguintes julgados:

DIREITO ELEITORAL. RECURSO ELEITORAL. REQUERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2024. VEREADORA. INDEFERIMENTO NO PRIMEIRO GRAU. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. DATA REGISTRADA NO FILIA QUE NÃO ATENDE AO REQUISITO TEMPORAL MÍNIMO. PROVA DO VÍNCULO PARTIDÁRIO NO PRAZO LEGAL POR OUTROS MEIOS. POSTAGENS EM REDES SOCIAIS. PROVIMENTO.

I. CASO EM EXAME

1. Recurso eleitoral interposto por candidata contra sentença do Juízo da 69ª Zona Eleitoral, que indeferiu seu pedido de registro de candidatura ao cargo de Vereadora do Município de Natal/RN nas Eleições de 2024, com fundamento na ausência de filiação partidária pelo prazo mínimo exigido em lei.

2. No caso em exame, verifica-se a existência de registro de filiação da recorrente ao Partido dos Trabalhadores, no sistema FILIA, com data de filiação em 01/07/2024 (id 11052629), que não atende ao prazo mínimo de seis meses anteriores ao pleito, nos moldes exigidos pelo art. 9º, caput, da Lei n.º 9.504/97.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

3. Há três questões em discussão: (i) se a ausência de registro de filiação partidária no sistema FILIA, pelo prazo mínimo exigido por lei, impede o deferimento do registro de candidatura; (ii) se a filiação partidária no prazo legal pode ser comprovada por outros meios de prova, incluindo postagens em redes sociais; (iii) se a comprovação por outros meios de prova pode ser realizada no próprio processo de registro de candidatura ou somente em ação específica.

III. RAZÕES DE DECIDIR

4. A legislação eleitoral permite a comprovação da filiação partidária por outros meios de prova, no próprio processo de registro de candidatura, caso o registro no sistema FILIA não satisfaça o prazo mínimo legal, desde que esses elementos de prova não sejam unilaterais e destituídos de fé pública. É o que dispõe expressamente o § 2º do art. 20 da Resolução TSE n.º 23.596/2019: "§ 2º. Inexistindo registro no FILIA que atenda ao disposto no § 1º deste artigo, a prova de filiação partidária deverá ser realizada por outros elementos de convicção, no próprio processo de registro de candidatura ou na forma do § 2º do art. 11 desta Resolução, não se admitindo para tal finalidade documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública".

5. Postagens em redes sociais podem ser utilizadas como prova da filiação partidária, desde que apresentem elementos que permitam aferir sua autenticidade e confiabilidade, especialmente quanto às datas de publicação, como ocorre no caso em questão.

6. No presente caso, as postagens realizadas pela candidata em sua rede social Facebook, datadas de outubro de 2023, demonstram de forma inequívoca a sua filiação ao Partido dos Trabalhadores antes do prazo legal exigido (17/10/2023), corroborando as demais provas apresentadas, como a carteira de filiação e a declaração subscrita pela presidente do diretório municipal do partido.

IV. DISPOSITIVO E TESE

7. Recurso provido.

Tese de julgamento:

8. A ausência de registro de filiação partidária no sistema FILIA não obsta o deferimento do registro de candidatura se a filiação puder ser comprovada por outros meios de prova idôneos, incluindo postagens em redes sociais.

9. Postagens em redes sociais, que evidenciem a data de filiação partidária anterior ao prazo legal e sejam corroboradas por outros elementos de prova, são aptas a comprovar a condição de elegibilidade.

10. A comprovação por outros meios de prova pode ser realizada no próprio processo de registro de candidatura, não apenas em ação específica.

[…].

(TRE-RN; REl n. 060009394, Acórdão, Des. Fabio Luiz De Oliveira Bezerra, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 03/09/2024) Grifei.

 

ELEIÇÕES 2022. REGISTRO DE CANDIDATURA INDEFERIDO POR AUSÊNCIA DE FILIAÇÃO PARTIDÁRIA NO SISTEMA FILIA. COMPROVAÇÃO DE FILIAÇÃO POR OUTROS ELEMENTOS. SÚMULA 20 TSE. AGRAVO INTERNO. AGRAVO PROVIDO PARA RECONHECER A FILIAÇÃO E DEFERIR O REGISTRO DE CANDIDATURA.

1. Candidato, ora agravante, requereu o deferimento de seu registro de candidatura, considerando que o conjunto probatório é apto a comprovar sua filiação partidária.

2. A Súmula nº 20 do TSE preconiza que embora não haja o registro de filiação no sistema FILIA, outros elementos de prova podem ser considerados, desde que não sejam documentos produzidos unilateralmente e destituídos de fé pública.

3. Conforme a jurisprudência do TSE, é admissível a juntada de documentos enquanto não exaurida a fase ordinária do processo de registro de candidatura, ainda que tal providência tenha sido anteriormente oportunizada.

4. A postagem feita há mais de seis meses antes do pleito, em rede social do candidato comprovando sua filiação ao partido, é suficiente para demonstrar o vínculo com a antecedência mínima prevista legalmente, quando não desconstituída por prova em contrário.

5. Agravo Interno provido para o fim de reconhecer a filiação partidária e deferir o registro de candidatura.

(TRE-PR; RCand n. 060062818, Acórdão, Des. Claudia Cristina Cristofani, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 23/09/2022) (Grifei.)

 

RECURSO ELEITORAL. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. EMENTA: COMPROVAÇÃOCONJUNTO DOS DOCUMENTOS. FICHA DE FILIAÇÃO. DECLARAÇÃOPARTIDÁRIA. FOTOS REDES SOCIAIS. RECONHECIMENTO. PROVIMENTO.

1. A filiação partidária é uma condição de elegibilidade prevista no art. 14, § 3º,inciso V, da Constituição Federal, e regulamentada pela Lei nº 9.096/95 eResolução TSE nº 23.596/2019.2. Considera-se deferida, para todos os efeitos, a filiação partidária com o atendimento das regras estatutárias do partido (Lei nº 9.096/1995, art. 17), sendo comunicada à Justiça Eleitoral para fins de anotação.

3. A filiação partidária pode ser demonstrada por outros meios, conforme Súmula

nº 20 do Colendo TSE.

4. Apesar de a ficha de filiação e a declaração do partido anexadas aos autos consistirem em documentos produzidos unilateralmente, verifica-se que o recorrente juntou aos autos várias fotos extraídas das redes sociais Instagram e Facebook, inclusive colacionando na sua peça recursal os links de acesso a tais publicações, as quais corroboram com os demais elementos e comprovam a sua filiação ao partido Democratas de Peixe-TO em 25 de março de 2020.

5. "Qualquer dado no Facebook torna-se informação pública para todos os efeitos,inclusive como prova processual, uma vez que não é possível editar a data da postagem,mas apenas excluí-la, de modo que os atributos da fotografia publicada na rede social Facebook goza de confiabilidade e consistência". Precedentes do TRE-GO.

6. O conjunto dos documentos constantes dos autos conferem confiabilidade e consistência às alegações do recorrente, não sendo razoável cogitar-se a manipulação dolosa dessas informações.

7. Regularidade da filiação reconhecida. Recurso Eleitoral provido.

(TRE-TO; RECURSO ELEITORAL n. 06004281320206270020, Acórdão, Des. Marco Anthony Stevenson Villas Boas, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 29/10/2020) (Grifei.)

 

Assim, os referidos documentos formam um conjunto probatório seguro, harmônico e apto a evidenciar a efetiva filiação da recorrente perante o partido político, no prazo exigido pelo art. 9º da Lei n. 9.504/97.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso para deferir o registro de candidatura de ROSANE SANTOS DOS SANTOS RECH para concorrer ao cargo de vereadora nas Eleições de 2024.