PC-PP - 0600243-32.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/09/2024 às 14:00

VOTO

Trata-se da prestação de contas do exercício financeiro de 2021 do Diretório Estadual do MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO - MDB do Rio Grande do Sul.

Passo a examinar os apontamentos relatados pelo órgão técnico em análise da documentação apresentada após o primeiro parecer conclusivo (ID 45661243).

1. Do Recebimento de Recursos de Fonte Vedada

O exame técnico detectou a existência de contribuições de pessoa física não filiada ao partido político, e, por meio de diligências a órgãos públicos (ofícios sob ID 45388846), verificou se tratar de doadora que exerceu função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2021, enquadrando-se na vedação prevista no art. 12 da Resolução TSE n. 23.604/19 e no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, conforme a seguinte tabela:

Em sua defesa (ID 45494809), a agremiação sustentou que:

Trata-se de um erro do diretório municipal que recebeu a ficha em junho de 2018 e não lançou no sistema de filiação.

Desde novembro do ano de 2021 o lançamento foi então feito. Hoje ela encontra-se corretamente filiada, como já acreditava ser desde 2018.

 

A mera alegação de que houve equívoco do partido político, que não realizou os necessários registros no sistema Filia no tempo oportuno, não tem aptidão para sanear a falha, uma vez que, juridicamente, está caracterizada a ausência de filiação partidária da doadora à época dos fatos, não existindo prova em sentido contrário.

As doações de pessoa física que exercia, no ano de 2021, função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, são consideradas fontes vedadas de arrecadação caso não abrangidas na ressalva contida no inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95, verbis:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[…].

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

 

Não tendo sido comprovada a filiação partidária da doadora, ao tempo das doações em exame, a irregularidade está objetivamente configurada.

Assim, na forma do art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, impõe-se que sejam reconhecidas como provenientes de fonte vedada as doações realizadas no montante de R$ 500,00; cujo valor deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, conforme art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Em semelhante sentido, destaco o seguinte julgado:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2018. IRREGULARIDADES ATINENTES AO USO INDEVIDO DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES ORIUNDAS DE FONTES VEDADAS. BAIXO PERCENTUAL. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. […]. 4. Reconhecida a utilização de recursos de fonte vedada, provenientes de contribuições de não filiados ou filiados à agremiação diversa e que exerciam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, em desatenção ao art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95. Importância ser recolhida ao Tesouro Nacional, conforme previsão contida no art. 14 da Resolução TSE n. 23.546/17. 5. O valor irregularmente versado representa 4,35% dos gastos examinados nas contas, possibilitando o juízo de aprovação com ressalvas. Circunstância que não afasta o dever de devolução ao Tesouro Nacional do montante impugnado. Inviável, entretanto, a aplicação da sanção de multa de até 20% sobre a importância apontada como irregular, assim como da suspensão das quotas do Fundo Partidário, nos termos da jurisprudência desta Corte. 6. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL nº 060025721, Acórdão, Des. Federal Luis Alberto D’azevedo Aurvalle, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 17/11/2022.

 

Assim, reconheço que o aporte no valor de R$ 500,00 configura recurso de fonte vedada, cujo valor deve ser recolhido ao Tesouro Nacional.

 

2. Da Ausência de Comprovação de Gastos Realizados com Recursos do Fundo Partidário

Ainda, o órgão técnico relatou a ausência de documentação comprobatória da aplicação de recursos oriundos do Fundo Partidário, no montante de R$ 3.876,98, conforme tabela anexada ao relatório de análise:

 

Em relação aos apontamentos, o partido apresentou a seguinte manifestação (ID 45494809):

Quanto a tabela anexa ao parecer tem-se que:

No que tange aos itens 1 e 2, tem-se que, como já dito, são pagamentos de ressarcimentos feitos a dois dirigentes partidários de despesas feitas no desempenho da atividade partidária.

Inicialmente é de se dizer que os ressarcimentos à dirigentes, filiados e/ou colaboradores geralmente é feito por roteiro e não individualmente por nota apresentada.

O ressarcido traz os comprovantes fiscais juntamente com relatório onde constam individualizadas as despesas e breve relato do roteiro razão do gasto.

Excelência, a equipe técnica não analisa o mérito das explicações trazidas. A atividade partidária não é essencialmente administrativa, nem sempre existem comprovações físicas, factíveis de um roteiro ou de uma reunião. Como já referido em outros processos onde apontamento semelhantes foram efetuados, nem todas as reuniões são noticiadas, nem todas as agendas são fotografadas. E o sigilo por vezes é inerente ao desempenho da atividade partidária, não porque se trata de algo ilegal, mas, sim, porque as vezes o assunto debatido é sigiloso. Podemos citar, como exemplo, uma reunião interna de um grupo político que irá enfrentar outro em uma convenção. Ou mesmo a reunião de um presidente com um membro de outro partido na qual haverá a sondagem para que este migre de partido.

No caso, por exemplo, do apontamento referente ao então presidente estadual da sigla, deputado federal Alceu Moreira, trata-se do pagamento feito ao restaurante onde houve reunião posteriormente a realização do Congresso Estadual do MDB-RS, ocorrido em 04 de dezembro de 2021. https://www.mdb-rs.org.br/?publicacao=congresso_estadual_mdb_lanca_plataforma_para_o_plano_de_governo-24657

Não há registros deste almoço tendo em vista que se tratou de reunião de lideranças.

Já no que tange ao ressarcimento feito à IGOR ROSA TAMBARA, presidente da associação de vereadores que foi parcialmente aceito e que está apontado em dois locais distintos da tabela anexa ao parecer conclusivo, não se compreende a razão do primeiro apontamento vez que o valor de R$116,00 ressarcido se refere ao total apresentado no relatório de prestação de contas de ressarcimento, anexo na mesma ID. a equipe técnica não refere a razão de apontar valor parcial que não é correspondente a uma nota específica mas, sim, à complementação de um ressarcimento feito relativamente a um relatório, que por equívoco, havia sido feito à menor valor.

Excelências, Igor é vereador da cidade de Jaguari e preside a Associação de Vereadores do MDB, além de ser membro da juventude de expressivo reconhecimento dentro do partido e, por esta razão, naquele período estava realizando diversos roteiros de mobilização tanto para o acampamento da juventude, evento tradicional deste núcleo partidário, quanto para o evento CAMINHOS DO RIO GRANDE, realizado pelo partido em diversas cidades mas, este apontamento refere-se exclusivamente à edição da cidade de alegrete, conforme matérias colacionadas juntamente aos comprovantes.

É de se dizer que a análise feita pela SAI, em que pese não seja analisado o mérito, é contraditória uma vez que por vezes entende o gasto como correto e por vezes não.

Esta agremiação concorda que alguns comprovantes estão um pouco apagados, mas todos eles estão descritos no relatório, com valor, data e descrição.

Os itens 4 a 15 são correspondentes a pagamentos de obrigações mensais feitos pelo partido. Frisa-se que não há como quitar a DARF com dois recursos diferentes.

Quanto aos itens 17 e 18¸ equivocadamente não foram anexados os documentos à resposta à diligência. Agora, pedindo máxima vênia, seguem em anexo planilha e documentos referentes ao fundo de caixa constituído.

O item 19 não se trata de hospedagem, mas, sim, como dito na resposta ao parecer, de locação de espaço para realização do evento CAMINHOS DO RIO GRANDE – EDIÇÃO SANTA MARIA-RS. https://www.mdb-rs.org.br/caminhosdoriogrande/06santamaria.html

 

Sobre os itens 1 e 2, a agremiação atesta, em síntese, consistirem em ressarcimentos de gastos de dirigentes partidários, que “geralmente é feito por roteiro e não individualmente por nota apresentada”.

Ocorre que tal expediente de ressarcimento cumulativo de despesas dificulta a discriminação de cada despesas e a fiscalização contábil, sendo, assim, possibilitado à Justiça Eleitoral reclamar provas adicionais para atestar a realização dos gastos e a vinculação às atividades partidárias, na forma do art. 21, § 6º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Ressalta-se, ainda, que o valor total de R$ 596,00 destinado a Alceu Moreira da Silva, conforme relatou o órgão técnico, não se compatibiliza com os documentos apresentados como suporte às alegações do partido político, em que registrado o gasto de R$ 420,00 por “refeições” (ID 45410879).

Quanto ao pagamento realizado para a conta bancária de Igor Rosa Tambara, no valor de R$ 116,90 (ID 45410959, fl. 01), trata-se de crédito em ressarcimento não refletido no conjunto de documentos envolvendo o roteiro de mobilização pela associação de vereadores (ID 45410959, fls. 02-10).

Assim, não apresentados documentos comprobatórios idôneos e suficientes para a comprovação das despesas, devem ser mantidas as glosas em questão.

Em relação aos valores pagos a título de multa, juros e/ou encargos, arrolados nos itens 4 a 15, o art. 17, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19 veda a utilização dos recursos do Fundo Partidário para “quitação de multas relativas a atos infracionais, ilícitos penais, administrativos ou eleitorais ou para a quitação de encargos decorrentes de inadimplência de pagamentos, tais como multa de mora, atualização monetária ou juros”.

A mera alegação de que a DARF não admite pagamento “com dois recursos diferentes” não é suficiente para afastar o preceito legal, pois, ainda que admitida tal circunstância, cumpriria ao partido manejar recursos não oriundos do Fundo Partidário para a quitação integral do título, privilegiando a obediência à norma.

A questão em exame já enfrentada por esta Corte no julgamento das contas partidárias do Diretório Estadual do MDB, relativamente ao exercício de 2019, em que mantida a glosa sobre os valores e não acolhido o argumento partidário de que “os valores vêm inclusos no boleto ou GRU ou DARF a serem pagos, sem possibilidade de pagamento em separado” (Prestação de Contas Anual n. 060008460/RS, Relatora: Desa. Kalin Cogo Rodrigues, Acórdão de 25.4.2023, DJE n. 75, data 02.5.2023).

Sobre o item 16, o partido político nada manifestou sobre os documentos comprobatórios emitidos em nomes de terceiros (ID 45411043).

No tangente aos itens 17, 18 e 19, embora o partido sustente a devida escrituração do fundo de caixa e descreva a suposta natureza dos gastos, as notas fiscais apresentadas estão apagadas ou ilegíveis, impedindo a verificação da regularidade no uso de recursos públicos, não tendo sido ofertados elementos adicionais de comprovação (ID 45410899, 45494817 e 45494818).

Destaca-se, aqui, que, nos termos do art. 29, § 4º, da Resolução TSE n. 23.604/19, a documentação relativa à prestação de contas deve permanecer sob a guarda e a responsabilidade do órgão partidário pelo prazo mínimo de 5 anos, o que pressupõe o encargo de preservar integridade e ilegibilidade dos documentos, o que não ocorreu na hipótese.

Dessa maneira, não tendo a agremiação apresentado argumentos e provas capazes de sanar as irregularidades relativas à comprovação de aplicação do Fundo Partidário, o montante de R$ 3.876,98 deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 58, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

 

3. Das Cominações Legais

O montante das irregularidades perpetradas alcança o valor de R$ 4.376,98 (R$ 500,00 + R$ 3.876,98), quantia que representa ínfimos 0,19% do total de recursos movimentados no exercício (R$ 2.311.252,10), percentual que permite a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para que as contas sejam aprovadas com ressalvas.

Uma vez aprovadas com ressalvas as contas, a jurisprudência desta Corte se posiciona no sentido de que não se aplica a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário (PC-PP n. 060020117, Relator Desembargador Eleitoral Afif Jorge Simoes Neto, Publicação: DJE, Tomo 150, em 17.8.2023; PCE n. 060019896, Relatora Desembargadora Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak. Publicação: DJE, Tomo 27, em 15.02.2023)

Da mesma forma, deve ser também afastada a imposição de multa, cabível apenas no caso de desaprovação, nos termos expressos do art. 37 da Lei n. 9.096/95. Nesse sentido, o julgamento da PC-PP n. 060010417, Relator Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Publicação: DJE de 15.8.2023.

Por outro lado, a aprovação com ressalvas não dispensa o partido político do recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, acrescidos de juros e correção monetária, que resulta de preceitos normativos específicos relacionados à utilização de recursos de fontes vedadas (art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19) e à ausência de comprovação da regularidade na aplicação de verbas do Fundo Partidário (art. 58, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19), independentemente do julgamento final de mérito das contas.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas do Diretório Estadual do MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO - MDB do Rio Grande do Sul, referentes ao exercício de 2021, com esteio no art. 45, inc. II, da Resolução TSE n. 23.604/19, e determino ao órgão partidário o recolhimento da quantia total de R$ 4.376,98 ao Tesouro Nacional, sendo: a) R$ 500,00 pela utilização de recursos de fonte vedada e b) R$ 3.876,98 em razão da ausência de comprovação dos gastos com verbas do Fundo Partidário.