REl - 0600101-82.2024.6.21.0121 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/09/2024 às 14:00

VOTO

A sentença indeferiu o pedido de registro de candidatura do recorrente em face da ausência de condição de elegibilidade afeta à falta de quitação eleitoral, devido à pendência de pagamento de multa fixada em processo de prestação de contas de campanha.

Com o recurso foi apresentado o comprovante de adimplemento do débito e, conforme certidões emitidas pela Seção de Partidos Políticos (SEPAR) e pela Secretaria de Orçamento e Finanças (SOF), a dívida foi quitada.

O recorrente afirma que o pagamento afasta a ausência de quitação, porque não foram esgotadas as instâncias ordinárias, e postula ao caso a aplicação do disposto no art. 11, § 10, da Lei n. 9.504/97, dos enunciados das Súmulas n. 43 e 50 do TSE e do entendimento firmado pelo Tribunal Superior Eleitoral no acórdão do AgR-RespEl 0600108-34.2020.6.10.0020 (Relator designado Ministro Edson Fachin, DJe de 24.3.2021):

Art. 11. Os partidos e coligações solicitarão à Justiça Eleitoral o registro de seus candidatos até as dezenove horas do dia 15 de agosto do ano em que se realizarem as eleições. (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

(...)

§ 10. As condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas no momento da formalização do pedido de registro da candidatura, ressalvadas as alterações, fáticas ou jurídicas, supervenientes ao registro que afastem a inelegibilidade. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

Súmula n. 43 do TSE:

As alterações fáticas ou jurídicas supervenientes ao registro que beneficiem o candidato, nos termos da parte final do art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/1997, também devem ser admitidas para as condições de elegibilidade.

 

Súmula n. 50 do TSE:

O pagamento da multa eleitoral pelo candidato ou a comprovação do cumprimento regular de seu parcelamento após o pedido de registro, mas antes do julgamento respectivo, afasta a ausência de quitação eleitoral.

 

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. VEREADOR. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CERTIDÃO DE QUITAÇÃO ELEITORAL. NÃO COMPARECIMENTO ÀS URNAS. PAGAMENTO DA MULTA ANTES DE ENCERRADA A INSTÂNCIA ORDINÁRIA. INTERPRETAÇÃO DA SÚMULA 50 DESTE TSE EM CONJUNTO COM O ART. 11, § 10º, DA LEI Nº 9.504/97. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 43 DESTE TSE. PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO. DEFERIMENTO DO REGISTRO DE CANDIDATURA.

1. A interpretação da Súmula nº 50 deste Tribunal Superior Eleitoral – O pagamento da multa eleitoral pelo candidato ou a comprovação do cumprimento regular de seu parcelamento após o pedido de registro, mas antes do julgamento respectivo, afasta a ausência de quitação eleitoral. – é de que o pagamento pode ocorrer antes do julgamento nas instâncias ordinárias, evitando–se regime jurídico mais gravoso do que o previsto no art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97.

2. O pagamento da multa eleitoral por ausência às urnas é fato jurídico apto a beneficiar o candidato e, portanto, deve ser analisado pelo prisma do art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97, conforme determinação da Súmula 43 deste Tribunal Superior Eleitoral.

3. Agravo interno provido para deferir o requerimento de registro de candidatura de Eunice Moreira Costa.

(TSE, Agravo Regimental No Recurso Especial Eleitoral 060010834/MA, Relator(a) Min. Edson Fachin, Acórdão de 11/03/2021, Publicado no(a) Diário de Justiça Eletrônico 53, data 24/03/2021)

 

A Procuradoria Regional Eleitoral, com fundamento em acórdãos do TSE dos anos de 2019 e 2020 envolvendo registros de candidatura de eleições gerais para os cargos de deputado estadual e federal, entende que o recurso não comporta provimento porque no presente processo de registro de candidatura o recorrente foi intimado para a juntada da prova da quitação e deixou transcorrer o prazo sem manifestação.

Segundo o órgão ministerial, “(…) admitir-se, injustificadamente, o pagamento e a comprovação da quitação eleitoral somente na fase recursal, após o requerente ter sido especificamente intimado para sanar a irregularidade no curso do procedimento em primeiro grau, equivale a desconsiderar a tramitação do processo na instância inicial, em detrimento à lealdade e boa-fé processual e inclusive à isonomia entre os candidatos, pois a regra é a juntada dos comprovantes com o pedido de registro” (ID 45683614, p. 2).

Contudo, os precedentes do TSE invocados pela Procuradoria Regional Eleitoral trataram de registros de candidatura relativos às eleições gerais, quanto aos quais da sentença cabe somente recurso dirigido ao TSE, que não se trata de instância ordinária.

Além disso, verifica-se que os julgados invocados pela Procuradoria Regional Eleitoral foram todos superados pelo acórdão paradigma trazido à colação pelo recorrente, da ano de 2021, em que houve debate específico da questão posta nos autos e da alegação ora trazida pelo Parquet pelo Tribunal Superior Eleitoral. No julgamento, foi firmada a diretriz jurisprudencial de que o pagamento da multa eleitoral após o pedido de registro pode ocorrer antes do julgamento nas instâncias ordinárias (AgR-RespEl n. 0600108-34.2020.6.10.0020, Relator designado Ministro Edson Fachin, DJe de 24.3.2021).

Conforme consta do acórdão, de um lado, o voto vencido do Ministro Mauro Campbell Marques desenvolveu o mesmo raciocínio da Procuradoria Regional Eleitoral, no sentido de negar o registro, uma vez que a parte foi regularmente citada e intimada para manifestar-se, deixou transcorrer in albis o prazo que lhe foi concedido e realizou o pagamento após a sentença.

Ao abrir a divergência, o voto condutor do Ministro Edson Fachin interpretou o disposto no art. 11, § 10, da Lei n. 9.504/97, em conjunto com o enunciado das Súmulas 43 e 50 do TSE, e afirmou que o adimplemento da multa eleitoral, após a sentença de 1º grau e antes do julgamento pelo Tribunal Regional Eleitoral, representa fato superveniente com aptidão para demonstrar o preenchimento da condição de quitação eleitoral, para fins de registro de candidatura, pois não esgotada a instância ordinária:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. VEREADOR. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CERTIDÃO DE QUITAÇÃO ELEITORAL. NÃO COMPARECIMENTO ÀS URNAS. PAGAMENTO DA MULTA ANTES DE ENCERRADA A INSTÂNCIA ORDINÁRIA. INTERPRETAÇÃO DA SÚMULA 50 DESTE TSE EM CONJUNTO COM O ART. 11, § 10º, DA LEI Nº 9.504/97. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 43 DESTE TSE. PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO. DEFERIMENTO DO REGISTRO DE CANDIDATURA.

1. A interpretação da Súmula nº 50 deste Tribunal Superior Eleitoral - O pagamento da multa eleitoral pelo candidato ou a comprovação do cumprimento regular de seu parcelamento após o pedido de registro, mas antes do julgamento respectivo, afasta a ausência de quitação eleitoral. - é de que o pagamento pode ocorrer antes do julgamento nas instâncias ordinárias, evitando-se regime jurídico mais gravoso do que o previsto no art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97.

2. O pagamento da multa eleitoral por ausência às urnas é fato jurídico apto a beneficiar o candidato e, portanto, deve ser analisado pelo prisma do art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97, conforme determinação da Súmula 43 deste Tribunal Superior Eleitoral.

3. Agravo interno provido para deferir o requerimento de registro de candidatura de Eunice Moreira Costa.

(TSE, AgR-RespEl 0600108-34, Relator designado Ministro Edson Fachin, Publicado em 24/03/2021)

 

Sublinho ainda que, ao acompanhar o voto condutor, o Ministro Alexandre de Moraes, em suas razões de decidir, asseverou que “a harmonização do teor das Súmulas 43 e 50 desta Corte Superior, somada à iterativa jurisprudência no sentido de que deve se prestigiar, o mais possível, a capacidade eleitoral passiva; e a constatação de que, indubitavelmente, o pagamento realizado 3 (três) dias após a sentença é, em si, fato superveniente que beneficia a candidata, a revelar superação do único óbice à quitação eleitoral, mister assentar nesta sede a efetiva presença da condição de elegibilidade, prestigiando a decisão da Corte Regional”.

Acrescento que, posteriormente ao AgR-RespEl n. 0600108-34, o TSE alargou ainda mais o prazo para juntar documentos afetos às condições de elegibilidade e às causas de inelegibilidade, nos autos do acórdão do recurso especial eleitoral REspEl n. 0600060-03.2020.6.09.0053 relativo a eleições municipais, assentando: “Os fatos supervenientes que tenham repercussão na elegibilidade de candidato podem ser conhecidos e apreciados em sede extraordinária, desde que constituídos até a data da diplomação” (Recurso Especial Eleitoral 060006003/GO, Relator(a) Min. Edson Fachin, Acórdão de 22.4.2021, Publicado no(a) Diário de Justiça Eletrônico 79, data 04.5.2021).

E o REspEl n. 0600060-03 tratou de caso muito mais grave, envolvendo causa de inelegibilidade decorrente de condenação por prática de abuso de poder econômico no âmbito de ação de investigação judicial eleitoral (AIJE). Naquele caso, igualmente no recurso, após todas as intimações, foi demonstrada a obtenção de medida liminar suspendendo os efeitos da decisão proferida na AIJE que lastreou o indeferimento do respectivo registro de candidatura.

No processo em apreço, a instância ordinária não foi esgotada, e deve ser considerado que a norma do art. 11, § 10, da Lei n. 9.504/97 quanto às alterações fáticas ou jurídicas supervenientes ao registro é largamente utilizada para permitir o registro em casos muito mais graves do que o presente, que tratam de causas de inelegibilidade.

Portanto, divirjo da Procuradoria Regional Eleitoral e entendo que a juntada do comprovante de adimplemento da multa com o recurso importa em fato superveniente capaz de atestar o requisito de quitação eleitoral para fins de registro de candidatura, consoante interpretação conjunta do art. 11, § 10, da Lei n. 9.504/97 com o enunciado das Súmulas 43 e 50, ambas do TSE, garantindo-se a máxima realização da capacidade passiva eleitoral do recorrente, decorrência direta de fundamento deste Estado Democrático de Direito, a cidadania.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso para reformar a sentença e deferir o requerimento de registro de candidatura de NELSON KLEIN para concorrer ao cargo de vereador.