PCE - 0603353-39.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/09/2024 às 14:00

VOTO

GECI TERESINHA MALLMANN, candidata não eleita ao cargo de deputada estadual, apresenta prestação de contas relativa às eleições de 2022.

Inicialmente, consigno que, após a emissão de parecer pela Procuradoria Regional Eleitoral e a conclusão dos autos para julgamento, a prestadora apresentou manifestação, acostando termo de cessão sobre uso de veículo e, posteriormente, juntando documento de propriedade do veículo objeto da cessão.

A despeito da intempestividade dos atos, tenho por admiti-los, na linha do entendimento desta Casa, porquanto dispensam diligências adicionais, sendo suficiente o exame primo ictu oculi, para aferir o aproveitamento ou não dos elementos de prova.

Ao caso propriamente dito.

Após exame inicial da contabilidade e intimação da candidata, sem aproveitamento, a Secretaria de Auditoria Interna – SAI, desta Corte, concluiu remanescer irregularidades referentes à comprovação de gastos realizados com verba do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

Especificamente, o órgão técnico apontou (1) irregularidade na comprovação dos gastos com pessoal e (2) despesas realizadas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia.

No concernente aos gastos com pessoal, destaco que a comprovação de tais despesas eleitorais deve ser realizada por meio de documentação que atenda aos requisitos específicos definidos no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…)

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

A unidade técnica relatou que os documentos para comprovação dos gastos com pessoal não apresentam a integralidade dos detalhes exigidos na legislação de regência, despesas estas que totalizam R$ 15.625,00 e estão apontadas na tabela que segue:

Saliento: há dois diferentes contratos de prestação de serviço em nome de Tiago Kolling Eckhardt, ambos para a atividade de coordenador de campanha no período de 16.8.2022 a 01.10.2022, nos valores de (1) R$ 9.100,00 e (2) R$ 6.525,00. Igualmente, constam comprovantes bancários com os respectivos registros no extrato bancário da conta FEFC de pagamentos nas quantias de R$ R$ 5.100, em 30.8.2022; R$ 4.000,00, em 26.8.2022; e R$ 6.525,00, em 26.9.2022, cujo beneficiário é o referido contratado.

Por ocasião da manifestação de ID 45526160, assim se pronunciou a prestadora:

No caso acima, cabe esclarecer que, por equívoco, foram realizados dois contratos com o mesmo objeto, mesma data e a mesma pessoa, apesar do ocorrido, essa foi a única contratação da candidata, o que passaremos a esclarecer:

No caso em tela, o contrato realizado com o Contratado Tiago Kolling Eckardt, para Coordenar a Campanha da Candidata foi o Contrato que totaliza o valor de R$ 9.100,00 (nove mil e cem reais), compreendendo todo o período eleitoral com abrangência no Vale do Taquari, Rio Pardo e Serra do Botucaraí.

Em relação ao contrato de valor R$ 6.525,00, (seis mil e vinte cinco reais), tem-se que o mesmo ocorreu para pagamento das despesas que o Contratado teria com a realização da prestação de serviços, visto que, em virtude da abrangência teve inúmeros deslocamentos, e despesas com alimentação, estadia, hospedagem etc...

Desta forma, ressaltamos que, o equívoco que causou a constatação das irregularidades pelo técnico que procedeu a análise da presente prestação de contas não teria ocorrido, caso tivessem descrito melhor as informações constantes no objeto, bem como fossem unificados os contratos descrevendo os valores que seriam pagos na integralidade e especificando o que compreenderiam esses valores.

Assim sendo, apesar da confusão ocasionada pelo erro no preenchimento dos contratos, foram juntados aos autos documentos que comprovam perfeitamente a origem do recurso, bem como a sua destinação final.

 

Pois bem.

Sob o prisma objetivo, o órgão técnico contábil destacou que nos referidos contratos “não foi especificado o objeto e execução do mencionado contrato de trabalho. Ausente também a abrangência da prestação do serviço, horas trabalhadas e justificativa do preço contratado”. Ademais, não se faz referência a local ou horário de trabalho em momento algum.

No ponto, alinho-me parcialmente ao d. Procurador Regional Eleitoral, que entende sanada a irregularidade, mediante as derradeiras explicações oferecidas pela prestadora, e considera suficientes os dados informados no contrato - somados aos esclarecimentos da candidata.

No entanto, julgo inviável relevar, entender regular a existência de dois contratos.

Explico.

A alegação de equívoco na formalização de dois contratos com idênticos objeto, período e pessoa não pode ter o condão de afastar a irregularidade, porque, por lógica, um dos dois documentos não espelha a realidade. Fossem complementares obviamente não consubstanciariam dois documentos diversos, mas sim estaria ou um ou outro na forma de adendo, de aditamento ao principal e tratando, forma exemplificativa, sobre um valor adicional a ser recebido. A tese do mero "equívoco" soa pouco verossímil sobretudo quando analisada sob o prisma do contratado, que certamente perceberia a suposta repetição, e sob a posição do responsável pela contratação: a presente campanha não envolveu equipe numerosa, certamente a sobreposição fora notada. 

Ademais, não há lastro probatório para a afirmação de que o contrato de menor valor (R$ 6.525,00) cobriu despesas de deslocamentos, alimentação e hospedagens, e o argumento soa contraditório com os próprios termos contratuais, pois há que se destacar a cláusula contratual quinta, a qual estabelece que as despesas de combustíveis ficam a cargo do CONTRATANTE – e sublinho que, além do pagamento realizado a Tiago, há gastos com combustível no valor de R$ 1.906,41.

Ainda, tenho como importante considerar a exigência de transparência na utilização de recursos públicos, bem como a coerência entre os valores pagos e os demais elementos das contas em análise e, nessa linha, causa estranheza a campanha investir R$ 15.625,00 em um coordenador (com a grande tolerância de considerar verossímeis os inusitados dois contratos – um para pagamento e outro para despesas) e ao mesmo tempo possuir apenas um militante para entrega de panfletos (ID 45231636).

Sublinho que o valor gasto com Tiago Kolling Eckhardt, a título de coordenador de campanha e suas despesas, representa 63,45% do total de recursos movimentados pela candidata, diga-se, um coordenador que teria "coordenado" apenas um cabo eleitoral. Bem destacou o Ilustre Procurador Regional Eleitoral no parecer de ID 45511294 ao referir que “os valores pagos para a atividade de coordenação de campanha são claramente incompatíveis com a dimensão da campanha da candidata, que se limita, além do pagamento de gráfica, combustível e contabilidade, à contratação de um cabo eleitoral.”

Ou seja, circunstâncias indiciárias um tanto nebulosas.

Contudo, na medida em que os esclarecimentos quanto aos aspectos objetivos estão sanados, entendo seja o caso de acolher um dos contratos como regular, de forma que reputo comprovado o gasto no valor de R$ 9.100,00 e irregular a despesa de R$ 6.525,00.

No que se refere ao segundo apontamento, o órgão técnico contábil destacou despesas realizadas com combustíveis sem a ocorrência das hipóteses previstas no art. 35, § 11, para os gastos na espécie:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26) :

(...)

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

A nota fiscal relativa ao gasto, emitida por COM DE COMB CODORNA EIRELI, aponta dois abastecimentos com gasolina comum, nas quantidades de 352,909 litros (R$ 1.669,26) e 61,381 litros (R$ 290,33), em total de R$ 1.959,59, valor que recebeu um desconto de R$ 53,18, (despesa final de R$ 1.906,41) em afronta à resolução de regência, pois não comprovou a utilização de veículos a serviço da campanha, carreatas ou geradores de energia.

Inicialmente, a prestadora trouxe esclarecimentos e termo de cessão de uso de veículo, a fim de elucidar o apontamento. Posteriormente, ingressou com o documento de propriedade do bem, mostrando-se regular a despesa.

Afasto este apontamento, diante da documentação apresentada.

A título de desfecho, indico que a irregularidade remanescente alcança o valor de R$ 6.525,00, que equivale a 26,49% do total de receitas declaradas (R$ 24.625,00), de modo a inviabilizar um juízo de aprovação com ressalvas mediante a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. A desaprovação impõe-se por si mesma.

Diante o exposto, VOTO pela desaprovação das contas de GECI TERESINHA MALLMANN e para determinar o recolhimento de R$ 6.525,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.