PCE - 0602712-51.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/09/2024 às 14:00

VOTO

Trata-se da prestação de contas apresentada por HELIOMAR ATHAYDES FRANCO, candidato não eleito ao cargo de deputado federal, relativamente à movimentação de recursos nas Eleições de 2022.

Inicialmente, registro que, após o parecer ministerial, o prestador de contas apresentou novos documentos, consistentes em nota fiscal, recibo de pagamento e contrato de prestação de serviços (ID 45617845).

Em tais contextos, este Tribunal tem mantido para o pleito de 2022 a jurisprudência quanto à possibilidade da apresentação intempestiva de documentos em processos de prestação de contas, mesmo após os pareceres técnicos e ministerial, desde que não acarrete prejuízo à tramitação e que, com a simples leitura, seja possível sanar as irregularidades, consoante ilustram as seguintes ementas:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. ALEGADA EXISTÊNCIA DE DÚVIDA, OMISSÃO E OBSCURIDADE NO ACÓRDÃO. REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. NÃO CONHECIDA PRESTAÇÃO DE CONTAS RETIFICADORA. APRECIAÇÃO DOS DOCUMENTOS JUNTADOS APÓS O PARECER DA PRE. AGREGADO FUNDAMENTO À DECISÃO RECORRIDA. PREQUESTIONAMENTO. MANTIDA A DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS E O RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. ACOLHIMENTO PARCIAL. [...]. Contudo, em relação aos documentos juntados antes do julgamento, cabível seu conhecimento, embora dentro dos limites de cognição daquela fase processual. Efetivamente, este Tribunal tem firme jurisprudência no sentido da possibilidade de apresentação intempestiva de documentos em processos de prestação de contas, após a emissão dos pareceres técnico e ministerial, desde que não acarrete prejuízo à tramitação e que sua simples leitura possa sanar a irregularidade. Portanto, se a documentação não demanda nova análise técnico–contábil e a reabertura da instrução, os documentos intempestivos podem ser conhecidos, desde que apreciáveis primo icto oculi e que sejam fidedignos, trazendo juízo de certeza e segurança quanto à comprovação de despesas. Acolhido o recurso neste ponto, a fim de que os documentos juntados pela candidata após o parecer da PRE sejam apreciados. [...].

(TRE-RS - PCE: 0603283-22.2022.6.21.0000 PORTO ALEGRE - RS 060328322, Relator: Luiz Mello Guimaraes, Data de Julgamento: 22/01/2024, Data de Publicação: DJE-13, data 24/01/2024)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. SEGUNDA SUPLENTE. DEPUTADA FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS PÚBLICOS. FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. JUNTADOS DOCUMENTOS E ESCLARECIMENTOS. SUPERADOS OS APONTAMENTOS. REGULARIDADE DAS CONTAS DE CAMPANHA. APROVAÇÃO. 1. Prestação de contas apresentada por candidata eleita segunda suplente ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022. 2. Conhecidos os esclarecimentos e documentos juntados, aptos a sanar as irregularidades sem a necessidade de nova análise técnica ou de outras diligências. Superados os apontamentos referentes à comprovação de gastos efetuados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. Declarada a regularidade das contas de campanha. 3. Aprovação.

(TRE-RS - PCE: 06030623920226210000 PORTO ALEGRE - RS, Relator: Des. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Data de Julgamento: 05/12/2022, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 259, Data: 07/12/2022) (Grifei.)

 

Assim, conheço dos documentos acostados após o parecer ministerial cujo conhecimento dispensa análise técnica e novas diligências.

Isso posto, passo à análise das irregularidades mantidas pelo órgão técnico após a emissão de parecer conclusivo (ID 45529454) e do relatório de complementação ao exame das contas em razão de novos documentos acostados pelo candidato (ID 45580905).

 

1. Da Omissão de Despesas Eleitorais

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI) deste Tribunal apontou a existência de diversas despesas eleitorais não declaradas nas contas, para as quais houve emissão de nota fiscal eletrônica para o CNPJ de campanha, nos seguintes termos (ID 45580905):

3.1. No item 3.1 do Parecer Conclusivo (ID 45529454) foi apontado que houve a identificação de omissões relativas às despesas constantes da prestação de contas em exame e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, obtidas mediante confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais, revelando indícios de omissão de gastos eleitorais, infringindo o que dispõe o art. 53, I, g, da Resolução TSE n. 23.607/2019, no valor total de R$ 5.863,63.

[...].

Em sua defesa, o candidato atesta que providenciou o estorno dos documentos, uma vez que ultrapassado o prazo legal de sete dias para o cancelamento, afirmando que (ID 45617846):

A nota fiscal no valor de R$ 624,00 (seiscentos e vinte e quatro reais), foi devidamente estornada pelo fornecedor IBM INDUSTRIA DE FARDAMENTOS MILITARES EIRELI, conforme consta no ID 45567016.

A nota fiscal no valor de R$ 5.024,60(cinco mil e vinte e quatro reais e sessenta centavos), foi devidamente estornada pelo fornecedor RESTAURANTE MODELO MANCHES LTDA, conforme consta no ID 45567017.

As demais notas fiscais que somam R$ 215,03 (duzentos e quinze reais e três centavos) não foram possíveis encontrar os fornecedores, tampouco não foram pagas com recursos provenientes das contas de campanha, conforme demonstra os extratos das contas.

[...].

Ademais, aproveitando juntamos ainda imagem da tela do sistema SEFAZ/RS que não permite ao emissor da Nota Fiscal Eletrônica efetuar o cancelamento da mesma. (DOC. 01)

 

Entretanto, conforme bem assinalou o órgão técnico: “constata-se que não foi observado o previsto na Instrução Normativa n. 98/11, visto que os documentos fiscais apresentados (IDs 45567016 e 45567017) são de natureza da operação ‘devolução de mercadoria’ e ‘devolução de venda’, respectivamente, e não ‘999 - Estorno de NF-e não cancelada no prazo legal’, o qual é utilizado para fins de ajuste” (ID 45580905, fl. 02).

Com efeito, a existência dos documentos fiscais contra o número de CNPJ do candidato, ausente provas do efetivo cancelamento, retificação ou estorno, tem o condão de caracterizar a omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Esta Corte já assentou, a respeito de emissão de notas fiscais com a anotação alegadamente equivocada do CNPJ da campanha, que “o procedimento correto para regularizar a situação seria a candidata buscar o cancelamento das notas junto ao estabelecimento comercial, tal como dispõem os arts. 59 e 92, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19” (REl n. 0600485-67.2020.6.21.0062, Relator: Des. Eleitoral Amadeo Henrique Ramella Buttelli, julgado em 23.9.2021).

Para afastar a irregularidade em tela, cumpriria ao prestador de contas buscar o oportuno cancelamento da nota fiscal ou, se ultrapassado o prazo para tal providência, realizar o “estorno” do documento fiscal, nos termos referidos pelo órgão técnico de análise.

Na hipótese, o candidato registrou a mera “devolução” de camisetas e de gêneros alimentícios após as eleições, o que não se mostra compatível com a realidade fática das contas, pois não é razoável a mera restituição de tais produtos ao fornecedor sem maiores esclarecimentos quanto aos seus estados de conservação ou efetivo emprego em campanha.

Além disso, a providência não se compatibiliza com o art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19, consoante o qual “o cancelamento de documentos fiscais deve observar o disposto na legislação tributária, sob pena de ser considerado irregular”.

Justamente, o prestador de contas não atendeu aos comandos da Resolução TSE n. 23.607/19 e da legislação tributária para efetivar o devido estorno dos documentos fiscais.

Em relação às demais operações, o candidato limitou-se a atestar que não reconhece as despesas e que não localizou os respectivos fornecedores, alegação insuficiente para afastar a presunção de realização do gasto eleitoral.

Nessa linha, o TSE entende que “gastos não declarados que tenham sido informados por fornecedores por meio do Sistema de Registro de Informações Voluntárias, e/ou constem de notas fiscais oriundas das Secretarias das Fazendas Estaduais e Municipais, (...) constituem omissão de despesas” (TSE; Prestação de Contas n. 97795, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, DJE, Tomo 241, Data: 16.12.2019, p. 73).

Além disso, as despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos gastos de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal do prestador de contas, caracterizando o recurso como de origem não identificada.

Nesse sentido, cito o seguinte precedente desta Corte:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. VEREADORA. OMISSÃO DE GASTOS ELEITORAIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. SAQUE ELETRÔNICO DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. CONFIABILIDADE CONTÁBIL. MACULADA. RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. RECOLHIMENTO DOS VALORES AO TESOURO NACIONAL. VALOR NOMINAL DAS IRREGULARIDADES. DIMINUTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO. PROVIMENTO PARCIAL. (...). 2. Detectadas 07 (sete) notas fiscais emitidas contra o CNPJ de campanha, sem que os recursos para quitação da despesa tenham transitado pelas contas bancárias da candidata, indicando omissão de gasto eleitoral. Os gastos não contabilizados afrontam o art. 53, inc. I, als. “g” e “i”, da Resolução TSE n. 23.607/19. Nesse trilhar, a Corte Superior entende que a omissão em tela viola as regras de regência e macula a confiabilidade do ajuste contábil. 3. As despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação da dívida de campanha, cujo trânsito ocorreu de modo paralelo à contabilidade formal da candidata, caracterizando o recurso como de origem não identificada, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19. (...).

(TRE-RS - RE: 06006545520206210094 IRAÍ/RS 060065455, Relator: DES. ELEITORAL FRANCISCO JOSÉ MOESCH, Data de Julgamento: 03/02/2022) (Grifei.)

 

Assim, está caracterizada a irregularidade, e a quantia de R$ 5.863,63 deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, na forma prescrita pelo art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

2. Das Dívidas de Campanha

O órgão técnico verificou, ainda, a existência de dívidas de campanha não assumidas pelo partido político, conforme o seguinte apontamento (ID 45580905):

3.2. No item 3.2 do Parecer Conclusivo (ID 45529454) foi apontado que há dívidas de campanha declaradas na prestação de contas decorrentes do não pagamento de despesas contraídas na campanha, no montante de R$ 2.500,00, não tendo sido apresentado(s) o(s) seguinte(s) documento(s), conforme dispõe o art.33, §§ 2° e 3°, da Resolução TSE nº 23.607/2019:

» autorização do órgão nacional para assunção da dívida pelo órgão partidário da respectiva circunscrição;

» acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência do credor; (termo ID 45276141 sem assinatura de todas as partes)

» cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo e

» indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

 

De seu turno, o candidato assevera que quitou os valores devidos com recursos pessoais, recibo particular de pagamento emitido por Mattos e Manini Advogados (ID 45617848).

Ocorre que a assunção da dívida pelo partido político é condição que viabiliza a continuidade da fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral em relação aos pagamentos realizados após o encerramento da campanha.

Assim, a despeito da providência, está caracterizada a irregularidade por descumprimento do art. 33, §§ 1º a 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19, uma vez que as despesas não foram integralmente quitadas até o prazo de entrega das contas e não se comprovou a assunção das dívidas remanescentes pelo órgão partidário.

Apesar da irregularidade, não deve ser comandado o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

De acordo com o entendimento assentado na jurisprudência, as dívidas de campanha consistem em categoria com regulamentação específica, que não prevê o recolhimento de valores em caso de infringência, restringindo-se o art. 34 da Resolução TSE n. 23.607/19 a estabelecer a possibilidade de desaprovação das contas:

Art. 34. A existência de débitos de campanha não assumidos pelo partido, na forma prevista no § 3º do art. 33 desta Resolução, será aferida na oportunidade do julgamento da prestação de contas da candidata ou do candidato e poderá ser considerada motivo para sua rejeição.

 

Nesse sentido, destaco recentes julgados do TSE:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DESAPROVAÇÃO NA INSTÂNCIA DE ORIGEM. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE PRESENTES. AGRAVO PROVIDO. DÍVIDA DE CAMPANHA. ASSUNÇÃO PELO PARTIDO. IRREGULARIDADE NO PROCEDIMENTO. EQUIPARAÇÃO A RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE RESPALDO NORMATIVO. PRECEDENTE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.1. Hipótese em que o TRE/SP, por unanimidade, desaprovou as contas de campanha de candidata ao cargo de deputado federal nas eleições de 2018, devido à existência de dívida de campanha assumida pelo partido, mas cujo procedimento estava em desacordo com o previsto no art. 35, § 3º, da Res.–TSE nº 23.553/2017.2. Agravo conhecido e provido, porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade do recurso especial. 3. Não há "[...] respaldo normativo para determinar o recolhimento de dívida de campanha ao Tesouro Nacional como se de recursos de origem não identificada se tratasse" (REspEl nº 0601205–46/MS, rel. designado Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 8.2.2022, DJe de 30.3.2022).4. Recurso especial parcialmente provido tão somente para afastar a determinação de devolução de R$ 4.048,00 ao Tesouro Nacional, mantida a desaprovação das contas.

(AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060851176, Acórdão, Relator: Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 175, Data: 09/09/2022) (Grifei.)

 

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPUTADO ESTADUAL. ELEIÇÕES 2018. DESAPROVAÇÃO. OMISSÃO DE DESPESAS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. IRREGULARIDADE GRAVE. SÚMULA 24/TSE. IRREGULARIDADES. PERCENTUAL E VALOR ABSOLUTO ELEVADOS. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. INAPLICÁVEIS. DÍVIDA DE CAMPANHA. RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. NÃO CABIMENTO. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RESTITUÍDO. PARCIAL PROVIMENTO. (...). 7. Este Tribunal, no julgamento do REspEl 0601205–46/MS, sessão de 8/2/2022, redator para acórdão Min. Luís Roberto Barroso, decidiu ser incabível determinar–se o recolhimento ao erário dos valores de dívida de campanha não paga, por inexistir respaldo normativo para se presumir que o débito será pago em momento futuro com recursos de origem não identificada. 8. Desse modo, impõe–se descontar do valor a ser recolhido ao Erário, fixado em R$ 70.324,67 pelo TRE/SP, a quantia de R$ 48.105,80, que, de acordo com o aresto regional, corresponde a dívida de campanha não quitada. (…).

(TSE - REspEl: 06053401420186260000 SÃO PAULO - SP, Relator: Min. Benedito Gonçalves, Data de Julgamento: 10/03/2022, Data de Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 55) (Grifei.)

 

Com essas considerações, reconheço a irregularidade em questão, na quantia de R$ 2.500,00, porém julgo incabível a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, ante a ausência de previsão normativa expressa, na linha do posicionamento do TSE.

 

3. Da Comprovação dos Gastos com Recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC

No item 4.1.1 do parecer conclusivo, o órgão técnico relacionou despesas pagas com recursos do FEFC, em favor de Hitler Kleber Perderssetti, não lastreadas em contratos ou notas fiscais, assim discriminadas (ID 45580905):

O prestador de contas pagou integralmente ao fornecedor o valor de R$ 9.500,00 referente a 46 dias de trabalho. No entanto, o contrato foi rescindido e o valor referente aos dias não trabalhados não foi reavido. Assim, por não comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, considera-se irregular o montante de R$ 4.130,43, passível de devolução ao Tesouro Nacional, conforme o art. 79, §1º da Resolução TSE 23.607/2019.

 

De acordo com a manifestação do candidato, “o prestador de serviços HITLER KLEBER PEDERSSETTI teve rescindido seu contrato de Administrador Financeiro, porém o mesmo continuou prestando serviços de administração das mídias sociais, no período 12 de setembro a 01 de outubro de 2022, conforme contrato em anexo DOC. 03, onde recebeu o valor de R$ 4.130,43 pelo serviço prestado” (ID 45617846).

Como prova da alegação, está juntado contrato com o prestador de serviços, cujo objeto é “a prestação de serviços em Mídias Sociais, que compreende administração da imagem do candidato no facebook, tik tok e site do candidato” (ID 45617849

Contudo, apesar da irregularidade em tela já ter sido apontada pelo órgão técnico desde o primeiro relatório de exame de contas, juntado aos autos em 14.7.2023 (ID 45511347) e repisada no parecer conclusivo de 14.8.2023 (ID 45529454), não são esclarecidos os motivos pelos quais o prestador de contas somente apresentou contrato em questão no dia 20.3.2024, ou seja, após o exame complementar dos documentos extemporaneamente apresentados (ID 45580905).

Não bastasse a injustificada demora no oferecimento da alegação e do instrumento contratual, a operação financeira não se harmoniza com as demais informações originalmente registradas nos demonstrativos contábeis.

Veja-se que os Recibos de Pagamentos a Autônomo (RPAs) emitidos em relação à despesa, que abarcam a totalidade dos valores entregues ao fornecedor, consignam apenas pagamento em razão de serviços de “gestor financeiro de campanha” (ID 45276236, de R$ 2.500,00, e ID 45276190, de R$ 7.000,00), nada mencionando sobre supostos serviços em mídias sociais.

Da mesma maneira, no Relatório de Despesas Efetuadas, os pagamentos em favor de Hitler Kleber Pederssetti têm por objeto exclusivamente a função de “gestor financeiro de campanha”, não existindo contabilização de serviços de administração de redes sociais (ID 45276161).

A própria forma como ocorreram os pagamentos e a emissão das RPAs, em dois créditos de R$ 2.500,00 e de R$ 7.000,00, afigura-se incongruente com a suposta realização de contratos sucessivos com diferentes objetos pelos quais teriam sido pagos R$ 5.369,57 pela gestão financeira de campanha e R$ 4.130,43 pela administração de imagem em redes sociais.

Desse modo, o conjunto de elementos postos nos autos não corrobora com a contemporaneidade do contrato em relação à campanha e à efetiva prestação dos serviços, razão pela qual o documento não se apresenta idôneo para o saneamento da irregularidade.

Assim, ausente documento hábil para comprovar a integralidade das quantias despendidas com o fornecedor em questão, contrariando o que dispõem os arts. 35, 53, inc. II, al. “c”, e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, deve ser reconhecida a ausência de comprovação de parcela dos gastos efetuados com Hitler Kleber Pederssetti com recursos do FEFC, na quantia de R$ 4.130,43, a ser restituída ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da citada Resolução.

 

4. Das Despesas com Impulsionamento de Conteúdos na Internet Pagas com Recursos do FEFC

Sobre a última irregularidade envolvendo o uso de recursos do FEFC, o órgão técnico considerou “não comprovado por documento fiscal hábil o valor de R$ 2.639,42 (a diferença entre o total pago e as notas emitidas pelo fornecedor)”, uma vez que foram creditados o total de R$ 40.000,00 ao Facebook Ltda., mas emitidas notas fiscais que comprovam apenas R$ 37.360,58 em serviços efetivamente realizados.

Portanto, o candidato encerrou sua campanha com créditos não utilizados junto ao Facebook Ltda., no valor de R$ 2.639,42, oriundos de recursos do FEFC, os quais deveriam ter sido devolvidos pela empresa fornecedora, pois não houve contraprestação de serviços, e, então, restituídos ao Tesouro Nacional, consoante prevê o art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em sua manifestação, o prestador de contas alega que houve erro na emissão das notas fiscais, posteriormente corrigidos pela empresa emissora, asseverando o seguinte (ID 45617846):

Ocorre que a nota fiscal apresentada no ID 45567490 está incompleta, houve um erro na emissão do Facebook Serviços Online do Brasil, pois a nota fiscal apresenta o valor de R$ 2.999,97, que foi corrigido na nota fiscal emitida posteriormente, (DOC. 04), com o valor correto de R$ 5.856,28.

Sendo assim os valores gastos com as três (03) notas fiscais emitidas pela Empresa Facebook Serviços Online do Brasil são de, respectivamente:

Nota fiscal emitida em setembro de 2022, referente aos gastos realizados com impulsionamentos no mês de agosto/22, foi no valor de R$ 2.379,41. ID 45567488

Nota fiscal emitida em outubro de 2022, referente aos gastos realizados com impulsionamentos no mês de setembro/22, foi no valor de R$ 31.981,20. ID 45567489

Nota fiscal emitida em novembro de 2022, referente aos gastos realizados com impulsionamentos no mês de outubro/22, foi no valor de R$ 5.856,28. (DOC.04)

Estas três notas fiscais totalizam o valor de R$ 40.216,89 (quarenta mil duzentos e dezesseis reais e oitenta e nove centavos).

Por fim, cabe informar que a diferença de R$ 216,89 (duzentos e dezesseis reais e oitenta e nove centavos) é oriundo dos impulsionamentos de pré-campanha do candidato, datados do início do mês de agosto, conforme descrição do extrato fornecido pela empresa Facebook (ID 45567487) abaixo:

[...].

Sendo assim, aproveitamos este momento para juntar a nota fiscal eletrônica CORRETA (DOC.04) emitida pela Empresa Facebook, e também reforçar que no ID 45567487, consta o extrato de todos os gastos realizados em nome do prestador de contas com a empresa FACEBOOK e sanear o apontamento de irregularidade apurado no parecer conclusivo.

 

A prova acostada pelo candidato consiste na Nota Fiscal n. 52383782, emitida em 02.11.2022, no valor de R$ 5.856,28, que discrimina os serviços prestados como “conjunto de pedidos de inserção de anúncios na internet durante o mês de outubro” e, no campo “Outras Informações”, consigna “(2) Esta NFS-e substituti o RPS Nº 51819703 Série C, emitido em 31/10/2022; (3) NFS-e quitada em 10/11/2022” (ID 45617850).

Por sua vez, as notas fiscais consideradas pelo órgão técnico no exame de contas são (ID 45580905, fl. 5-6):

- Nº 49521363, no valor de R$ 2.379,41, emitida em 02.09.2022 (ID 45567488);

- Nº 50668644, no valor de R$ 31.981,20, emitida em 02.10.2022 (ID 45567489); e

- Nº 22832185, no valor de R$ 2.999,97, emitida em 03.11.2020 (ID 45567490).

Ocorre que essa última nota fiscal, sob o n. 22832185, no valor de R$ 2.999,97, foi expedida no ano de 2020, para “ELEIÇAO 2020 HELIOMAR ATHAYDES FRANCO PREFEITO”, contra o CNPJ n. 38.678.055/0001-28 (ID 45567490), ou seja, o documento refere-se aos gastos do candidato no pleito de 2020, e não à disputa para o cargo de deputado federal em 2022.

Por óbvio, o documento relacionado à campanha de 2020 não pode ser avaliado nas contas do pleito de 2022, razão pela qual o exame deve considerar a Nota Fiscal n. 52383782, emitida em 02.11.2022, no valor de R$ 5.856,28 (ID 45617850).

Assim, o total de serviços prestados pelo Facebook Ltda. e comprovados por documentos fiscais alcança o somatório de R$ 40.216,89 (R$ 2.379,41 + R$ 31.981,20 + R$ 5.856,28), superando em R$ 216,89 o montante pago ao fornecedor.

Quanto ao ponto, o candidato alegou que a quantia excedente envolveu impulsionamentos de conteúdo realizados durante a pré-campanha.

Porém, o lançamento de nota fiscal eletrônica contra o CNPJ de campanha atrai a presunção de realização de gasto de natureza eleitoral.

Se os gastos não ocorreram no período de campanha ou o prestador não reconhece as despesas, as notas fiscais deveriam ter sido canceladas junto aos estabelecimentos emissores, consoante os procedimentos previstos no art. 92, §§ 5º e 6°, da Resolução TSE n. 23.607/19, o que não se observou no caso em exame.

Conclui-se, assim, que pagamento de R$ 216,89 por serviços à campanha eleitoral ocorreu externamente à contabilidade formal do prestador de contas, caracterizando o recurso como de origem não identificada e impondo o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional, na forma prescrita pelo art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Do Julgamento das Contas

O valor total das irregularidades apuradas nos autos alcança R$ 12.710,95 (item 1: R$ 5.863,63 + item 2: R$ 2.500,00 + item 3: R$ 4.130,43 + item 4: R$ 216,89), que representa 4,21% do montante arrecadado (R$ 301.800,00), de maneira a viabilizar a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas, na esteira do entendimento do TSE (RESPE n. 0603559-17/MG, Relator: Min. Edson Fachin, Data de Julgamento: 26.5.2020, DJE de 04.6.2020).

Ainda, deve ser comandada ao prestador de contas o recolhimento do montante total de R$ 10.210,95 ao Tesouro Nacional, dos quais a quantia de R$ 6.080,52 refere-se ao uso de recursos de origem não identificada (art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19) e o montante de R$ 4.130,43 envolve a ausência de comprovação dos gastos com recursos do FEFC (art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas de HELIOMAR ATHAYDES FRANCO, nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, e pela determinação do recolhimento de R$ 10.210,95 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.