REl - 0600021-06.2024.6.21.0029 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/08/2024 00:00 a 23:59

VOTO 

Conforme já consignado no relatório, trata-se de recurso eleitoral oriundo do Município de CRUZEIRO DO SUL, interposto por UBIRAJARA DA SILVA MARQUES em face da sentença proferida pelo Juízo da 029ª Zona Eleitoral que, ao dar pela procedência da representação intentada pelo Ministério Público, condenou-o por abuso de poder econômico ao pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), com base no § 3º do art. 36 da Lei n. 9.504/97.

 

1. Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos processuais, razão pela qual dele conheço.

 

2. Mérito

Eminentes colegas:

Adianto assistir razão, na minha compreensão, ao douto Procurador Regional Eleitoral ao opinar, neste grau de jurisdição, pela extinção do feito sem resolução de mérito.

Com efeito, ao protocolar a inicial no dia 08.5.2024, o representante – na condição de Promotor Eleitoral na 29ª Zona – solicitou a abertura de investigação judicial eleitoral, nos termos do art. 22, caput, da Lei Complementar n. 64/90, procedimento que resultou no ulterior ajuizamento da da Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), cuja inicial, entretanto, foi recebida como representação, conforme decisão estampada no ID 45655839.

E quanto a tal aspecto, importa registrar que no âmbito do Direito Processual Eleitoral deve ser observada a aplicação do princípio da tipicidade das ações eleitorais, as quais são delineadas em numerus clausus, cada uma possuindo suas especificidades em termos de procedimento, prazos, forma e legitimidade. Vale dizer, o processamento das demandas aforadas junto a esta justiça especializada deve pautar-se, estritamente, pelo princípio da legalidade.

O calendário eleitoral, por seu turno, impõe a observância rigorosa das datas estipuladas, o que exige que os atos processuais e as ferramentas destinadas ao controle da validade desses atos sejam realizados no momento apropriado, sob pena de comprometimento do processo subsequente.

Dessa forma, inadmissível o ajuizamento de uma ação de investigação judicial eleitoral antes do prazo para a escolha de candidatos em convenções partidárias e do requerimento de registro de candidatura.

Nesse sentido, a jurisprudência do egrégio TSE, trazida à colação pelo ilustre Procurador Regional Eleitoral, cuja ementa, pela pertinência, a seguir transcrevo:

DIREITO ELEITORAL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER. ART. 74 DA LEI Nº 9.504/1997. AJUIZAMENTO ANTERIOR AO REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 30/TSE. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno contra decisão monocrática que negou seguimento a recurso especial eleitoral, mantendo o acórdão regional que julgou a AIJE extinta sem resolução do mérito, com fundamento no art. 485, VI, do CPC/2015, porquanto ajuizada antes do prazo para escolha de candidatos em convenções partidárias e do requerimento do registro de candidatura.

2. O entendimento predominante desta Corte Superior é no sentido de que as ações de investigação judicial eleitoral somente podem ser ajuizadas após o período do registro de candidatura, ainda que para apuração de atos abusivos anteriores àquele período, não se fazendo qualquer distinção sobre o tipo de abuso.

3. Uma vez que a presente AIJE foi ajuizada antes mesmo do prazo para a escolha de candidatos em convenção partidária, alinha-se a decisão regional com o entendimento deste Tribunal Superior sobre a matéria. Incide, na espécie, a Súmula nº 30/TSE.

4. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgR no REspe nº 0600361-64.2018.6.06.0000/CE, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, Sessão de 7.10.2021.)

(Sem grifos no original)

Sob essa ótica, inexiste fundamento processual para que se proponha uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) antes do registro de candidatura. Isso porque, sem que esteja em questão a análise de um possível benefício em favor de alguém já reconhecido como candidato, o propósito da AIJE, que é zelar pela moralidade e legitimidade das eleições, resta esvaziado.

Logo, sem a definição dos candidatos que disputarão o pleito, impossível medir, avaliar ou deduzir interferências no processo eleitoral.

Ademais, a AIJE e as representações baseadas na Lei n. 9.504/97 têm prazos processuais distintos, inclusive os recursais.

Outrossim, no caso de candidatos a prefeito, a AIJE deve ser proposta também contra o respectivo vice, constituindo-se, portanto, em litisconsórcio passivo necessário, em virtude do princípio da indivisibilidade da chapa.

Como bem salientou o douto Procurador Regional Eleitoral, em que pese “a demonstração de que o Representado ocupava cargo público não altere a conclusão deste parecer, tal fato é relevante para a análise do caso, podendo levar a um novo enquadramento jurídico em virtude das restrições aplicáveis aos agentes públicos no período pré-eleitoral”.

Do mesmo douto Parecer, ainda, vale ser destacada a ressalva posta pelo ínclito Parecerista ao alertar para a importância de ser destacado “que a eventual extinção desta ação não impede que, em momento oportuno, após o registro de candidatura, seja renovada a pretensão de responsabilização do Representado pelo fato objeto deste processo, ou seja, possível abuso de poder econômico cometido antes do registro de candidatura.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela extinção do feito, sem resolução de mérito, em virtude da ausência de interesse processual, conforme disposto no art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil. E, via de consequência, resta insubsistente a pena de multa aplicada ao recorrente.