REl - 0600013-12.2023.6.21.0046 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/08/2024 00:00 a 23:59

VOTO

O DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO – PTB de Santo Antônio da Patrulha recorre da sentença que aprovou suas contas com ressalvas, relativas ao exercício financeiro do ano de 2022, em razão de recebimento de verbas de fonte vedada. A decisão hostilizada determinou o recolhimento da quantia de R$ 3.403,03 (três mil quatrocentos e três reais e três centavos) ao Tesouro Nacional.

No caso dos autos, a unidade contábil da origem verificou o recebimento de contribuições de pessoas físicas não filiadas ao partido político em exame, as quais exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2022, em afronta à vedação prevista no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, regulamentado pelo Tribunal Superior Eleitoral na Resolução TSE n. 23.604/19, inc. IV e § 1º:

Lei 9.096/1995:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de: (…)

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

 

Resolução TSE n. 23.604/2019:

Das Fontes Vedadas

Art. 12. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

IV - autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se autoridades públicas, para fins do inciso IV do caput, pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

(…)

 

Os doadores, todos vinculados à Prefeitura de Santo Antônio da Patrulha, cargos, doações e datas das contribuições estão discriminados na tabela que segue:

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 170,00

11/01/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 170,00

03/02/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

02/03/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

31/03/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

29/04/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

02/06/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

30/06/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

29/07/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

31/08/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

30/09/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

31/10/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

30/11/22

SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH

Diretor de Departamento CC

R$ 190,00

29/12/22

CÁSSIA FRAIBERGER PANZENHAGEN

Coordenador de Setor CC

R$ 96,00

11/01/22

CÁSSIA FRAIBERGER PANZENHAGEN

Coordenador de Setor CC

R$ 100,00

02/02/22

CÁSSIA FRAIBERGER PANZENHAGEN

Coordenador de Setor CC

R$ 110,00

02/03/22

CÁSSIA FRAIBERGER PANZENHAGEN

Coordenador de Setor CC

R$ 116,75

01/04/22

CÁSSIA FRAIBERGER PANZENHAGEN

Coordenador de Setor CC

R$ 116,75

29/04/22

CÁSSIA FRAIBERGER PANZENHAGEN

Coordenador de Setor CC

R$ 109,64

01/06/22

CÁSSIA FRAIBERGER PANZENHAGEN

Coordenador de Setor CC

R$ 123,89

30/06/22

BRUNO BARCELOS DA SILVA

Coordenador de Setor CC

R$ 200,00

21/07/22

 

Ao exame propriamente dito.

Friso que a agremiação deixa de referir o doador BRUNO BARCELOS DA SILVA e, no concernente às contribuintes SUELEN BRAGA DE ANDRADE KALTBACH e CÁSSIA FRAIBERGER PANZENHAGEN, assim argumenta:

(…)

7. Em análise a relação de contribuintes apontados como de recursos de fontes vedadas é necessário ressaltar que tanto a doadora SUELEN, CPF 007.594.520-75, como a doadora CASSIA, CPF 028.277.900-58, são filiadas do partido, com ficha de Filiação assinada no dia 04 de janeiro de 2022, conforme cópia documentos juntados com o ID 121043214 , abonadas naquela oportunidade pelo vereador JORGE ELOY DE OLIVEIRA .

8. Ocorre, que como a Comissão Provisória do Partido restou com vigência finda em 05 de abril de 2022, ou seja, cerca de três meses após o acolhimento das filiações , tratando-se de diretório com modesta estrutura, sem funcionário ou contador efetivo, quando buscou promover o registro dos filiados no sistema FILIAWEB do TSE não obteve êxito dado o registro de inatividade do partido, o que vedava a partir daquela data o ACESSO com senha e login do dirigente partidário autorizado;

9. E a regularização do diretório, assim como a impostação de nova SENHA dependia da autenticação e liberação pelo Administrador do Diretório Estadual, que igualmente em decorrência dos problemas enfrentados à nível Nacional com a sigla e seu então Presidente, Roberto Jeferson, que em sequência hierárquica, era quem liberava a senha para o Diretório Regional, não foi possível obter a regularização do Diretório Municipal perante a Justiça Eleitoral e, por consequência, registrar os referidos filiados. É de se ressaltar que também nesse exercício o Partido a nível estadual perdeu seu presidente, Edir Oliveira, que veio a óbito no curso da gestão, dificultando igualmente a regularização das comissões provisórias municipais renovadas. 10. Logo, a não inscrição das FILIADAS no sistema FILIA do TSE decorreu de impedimento técnico de acesso ao sistema advindo da classificação de “ INATIVO” imposta ao diretório, conforme documento que acompanhou as fichas de filiação contidas no já referido ID

11. Se o diretório se encontrava INATIVO, vale dizer sem senha para acessar o sistema, dependendo da liberação do acesso a ser fornecido pela Instância Superior da Agremiação e, esta, igualmente se encontrava com irregularidades na transição administrativa, não tinha o Diretório Municipal como providenciar os registros à partir de 05 de abril de 2022.

12. Sendo certo o encerramento da vigência do diretório municipal em 05.04.2022, no aguardo de validação a partir de 06 de abril de 2022, conforme consta de campo específico da certidão de composição completa do diretório, dado ao enfrentamento das dificuldades apontadas para regularização, havia um óbice de força maior a impedir os registros dos novos filiados e, portanto, da regularização de suas filiações frente a Justiça Eleitoral.

13. Se o partido se encontrava INATIVO e em decorrência de tal inatividade era impossível a prática de atos administrativos que viabilizassem o registro da inscrição dos novos filiados, tem-se que a partir de tal impedimento, não é crível considerar-se as doações realizadas como de origem em fontes vedadas, a uma, sob o prisma dos doadores, de estarem realizando a doação para a agremiação que se consideravam filiados ( teoria da aparência); a duas, porque estando inoperante o partido para fins eleitorais, a norma cogente supostamente violada, de cunho estritamente eleitoral, não se amolda ao fato concreto, traduzindo-se os depósitos em manifestação de vontade na esfera civil, quando muito se mantido o convencimento de sua irregularidade, deveria ser devolvida a seus doadores e não, repassados a União.

14 Ademais, a irregularidade administrativa apontada ( não constar da relação de filiados no programa filia) , data-vênia, não retira a condição de fato dos doadores, considerados simpatizantes e vinculados ao partido a partir da assinatura da ficha de filiação, tanto que passaram a colaborar de forma espontânea à Pessoa Jurídica da agremiação que seguia regular perante a Receita Federal do Brasil e obrigada legalmente a produzir balanço de suas movimentações financeiras.

Em suma, o recorrente alega que as doadoras Suélem Braga de Andrade e Cássia Fraiberger Panzenhagem assinaram ficha de filiação à agremiação em janeiro de 2022, abonada por vereador local. Argumenta, ainda, que com o final da vigência da comissão provisória, ocorrida em março daquele ano, e em decorrência de problemas enfrentados pela sigla em nível nacional, não foi possível a regularização do diretório nem o registro dos vínculos no Sistema FILIAWEB do Tribunal Superior Eleitoral; concluindo que a impossibilidade decorreu de impedimento técnico de acesso ao sistema, constituindo-se em um óbice de força maior a impedir o registro das pretensas filiadas. Em complemento, aduz que as doações não podem ser consideradas de fonte vedada, pois, (i) sob o prisma dos doadores, estariam “realizando a doação para a agremiação que se consideravam filiados (teoria da aparência)”; e (ii) “estando inoperante o partido para fins eleitorais, a norma cogente supostamente violada, de cunho estritamente eleitoral, não se amolda ao fato concreto, traduzindo-se os depósitos em manifestação de vontade na esfera civil”.

Adianto que não assiste razão ao recorrente, na linha do bem externado posicionamento da Procuradoria Regional Eleitoral.

A despeito da citada problemática enfrentada pelo partido (notória), faz-se necessário sublinhar a responsabilidade partidária por seus atos interna corporis e pelas consequências destes advindas, quando resultam em desrespeito às regras eleitorais aplicáveis a todas as agremiações.

Ora, as fichas de filiação foram alegadamente assinadas três meses antes do término da vigência da comissão provisória do ente municipal, ou seja, com farto prazo para que fosse efetuado seu registro no sistema FILIAWEB, desta Especializada; e resta pacificado o entendimento no sentido de que as fichas de filiação caracterizam informação de caráter unilateral, sendo o vínculo pretendido somente perfectibilizado por meio do registro da filiação no banco de dados do Tribunal Superior Eleitoral (por exemplo, o RE n. 16-71.2019.6.21.0073, Rel. Des. Eleitoral Gustavo Diefenthäler, j. em 21.9.2020, unânime.)

Este é, também, o posicionamento do e. Tribunal Superior Eleitoral:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. REGISTRO DE CANDIDATURA. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. PROVA. DOCUMENTO UNILATERAL. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA 20/TSE. NEGATIVA DE PROVIMENTO. 1. No decisum monocrático, manteve–se acórdão unânime do TRE/SE em que se indeferiu o registro de candidatura do agravante, não eleito ao cargo de vereador de Arauá/SE em 2020, por ausência de prova de filiação partidária antes dos seis meses que antecedem o pleito (art. 9º da Lei 9.504/97). 2. Nos termos da Súmula 20/TSE, "[a] prova de filiação partidária daquele cujo nome não constou da lista de filiados de que trata o art. 19 da Lei nº 9.096/1995, pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública". 3. No caso, conforme a moldura fática do aresto a quo, o candidato apresentou "relação interna do partido, ficha de filiação e declaração firmada pelo partido", documentos, contudo, insuficientes para comprovar o tempestivo ingresso nos quadros da grei. Precedentes. 4. De outra parte, concluir a respeito da regular filiação a partir de ata notarial, cuja transcrição exata não consta da moldura fática do acórdão regional, esbarra no óbice da Súmula 24/TSE, não sendo possível o reexame fático–probatório em sede extraordinária. 5. Agravo interno a que se nega provimento. (RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060019096, Relator Min. Luis Felipe Salomão, DJE 30.06.2021) (Grifei.)

 

Portanto, nenhum dos doadores elencados teve a sua filiação comprovada, de forma que à situação não aproveita a alteração produzida pela Lei n. 13.488/17 no art. 31 da Lei 9.096/95, a qual prevê que as pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, podem realizar contribuições a campanhas eleitorais desde que filiadas a partido político.

Do mesmo modo, descabida a pretensão do recorrente de devolução dos valores doados às doadoras originárias. Como dito, o desatendimento das normas por parte da grei resulta de atos sob sua responsabilidade e não a isenta das consequências legais. No ponto, a única previsão de retorno de valores a eventuais doadores considerados fonte vedada se circunscreve à situação referida no art. 11, § 5º, c/c art. 14, § 1º, ambos da Resolução TSE n. 23.604/19, que transcrevo:

Art. 11.

§ 5º Os partidos políticos podem recusar doação identificável que seja creditada em suas contas bancárias indevidamente, promovendo o estorno do valor para o doador identificado até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito, ressalvado o disposto no art. 13.

 

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 1º O disposto no caput também se aplica aos recursos provenientes de fontes vedadas que não tenham sido estornados no prazo previsto no § 5º do art. 11, os quais devem, nessa hipótese, ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

 

Nessa linha de raciocínio, não há base legal para deferir a devolução das importâncias doadas às respectivas doadoras.

Irregulares, assim, as doações realizadas pelos ocupantes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, no total de R$ 3.403,03, pois não comprovada a filiação ao partido político, de maneira que a sentença deve ser mantida integralmente.

Diante do exposto, VOTO para negar provimento ao recurso.