REl - 0600047-25.2023.6.21.0001 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/08/2024 00:00 a 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, as contas do exercício financeiro de 2022 do DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de PORTO ALEGRE/RS foram desaprovadas em razão do recebimento de doações de fontes vedadas, no valor total de R$ 2.589,00, resultantes de: (1) recebimento de doações de pessoas jurídicas, na quantia total de R$ 55,00; e, (2) recebimento de contribuições de pessoas físicas não filiadas ao partido político em exame e que exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2022, no somatório de R$ 2.534,00.

Com base em tais apontamentos, a sentença determinou, ainda, o recolhimento do montante irregular ao Tesouro Nacional, acrescido de multa de 20% sobre o valor a ser recolhido e da suspensão de repasses de quotas do Fundo Partidário pelo período de 3 meses.

Em relação às doações oriundas de pessoas jurídicas, fonte expressamente vedada pelo art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, conforme detectado pelo exame de contas (ID 45606252), a agremiação recebeu duas contribuições procedentes de TOQUE DANDARA MODA PLUS SIZE AFROBRASIL CONFECCOES (CNPJ 43.497.405/0001-90), na quantia de R$ 35,00, e de Residencial Geriátrico Gomes e Duarte Ltda. (CNPJ 27.690.146/0001-62), na monta de R$ 20,00, totalizando R$ 55,00.

As razões recursais nada abordam sobre licitude ou não das operações, de modo que, por aplicação do princípio do tantum devolutum quantum apelatum, não tendo sido a matéria devolvida a este Tribunal, impõe-se a manutenção da sentença em relação ao reconhecimento das irregularidades.

Por outro lado, o órgão técnico com atuação em primeira instância apontou, no item 2.2 do parecer conclusivo, “contribuições de pessoas físicas não filiadas ao partido político em exame e que tenham exercido função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2022, os quais se enquadram na vedação prevista no art. 12 da Resolução TSE n. 23.604/19 e art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95”, no valor total de R$ 2.534,00 (ID 45606252).

Na hipótese dos autos, é incontroverso que os doadores relacionados pelo órgão técnico realizaram doações ao órgão partidário ao tempo em que ocupavam funções ou cargos públicos comissionados e não estavam filiados ao partido político favorecido no tempo das contribuições.

De seu turno, os recorrentes argumentam que “não há caracterização da doação de pessoas ligadas a cargos de autoridade, o que é vedado pela lei, mas sim, de cargos de mero assessoramento”. Salientam, também, “que o exercício da função gratificada ou cargo público por si, não é suficiente para denotar a vedação legal sendo necessário se aponte, pela descrição de suas funções que efetivamente se encaixe como de autoridade o que por si só é suficiente para afastar a imputação de recebimento de recursos”.

Ocorre que a Lei n. 13.488/17 alterou a Lei n. 9.096/95, suprimindo a expressão “autoridade” então contida no artigo 31 referido para incluir a nova redação que versa sobre “pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário”, então vigente desde meados do ano de 2017.

Dessa forma, desde o advento da Lei n. 13.488/17, que revogou a expressão “autoridades” do rol de fontes vedadas, também está superada qualquer discussão anteriormente existente envolvendo a extensão deste termo dentro das diversas espécies de agentes públicos classificadas no Direito Administrativo.

Conforme a atual redação do art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, já vigente ao tempo dos fatos, para a configuração de fonte vedada de recursos basta que os doadores estejam investidos em “função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário”, situação não impugnada no recurso, sendo desnecessária a análise casuística envolvendo o enquadramento de suas atribuições como direção, chefia, assessoramento, administração, ordenação de despesas ou poder de autoridade, ou quaisquer outras.

Portanto, a sentença recorrida acertadamente entendeu pela configuração de irregularidade no recebimento de recursos de fonte vedada, no importe de R$ 2.534,00, oriundos de contribuições de servidores ocupantes de cargos ou funções de livre nomeação e exoneração, devendo, em consequência, o respectivo valor ser recolhido ao Tesouro Nacional, com fulcro no art. 12, inc. IV e § 1º, c/c o art. 14, caput e § 1º, todos da Resolução TSE n. 23.604/19.

Em sequência, sob o argumento de que o percentual de irregularidade diante da totalidade da movimentação financeira é ínfimo, os recorrentes postulam que seja afastada a desaprovação das contas, mediante a aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, de forma que sejam as contas aprovadas ou aprovadas com ressalvas, sem a aplicação das penalidades de multa e sem a suspensão do recebimento de recursos do Fundo Partidário.

As irregularidades verificadas alcançam o somatório de R$ 2.589,00 (R$ 55,00 de pessoas jurídicas + R$ 2.534,00 de pessoas físicas), resultando no percentual de 0,85% do montante arrecadado no exercício financeiro, de R$ 304.224,48 (ID 45606252).

Assim, o baixo percentual de falhas permite a aprovação das contas com ressalvas com base nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade, na linha da jurisprudência do TSE (PC n. 0601219-63, Relator: Min. Benedito Gonçalves, Data de Julgamento: 28.4.2023, Data de Publicação: 11.5.2023).

Em decorrência da aprovação das contas com ressalvas, devem ser afastadas as sanções de multa e de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário.

A sanção de multa prevista no art. 37 da Lei n. 9.096/97 é expressamente restrita aos casos de desaprovação da contabilidade, sendo, portanto, inaplicável aos casos de aprovação com ressalvas, consoante confirma a jurisprudência desta Corte Regional:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DO ANO DE 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. DOAÇÕES RECEBIDAS DO DIRETÓRIO NACIONAL. NÃO IDENTIFICADOS DOADORES ORIGINÁRIOS. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. FALHAS SANADAS PARCIALMENTE. PERCENTUAL DA IRREGULARIDADE ABAIXO DO PARÂMETRO JURISPRUDENCIAL. DESCABIDA A APLICAÇÃO DE MULTA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas de diretório estadual de partido político, referente ao exercício financeiro do ano de 2020.

[...].

4. As irregularidades remanescentes representam 1,06% das receitas declaradas, ficando abaixo do percentual (10%) utilizado como parâmetro para permitir a aprovação das contas com ressalvas, a teor da jurisprudência desta Corte. Imprópria a aplicação de multa, no entendimento desta Corte, pois apenas devida na hipótese de desaprovação das contas. Recolhimento da importância irregular ao Tesouro Nacional.

5. Aprovação com ressalvas.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL nº060010417, Acórdão, Des. RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 15/08/2023) (Grifei.)

 

Na mesma senda, a jurisprudência desta Casa consolidou-se no sentido de que não se aplica a suspensão do repasse do Fundo Partidário quando houver aprovação com ressalvas de contas, pois resultaria em medida desproporcional e incompatível com a irrelevância das falhas sobre o conjunto das contas. Nesse sentido, destaco o seguinte julgado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2021. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. CRÉDITOS EFETIVADOS MEDIANTE CNPJ DE CAMPANHA SEM A IDENTIFICAÇÃO DE DOADOR ORIGINÁRIO. AUSÊNCIA DE CONFIABILIDADE E TRANSPARÊNCIA. MONTANTE IRREGULAR DE PEQUENA PROPORÇÃO. PERCENTUAL ABAIXO DO PARÂMETRO DE REFERÊNCIA UTILIZADO POR ESTA CORTE. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. AFASTADAS A MULTA E A DETERMINAÇÃO DE SUSPENSÃO DE REPASSES DOS VALORES ORIUNDOS DO FUNDO PARTIDÁRIO E DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA. MANTIDA A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas anuais do partido, referentes ao exercício financeiro de 2021, em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada - RONI. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional, acrescido de multa de 20%, bem como a suspensão do repasse dos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC pelo período de 1 (um) ano.

[...].

4. No mesmo sentido, afastada a determinação de suspensão de repasses dos valores oriundos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha. Este Tribunal, ao interpretar os arts. 36 e 37, § 3º, da Lei dos Partidos Políticos, tem se posicionado no sentido de que não se aplica a suspensão do repasse quando houver aprovação com ressalvas de contas, uma vez que o apontamento de ressalvas não descaracteriza o fato de que a contabilidade foi, logicamente, aprovada. Não se mostra razoável, tampouco proporcional, equiparar a aprovação com ressalvas à desaprovação, sobretudo para efeitos de sancionamento.

5. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Mantida a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional. Afastada a multa e a determinação de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário e do FEFC.

(RECURSO ELEITORAL nº 060003026, Acórdão, Des. Afif Jorge Simoes Neto, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 17/10/2023) (Grifei.)

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento parcial do recurso interposto pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES - PT de PORTO ALEGRE/RS, RENATA NUNES RODRIGUES e MARIA CELESTE DE SOUZA DA SILVA, para aprovar com ressalvas as contas relativas ao exercício financeiro de 2022 e, por consequência, afastar as sanções de multa e de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, mantendo a determinação de recolhimento de R$ 2.589,00 (dois mil quinhentos e oitenta e nove reais) ao Tesouro Nacional.