PCE - 0602159-04.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 21/08/2024 00:00 a 23:59

VOTO

Trata-se da prestação de contas do candidato FABIANO ANDRÉ DA SILVA, relativa às Eleições de 2022 ao cargo de deputado estadual.

Após exame inicial da contabilidade, diante da ausência de manifestação do prestador, a Secretaria de Auditoria Interna – SAI desta Corte concluiu haver impropriedades e, como falha mais relevante, indicou a ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

A Procuradoria Regional Eleitoral apresentou parecer, no qual afastou uma das irregularidades apontadas, acompanhando a SAI nos demais apontamentos.

Vindo os autos conclusos, verificou-se a necessidade do retorno do processo ao órgão técnico contábil, para esclarecimento no relativo ao recebimento de doação realizada com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC por Claiton Garcia da Cruz, candidato pardo/negro, sem indicação de benefício para a campanha do doador.

Foi apresentada informação técnica, na qual a SAI, primeiramente, acolheu o entendimento do parecer ministerial, para reduzir o valor a ser recolhido, e registrou

“que na data de 12/09/2022 ingressou na conta bancária do candidato em análise recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC provenientes do candidato Claiton Garcia da Cruz, autodeclarado pardo, no valor de R$ 4.640,00. Observa-se que o candidato realizou diversos pagamentos, utilizando o referido recurso”.

Opinou pela responsabilização solidária quanto à devolução.

Em suma, as irregularidades apontadas, todas envolvendo recursos do Fundo Especial de Financiamento Partidário – FEFC, consistem em (1) excesso no valor despendido com aluguel de veículo; (2) gastos não comprovados por meio de notas fiscais ou contratos; e (3) recebimento de doação oriunda de candidato autodeclarado "pardo/negro".

Passo à análise.

1. Excesso com despesa de aluguel de veículo

A Secretaria de Auditoria Interna desta Corte anotou o excesso de gasto com aluguel de veículo, realizado com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

Com efeito, o total de gastos de campanha contratados pelo candidato alcançou a quantia de R$ 14.618,65, enquanto que a despesa realizada com aluguel de veículo automotor foi de R$ 4.500,00, em equivalência a 30,78% da receita financeira utilizada na campanha, conforme contrato de locação de ID 45182065, de forma a ultrapassar o limite estabelecido nas normas de regência:

Lei n. 9.504/97

Art. 26. São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta Lei:

§ 1º São estabelecidos os seguintes limites com relação ao total do gasto da campanha:

(...)

II - aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

 

Resolução TSE n. 23.607/19

Art. 42. São estabelecidos os seguintes limites em relação ao total dos gastos de campanha contratados (Lei nº 9.504/1997, art. 26, § 1º):

(...)

II - aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

Como referido, o candidato não exerceu seu direito de manifestação, embora adequadamente intimado.

Deste modo, uma vez extrapolado o limite de 20% do total de gastos da campanha contratados (R$ 2.923,72), em R$ 1.576,27, o prestador deve receber ordem de recolhimento da quantia em excesso ao Tesouro Nacional, por aplicação irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Neste sentido, precedente desta Casa:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSO DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. EXTRAPOLAÇÃO DO LIMITE DE GASTOS COM ALUGUEL DE VEÍCULO AUTOMOTOR. ALTO PERCENTUAL DA FALHA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

2. No intuito de garantir o equilíbrio na disputa eleitoral, a legislação estabelece regras objetivas acerca de determinados limites de gastos de campanha, nos quais se inclui a despesa com aluguel de veículos automotores. Desse modo, os dispêndios com locação de veículos ficam limitados a 20% do total dos gastos eleitorais, sob pena de ser caracterizada irregularidade atinente à aplicação dos recursos de campanha.

3. Na espécie, foram empregados recursos do FEFC para pagamento das despesas com aluguel de automóveis, sendo extrapolado o correspondente limite, restando configurada a aplicação irregular de verba pública, impondo o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

4. A irregularidade representa 19,32% do montante arrecadado pelo candidato, de maneira a inviabilizar a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade como meio de atenuar a gravidade das máculas sobre o conjunto das contas.

5. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PCE 0602293-31.2022.6.21.0000, Relator: CAETANO CUERVO LO PUMO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data: 17/10/2023)

 

Sigo.

2. Gastos não comprovados por meio de notas fiscais

O parecer conclusivo identificou despesas pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, cuja comprovação por meio de documento fiscal não foi providenciada pelo prestador (C), no montante de R$ 4.889,04, conforme tabela que segue:

Intimado a manifestar-se, o candidato restou silente e desatendeu a legislação no que determina que a movimentação financeira integral deve compor a prestação de contas, e a comprovação dos gastos exige “documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos”.

De fato.

Ao serem cotejadas as despesas com os dados disponíveis no Sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, a única despesa declarada que encontra reflexo nos documentos fiscais é aquela realizada junto ao fornecedor PADARIA E CONFEITARIA TIA MURI LTDA, no valor de R$ 350,00, que deve ser deduzida do total de irregularidades.

De outra banda, cabe registrar que as despesas contratadas com ROSELAINE BEATRIZ PEREIRA DE OLIVEIRA bem como as referentes a combustível não são aptas a comprovar as despesas. A primeira, relativa a material impresso, deixa de trazer as dimensões dos produtos, como exige a legislação de regência, e as últimas não registram as placas dos veículos abastecidos.

No concernente às despesas com contratação de pessoal, que, a priori, dispensariam a emissão de nota fiscal, julgo não ter sido cumprida a exigência de comprovação por meio de contratos de prestação de serviço, os quais, quando juntados, deixaram de observar os requisitos da legislação de regência.

Nessa linha de raciocínio, sem comprovação a aplicação da quantia de R$ 4.539,04 (R$ 4.889,04 – R$ 350,00), cujo equivalente deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. Recebimento de doação oriunda de candidato autodeclarado pardo

O prestador Fabiano André da Silva, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, autodeclarou-se “branco” ao tempo que recebeu doação de verbas oriundas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC do candidato não eleito ao cargo de deputado federal, Claiton Garcia da Cruz (PCE 0602287-24.2022.6.21.0000), autodeclarado pardo, no valor de R$ 4.640,00.

O órgão técnico contábil, em Informação, destacou “que o candidato realizou diversos pagamentos, utilizando o referido recurso”.

Sublinho que a doação configura irregularidade na medida em que “a verba do Fundo Especial de Financiamento das Campanhas (FEFC) destinada ao custeio das campanhas femininas e de pessoas negras deve ser aplicada exclusivamente nestas campanhas, sendo ilícito o seu emprego no financiamento de outras campanhas não contempladas nas cotas a que se destinam”, conforme preceitua o art. 17, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Há exceção à regra, qual seja, a cobertura de despesas comuns entre candidatos cotistas e não cotistas, mas para tanto há a necessidade de prova documental do benefício à candidata mulher ou à candidata ou ao candidato de raça negra (pretos e pardos), na inteligência do § 7º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19, situação que não ocorreu nos autos.

Portanto, julgo violado o direito de acesso à integralidade da verba destinada à candidatura de pessoas abrigadas pela cota racial e entendo necessária a devolução, ainda que solidária, do valor irregularmente doado, como determinado no § 9º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19:

§ 9º Na hipótese de repasse de recursos do FEFC em desacordo com as regras dispostas neste artigo, configura-se a aplicação irregular dos recursos, devendo o valor repassado irregularmente ser recolhido ao Tesouro Nacional pelo órgão ou candidata ou candidato que realizou o repasse tido por irregular, respondendo solidariamente pela devolução a pessoa recebedora, na medida dos recursos que houver utilizado.

Assim, o valor de R$ 4.640,00 deve ser recolhido ao Tesouro Nacional pelo ora prestador, respondendo solidariamente pela devolução o candidato Claiton Garcia da Cruz, nos termos do art. 17, § 9º, da Resolução TSE n. 23.607/19, aplicadas as regras do Código Civil, arts. 264 e 275.

Ressalto que a eventual configuração do bis in idem, em razão da responsabilidade solidária, deve ser tratada por ocasião da fase de adimplemento das sanções - cumprimento de sentença.

A título de desfecho, destaco que as irregularidades, totalizadas em R$ 10.755,31 (R$ 1.576,27 + R$ 4.539,04 + R$ 4.640,00), representam 51,48% dos recursos recebidos pelo prestador (R$ 20.890,69), circunstância que impede a construção de um juízo de aprovação com ressalvas mediante a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

A desaprovação é medida que se impõe.

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação das contas de FABIANO ANDRÉ DA SILVA, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, e determino o recolhimento do valor de R$ 10.755,31 ao Tesouro Nacional, dos quais R$ 4.640,00 em solidariedade com o candidato Claiton Garcia da Cruz, nos termos da fundamentação.