REl - 0600003-27.2023.6.21.0091 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/08/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo (nos termos do art. 258 do Código Eleitoral) e comporta conhecimento, tendo em vista o atendimento de todos os pressupostos processuais.

1. Ação anulatória. Cabimento

Trata-se de recurso contra sentença proferida na presente ação anulatória, proposta por CELSO LUTZ ESPANHOL E CLÁUDIA VOSS NASS, em razão de decisão terminativa, nos autos da prestação de contas n. 0600285-70.2020.6.21.0091, que desaprovou as contas dos candidatos e exarou ordem de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional - R$ 14.997,20, valor não atualizado. A sentença lá exarada transitou em julgado, e a demanda encontra-se, atualmente, na fase de cumprimento de sentença.

Inicialmente, observo que a controvérsia gira em torno da validade das intimações realizadas naquela demanda de prestação de contas, e entendo que a matéria acusa vício apto a ser discutido em ação anulatória, instrumento próprio para sanar vícios transrescisórios de gênese processual. É cediço que o e. Tribunal Superior Eleitoral tem posicionamento bastante restritivo no que toca ao cabimento de ações rescisórias - matéria inclusive objeto de Súmula, de n. 33:

Somente é cabível ação rescisória de decisões do Tribunal Superior Eleitoral que versem sobre a incidência de causa de inelegibilidade.

 

Contudo, por clareza, entendo que não se está a tratar, aqui, de hipótese de ação rescisória, mas sim de ação anulatória (ou Querela Nullitatis Insanabilis, havendo alguma divergência na doutrina, sem utilidade prática ao caso posto). Embora ambas tenham como objetivo atacar a formação e a validade da coisa julgada, a possibilidade de ajuizamento de ação anulatória, na Justiça Eleitoral, é bem mais ampla do que a hipótese de ajuizamento da ação rescisória - por exemplo, Agr-REspeEl n.  0604922-71.2018.6.19.0000 - RJ, rel. Min. Og Fernandes, j. em 4.8.2020.

Considero adequada a eleição do meio, portanto.

2. Controvérsia já analisada por esta Corte

Sublinho que a mesma pretensão ora veiculada, com as mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido já fora analisada no bojo do cumprimento de sentença do citado processo de prestação de contas n. 0600285-70.2020.6.21.0091, em incidente de exceção de pré-executividade, circunstância que induziria a uma primeira conclusão de ocorrência de coisa julgada (o acórdão deste Tribunal, rel. Des. Caetano Cuervo Lo Pumo, transitou em julgado em 29.11.2023, conforme certidão constante no ID 45586001 daqueles autos).

Transcrevo a ementa do acórdão:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE REJEITADA. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2020. RECEBIDA NOVA MANIFESTAÇÃO DO AGRAVANTE COMO SIMPLES MEMORIAIS ANTECEDENTES AO JULGAMENTO. CABIMENTO DO INSTRUMENTO DE DEFESA. FORMA DE COMUNICAÇÃO DETERMINADA PELA LEGISLAÇÃO. REGULARIDADE DOS ATOS. AUSENTE FALHA OU NULIDADE. DESPROVIMENTO.

1. Agravo de instrumento interposto em face da decisão do juízo de primeiro grau, que indeferiu a tutela de urgência e rejeitou sumariamente a exceção de pré-executividade apresentada nos autos de cumprimento de sentença. Indeferido pedido de tutela de urgência para suspensão do processo executivo.

2. Nova manifestação do agravante, após o oferecimento de parecer pela PRE. Considerando a extemporaneidade da referida peça e a ausência de inovação substancial das razões recursais, recebida como simples memoriais antecedentes ao julgamento, na forma do art. 58, § 4º, do Regimento Interno deste Tribunal.

3. Exceção de pré-executividade. Cabível para discutir questões de ordem pública, quais sejam, os pressupostos processuais, as condições da ação, os vícios objetivos do título executivo atinentes à certeza, liquidez e exigibilidade, desde que não demandem dilação probatória (STJ - AgInt no REsp: 1960444 SP 2021/0295868-1, Data de Julgamento: 23/08/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 31/08/2022).

4. A Lei n. 11.419/06, ao disciplinar o Processo Judicial Eletrônico, prevê dois tipos de intimações: a primeira, tratada no art. 4º, de caráter geral, é realizada por publicação no Diário da Justiça Eletrônico; e a segunda, referida no art. 5º, de índole especial, é feita pelo Portal Eletrônico, no qual os advogados previamente se cadastram nos sistemas eletrônicos dos Tribunais para receber a comunicação dos atos processuais. A forma de comunicação determinada pela legislação eleitoral para as prestações de contas da campanha de 2020, após a data de diplomação dos eleitos, é o Diário da Justiça Eletrônico, conforme estabelecem o art. 98, § 7º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e art. 7º, inc. XVIII, da Resolução TSE n. 23.624/20.

5. No caso dos autos, todas as intimações ocorreram por meio de publicação no Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral (DEJERS), nas quais constou o nome do advogado, cuja procuração foi acostada aos autos, não tendo sido utilizado qualquer outro meio concomitante ou substitutivo de comunicação. Dessa forma, é evidente a inaplicabilidade do art. 5º, § 4º, da Lei n. 11.419/06, uma vez que não houve a utilização de portal eletrônico próprio para as intimações no processo de contas em questão, o que sequer teria amparo na legislação eleitoral caso fosse empregado. Além disso, o art. 272, §§ 1º a 5º, do CPC prescreve a nulidade do ato apenas quando, na publicação do ato no órgão oficial, ocorre equívoco no registro do nome do advogado ou, se assim requerido, não constar o nome da sociedade de advogados ou o nome de advogados indicados, falha inocorrente no caso em exame.

6. Desprovimento.

(AI n. 0600190-17.2023.6.21.0000. Rel. Des. El. Caetano Cuervo Lo Pumo, unânime, j. em 17.10.2023)

 

De todo modo, antecipo que opto por analisar a questão de fundo de causa, pois o incidente processual de exceção de pré-executividade não possui, obviamente, os instrumentos dialéticos de uma demanda em si mesma (como a que ora se analisa) e tampouco tem, sequer em hipótese, o efeito de desfazimento da coisa julgada, como as ações anulatórias.

Dessarte, e ainda que esta Corte já tenha se manifestado de forma unânime no sentido de que o art. 5º, § 4º, da Lei n. 11.419/06 é inaplicável ao caso posto, tenho por privilegiar o princípio da primazia da decisão de mérito, art. 4º do CPC, e também, conforme se verá, há questões na presente ação que merecem atenção sob o aspecto da lealdade processual. 

3. Mérito. Modo de intimação nas prestações de contas de 2020

Sustentam os recorrentes que a realização de intimações mediante o Diário de Justiça Eletrônico, sem correspondente comunicado por meio de mensagem eletrônica, feriu os direitos constitucionais da ampla defesa e do contraditório, uma vez que houve pedido expresso, por parte dos ora recorrentes, para que “todos os atos e publicações alusivos ao feito sejam também realizados em nome dos supracitados patronos no e-mail elisandro.topper@outlook.com”.

Transcrevo trecho das razões de recurso, ao que importa de momento:

(...)

No entanto, em manifesta quebra ao direito constitucional, mesmo tendo o procurador expressamente solicitado a comunicação dos atos processuais no e-mail: elisandro.topper@outlook.com, tal pedido não foi atendido, ocorrendo todos os atos processuais sem a possibilidade de defesa.
Veja Exa., o pedido de comunicação das movimentações no e-mail do procurador está devidamente amparado em lei que disciplina os processos eletrônicos, o no caso concreto, trata-se de processo eletrônico, não tendo nenhuma justificativa o não cumprimento do pedido.
Criou-se a expectativa de que as movimentações processuais seriam comunicadas, mesmo que em caráter informativo, no e-mail do procurador uma vez que não houve o indeferimento de pedido expresso realizado naqueles autos.
Conforme art. 5, § 4º, da Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial, em caráter informativo, poderá ser efetivada remessa de correspondência eletrônica, comunicando o envio da intimação e a abertura automática do prazo processual nos termos do § 3º deste artigo, aos que manifestarem interesse por esse serviço.

(...)

Obviamente a comunicação em e-mail não serviria para controle de prazos, mas sim, como comunicação/informação ao procurador de que houve movimentação no referido processo, possibilitando a este, verificar e atender a determinação judicial, conforme realizado em todos os outros
processos que tramitaram perante a Justiça Eleitoral que tinham o advogado que subscreve como patrono, em que o Procurador foi informado dos atos via e-mail, manifestando-se quando solicitado.

No presente caso a Sentença proferida fere frontalmente norma jurídica que dispõe sobre a ampla defesa e o contraditório, uma vez que o cerceamento de defesa é manifestamente comprovado diante da finalização do processo sem que a parte tivesse a devida assistência técnica.
Isso porque não houve a comunicação dos atos processuais no e-mail do procurador, destaca-se novamente que foi requerida expressamente a comunicação, gerando a ausência de qualquer recurso a materializar a ampla defesa da parte, culminando na sua irrefutável nulidade.
Trata-se de falha insanável, uma vez que impediu que a parte tomasse ciência da decisão, configurando grave prejuízo ao contraditório e e à ampla defesa.
Conforme narrativa acima colacionada, ficou perfeitamente caracterizada a ofensa ao contraditório e à ampla defesa, pois o trâmite processual, ao cercear a ampla publicidade, se deu em clara inobservância
DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.

À análise.

O processo judicial eleitoral é, de fato, bastante peculiar. Contudo, suas peculiaridades não advêm de mero diletantismo - visam atender, precipuamente, a absoluta celeridade inerente às eleições. Os prazos são curtos, contados inclusive em horas em diversas ocasiões, as fases do pleito (registro, propaganda, eleição, diplomação, prestação de contas) muitas vezes são concomitantes.

Decorre, daí, o consenso de que em muitos casos as normas processuais ordinárias - rito e procedimento - não atenderiam às necessidades dos processos eleitorais - tal qual o de prestação de contas, já há algum tempo de natureza reconhecidamente jurisdicional.

Demonstração do afirmado é que, com o advento do Código de Processo Civil de 2015 (e devido às modificações por ele trazidas), o Tribunal Superior Eleitoral entendeu por bem editar a Resolução TSE n. 23.478/16, para estabelecer diretrizes gerais para a aplicação da Lei n. 13.105, de 16.3.2015 – CPC – no âmbito da Justiça Eleitoral. 

Cito, por relevante, o art. 2º da Resolução TSE n. 23.478/16:

Art. 2º  Em razão da especialidade da matéria, as ações, os procedimentos e os recursos eleitorais permanecem regidos pelas normas específicas previstas na legislação eleitoral e nas instruções do Tribunal Superior Eleitoral.

Parágrafo único.  A aplicação das regras do Novo Código de Processo Civil tem caráter supletivo e subsidiário em relação aos feitos que tramitam na Justiça Eleitoral, desde que haja compatibilidade sistêmica.

 

Ou seja, o TSE deixou claro que, em razão da especialidade da matéria, os procedimentos permanecem regidos pelas normas específicas previstas na legislação eleitoral e nas instruções do Tribunal Superior Eleitoral, sendo que as regras do "Novo" Processo Civil possuem caráter supletivo e subsidiário em relação aos feitos que tramitam na Justiça Eleitoral, desde que haja compatibilidade sistêmica.

E a importância de tal observação, no caso posto, se dá porque a Lei n. 11.419/06 – lei do processo eletrônico, invocada pelos recorrentes, surgiu à época para, forma expressa, dispor sobre a informatização do processo judicial e alterar a Lei n. 5.869/73, o antigo Código de Processo Civil, portanto, denominado Buzaid, em respeito ao seu idealizador.

Desde o surgimento do CPC/15, é certo que bibliotecas inteiras têm sido escritas acerca das compatibilidades - e incompatibilidades - entre a Lei n. 11.419/06 e o CPC/15, com opiniões predominantes de casos de derrogação, ainda que tácita, de dispositivos da Lei n. 11.419/06 pelo então "Novo" Código de Processo Civil.

Convém asseverar, de todo modo, e fixar como suporte de raciocínio, que a Lei n. 11.419/06, relativa ao processo eletrônico, surgiu expressamente como legislação complementar ao Código Buzaid, de 1973 (que obviamente era omisso no relativo aos processos eletrônicos), e manteve tal posição com o surgimento do CPC/2015, de modo que não se sobrepõe, forma alguma, aos comandos exarados nas resoluções do Tribunal Superior Eleitoral, sobretudo quando constatada incompatibilidade sistêmica. A lex especialis, aqui, é a resolução do Tribunal Superior Eleitoral, instrumento de força normativa plena, até mesmo porque o c. Supremo Tribunal Federal se posiciona pela possibilidade de ajuizamento de ADI contra as resoluções do TSE (v.g., a recente ADI n. 7261).

Apenas a título de escorço histórico, antes do advento do CPC/2015 (ano de 2014), a Justiça Eleitoral chegou a utilizar plenamente a Lei n. 11.419/06, exatamente pela (então) inexistência de regramento próprio atinente aos processos eletrônicos. A utilização se deu para afastar comando do (vetusto) Código Eleitoral de 1965:

“[...] Recurso especial. Tempestividade. Prestação de contas. Partido político. Desaprovação. - A publicação do acórdão regional se deu nos termos da Lei nº 11.419/2006, que prevê disciplina própria, adotada por esta Justiça especializada, para a comunicação eletrônica dos atos processuais. Assim, é inaplicável, na espécie, o art. 274, § 1º, do Código Eleitoral, o qual estabelece a obrigatoriedade de intimação pessoal quando o acórdão não for publicado no prazo de três dias contados do seu encaminhamento ao órgão oficial de imprensa. [...]” (AI n. 150622, Ac. de 20.3.2014, rel. Min. Henrique Neves).

 

Contudo, a utilização, à época, decorreu de opção do TSE, fique claro. Após o advento do CPC/15 e a edição da Resolução n. 23.478/16, é certo que o meio eletrônico de tramitação processual ganhou proeminência, e o Tribunal Superior Eleitoral passou a editar resoluções com normas específicas. A demonstrar essa evolução, refiro que as eleições do ano de 2018 foram as primeiras em que as prestações de contas tramitaram de forma obrigatória pelo PJe - Processo Judicial Eletrônico, e a Resolução TSE n. 23.553/17, relativa àquele pleito (hoje revogada), estabeleceu uma forma de intimação para os candidatos eleitos (mural eletrônico ou outro meio eletrônico que garanta a entrega ao destinatário) e outra aos não eleitos (órgão oficial de imprensa): art. 101 e seus desdobramentos.

E também há legislação específica para o caso dos autos, mais propriamente no que concerne às intimações em prestações de contas relativas às Eleições 2020, pois o Tribunal Superior Eleitoral editou a Resolução TSE n. 23.624/20 e a Resolução TSE n. 23.607/19.

Transcrevo os artigos que importam ao tema:

Resolução TSE n. 23.607/19

Art. 98. No período de 15 de agosto a 19 de dezembro, as intimações serão realizadas pelo mural eletrônico, fixando-se o termo inicial do prazo na data de publicação e devem ser feitas na pessoa da advogada ou do advogado constituída(o) pelo partido político ou pela candidata ou pelo candidato, abrangendo:

(…)

§ 7º A publicação dos atos judiciais fora do período estabelecido no caput será realizada no Diário da Justiça Eletrônico.

 

Resolução TSE n. 23.624/20

Art. 7º A aplicação, às Eleições 2020, da Res.-TSE nº 23.607, de 17 de dezembro de 2019, que dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos e candidatos e sobre a prestação de contas nas eleições, dar-se-á com observância dos ajustes a seguir promovidos nos dispositivos indicados:

(…)

XVIII – a publicação dos atos judiciais fora do período compreendido entre 26 de setembro e 18 de dezembro de 2020 será realizada no Diário da Justiça Eletrônico (DJE)

 

Ou seja, é cristalina, é solar, a inaplicabilidade do art. 5º da Lei n. 11.419/06 ao caso sob exame, como já asseverado pelo Juízo de Primeiro Grau, pela Advocacia-Geral da União em suas contrarrazões e pela d. Procuradoria Regional Eleitoral, no parecer de ID 45607643, e inclusive por esta Corte nos autos da prestação de contas, pois a norma carece de compatibilidade sistêmica com as Resoluções TSE n. 23.607/19 e n. 23.624/20. Note-se que, na realidade, o art. 4º da Lei n. 11.419/06 é que possui tal compatibilidade. Transcrevo:

(...)

Art. 4º Os tribunais poderão criar Diário da Justiça eletrônico, disponibilizado em sítio da rede mundial de computadores, para publicação de atos judiciais e administrativos próprios e dos órgãos a eles subordinados, bem como comunicações em geral.

§ 1º O sítio e o conteúdo das publicações de que trata este artigo deverão ser assinados digitalmente com base em certificado emitido por Autoridade Certificadora credenciada na forma da lei específica. 

§ 2º A publicação eletrônica na forma deste artigo substitui qualquer outro meio e publicação oficial, para quaisquer efeitos legais, à exceção dos casos que, por lei, exigem intimação ou vista pessoal.

§ 3º Considera-se como data da publicação o primeiro dia útil seguinte ao da disponibilização da informação no Diário da Justiça eletrônico.

§ 4º Os prazos processuais terão início no primeiro dia útil que seguir ao considerado como data da publicação.

5º A criação do Diário da Justiça eletrônico deverá ser acompanhada de ampla divulgação, e o ato administrativo correspondente será publicado durante 30 (trinta) dias no diário oficial em uso.

 

De igual modo, há regramento do Código de Processo Civil aplicável ao caso - art. 205, norma supletiva, subsidiária e compatível com o caso posto:

Art. 205. Os despachos, as decisões, as sentenças e os acórdãos serão redigidos, datados e assinados pelos juízes.

(...)

§ 3º Os despachos, as decisões interlocutórias, o dispositivo das sentenças e a ementa dos acórdãos serão publicados no Diário de Justiça Eletrônico.

 

Nessa linha de raciocínio, não, o recurso não merece provimento. Ainda que com o risco de repetição, transcrevo os itens 4 e 5 da ementa do acórdão AI n. 0600190-17.2023.6.21.0000. Rel. Des. Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, unânime, j. em 17.10.2023, e adoto expressamente como razões de decidir:

(...)

4. A Lei n. 11.419/06, ao disciplinar o Processo Judicial Eletrônico, prevê dois tipos de intimações: a primeira, tratada no art. 4º, de caráter geral, é realizada por publicação no Diário da Justiça Eletrônico; e a segunda, referida no art. 5º, de índole especial, é feita pelo Portal Eletrônico, no qual os advogados previamente se cadastram nos sistemas eletrônicos dos Tribunais para receber a comunicação dos atos processuais. A forma de comunicação determinada pela legislação eleitoral para as prestações de contas da campanha de 2020, após a data de diplomação dos eleitos, é o Diário da Justiça Eletrônico, conforme estabelecem o art. 98, § 7º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e art. 7º, inc. XVIII, da Resolução TSE n. 23.624/20.

5. No caso dos autos, todas as intimações ocorreram por meio de publicação no Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral (DEJERS), nas quais constou o nome do advogado, cuja procuração foi acostada aos autos, não tendo sido utilizado qualquer outro meio concomitante ou substitutivo de comunicação. Dessa forma, é evidente a inaplicabilidade do art. 5º, § 4º, da Lei n. 11.419/06, uma vez que não houve a utilização de portal eletrônico próprio para as intimações no processo de contas em questão, o que sequer teria amparo na legislação eleitoral caso fosse empregado. Além disso, o art. 272, §§ 1º a 5º, do CPC prescreve a nulidade do ato apenas quando, na publicação do ato no órgão oficial, ocorre equívoco no registro do nome do advogado ou, se assim requerido, não constar o nome da sociedade de advogados ou o nome de advogados indicados, falha inocorrente no caso em exame.

Destarte, não merece reforma a sentença que julgou improcedente a ação.

 

4. Argumentação de ferimento a princípios constitucionais, regime de nulidades e dever de lealdade processual

Há, ainda, a necessidade de manifestação no relativo a algumas afirmações realizadas pela parte autora, por respeito ao princípio da lealdade processual. No ID 45593355 dos presentes autos há, fl. 156, a apresentação do requerimento dos advogados outorgados, nos seguintes termos:

ELISANDRO VOLMIR TOPPER, brasileiro, advogado, inscrito na OAB-RS  120.086 e-mail: elisandro.topper@outlook.com e, ANTONIO LEANDRO TOPPER, brasileiro, advogado, inscrito na OAB/RS sob n° 72.559 e-mail: al.topper@hotmail.com, com escritório profissional à Praça Tenente Paiva, nº 77, Tenente Portela/RS, Telefone (55) 9 99, E-mail: Vêm, mui respeitosamente a presença de Vossa Excelência, requerer habilitação nos autos do processo em epígrafe, para tanto, junta os devidos instrumentos de mandato.
Ainda, na oportunidade, requer que todos os atos e publicações alusivos ao feito sejam também realizados em nome dos supracitados patronos no e-mail elisandro.topper@outlook.com, sob pena de nulidade. (Grifei)

Ora, o regime de nulidades é pautado pelo princípio da legalidade, que se baseia na natureza das relações jurídicas que regula. Nessa linha de ideias, nulo será aquilo que a lei determinar como tal. Não é facultado, assim, às partes, entender que determinada situação há de acontecer "sob pena de nulidade", ao longo de um processo judicial. Não se trata de uma relação contratual. A nulidade pretendida, aqui, não tem base legal.

A participação em processo judicial obedece a uma dialética estabelecida previamente em dicção legal, exatamente caracterizadora do processo em sua acepção constitucional. Desse modo, os argumentos trazidos pelos recorrentes, de ferimento ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa são, portanto, graves. Há que se ter, sobretudo, responsabilidade da parte que os vindica.

Não é o ocorrido no caso concreto. Demonstro.

A par de afirmar ter havido a criação de "expectativa" de comunicações via e-mail (expectativa essa unilateral e baseada em desconhecimento da legislação de regência, pois não houve manifestação do juízo de origem acerca de tal requerimento), os recorrentes indicaram, para além da leal combatividade, uma falsa comparação: aduziram (item 6 da réplica, ID 45593373) que no presente processo estão a receber notificações por correio eletrônico (e-mail), situação que indicaria a possibilidade de recebimento, também, em relação ao processo de prestação de contas n. 0600285-70.2020.6.21.0091.

Ocorre que nestes autos os advogados se inscreveram no sistema PUSH - comprovação no ID 45593374, e no próprio corpo da petição, ID 45593373.

Contudo, e mesmo ironicamente, com a duvidosa manobra apenas demonstraram a falta de razão que possuem, pois sempre disso se tratou: da disponibilização, às partes, de sistema (PUSH) para aqueles que, querendo e sendo diligentes, passem a receber notificações informativas mediante correio eletrônico. Tivessem realizado, nos autos da PC n. 0600285-70.2020.6.21.0091, a mesma diligência aqui operada (inscrição no sistema PUSH), teriam recebido os e-mails de notícia. No ponto, destaco excerto da sentença hostilizada, que não merece reparos:

O artigo em questão não trata de intimação por e-mail, pois a intimação eletrônica é feita por portal próprio (no caso, o portal do PJ-e). O que o artigo trata é a possibilidade de o advogado optar por receber um e-mail, a título de aviso, com mero caráter informativo, toda vez que ocorrer uma intimação via PJ-e, modalidade que depende de sua inscrição via sistema "PUSH", e não mediante mera comunicação de que quer receber intimações via e-mail. Há, inclusive, um alerta na página do TRE-RS a respeito do caráter informativo do sistema PUSH (disponível em https://www.trers.jus.br/institucional/a-instituicao/carta-de-servicos/paginasinternas/servicos-judiciais): "O acompanhamento processual oferece a opção de cadastro no Sistema Push. Feito o cadastramento neste sistema, por meio de endereço de e-mail, o cidadão poderá selecionar processos de seu interesse e receber as informações sobre o seu andamento automaticamente em sua caixa de e- mail. Atenção : a consulta processual é um serviço de caráter informativo, ou seja, o resultado da pesquisa não tem efeitos legais.

 

5.  Pedido de gratuidade de custas e emolumentos.

Por fim, julgo prescindível a análise do pedido de deferimento de gratuidade na prestação jurisdicional, pois, como é cediço, a jurisdição eleitoral é gratuita, sem a necessidade de pagamento de taxas, custas, emolumentos, tampouco a condenação das partes em verbas sucumbenciais.

Diante o exposto, VOTO por negar provimento ao recurso, mantendo a sentença que julgou improcedente a ação anulatória, pelos seus próprios fundamentos.