AI - 0600084-21.2024.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/08/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, três pontos estão em discussão: a) a aplicabilidade da anistia; b) base de cálculo dos honorários advocatícios; e c) o percentual deve ser utilizado para fixação dos honorários advocatícios.

A Lei n. 13.831/19, que incluiu o art. 55-D na Lei n. 9.096/95, anistiou a obrigação de pagamento em virtude de recebimento de recursos de fonte vedada, de valores provenientes de doações ou contribuições feitas em anos anteriores por servidores públicos que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político. A redação da norma tem o seguinte teor:

Art. 55-D. Ficam anistiadas as devoluções, as cobranças ou as transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições feitas em anos anteriores por servidores públicos que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político.

 

Destaca-se que a própria Lei n. 13.831/19, em seu art. 3º, estabelece parâmetros para concessão da anistia, vejamos:

Art. 3º As disposições desta Lei terão eficácia imediata nos processos de prestação de contas e de criação dos órgãos partidários em andamento, a partir de sua publicação, ainda que julgados, mas não transitados em julgado.

Parágrafo único. Aplica-se também aos processos que se encontram em fase de execução judicial o disposto no art. 55-D da Lei nº 9.096, de 19 de setembro 1995.

 

Conforme se verifica nos autos, a sentença que determinou o recolhimento do valor irregularmente recebido pela agremiação transitou em julgado em 25.11.2021, data a partir da qual formado o título executivo judicial, que se encontra em fase de cumprimento de sentença.

No caso em tela, a questão acerca da incidência da anistia sobre a cobrança de valor que possui como causa doações efetuadas por servidores públicos que exerciam função ou cargo de livre nomeação ou exoneração, uma vez que filiados, não foi analisada em seu mérito durante a fase de conhecimento, por ter o Tribunal reconhecido a inconstitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95.

De efeito, este Tribunal Regional declarou incidentalmente a inconstitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, o que afastou a possibilidade de reconhecimento da anistia.

Transcrevo a ementa do julgamento paradigma, no ponto que interessa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. DESAPROVAÇÃO. MATÉRIA PRELIMINAR ACOLHIDA. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 55-D DA LEI N. 9.096/95, INCLUÍDO PELA LEI N. 13.831/19. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA E DE FONTE VEDADA. PORCENTAGEM REPRESENTATIVA DAS IRREGULARIDADES DIANTE DA TOTALIDADE DOS RECURSOS ARRECADADOS NO PERÍODO. AFASTADA A APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE DESAPROVAÇÃO. REDUZIDO O PERÍODO DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. AFASTADA A CONDIÇÃO DE QUE A SANÇÃO SUBSISTA ATÉ QUE OS ESCLARECIMENTOS SEJAM ACEITOS PELA JUSTIÇA ELEITORAL. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Incidente de inconstitucionalidade suscitado pelo Procurador Regional Eleitoral. 1.1. O art. 55-D da Lei n. 9.096/95, norma legal objeto do aludido incidente, incluído pela Lei n. 13.831/19, assinala a anistia das devoluções, cobranças ou transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições efetuadas, em anos anteriores, por servidores públicos os quais exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político. Ausência de notícia de que tenha havido oferecimento dos dados relativos à previsão de estimativa de impacto orçamentário e financeiro quando da tramitação da proposta legislativa prevendo a renúncia da receita. Omissão que afronta a exigência constitucional incluída pela EC n. 95/16 no art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A legislação infraconstitucional igualmente exige seja comprovado o impacto orçamentário e financeiro à concessão de benefício que gere a diminuição de receita da União, nos termos do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal e arts. 114 e 116 da Lei n. 13.707/18. 1.2. A anistia das verbas consideradas como oriundas de fontes vedadas - benefício instituído em causa própria e sem qualquer finalidade pública subjacente - atenta ao princípio da moralidade administrativa e desvirtua a natureza jurídica do instituto. 1.3. Vício de inconstitucionalidade formal e material. Acolhimento da preliminar. Afastada, no caso concreto, a aplicação do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831/19. (...) (grifo nosso)

(…) (TRE-RS, Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, RE 35-92.2016.6.21.0005, Rel. Des. Eleitoral Gerson Fischmann, DEJERS de 23.08.2019)

 

O entendimento vigente à época nesta Corte era no sentido de que a anistia concedida em relação aos feitos não transitados em julgado padecia dos vícios de inconstitucionalidade formal e material, e a possibilidade de ampliá-la aos processos em fase de execução judicial (Lei n. 13.877/19) acarretaria ofensa à coisa julgada prevista no inc. XXXVI do art. 5º da Constituição Federal.

Ocorre que, em 2022, foi reconhecida a constitucionalidade da anistia pelo Supremo Tribunal Federal, no âmbito da ADI n. 6230/DF, não sendo mais possível aplicar o entendimento desta Corte.

Em sede de cumprimento de sentença, a parte agravada apresentou Impugnação, requerendo a exclusão da condenação sobre fonte vedada de doações de autoridades, no valor de R$ 205.949,84 (duzentos e cinco mil, novecentos e quarenta e nove reais e oitenta e quatro centavos), em face da incidência da anistia do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, o que foi atendido.

Assim constou na parte dispositiva:

Pelo exposto, RESOLVO a Impugnação ao Cumprimento de Sentença, para julgá-la PROCEDENTE, na forma do art. 487, I, do CPC, extirpando da execução a quantia excedente R$ 205.949,84 (duzentos e cinco mil, novecentos e quarenta e nove reais e oitenta e quatro centavos). Prossiga-se a execução quanto ao valor subsistente na condenação da prestação de contas do exercício de 2016, no total de R$ 43.715,41 (quarenta e três mil, setecentos e quinze reais e quarenta e um centavos). Ressalto que, nos termos da sentença ID 109207733, fls. 07-10, ainda deverá ser acrescida multa no percentual de 5% sobre o valor principal, na forma do art. 49 da Resolução TSE nº 23.464/2015.

Ademais, condeno a parte impugnada no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao advogado da parte impugnante, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, corrigidos pela variação do IGP-M, a serem atualizados desde esta data até o efetivo pagamento, atenta que estou aos parâmetros do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

 

Após a oposição de embargos declaratórios, a decisão que resolveu a Impugnação manteve a aplicação da anistia, mas foi retificada para determinar que os honorários sejam calculados sobre o valor histórico, constituído do valor do excesso acrescido do valor da multa, ou seja, R$ 216.244,33:

Ademais, condeno a parte impugnada no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao advogado da parte impugnante, os quais fixo em 10% sobre o valor histórico de R$ 216.244,33 (duzentos e dezesseis mil, duzentos e quarenta e quatro reais e trinta e três centavos), cujo montante deverá ser corrigido pela SELIC desde 02/01/2017, acrescido de 1% relativamente ao mês em que o pagamento estiver sendo efetuado.

 

Pois bem.

a) Quanto à aplicabilidade da anistia

A agravante sustenta a inaplicabilidade da anistia, forte no instituto da coisa julgada, de modo que a questão não poderia ser rediscutida em sede de cumprimento de sentença.

Em contrapartida, o agravado alega que a aplicabilidade da anistia não teve o mérito analisado no processo de conhecimento, já que o TRE-RS declarou, preliminarmente, a inconstitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95 e que, consoante o disposto no parágrafo único do art. 3º da Lei n. 13.877/19, a anistia pode ser aplicada na fase de execução, momento que obviamente pressupõe a existência da coisa julgada.

A Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pela aplicabilidade da anistia, atendendo ao disposto no art. 55-D da Lei n. 9.096/95 e com fundamento em precedente do Tribunal Superior Eleitoral que afasta a cobrança das parcelas pendentes de pagamento, referentes a doações de servidores demissíveis ad nutum filiados ao partido (TSE, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 0000015-33.2018.6.00.0000, Redator para o Acórdão: Ministro Alexandre de Moraes, 22/03/2022).

Tenho que, quanto à aplicabilidade da anistia, não há reparos à decisão do juízo a quo ao não acolher a tese da coisa julgada e observar o art. 3º, parágrafo único, da Lei n. 13.831/19, em consonância com a interpretação firmada no âmbito do TSE de que a coisa julgada não impede a aplicação imediata da anistia nas hipóteses em que há crédito não extinto, nos termos da ementa do julgado acima referido:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2012. DOAÇÃO DE AUTORIDADES PÚBLICAS FILIADAS A PARTIDO. ART. 55-D DA LEI 9.096/1995, INCLUÍDO PELA LEI 13.831/2019. ANISTIA. APLICAÇÃO IMEDIATA. APURAÇÃO DOS VALORES ANISTIADOS. JUÍZO DA EXECUÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL

1. O art. 31, II, da Lei 9.096/1995 (redação original) vedava o recebimento de recursos provenientes de autoridades públicas filiadas a partidos políticos. No caso, a Lei 13.488/2017 não tem aplicação retroativa para afastar o vício da doação, em prestígio aos princípios do tempus regit actum, da segurança jurídica e da isonomia. Precedentes.

2. O art. 55-D da Lei 9.096/1995, incluído pela Lei 13.831/2019, anistiou as devoluções, cobranças ou transferências ao Tesouro Nacional de doações realizadas por servidores filiados a partidos e que exerceram função ou cargo público demissíveis ad nutum.

3. A norma examinada tem aplicação imediata, cabendo apenas ao juízo da execução a apuração dos valores anistiados.

4. A coisa julgada não obsta a aplicação da lei remissiva, que somente restaria esvaziada, caso houvesse a quitação definitiva dos valores, mediante a conversão do pagamento em renda.

5. Agravo Regimental parcialmente provido, nos termos do voto.

(TSE - AI: 00000153320186000000 PORTO ALEGRE - RS 1533, Relator: Min. Og Fernandes, Data de Julgamento: 22.03.2022, Data de Publicação: 03.05.2022.) (Grifo nosso)

 

Em reforço, o seguinte excerto do Parecer do Procurador Regional Eleitoral, que transcreve tópicos da fundamentação expendida pelo Ministro Alexandre de Moraes no agravo regimental em agravo de instrumento que referiu em sua manifestação (ARAI 0000015-33.2018.6.00.0000, ):

A fim de se evidenciar ainda mais o entendimento expresso na ementa acima, colacionam-se a seguir trechos do voto do Ministro redator para o Acórdão, Alexandre de Moraes: "o fato de haver decisão judicial transitada em julgado que confirma a legalidade do crédito exigido é irrelevante para a lei instituidora da anistia, o que é importante é a existência do crédito não extinto e não ter havido ainda a ordem judicial para a transformação em pagamento definitivo ou conversão em renda."; "O término da obrigação somente ocorreria caso houvesse o pagamento definitivo do partido, o que não ocorreu no caso dos autos. A coisa julgada, portanto, não obsta a aplicação da lei remissiva." (grifou-se)

Conforme se depreende, a interpretação firmada é no sentido de que a coisa julgada impede a aplicação do art. 55-D da Lei 9.096/1995 apenas no que se refere aos valores sobre os quais recai ordem judicial para a transformação em pagamento definitivo ou conversão em renda, não impedindo, por outro lado, a aplicação imediata da anistia nos demais casos em que há crédito não extinto.

 

Nesse sentido, a coisa julgada impede a aplicação do art. 55-D da Lei n. 9.096/95 somente em relação aos valores sobre os quais tenha havido cumprimento de ordem judicial para a transformação em pagamento definitivo ou conversão em renda.

Portanto, imperativa a aplicação da anistia no caso dos autos, em relação ao valor de R$ 205.949,84, já que se trata de crédito não extinto.

 

b) Quanto à base de cálculo para fixação dos ônus sucumbenciais

Após os aclaratórios, os ônus sucumbenciais foram fixados sobre o valor histórico de R$ 216.244,33 (R$ 205.949,84 + R$ 10.294,49), valor que corresponde ao excesso, acrescido da multa de 5% estabelecida no art. 49 da Resolução TSE n. 23.464/15 em razão da desaprovação das contas.

A agravante sustenta que o valor dos ônus sucumbenciais deve recair apenas sobre o valor do excesso, qual seja, R$ 205.949,84.

Sobre o tema, no julgamento do REsp n. 1.746.072/PR, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que o CPC/15 introduziu uma ordem de critérios preferenciais para a fixação da base de cálculo dos honorários advocatícios, afirmando, ainda, serem excludentes entre si, na medida em que o enquadramento do caso analisado em uma das situações legais prévias inviabiliza o avanço para a outra categoria.

Colaciona-se a ementa do julgado:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. JUÍZO DE EQUIDADE NA FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. NOVAS REGRAS: CPC/2015, ART. 85, §§ 2º E 8º. REGRA GERAL OBRIGATÓRIA (ART. 85, § 2º). REGRA SUBSIDIÁRIA (ART. 85, § 8º). PRIMEIRO RECURSO ESPECIAL PROVIDO. SEGUNDO RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

1. O novo Código de Processo Civil - CPC/2015 promoveu expressivas mudanças na disciplina da fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais na sentença de condenação do vencido.

2. Dentre as alterações, reduziu, visivelmente, a subjetividade do julgador, restringindo as hipóteses nas quais cabe a fixação dos honorários de sucumbência por equidade, pois: a) enquanto, no CPC/1973, a atribuição equitativa era possível: (a.I) nas causas de pequeno valor; (a.II) nas de valor inestimável; (a.III) naquelas em que não houvesse condenação ou fosse vencida a Fazenda Pública; e (a.IV) nas execuções, embargadas ou não (art. 20, § 4º); b) no CPC/2015 tais hipóteses são restritas às causas: (b.I) em que o proveito econômico for inestimável ou irrisório ou, ainda, quando (b.II) o valor da causa for muito baixo (art. 85, § 8º).

3. Com isso, o CPC/2015 tornou mais objetivo o processo de determinação da verba sucumbencial, introduzindo, na conjugação dos §§ 2º e 8º do art. 85, ordem decrescente de preferência de critérios (ordem de vocação) para fixação da base de cálculo dos honorários, na qual a subsunção do caso concreto a uma das hipóteses legais prévias impede o avanço para outra categoria.

4. Tem-se, então, a seguinte ordem de preferência: (I) primeiro, quando houver condenação, devem ser fixados entre 10% e 20% sobre o montante desta (art. 85, § 2º); (II) segundo, não havendo condenação, serão também fixados entre 10% e 20%, das seguintes bases de cálculo: (II.a) sobre o proveito econômico obtido pelo vencedor (art. 85, § 2º); ou (II.b) não sendo possível mensurar o proveito econômico obtido, sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 2º); por fim, (III) havendo ou não condenação, nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou em que o valor da causa for muito baixo, deverão, só então, ser fixados por apreciação equitativa (art. 85, § 8º).

5. A expressiva redação legal impõe concluir: (5.1) que o § 2º do referido art. 85 veicula a regra geral, de aplicação obrigatória, de que os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser fixados no patamar de dez a vinte por cento, subsequentemente calculados sobre o valor: (I) da condenação; ou (II) do proveito econômico obtido; ou (III) do valor atualizado da causa; (5.2) que o § 8º do art. 85 transmite regra excepcional, de aplicação subsidiária, em que se permite a fixação dos honorários sucumbenciais por equidade, para as hipóteses em que, havendo ou não condenação: (I) o proveito

econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (II) o valor da causa for muito baixo. 6. Primeiro recurso especial provido para fixar os honorários advocatícios sucumbenciais em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico obtido. Segundo recurso especial desprovido.

(REsp 1746072/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13.02.2019, DJe 29.03.2019.)

 

Desse modo, o § 2º do art. 85 estabeleceu uma ordem preferencial de base de cálculo para a fixação dos honorários de sucumbência. No caso, como não há condenação, passa-se ao segundo critério para estabelecimento dos honorários advocatícios: o valor do proveito econômico.

Aliás, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se no sentido de que os honorários advocatícios não podem recair sobre o valor da multa, uma vez que esta importância não constitui proveito econômico (ID 45656244):

Por outro lado, quanto aos ônus de sucumbência, o Juízo a quo reconheceu devida a multa de 5% sobre o valor principal, de modo que tal parcela não constitui proveito econômico obtido com a decisão e, por conseguinte, não deve ser considerada para o cálculo dos honorários advocatícios.

 

Quanto ao ponto, tenho que os honorários sucumbenciais, em impugnação ao cumprimento de sentença, têm a sua base de cálculo no valor excedente ao indicado na sentença (valor executado), e não no resultado da soma do valor e da multa. Ademais, a base de cálculo, tanto dos honorários como da multa, é a mesma, incidem apenas sobre o valor do débito principal fixado.

A fim de corroborar o entendimento, trago decisão do STJ da relatoria do Min. Sérgio Kukina:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PROVIMENTO PARCIAL PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO DA PARTE IMPUGNADA, ORA AGRAVANTE. CABIMENTO. PRINCÍPIO DA SUCUMBÊNCIA. MATÉRIA EMINENTEMENTE DE DIREITO. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 7/STJ.

1. Ao contrário do que afirma a parte agravante, a tese de ofensa ao art. 85, caput, §§ 1º e 7º, do CPC, deduzida no apelo especial do DISTRITO FEDERAL, não envolve o reexame de matéria fático-probatória, porquanto exclusivamente de direito.

2. Ressalte-se que, "diante do princípio da sucumbência, o vencido fica condenado ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais devem ter como base de cálculo o valor da condenação ou do proveito econômico obtido e, na hipótese de não haver condenação ou não sendo possível mensurar o proveito econômico, no valor atualizado da causa" ( AgInt no REsp 1.658.473/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe 29/8/2018).

3. Caso concreto em que, inexistindo controvérsia no sentido de que a subjacente impugnação ao cumprimento de sentença, manifestada pelo DISTRITO FEDERAL, fora parcialmente acolhida pelas instâncias ordinárias, faz-se necessária a condenação da parte ora agravante ao pagamento de honorários advocatícios, ante o princípio da sucumbência. 3. De fato, segundo o entendimento desta Corte Superior, "'o reconhecimento do excesso de execução em sede de impugnação do cumprimento de sentença resultou na redução da quantia a ser executada, de modo que o executado faz jus à fixação de honorários advocatícios em seu favor, fixados em percentual sobre o valor decotado do inicialmente cobrado (proveito econômico), nos termos do art. 85, § 2º, do CPC/2015' (AgInt no AREsp 1724132/SC, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 19/04/2021, DJe 24/05/2021)" (EDcl no AgInt no AREsp 1.704.142/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO). 4. Agravo interno não provido.

(STJ - AgInt no REsp: 1897903 DF 2020/0252995-6, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 21.02.2022, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 24.02.2022.)

 

Ademais, em cumprimento de sentença, a base de cálculo sobre a qual incidem os honorários advocatícios é o valor da dívida (quantia fixada em sentença ou na liquidação), acrescido das custas processuais, se houver, sem a inclusão da multa de 10% (dez por cento) pelo descumprimento da obrigação dentro do prazo legal (art. 523, § 1º, do CPC/15).

Quanto ao ponto, a doutrina do professor Fredie Didier Jr. (2018):

A base de cálculo sobre a qual incidem os honorários é o valor da dívida, sem a multa de dez por cento, constante do demonstrativo discriminado e atualizado do crédito, que instrui o requerimento do exequente. "(DIDIER JR, Fredie; et al. Curso de direito processual civil - Execução, 8ª Ed. 2018, p. 437)

 

No caso dos autos, em que pese a multa em exame não seja a multa cominatória pelo descumprimento da obrigação dentro do prazo legal (art. 523, § 1º, do CPC), mas equivalente à sanção do art. 49 da Resolução TSE n. 23.464/15, tenho que deve ser excluída da base de cálculo dos honorários.

Assim, os honorários advocatícios devem ser fixados com base no valor do excesso, ou seja, R$ 205.949,84.

c) Quanto ao percentual que deve ser utilizado para fixação dos honorários advocatícios.

A decisão de origem determinou em sua parte dispositiva a fixação dos honorários em 10% do valor da causa:

Ademais, condeno a parte impugnada no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao advogado da parte impugnante, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, corrigidos pela variação do IGP-M, a serem atualizados desde esta data até o efetivo pagamento, atenta que estou aos parâmetros do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

 

Ocorre que, nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários advocatícios deve seguir o escalonamento estabelecido no § 3° do art. 85 do CPC.

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

§ 1º São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente.

§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:

I - o grau de zelo do profissional;

II - o lugar de prestação do serviço;

III - a natureza e a importância da causa;

IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

§ 3º Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais:

I - mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;

II - mínimo de oito e máximo de dez por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 200 (duzentos) salários-mínimos até 2.000 (dois mil) salários-mínimos;

III - mínimo de cinco e máximo de oito por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 2.000 (dois mil) salários-mínimos até 20.000 (vinte mil) salários-mínimos;

IV - mínimo de três e máximo de cinco por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários-mínimos até 100.000 (cem mil) salários-mínimos;

V - mínimo de um e máximo de três por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 100.000 (cem mil) salários-mínimos.

§ 4º (omissis)

§ 5º Quando, conforme o caso, a condenação contra a Fazenda Pública ou o benefício econômico obtido pelo vencedor ou o valor da causa for superior ao valor previsto no inciso I do § 3º, a fixação do percentual de honorários deve observar a faixa inicial e, naquilo que a exceder, a faixa subsequente, e assim sucessivamente. (Grifo nosso)

Assim, considerando a quantia de R$ 205.949,84 e o salário mínimo vigente, no valor de R$ 1.412,00, o montante do excesso corresponde a 145,85 salários mínimos. Portanto, o proveito econômico encontra-se na faixa abaixo dos 200 salários mínimos, devendo a verba honorária ser fixada entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico, consoante o inc. I do § 3º do art. 85 do CPC.

Assim, adequada a fixação da sucumbência em 10%, a incidir, contudo, sobre o valor do proveito econômico, decotada a multa de 5% do art. 49 da Resolução TSE n. 23.464/15.

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do Agravo de Instrumento interposto pela UNIÃO, ao efeito de, considerando o excesso de execução do valor de R$ 205.949,84 (proveito econômico), fazer incidir sobre este valor (R$ 205.949,84) o percentual de 10% a título de honorários advocatícios.