PCE - 0603188-89.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/08/2024 00:00 a 15/08/2024 23:59

VOTO

Trata-se da prestação de contas do candidato LUCIANO GUILHERME CESA, relativa às Eleições de 2022, ao cargo de deputado federal.

Após exame inicial da contabilidade, houve a apresentação de contas retificadoras, e a Secretaria de Auditoria Interna desta Corte concluiu haver (1) impropriedades relativas a gasto com combustível realizado com recursos privados; irregularidades (2) atinentes à dívida de campanha; (3) recebimento de recursos de fontes vedadas; e (4) gasto irregular com combustível, quitado com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

Passo à análise.

1. Impropriedades

O órgão técnico contábil apontou a existência de gastos com combustível nos valores de R$ 538,60 e R$ 1.482,81, conforme notas fiscais de números 2883 e 5148,  efetuados com verbas da conta 458910, agência 1801, do Banco do Brasil, aberta para trânsito dos valores privados, percebidos pela campanha (conta “outros recursos”).

O prestador acostou “contrato de cessão temporária de uso gratuito de veículo para fins eleitorais”, firmado entre o candidato e Flabiane Mariel Staffen Cesa. Contudo, deixou de apresentar documentação comprobatória da propriedade do bem cedido, exigência do art. 58 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 58. As doações de bens ou serviços estimáveis em dinheiro, observado o disposto no art. 38, § 2º, da Lei nº 9.504/1997, ou as cessões temporárias devem ser avaliadas com base nos preços praticados no mercado no momento de sua realização e comprovadas por:

I - documento fiscal ou, quando dispensado, comprovante emitido em nome da doadora ou do doador ou instrumento de doação, quando se tratar de doação de bens de propriedade da doadora ou do doador pessoa física em favor de candidata ou candidato ou partido político;

II - instrumento de cessão e comprovante de propriedade do bem cedido pela doadora ou pelo doador, quando se tratar de bens cedidos temporariamente à candidata ou ao candidato ou ao partido político;

III - instrumento de prestação de serviços, quando se tratar de produto de serviço próprio ou atividades econômicas prestadas por pessoa física em favor de candidata ou candidato ou partido político.

 

No ponto, em resumo, o prestador não apresentou documentos suficientes quando oportunizado, de modo que se impõe a manutenção do apontamento. Deixo, de todo modo, de determinar o recolhimento, ao Tesouro Nacional, do valor de R$ 2.021,41, por ausência de previsão legal.

2. Dívida de campanha

Ao apresentar a prestação de contas retificadoras, o candidato informou despesas não quitadas com Luiz Claudio Panazzolo Knob (R$ 300,00) e Auto Posto Comboio Ltda. (R$ 150,00).

Configurada a dívida de campanha, portanto, nos termos da legislação de regência.

No entanto, a despeito de estar a falha caracterizada, o recolhimento não deve ser determinado, por falta de amparo normativo, conforme entendimento desta Corte, esposado no processo de Prestação de Contas n. 0600604-54.20206210021, rel. Des. Federal Luis Alberto D'Azevedo Aurvalle, julgado em 07.3.2023, em linha com o posicionamento do e. Tribunal Superior Eleitoral, firmada por ocasião do julgamento do RESPE n. 0601205-46.2018.6.12.000, redator designado o Ministro Luís Roberto Barroso.

Não obstante, ainda que incabível a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional, saliento que a irregularidade no valor de R$ 450,00 há de ser considerada para juízo de aprovação, ressalvas ou desaprovação das contas.

3. Fontes vedadas

A Secretaria de Auditoria Interna desta Corte, mediante a integração (a) do módulo de análise do SPCE; (b) da base de dados da Secretaria da Receita Federal do Brasil; e (3) da base de dados de pessoas físicas permissionárias de serviço público, identificou o recebimento de doações oriundas de pessoas jurídicas e de permissionário de serviço público:

 

A prática afronta o art. 31, inc. I e inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 31. É vedado a partido político e a candidata ou candidato receber, direta ou indiretamente, doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I - pessoas jurídicas;

II - origem estrangeira;

III - pessoa física permissionária de serviço público.

 

Destaco que o prestador não apresentou esclarecimentos sobre o presente tópico, ainda que tenha sido concedida oportunidade para tanto.

Destaco que a proibição contida no dispositivo incide de maneira objetiva e, portanto, não há como afastar a irregularidade. A quantia de R$ 278,00 deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

4. Gastos irregulares com verbas do FEFC

4.1. Publicidade por materiais impressos

No presente item, reside a irregularidade de maior monta da presente prestação de contas. O parecer conclusivo apontou divergência entre fornecedor e beneficiário da quitação de gasto eleitoral, identificado por meio do cotejo entre os elementos dos autos e os registros apresentados no extrato bancário.

Especificamente, trata-se da Nota Fiscal n. 11756, emitida por LORIGRAF, CNPJ 93.532.968/0001-40, contra o CNPJ da campanha, no valor de R$ 10.900,00 (dez mil e novecentos reais).

Contudo, houve o desconto por meio do cheque 001, cuja beneficiária foi CAMILA PEROTONI. Não há esclarecimentos sobre tal divergência, ocorrida em franca desobediência à legislação. Indico que, no documento de ID 45566702, é possível verificar que o cheque preenchido de modo nominal à Lorigraf Gráfica e Editora Ltda., deixou de ser cruzado. Ademais, a microfilmagem da cártula, conforme bem observou o parecer conclusivo da Secretaria de Auditoria Interna, “não comprova que o fornecedor registrado na prestação de contas foi o beneficiário do recurso”.

Portanto, irregular a despesa, nos termos do art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, cujo recolhimento ao Tesouro Nacional vem previsto no art. 79, § 1º, do mesmo diploma regulamentar. Transcrevo os dispositivos:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

(...)

Art. 79. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma prevista nos arts. 31 e 32 desta Resolução.

§ 1º Ausente a comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário (FP) e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou comprovada a utilização indevida, a execução da decisão que julgar as contas, após o seu trânsito em julgado, determinará a devolução do valor correspondente na forma estabelecida pela Res.-TSE nº 23.709/2022. (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

 

4.2. Combustível

Além dos gastos com combustível nos valores de R$ 538,60 e R$ 1.482,81, realizados com verbas privadas e já analisados no item 1, o prestador declarou outra despesa com combustível no valor de R$ 483,60, contratada junto a ANGELAS AUTO POSTO LTDA.

Conforme relatado, o candidato apresentou “contrato de cessão temporária de uso gratuito de veículo para fins eleitorais”, firmado entra o candidato e Flabiane Mariel Staffen Cesa. Contudo, deixou de apresentar documentação comprobatória da propriedade do bem cedido, nos termos do já citado art. 58 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ora, não havendo demonstração da propriedade do bem, a despesa não alcança comprovação e afronta a legislação de regência, como, exemplificativamente, registra a ementa que segue:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. DEPUTADA ESTADUAL. SUPLENTE. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. DESPESAS COM MILITÂNCIA DE PESSOAL. AUSENTES OS REQUISITOS NORMATIVOS. TERMO DE CESSÃO/LOCAÇÃO DE VEÍCULO. DESCUMPRIMENTO DO ART. 35, § 11, INC. II, AL. "B", DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. FALHAS QUE REPRESENTAM ELEVADO PERCENTUAL. INAPLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DEVER DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas apresentada por candidata que alcançou a suplência ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

2. Apontada irregularidades na comprovação da aplicação dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC, em razão da ausência de assinaturas das partes contratantes em relação a termo de cessão e/ou locação de veículo automotor, bem como em contratos de atividades de militância e mobilização de rua.

3. Ausência de assinatura nos contratos de trabalho juntados aos autos, relativamente aos gastos com pessoal. Inobservância à exigência do art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. As despesas com pessoal necessitam ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado, nos termos previstos no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19.

4. Termo de cessão e/ou locação de veículo não assinado, sem a comprovação de propriedade do cedente do bem e sem a apresentação do relatório do qual constem o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para o fim de despesas de campanha, restando descumprido o art. 35, § 11, inc. II, al. "b", da Resolução TSE n. 23.607/19.

5. As irregularidades constatadas representam 25,82% dos recursos recebidos, soma percentualmente expressiva em relação ao total arrecadado, pois é superior ao limite utilizado (R$ 1.064,10 ou 10% do total auferido) como critério pela Justiça Eleitoral para aprovação com ressalvas das contas de campanha. Impossibilidade de utilização dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

6. Desaprovação. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº060303386, Acórdão, Des. José Luiz John Dos Santos, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 18.12.2023.

 

Assim, a quantia equivalente ao somatório dos gastos realizados com recursos públicos, R$ 11.383,60 (R$ 10.900,00 + R$ 483,60), deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A título de desfecho, destaco: o total das irregularidades, no valor de R$ 14.133,01 (R$ 2.021,41 + R$ 450,00  + R$ 278,00 + R$ 11.383,60), representa 21,47% dos recursos declarados pelo prestador, R$ 65.812,72, circunstância que impede seja exarado juízo de aprovação com ressalvas mediante a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Em resumo, a desaprovação é medida que se impõe.

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação das contas de LUCIANO GUILHERME CESA, candidato ao cargo de deputado federal, e determino o recolhimento do valor de R$ 11.661,60 (R$ 278,00 por recebimento de recursos de fonte vedada e R$ 11.383,60 por gasto irregular com verba do FEFC) ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.