PC-PP - 0600183-25.2023.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/08/2024 às 14:00

VOTO

Trata-se de analisar as contas do Diretório Estadual do CIDADANIA, referentes ao exercício de 2022, apresentadas na forma da Lei n. 9.096/95 e da Resolução TSE n. 23.604/19.

Ausentes matérias preliminares a serem enfrentadas, passo à análise do mérito das contas partidárias, notadamente das impropriedades e irregularidades apontadas pela Secretaria de Auditoria Interna (SAI) em seu parecer conclusivo (ID 45643434):

Das Fontes Vedadas

A unidade técnica do Tribunal, no item 2.1 do parecer conclusivo (ID 45643434), constatou nos extratos bancários eletrônicos o ingresso de 12 contribuições de R$ 60,00 de pessoa jurídica indicada no extrato bancário eletrônico - a empresa Instituto da Previdência do Estado do Rio Grande do Sul (CNPJ n. 91.829.100/0001-43) - no valor de R$ 720,00, consoante art. 12 da Resolução TSE n. 23.604/19 em desconformidade com o art. 31, incs. I a IV, da Lei n. 9.096/95.

Em sua defesa, o prestador alega que “os valores em questão são provenientes de contribuições realizadas pela pensionista Solange Massoti da Silva, inscrita no CPF sob o nº 026.613.950-91”. Junta declaração.

A manifestação do partido não traz argumentos com o condão de reverter o posicionamento técnico sobre a irregularidade identificada, tampouco apresenta documentos que comprovem a devolução dos valores à pessoa jurídica.

Nesse contexto, urge trazer à baila o entendimento jurisprudencial do nosso Tribunal Regional Eleitoral:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÃO 2020. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTE VEDADA. PESSOA JURÍDICA. INEXPRESSIVIDADE DO VALOR PERCEBIDO INSUFICIENTE PARA AFASTAR O ILÍCITO. IRREGULARIDADE DE BAIXA MONTA. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO PARCIAL

1. Insurgência em face de sentença que julgou desaprovada prestação de contas, em virtude de recebimento de recursos de fonte vedada, sem determinar o recolhimento de quantia ao Tesouro Nacional.

2. Aporte, em conta de candidato, de valores de origem vedada, nos termos do art. 31, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. Recebimento de quantia oriunda de pessoa jurídica, a qual consta no rol de proibições vertidas na norma. A inexpressividade econômica da contribuição é insuficiente para afastar o ilícito. Ausente irresignação quanto ao dever de recolhimento da quantia indevida, inviável a ordem na presente instância, sob pena de piora na situação jurídica do recorrente.

3. Irregularidade equivalente a 14,67% das receitas declaradas, mas de valor nominal diminuto, de modo a permitir a aplicação do princípio da razoabilidade e aprovar as contas com ressalvas.

4. Provimento Parcial.

(Recurso Eleitoral n 060041754, ACÓRDÃO de 17/11/2021, Relator OYAMA ASSIS BRASIL DE MORAES, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE) (grifo nosso)

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. RECEBIMENTO DE RECURSOS ORIUNDOS DE FONTE VEDADA. PESSOA JURÍDICA. BAIXO PERCENTUAL. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas da agremiação referente ao exercício financeiro de 2020, disciplinada, quanto ao mérito, pela Resolução TSE n. 23.604/19.

2. Recebimento de verbas oriundas de fonte vedada advindas de pessoa jurídica, em afronta ao disposto no art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, regulamentado pelo Tribunal Superior Eleitoral no art. 12, inc. II, da Resolução TSE n. 23.604/19.

3. Falha admitida pelo prestador. Configurado o recebimento e a utilização de recursos de fonte vedada, impositiva a determinação de recolhimento do valor equivalente ao Tesouro Nacional, conforme o art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19. […]

(Prestação de Contas nº 060016572, Acórdão, Relator(a) Des. OYAMA ASSIS BRASIL DE MORAES, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data: 30/09/2022.) (Grifo nosso)

 

Assim, não sanada a falha apontada no item 2.1 do parecer conclusivo, relativa ao recebimento e à utilização de recursos de fonte vedada provenientes de pessoa jurídica deve ser recolhido o valor de R$ 720,00 ao Tesouro Nacional, conforme o art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Verificou-se, também, no item 2.2 do parecer conclusivo (ID 45643434) a existência de contribuições de pessoas não filiadas ao CIDADANIA, no valor total de R$ 10.640,60, que exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2022, as quais se enquadram na vedação prevista no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95.

Em sede de defesa (ID 45626330), o partido apresentou a seguinte justificativa: que “faz-se necessário um singelo esclarecimento, por parte dos dignos auditores, em torno da ausência do nome do responsável pelas contribuições apontadas entre os nomes dos doadores Leandro Mello de Souza e Neusa Beatriz Pedroso Bueno. Vale dizer, não foi devidamente identificado o contribuinte/doador que realizou as contribuições mensais (12x) no valor de R$ 180,00 (cento e oitenta reais), entre os dias 01.02.2022 e 30.12.2022”. Ainda, juntou certidão de filiação referente à ALINE ANDRES KARSTEN na qual consta que a contribuinte se filiou ao CIDADANIA em 28.3.2022 (ID 45626331, pág. 10).

Com relação ao pedido de esclarecimentos, a SAI informou que os apontamentos correspondiam à contribuinte Neusa (efeito da quebra de página), e que os valores foram retirados da tabela, pois estavam em duplicidade, de modo que o valor foi reduzido para R$ 7.584,60. Já no que se refere ao apontamento das contribuições de ALINE ANDRES KARSTEN, verificou-se que as contribuições identificadas foram realizadas em data anterior à data de filiação.

Em semelhante sentido, assim já se manifestou esta Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTE VEDADA. EMPREGO IRREGULAR DE RECURSOS ORIUNDOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. BAIXO PERCENTUAL. APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. AFASTADA A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO REPASSE DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Prestação de contas de diretório estadual partidário, relativa ao exercício financeiro de 2020. 2. Recebimento de recursos de fonte vedada. Identificados aportes financeiros advindos de pessoa jurídica e de pessoas físicas não filiadas à agremiação na data em que foram realizadas as doações, impondo a restituição da quantia irregular ao Tesouro Nacional. Demonstrado o recolhimento espontâneo de parte do valor pelo prestador. [...] (PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL nº 060016135, Acórdão, Relator(a) Des. Candido Alfredo Silva Leal Junior, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 167, Data: 12/09/2023)

 

Assim, reconhecido o recebimento de recursos oriundos de Fontes Vedadas pelo prestador de contas, deverá o valor e R$ 8.304,60 (item 2.1 + item 2.2) ser integralmente recolhido ao Tesouro Nacional, a teor do § 1º do art. 14 da Resolução TSE n. 23.604/19.

Recursos do Fundo Partidário

Em relação ao Fundo Partidário, o parecer conclusivo aponta no item 4.1 que, em consulta ao Sistema de Informação de Contas – SICO web, constatou o recebimento de recursos pela agremiação de 22.02.2022 a 04.7.2022, enquanto cumpria sanção de suspensão por decisão judicial transitada em julgado. Ainda, a unidade técnica apontou em parecer conclusivo (ID 45643434) que:

Constatou-se no extrato bancário eletrônico destinado à movimentação de Fundo Partidário, o recebimento de recursos dessa natureza, transferidos pelo Diretório Nacional do PPS, nos valores de R$ 10.000,00, em 08/04/2022, R$ 20.000,00, em 29/04/2022 e R$ R$ 20.000,00, em 02/06/2022.

 

O prestador, em sede de Razões Finais (ID 45646994), sustenta a regularidade do recebimento dos referidos recursos, durante o período de sanção, porque a intimação do órgão nacional do CIDADANIA teria ocorrido após os repasses:

Em atenção ao apontamento exibido no subitem 4.1, do respeitável parecer conclusivo (id. 45643434), faz-se necessário destacar que os repasses do órgão nacional do partido foram realizados em momento anterior ao e-mail (doc. em anexo) enviado pela SCCOP (Processo nº 0000038-28.2017.6.21.0000). Já sobre o segundo processo (nº 0600268-50.2019.6.21.0000), resta oportuno mencionar que o trânsito em julgado ocorreu no dia 03 de junho de 2022, ou seja, em data posterior ao repasse da última transferência apontada (02/06/2022). Ademais, sequer há informação acerca da intimação da decisão ao órgão nacional. Assim, por força do exposto no art. 59, inc. III, alínea a, nº 1, da Resolução nº 23.604/2019 do TSE (dispositivo revogado tão somente em setembro de 2022), o desconto e a retenção dos recursos só poderia ocorrer a partir da devida intimação do órgão partidário hierarquicamente superior. Desta forma, uma vez comprovado que a intimação do órgão nacional do CIDADANIA ocorreu após os repasses glosados (08/04/2022 – 29/04/2022 – 02/06/2022), o apontamento exposto no supracitado subitem merece ser desconsiderado no momento do julgamento

 

Sendo assim, se faz necessário verificar se a Direção Nacional do partido foi intimada da suspensão de repasses do Fundo Partidário em data anterior à ocorrência dos repasses efetuados.

No que diz respeito ao Proc. n. 0000038-28.2017.6.21.0000 (Prestação de Contas referente ao exercício de 2016), o trânsito em julgado ocorreu em 21.02.2022 (ID 45022527), o registro no sistema SICO foi lançado em 03.8.2022 (ID 45029013) e a intimação da decisão de suspensão foi expedida e recebida na data de 05.10.2022 (ID 45138828).

Já com relação ao Proc. n. 0600268-50.2019.6.21.000 (Prestação de Contas referente ao exercício 2018), o trânsito em jugado se deu em 03.6.2022 (ID 44987808), o registro no sistema SICO foi lançado em 07.6.2022 (ID 44988730), a expedição da intimação ocorreu em 21.6.2022 (ID 44997502) e não consta nos autos a data da confirmação de leitura do e-mail. De qualquer forma, considerando que o e-mail foi expedido em 21.6.2022, por óbvio, a data da confirmação da leitura não pode ter ocorrido em data anterior.

O disposto no art. 37, § 3º-A, da Lei 9.096/95 assim preconiza:

Art. 37. A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento).

[...]

§ 3º-A O cumprimento da sanção aplicada a órgão estadual, distrital ou municipal somente será efetivado a partir da data de juntada aos autos do processo de prestação de contas do aviso de recebimento da citação ou intimação, encaminhada, por via postal, pelo Tribunal Regional Eleitoral ou juízo eleitoral ao órgão partidário hierarquicamente superior.

 

Dessa forma, considerando tanto a data do registro no sistema SICO (07/06 e 03/08/2022) quanto a data de emissão dos e-mails (21/06 e 05/10), os repasses de valores do Diretório Nacional foram realizados em datas anteriores (08/04/2022 – 29/04/2022 – 02/06/2022) à comunicação de suspensão de repasse de quotas do Fundo Partidário.

Assim, tenho por afastar o apontamento da SAI em relação ao montante de R$ 50.000,00 que foi repassado a título de Fundo Partidário pelo Diretório Nacional ao Diretório Regional.

Ainda, o órgão técnico apontou no item 4.4 do parecer conclusivo gastos efetuados em desacordo com o art. 18 e art. 29, inc. V, em c/c o art. 36, § 2º, todos da Resolução TSE n. 23.604/19, no valor de R$ 33.375,45, como tabela abaixo:

 

Em razões finais, o partido pretende justificar as despesas com o fornecedor Sílvio Luiz Marques juntando parte de um contrato, sem assinaturas, o qual não pode ser aceito como comprovação em relação a gastos com recursos públicos (ID 45626331, pág. 11).

Quanto ao ponto, a Procuradoria Regional Eleitoral (ID 45648634) assim manifestou-se em seu parecer:

Ademais, foi verificado que a grei realizou pagamentos irregulares (sem documentação fiscal comprobatória do gasto, com descrição detalhada do serviço prestado e vinculação com atividade partidária) com recursos oriundos do Fundo Partidário no valor de R$ 33.375,45 (trinta e três mil e trezentos e setenta e cinco reais e quarenta e cinco centavos), detalhados no item 4.4 do Parecer Conclusivo (ID 45643433), cujos valores devem ser devolvidos ao erário, com fundamento no art. 58, § 2º, da Resolução TSE nº 23.604/19

 

Nesse sentido colaciono julgado de nossa Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. RESPONSÁVEIS. RECEBIMENTO DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO EM PERÍODO DE SUSPENSÃO DO REPASSE. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. OMISSÃO DE CONTA BANCÁRIA. AUSÊNCIA DE APLICAÇÃO DO PERCENTUAL MÍNIMO EM PROGRAMAS DE PROMOÇÃO E DIFUSÃO DA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES. AUSÊNCIA DE REGISTRO DE DÍVIDAS. ALTO PERCENTUAL. MULTA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

[...]

4. Aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário. Despesas sem comprovação da efetiva prestação do serviço e da sua vinculação às atividades partidárias, visto que as descrições dos serviços prestados demonstraram–se insuficientes, contrariando a exigência da norma. Ausente a comprovação dos gastos com recursos do Fundo Partidário na forma dos arts. 17, § 2º, 18 e 29, inc. VI, combinados com o art. 35, § 2º, todos da Resolução TSE n. 23.546/17, deve a quantia equivalente ser recolhida ao erário. Ademais, verificou–se a aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário por meio de pagamento de juros e multas, contrariando o disposto do § 2º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.546/17, cuja quantia, igualmente, deve ser recolhida aos cofres públicos. […]

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL nº 060021450, Acórdão, Relator(a) Des. Luis Alberto Dazevedo Aurvalle, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 248, Data: 01/12/2022.)

 

Logo, consideram-se irregulares os pagamentos efetuados com recursos oriundos do Fundo Partidário, no montante de R$ 33.375,45, sujeitos à devolução ao erário, conforme determinação do art. 58, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Acrescenta-se que o parecer da unidade técnica, no item 4.5, infere que o partido não demonstrou a aplicação mínima de 5% de recursos do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, consoante o disposto no inc. V do art. 44 da Lei n. 9.096/95, conforme quadro abaixo:

Em que pese conste no extrato bancário da conta Fundo Partidário Mulher (conta n. 643095902, agência 100, do Banrisul) uma despesa no valor de R$ 360,00, não foi juntada pela agremiação documentação fiscal para comprovação da despesa, de modo que não foi possível aferir se aludido gasto foi efetuado em promoção e difusão da participação política das mulheres. Assim, considero irregular o pagamento efetuado no valor de R$ 360,00, estando, portanto, sujeito ao previsto no art. 58, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Em semelhante sentido:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. MANTIDA A IRREGULARIDADE DE GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. AUSÊNCIA DE REPASSE AO PROGRAMA DE PROMOÇÃO E DIFUSÃO DA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES DO PERCENTUAL MÍNIMO DE 5% DA VERBA CAPTADA DO FUNDO PARTIDÁRIO. INOBSERVÂNCIA AO ART. 22 DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.546/17. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTE VEDADA CARACTERIZADO. PROIBIÇÃO DE OS PARTIDOS RECEBEREM VERBAS DE PESSOAS EXERCENTES DE CARGOS DE CHEFIA E DIREÇÃO DEMISSÍVEIS AD NUTUM SEM ESTAREM FILIADAS AO PARTIDO. IRREGULARIDADES DE BAIXO PERCENTUAL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. REDUZIDO O VALOR A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. PARCIAL PROVIMENTO.

[...] 2. Ausência de comprovação da regularidade de gastos com recursos do Fundo Partidário. Consoante prescreve o art. 18 da Resolução TSE n. 23.546/17, incumbe ao partido político comprovar seus dispêndios por documentos idôneos. Entretanto, nenhuma documentação foi carreada ao processo, embora tenha a sigla partidária sido oportunamente instada a tanto. Dessa maneira, não tendo sido apresentados documentos comprobatórios dos gastos custeados com recursos públicos, deve ser integralmente mantida a irregularidade e a determinação de recolhimento da quantia de irregular ao Tesouro Nacional. […]

(RECURSO ELEITORAL nº 060003005, Acórdão, Relator(a) Des. CAETANO CUERVO LO PUMO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 176, Data: 26/09/2023)

 

Por fim, haja vista a ausência dos repasses mínimos legais, deveria a agremiação ser condenada a transferir o montante de R$ 7.500,00 no exercício subsequente para a conta bancária específica destinada à criação ou à manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, vedada sua aplicação em finalidade diversa, e utilizado no exercício financeiro subsequente, sob pena de acréscimo de 12,5% do valor total devido (art. 22, § 3º, da Resolução TSE n. 23.604/19 e conforme § 5º do art. 44 da Lei n. 9.096/95).

Entretanto, diante da promulgação da Emenda Constitucional n. 117, de 05 de abril de 2022, afastou-se eventual condenação aplicável às agremiações que não tenham implementado a medida e que ainda estivessem com o processo de prestação de contas sem decisão judicial transitada em julgado:

Art. 2º Aos partidos políticos que não tenham utilizado os recursos destinados aos programas de promoção e difusão da participação política das mulheres ou cujos valores destinados a essa finalidade não tenham sido reconhecidos pela Justiça Eleitoral é assegurada a utilização desses valores nas eleições subsequentes, vedada a condenação pela Justiça Eleitoral nos processos de prestação de contas de exercícios financeiros anteriores que ainda não tenham transitado em julgado até a data de promulgação desta Emenda Constitucional.

Art. 3º Não serão aplicadas sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução de valores, multa ou suspensão do fundo partidário, aos partidos que não preencheram a cota mínima de recursos ou que não destinaram os valores mínimos em razão de sexo e raça em eleições ocorridas antes da promulgação desta Emenda Constitucional.

 

Assim, embora o partido tenha deixado de comprovar a destinação de R$ 7.500,00 em recursos do Fundo Partidário para a criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, em razão da EC n. 117, essa quantia não está sujeita a recolhimento ao Tesouro Nacional.

Todavia, o disposto na EC n. 117 não afasta o dever da Justiça Eleitoral de aferir a regularidade do uso das verbas públicas, inclusive em relação à efetiva aplicação dos recursos em exercícios subsequentes, sendo vedada a aplicação para finalidade diversa, sob pena de acréscimo de 12,5% (doze inteiros e cinco décimos por cento) do valor previsto no inc. V do caput, a ser aplicado no mesmo fim, nos termos do art. 44, § 5º, da Lei n. 9.096/95.

Em conclusão, o total de irregularidades constatadas na prestação de contas é de R$ 49.540,05, dos quais: R$ 8.304,60 referem-se ao recebimento de Fontes Vedadas [R$ 720,00 (item 2.1) + R$ 7.584,60 (item 2.2)]; R$ 33.735,45 são relativos à aplicação irregular do Fundo Partidário [R$ 33.375,45 (item 4.4) + R$ 360,00 (item 4.5)]; e R$ 7.500,00 diz respeito à ausência de aplicação do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres no valor de (item 4.5).

Tal montante é quantia expressiva que representa 20,26% do total de recursos arrecadados (R$ 244.478,74), ou seja, mais de 10% da receita do exercício, inviabilizando a aprovação das contas com ressalvas, por aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, uma vez ter sido comprometida de forma substancial a transparência e a confiabilidade da escrituração contábil, sendo a desaprovação das contas medida que se impõe.

Esse é o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral e deste Tribunal:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PREFEITO E VICE-PREFEITO. DESAPROVAÇÃO. COMPROMETIMENTO DA CONFIABILIDADE DAS CONTAS. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INAPLICABILIDADE. IRREGULARIDADES GRAVES.

[...]

6. Inaplicabilidade dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade ante a existência de irregularidades graves, que representam mais de 10% do montante global arrecadado. 7. Dissídio jurisprudencial. Ausência do indispensável cotejo analítico a demonstrar a similitude fática entre o acórdão impugnado e o paradigma. 8. Decisão agravada mantida por seus fundamentos. Agravo regimental desprovido.

(TSE – RESPE n. 00002564120126180024 JOSÉ DE FREITAS - PI, Relator: Min. Gilmar Ferreira Mendes, Data de Julgamento: 01.10.2015, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 211, Data: 09.11.2015, pp. 82-83.)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES DE 2016. VEREADOR. LIMITE DE GASTOS COM ALIMENTAÇÃO. DIVERGÊNCIA QUANTO À AUTORIA DAS DOAÇÕES. IRREGULARIDADES INFERIORES A 10% DA ARRECADAÇÃO. PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

Gastos com alimentação que excedem em 3,2% o limite de despesas dessa natureza e divergência entre os dados do extrato bancário e as declarações de doações registradas no balanço contábil que expressam 3,57% dos recursos arrecadados. Falhas que, somadas, representam menos de 10% dos recursos utilizados na campanha, não prejudicando a confiabilidade das contas. Incidência do princípio da proporcionalidade. Provimento parcial. Aprovação com ressalvas. (TRE-RS – RE n. 41060 PORTO ALEGRE - RS, Relator: MIGUEL ANTÔNIO SILVEIRA RAMOS, Data de Julgamento: 25.6.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 112, Data: 27.6.2018, p. 6.)

 

Decorre da desaprovação de contas a incidência de multa nos termos do art. 37 da Lei n. 9.096/95, a qual fixo em 4% sobre as falhas constatadas, percentual proporcional ao montante das irregularidades (20,26% do total de recursos arrecadados R$ 244.478,74), equivalente a R$ 1.981,60, em homenagem aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Embora a Procuradoria Regional Eleitoral não mencione a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, trata-se de consequência específica do recebimento de recursos de fonte vedada no montante de 8.304,60, respectivamente, nos termos do art. 36, inc. II, da Lei n. 9.096/95.

No presente caso, considerando que a receita de fontes vedadas de R$ 8.304,60 representa 0,29% de toda a arrecadação (R$ 244.478,74), mostra-se razoável e proporcional que a agremiação não sofra a penalização de suspensão de repasse de quotas.

DIANTE O EXPOSTO, VOTO pela desaprovação das contas do exercício financeiro de 2022 do partido CIDADANIA DO RIO GRANDE DO SUL e determino o recolhimento dos seguintes valores ao Tesouro Nacional:

a) R$ 8.304,60, a título de recebimento de Fontes Vedadas;

b) R$ 33.735,45 a título de aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário; e

c) R$ 1.981,60 a título de multa de 4% sobre as falhas constatadas.