PCE - 0602514-14.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/08/2024 às 14:00

VOTO

Ao examinar as contas a unidade técnica constatou as seguintes falhas:

a) ausência de comprovação da propriedade de veículos locados para a campanha, no total de R$ 17.013,00;

b) realização de despesas com pessoal em desacordo com os arts. 35, § 12; 53, inc. II, al. “c”, e 60, caput, todos da Resolução TSE n. 23.607/19, no montante de R$ 3.800,00;

c) existência de débitos bancários sem identificação, no extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE, da contraparte beneficiada com o recurso, no montante de R$ 2.400,82; e

d) realização de despesa que não consta do rol dos gastos eleitorais previstos no art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, no valor de R$ 750,00 (item 4.1. do exame preliminar e do parecer conclusivo, IDs 45514971 e 45554251).

Intimado para sanar os apontamentos, o candidato não se manifestou.

Passo à análise das irregularidades:

 

a) Ausência de comprovação da propriedade de veículos locados para a campanha, no montante de R$ 17.013,00.

O candidato declarou despesas com a locação de veículos para a realização de sua campanha eleitoral, acostando aos autos contratos de locação celebrados com os fornecedores José Roberto Zucolotto Moura Junior, José Reis Brum, Orivaldo Reis Silva, Lair Antonio Cechetto, Ingrid Goettems Kuntler, Janete Maria Brum e João Batista Terra Cortes.

Os gastos com os aluguéis de veículo totalizaram o valor de R$ 17.013,00 e foram pagos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

Ocorre que, além da apresentação dos aludidos contratos, é necessária a demonstração de que os fornecedores são efetivamente proprietários dos respectivos veículos locados, conforme apontado pela unidade técnica no relatório de exame de contas.

No entanto, embora devidamente intimado para cumprimento das diligências apontadas no relatório preliminar, o prestador quedou-se inerte.

Importa destacar, ainda, o que bem observou a Procuradoria Regional Eleitoral acerca das despesas com aluguéis de veículos realizadas pelo candidato, verbis:

Cumpre registrar que, no caso, as despesas relativas à locação de veículos (R$ 17.013,00) representam 56,71% do total de recursos financeiros recebidos pela campanha (R$ 30.000,00), inclusive com pagamento a fornecedores apontados como filho e irmã do candidato (JOSE ROBERTO ZUCOLOTTO JUNIOR e JANETE MARIA BRUM), além de outras duas pessoas que compartilham os sobrenomes REIS e BRUM.

Em síntese, a maior parte das despesas de campanha está concentrada na locação de veículos e respectivo pagamento aos fornecedores elencados, situação que destoa das de outras candidaturas que dispunham de semelhante volume de recursos (exemplificativamente, PCEs nº 0602015-30.2022.6.21.0000, nº 0602331-43.2022.6.21.0000 e nº 0602249-12.2022.6.21.0000).

 

Particularmente em relação às despesas atribuídas aos fornecedores Janete Maria Brum e João Batista Terra Cortes, cumpre observar que também não houve a identificação do beneficiário do pagamento, como indicado pela unidade técnica.

Com efeito, o extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE demonstra que os pagamentos foram efetuados mediante saque dos cheques n. 00011 e n. 00012 (histórico – Cheque Terceiros por Caixa), sem a devida identificação do beneficiário do recurso, em desconformidade com o disposto no art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Dessa forma, conclui-se, no ponto, que, inexistindo prova da propriedade dos veículos automotores, se tem a inexistência de prova de vínculo jurídico entre os locadores e os respectivos bens locados com recursos públicos, merecendo ser mantido o apontamento no montante de R$ 17.013,00, devendo a quantia ser recolhida ao Tesouro Nacional, na forma do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

b) Despesas com pessoal em desacordo com os arts. 35, § 12, 53, inc. II, al. “c”, e 60, caput, todos da Resolução TSE n. 23.607/19, no montante de R$ 3.800,00.

A análise técnica apontou a ocorrência de despesas com pessoal em desacordo com os arts. 35, § 12, 53, inc. II, al. “c”, e 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19, no montante de R$ 3.800,00, relativamente aos fornecedores Juarez Foletto, Everaldo da Silva dos Santos e Magnus Alan Foletto.

A documentação de comprovação dos gastos com pessoal não apresenta a integralidade dos detalhes previstos no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, tais como: contrato contendo locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado.

Relativamente aos gastos com pessoal, foram acostados aos autos pelo candidato tão somente recibos de pagamentos firmados pelos fornecedores, os quais não permitem aferir o local de trabalho, o quantitativo de horas trabalhadas e a descrição das atividades executadas, em desatenção às exigências dos arts. 35, § 12, 53, inc. II, al. “c”, e 60, caput, todos da Resolução TSE n. 23.607/19.

O candidato não exerceu seu direito de manifestação e não apresentou esclarecimentos ou juntou comprovantes que alterassem as falhas apontadas.

A adoção, sem qualquer justificativa, de procedimento contábil consistente em cláusulas contratuais sem especificação sobre a divisão das atividades realizadas pelos prestadores de serviço e sem a apresentação da formalização contratual adequada com a especificação do quantitativo de horas trabalhadas e de local de trabalho, compromete a fiscalização desta Justiça Especializada sobre a correta utilização dos recursos públicos do FEFC e viola o art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A propósito, esta Colenda Corte reafirma a observância obrigatória do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme precedente de relatoria da Excelentíssima Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CARGO DE DEPUTADA FEDERAL. 3ª SUPLENTE. IMPROPRIEDADES. ABERTURA EXTEMPORÂNEA DE CONTA BANCÁRIA. NÃO APRESENTADOS OS EXTRATOS DAS CONTAS BANCÁRIAS. OMISSÃO DE GASTOS. NOTA FISCAL NÃO CANCELADA. ATUALIZAÇÃO JURISPRUDENCIAL DO TSE NÃO APLICÁVEL À HIPÓTESE. NÃO COMPROVADOS GASTOS REALIZADOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). COMBUSTÍVEIS. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO. FACEBOOK. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTO FISCAL IDÔNEO. DESPESAS COM PESSOAL. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

(...)

4. Ausência de documentação apta a comprovar gastos realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

4.4. Inobservância do § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, referente às despesas com pessoal. Apresentados contratos firmados com os prestadores de serviço que revelam inconsistências que não podem ser superadas. Determinada a devolução do somatório irregular ao Tesouro Nacional (art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

(...)

6. Desaprovação. Determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

(TRE/RS – PCE nº 060237477, Relatora Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Publicação: DJE, Tomo 273, 16/12/2022.) (Grifou-se.)

 

Acrescente-se que, relativamente às despesas com pessoal ora sob análise, também não foram identificados os fornecedores no extrato bancário disponibilizado pelo TSE, constando apenas o histórico “CHEQUE TERCEIROS POR CAIXA”.

Portanto, a ausência das informações de que tratam os arts. 35, § 12, 53, inc. II, al. “c”, e 60, todos da Resolução TSE n. 23.607/19 culmina na impossibilidade de fiscalização sobre o conteúdo e os requisitos legais dessa prestação de serviço de pessoal.

Considera-se irregular a utilização de recursos originados do FEFC na quantia de R$ 3.800,00, a qual deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, consoante dispõe o § 1° do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

c) Existência de débitos bancários sem identificação, no extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE, da contraparte beneficiada com o recurso, no montante de R$ 2.400,82.

Outro apontamento realizado pelo órgão técnico diz respeito à existência de débitos bancários sem a devida identificação do beneficiário do recurso.

Além das despesas sem a devida identificação das contrapartes beneficiárias dos recursos já referidas nos itens (a) e (b), outras foram apuradas pela análise técnica relativamente aos seguintes fornecedores: Jornal Integração Regional - Paulo Cesar Callegari (R$ 1.000,00), Jornal Folha - Nilton Golle Mei (R$ 400,00), Abastecedora de Combustiveis e Derivados Ltda. (R$ 250,82) e Oseias Casarotto dos Reis (R$ 750,00).

Também em relação aos fornecedores suprarreferidos não houve a identificação dos respectivos CNPJs/CPFs nos extratos bancários disponibilizados pelo TSE, tratando-se de cheques emitidos sem observância da norma de regência.

O pagamento de gastos eleitorais deve observar o disposto no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, que assim preceitua:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ da beneficiária ou do beneficiário;

III - débito em conta; (Redação dada pela Resolução nº 23.665/2021)

IV - cartão de débito da conta bancária; ou (Redação dada pela Resolução nº 23.665/2021)

V - PIX, somente se a chave utilizada for o CPF ou o CNPJ. (Incluído pela Resolução nº 23.665/2021)

§ 1º O pagamento de boletos registrados pode ser realizado diretamente por meio da conta bancária, vedado o pagamento em espécie.

§ 2º É vedado o pagamento de gastos eleitorais com moedas virtuais.

 

O escopo da norma é garantir que os valores sejam direcionados diretamente aos respectivos fornecedores de campanha, de modo a viabilizar a rastreabilidade dos recursos envolvidos. Anoto que, em razão da natureza pública da verba do FEFC, o escrutínio contábil, neste ponto, exige redobrada atenção aos requisitos do art. 38, e incisos, e art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19, demandando exata vinculação do dispêndio efetivamente contratado.

Assim, a emissão de cheques sem a observância da legislação aplicável à espécie impede o rastreio dos recursos públicos despendidos e a vinculação do crédito às fornecedoras declaradas, bem como a transparência das contas e sua fiscalização pela Justiça Eleitoral.

Portanto, merece ser mantido o apontamento no valor de R$ 2.400,82, ensejando o recolhimento ao Tesouro Nacional nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n.  23.607/19.

d) Realização de despesa que não consta do rol dos gastos eleitorais previstos no art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, no montante de R$ 750,00.

Constou, ainda, dos apontamentos da unidade técnica uma despesa junto ao fornecedor Oseias Casarotto dos Reis, no valor de R$ 750,00, identificada como “serviços de martelinho de ouro no veículo de placas IWO 9723", conforme nota fiscal de ID 45177342.

A aludida despesa não integra o rol dos gastos eleitorais dispostos no art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, de forma que merece ser mantido o apontamento.

No entanto, tendo em vista que a referida despesa já restou indicada como irregular em virtude da ausência de informação acerca do beneficiário do recurso público no extrato bancário, consoante análise realizada no item (c), é de ser mantida a mácula, sem contudo, determinar-se o recolhimento ao Tesouro Nacional, sob pena de incidir-se em bis in idem.

Conclusões

As irregularidades somadas totalizam R$ 23.213,82 (R$ 17.013,00 + R$ 3.800,00 + R$ 2.400,82), equivalendo a 60,6% do total de recursos recebidos pelo candidato em sua campanha (R$ 38.290,69), e extrapolam os parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade, para formar juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade (ou seja, montante superior a R$ 1.064,10 e excedente a 10% da arrecadação financeira).

Dessa forma, em linha com o entendimento da Procuraria Regional Eleitoral (ID 45564092), impõe-se a desaprovação das contas, na forma do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em face do exposto, VOTO pela desaprovação das contas de JOSE ROBERTO ZUCOLOTTO MOURA, determinando o recolhimento, com juros e com correção monetária, da quantia de R$ 23.213,82 (vinte e três mil duzentos e treze reais e oitenta e dois centavos) ao Tesouro Nacional, referente à aplicação irregular de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, com fundamento no § 1° do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Com o trânsito em julgado, anotações de estilo e satisfação de obrigações, arquivem-se os autos com baixa na instância pertinente.