REl - 0600025-70.2023.6.21.0096 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/08/2024 às 14:00

VOTO

Trata-se de recurso interposto pelo PROGRESSISTAS de São Pedro do Butiá/RS contra a sentença do Juízo da 96ª Zona Eleitoral, sediada em Cerro Largo/RS, a qual desaprovou as contas da agremiação referentes ao exercício financeiro de 2022.

A decisão hostilizada reconheceu o recebimento de recursos de origem não identificada – RONI, por meio de duas operações financeiras nos valores de R$ 300,00 e R$ 695,00.

Passo à análise.

1. Operação de R$ 300,00.

No que diz respeito ao valor de R$ 300,00, a sentença julgou irregular conforme segue:

Inicialmente, destaca-se que o Exame de Contas de ID 119087526 apontou que o Diretório Municipal recebeu depósito de origem não identificada no valor de R$ 300,00, em 11/10/2022, e que o valor foi estornado para origem sem a observância da regra prevista no art. 14 da Resolução TSE 23.604/2019, que determina que o valor deve ser recolhido ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU) até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito bancário.

Nessa esteira, o Diretório Municipal, por meio da Petição de ID 119694065, juntou declaração em que autorizou a Sicredi União RS a estornar o referido valor, descumprindo a determinação da Resolução TSE 23.604/2019 acima mencionada. Ademais, nas alegações finais de ID 120812100, o Diretório Municipal alegou que a questão referente ao estorno de valor de origem não identificada já foi apreciada no processo de prestação de contas eleitorais 0600067-56.2022.6.21.0096, o qual teve as contas julgadas como aprovadas. Porém, tal valor foi depositado no Sicredi, Agência 307, conta-corrente 96563, que é a conta de Outros Recursos utilizadas para gastos ordinários de manutenção do partido político, não tendo relação com as despesas eleitorais. Outrossim, o Diretório Municipal possui obrigação de trazer todos os documentos que interessam a sua defesa nestes autos.

Desse modo, é o processo de prestação de contais anuais que tem como objeto a fiscalização das contas de Outros Recursos para manutenção do partido político e ficou comprovado que o Diretório Municipal não observou o regramento do art. 14 da Resolução TSE 23.604/2019, de modo que fica caracterizada irregularidade na prestação de contas (art. 14, §3º, da Resolução TSE 23.604/2019).

 

Com efeito, os valores recebidos nas contas dos partidos políticos, cuja origem não tenha sido identificada no momento do depósito, sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º, sendo vedada a devolução ao doador originário (art. 14 da Resolução TSE n. 23.604/19).

No ponto sob análise, adianto que o recurso merece provimento.

Muito embora o recorrente tenha extrapolado o prazo estabelecido no citado dispositivo, é incontroverso que foi realizada a devolução do valor, de modo que entendo incabível a determinação do recolhimento deste valor ao Tesouro Nacional. O recorrente invoca precedente deste Tribunal - PCE 0600067-56.2022.6.21.0096, prestação de contas desta mesma agremiação - Diretório Municipal do PROGRESSISTAS de São Pedro do Butiá, relativas às Eleições 2022.

No que lhe assiste razão.

Naquele feito, a irregularidade em comento fora apontada pela análise contábil, a grei apresentou as provas e recebeu análise favorável, de regularidade da operação financeira, de modo que entendo incabível rejulgar fato já apreciado por órgão julgador.

Desse modo, afasto a irregularidade e, também, a ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional, no valor de R$ 300,00, determinado na sentença.

2. Operação de R$ 695,00.

No relativo à irregularidade no recebimento de recurso de origem não identificada – RONI, no valor de R$ 695,00, o exame das contas verificou que a doação se deu por meio de operação sem identificação do depositante, em contrariedade à legislação de regência:

Resolução TSE n. 23.604/2019

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Parágrafo único. Constituem recursos de origem não identificada aqueles em que:

I - o nome ou a razão social, conforme o caso, ou a inscrição no CPF do doador ou do contribuinte ou no CNPJ, em se tratando de partidos políticos ou candidatos:

a) não tenham sido informados; ou

b) se informados, sejam inválidos, inexistentes, nulos, cancelados ou, por qualquer outra razão, não sejam identificados;

II - não haja correspondência entre o nome ou a razão social e a inscrição no CPF ou no CNPJ informado; e

III - o bem estimável em dinheiro que tenha sido doado ou cedido temporariamente não pertença ao patrimônio do doador ou, quando se tratar de serviços, não sejam produtos da sua atividade.

 

Houve a solicitação cartorária para que a parte providenciasse a juntada da microfilmagem do cheque número “NCX 0000202”, registrado no extrato bancário sem contraparte. Em resposta, o partido apresentou na origem a microfilmagem de cheque no valor em questão:

 

Documento de inviável aceitação para o esclarecimento da irregularidade. A par de o título apresentado ter sido emitido no ano anterior ao ora analisado, há desconformidade na série e número do cheque: ANX 000113, em evidente ausência de correspondência àquele apontado no documento bancário (NCX 0000202).

Em grau de recurso, a grei apenas reproduziu a imagem da cártula e argumentou ser suficiente para a comprovação da origem da doação, aduzindo que, por estar abaixo do patamar de R$ 1.064,10, estabelecido pela Resolução n. 23.604/19, a transação teria gerado apenas impropriedade.

A questão é solucionada pelos arts. 7º e 8º, caput, e §§ 1º, 2º e 3º, da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou do contribuinte ou no CNPJ, no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

Art. 8º As doações realizadas ao partido político podem ser feitas diretamente aos órgãos de direção nacional, estadual ou distrital, municipal e zonal, que devem remeter à Justiça Eleitoral e aos órgãos hierarquicamente superiores do partido o demonstrativo de seu recebimento e da respectiva destinação, acompanhado do balanço contábil (art. 39, § 1º, da Lei nº 9.096/95

§ 1º As doações em recursos financeiros devem ser, obrigatoriamente, efetuadas por cheque cruzado em nome do partido político, transferência eletrônica, depósito bancário diretamente na conta do partido político, mecanismo disponível em sítio do partido na internet que permita o uso de cartão de crédito, cartão de débito, emissão on-line de boleto bancário ou, ainda, convênios de débitos em conta e outras modalidades, desde que atenda aos requisitos previstos no art. 7º, § 1º, desta Resolução, devendo ser registradas na prestação de contas de forma concomitante à sua realização com a inclusão da respectiva documentação comprobatória.

§ 2º O depósito bancário previsto no § 1º deve ser realizado na conta "Doações para Campanha" ou na conta "Outros Recursos", conforme sua destinação, sendo admitida a efetivação por qualquer meio de transação bancária no qual o CPF do doador ou do contribuinte ou o CNPJ, no caso de partidos políticos ou candidatos, seja obrigatoriamente identificado.

§ 3º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

 

Na linha da inteligência dos dispositivos, inicialmente a legislação de regência impõe a identificação por meio de CPF ou CNPJ a toda e qualquer doação financeira, e na sequência enumera as formas permitidas para a realização de doações financeiras: cheque cruzado em nome do partido político, transferência eletrônica, depósito bancário diretamente na conta do partido político, mecanismo disponível em sítio do partido na internet que permita o uso de cartão de crédito, cartão de débito, emissão on-line de boleto bancário ou, ainda, convênios de débitos em conta e outras modalidades. E somente após, ao final, é que fixa o teto de R$ 1.064,00 para afastar restrições quanto à forma de contribuir.

Portanto, não merece acolhida a alegação do recorrente.

No caso em tela, o partido recebeu contribuição por meio de cheque sem cruzamento, e ao ser instado a apresentar a cártula com a finalidade de identificação do doador, trouxe aos autos microfilmagem de outro cheque.

Desta forma, presente a utilização de recurso de origem não identificada, não há possibilidade de afastar, no ponto, o comando sentencial de recolhimento da quantia de R$ 695,00.

Por fim, destaco que a irregularidade remanescente alcança a importância de R$ 695,00, módica, de modo a admitir a aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade para estabelecer um juízo de aprovação com ressalvas das contas, sendo mantida a suspensão de repasse de recursos do Fundo Partidário ao recorrente até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral, ou seja comprovado o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor recebido indevidamente. Afastado o juízo de desaprovação, tenho igualmente por afastar a determinação de suspensão do repasse de recursos do Fundo Partidário, nos termos dos precedentes desta Corte, em decorrência da aprovação, ainda que com ressalvas, das contas.

Diante do exposto, VOTO para dar parcial provimento do recurso, aprovar as contas com ressalvas, afastar (1) a ordem de recolhimento, ao Tesouro Nacional de R$ 300,00, e (2) a determinação de suspensão do repasse de recursos do Fundo Partidário, e manter a ordem de recolhimento de R$ 695,00, nos termos da fundamentação.