PCE - 0602802-59.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/08/2024 às 14:00

VOTO

Cuida-se de analisar, nas contas relativas às Eleições de 2022 prestadas por MARIA DA GLORIA MENEGOTTO, as seguintes irregularidades apontadas pela unidade técnica:

a) dívida de campanha, no montante total de R$ 5.000,00, desacompanhada da autorização por parte do órgão nacional para assunção da dívida pelo órgão partidário estadual, em desconformidade com os §§ 2º e 3º do art. 33, art. 53, inc. II, al. "e", da Resolução TSE n. 23.607/19 (item 3 do parecer conclusivo, ID 45526782);

b) ausência de comprovação da utilização de R$ 3.922,32, originários do Fundo Partidário, com impulsionamento de conteúdo de internet (item 4.2.1 do parecer conclusivo, ID 45526782).

Passo à análise dessas irregularidades, considerando a retificação das contas e as notas explicativas apresentadas pela candidata:

a) dívidas de campanha não assumidas pelo partido político

Ao analisar as contas apresentada por MARIA DA GLORIA MENEGOTTO relativas às Eleições Gerais de 2022, a unidade técnica aferiu dívida de campanha, no montante total de R$ 5.000,00, desacompanhada da autorização por parte do órgão nacional para assunção da dívida pelo órgão partidário estadual, em desconformidade com os §§ 2º e 3º do art. 33, art. 53, inc. II, al. "e", da Resolução TSE n. 23.607/19 (item 3 do parecer conclusivo, ID 45526782).

Intimada, a candidata apresentou “Termo de Assunção de Dívida, Cronograma de Quitação e Anuência do Credor”, bem como o requerimento do Diretório Regional dirigido ao Presidente Nacional do Partido União Brasil, Luciano Caldas Bivar, pedindo autorização para assumir o débito de R$ 5.000,00 referente à dívida contraída com honorários do advogado patrono desta prestação de contas (termo, ID 45520331; ofício à direção nacional partidária, ID 45519039, 45309224).

Ao mesmo tempo, junta carta resposta do Diretório Nacional a qual contém recomendação de entregar à Justiça Eleitoral as contas no prazo legal, “deixando para um segundo momento a juntada da Resolução da Comissão Executiva Nacional Instituidora que vier a autorizar, de maneira individualizada, a assunção das dívidas de campanha do(a) candidato(a) pelo órgão estadual” (ID 45309223, 45519040).

A Procuradoria Regional Eleitoral, por sua vez, opina pela ressalva desse apontamento e pelo não recolhimento do valor aos cofres públicos, uma vez que caracterizada dívida de campanha.

Nesse sentido, constato a escrituração de dívida de campanha no valor de R$ 5.000,00 (vide o relatório de despesas efetuadas e não pagas, ID 45519056; e o extrato da prestação de contas, “item 7.3, dívida de campanha”, ID 45519254, p. 4).

Além disso, está presente acordo expressamente formalizado, com cronograma de pagamento e anuência do credor (ID 45520331).

Entretanto, até o momento, não se apresentou autorização do órgão nacional para assunção da dívida pelo órgão partidário da respectiva circunscrição, conforme exigido no art. 33, §§ 2° e 3°, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, entendo caracterizada a falha destacada no item 3 do exame preliminar e do parecer conclusivo (ID 45508739 e 45526782).

Todavia, quanto ao dever de recolhimento ao erário do valor relativo à dívida de campanha, o órgão técnico entende que a eventual quitação da dívida ocorrerá fora do procedimento normativo, com utilização de recursos que não circulam em contas bancárias de campanha e que não estão sujeitos à fiscalização da Justiça Eleitoral, circunstância que representaria, caso haja quitação, a utilização de recursos de origem não identificada, arrecadação vedada pelo art. 32, § 1º, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Essa é a posição defendida nestes autos pela Procuradoria Regional Eleitoral.

Contudo, este Tribunal, no julgamento da PCE n. 0602652-78.2022.6.21.0000, por maioria, alinhou-se à jurisprudência do TSE, firmada no acórdão do RESPE n. 0601205-46.2018.6.12.000, da relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso, enquanto redator designado, no sentido da ausência de dever de recolhimento ao erário da importância equivalente à dívida, por falta de amparo normativo.

Transcrevo a ementa:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO ELEITO. SEGUNDO SUPLENTE. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. OMISSÃO DE DESPESA. EXISTÊNCIA DE NOTAS FISCAIS CONTRA O NÚMERO DE CNPJ DE CAMPANHA. PRESUNÇÃO DE DESPESA ELEITORAL. INFRAÇÃO AO ART. 53, INC. I, AL. “G”, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DÍVIDAS DE CAMPANHA NÃO ASSUMIDAS PELO PARTIDO. INCABÍVEL A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NORMATIVA. BAIXO PERCENTUAL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidato, eleito 2º suplente ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022.

2. Omissão de gastos. Divergência entre as informações relativas às despesas lançadas da prestação de contas e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, obtidas mediante confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais. Falha que não se confunde com simples dívidas de campanha. Operações não registradas na contabilidade, apartando-se de verificações técnicas sobre a regularidade de seus objetos, idoneidade dos fornecedores, limites de gastos, dentre outros aspectos necessários para que se apure a higidez das contas. A emissão de nota fiscal para o CNPJ de campanha gera a presunção de existência da despesa eleitoral, conforme preceitua o art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19. Infração ao disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19. Sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos gastos de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal do candidato, caracterizando os recursos como de origem não identificada. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

3. Identificada dívida de campanha não assumida pelo partido político. Falha reconhecida. Informado que a agremiação partidária indeferiu o pedido de assunção de dívidas, consoante resposta juntada aos autos, razão pela qual o prestador pugna pela autorização para que proceda à quitação com recursos próprios. Todavia, o pedido deduzido não encontra amparo na legislação de regência. Caracterizada a irregularidade por descumprimento do art. 33, §§ 1º a 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19, uma vez que as despesas não foram integralmente quitadas até o prazo de entrega das contas e as dívidas remanescentes não foram assumidas pelo partido político. Incabível o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, pois as dívidas de campanha consistem em categoria com regulamentação específica, que não prevê a restituição de valores em caso de infringência.

4. O total das irregularidades representa 4,64% do montante de recursos recebidos, autorizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

5. Aprovação com ressalvas, com esteio no art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS, PCE n. 0602652-78.2022.6.21.0000, Des. Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, publicado julgado em 9.12.2022).

Segundo a mais recente posição do Tribunal Superior Eleitoral, não há “respaldo normativo para determinar o recolhimento de dívida de campanha ao Tesouro Nacional como se de recursos de origem não identificada se tratasse” (REspEl n. 0601205–46/MS, rel. designado Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 8.02.2022, DJe de 30.3.2022).

Trata-se de posicionamento acolhido por maioria neste Tribunal para as Eleições de 2022, consoante julgamentos da PCE n. 0602777-46.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, DJe de 14.12.2022; PCE n. 0603265-98.2022.6.21.0000, Relator Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, DJe de 16.12.2022; PCE n. 0602861-47.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Eleitoral Elaine Maria Canto da Fonseca, DJe de 13.12.2022; PCE n. 0602936-86.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Eleitoral Kalin Cogo Rodrigues, DJe de 15.12.2022; PCE n. 0603217-42.2022.6.21.0000, Relator Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, DJe de 11.12.2022.

Com essas considerações, reconheço a irregularidade em questão, a qual se deve ter em vista para o julgamento de aprovação ou rejeição das contas, mas deixo de determinar o recolhimento da importância de R$ 5.000,00 ao Tesouro Nacional.

 

b) Falta de comprovação dos gastos com impulsionamento de conteúdo (art. 35, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19)

Ao examinar as contas, a unidade técnica verificou a aquisição de créditos de impulsionamento de conteúdo de internet no valor total de R$ 13.000,00 através da empresa Adyen BR Ltda., a serviço de Facebook Serviços Online do Brasil Ltda., com recursos procedentes do Fundo Partidário.

Do total contratado, foi comprovada somente a destinação da quantia de R$ 9.077,68 para o serviço em questão, mediante emissão de notas fiscais, resultando em diferença (saldo) do valor de R$ 3.922,32, o qual não foi comprovado o recolhimento ao partido político via conta Funda Partidário, contrariando o disposto no art. 35, § 2º, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19 (item 4.2.1 do parecer conclusivo, 45526782; comprovantes ID 45520337).

Em defesa, a candidata argumenta que destinou a quantia de R$ 3.922,32 para a conta do Fundo Partidário da agremiação, anexando captura de tela da solicitação do reembolso desse valor junto ao fornecedor Facebook (petição, ID 45520330; solicitação de reembolso, ID 45520337).

Todavia, não há comprovação do efetivo envio da referida solicitação de reembolso ao fornecedor Facebook, nem do correspondente recebimento dos valores na conta da agremiação destinada ao recebimento do Fundo Partidário.

Dessa forma, não há justificativa para afastar a falha constatada, pois a candidata encerrou sua campanha com créditos não utilizados junto ao Facebook, oriundos de recursos do Fundo Partidário, os quais deveriam obrigatoriamente ter sido devolvidos, uma vez que não houve contraprestação de serviços, e restituídos ao partido político via conta Fundo Partidário, conforme estabelece o art. 35, § 2º, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Eventual dificuldade do prestador na obtenção junto à empresa do respectivo ressarcimento ou do comprovante fiscal deve ser dirimida na via processual própria, pois a jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que a responsabilidade pela gestão dos valores destinados à campanha eleitoral cabe exclusivamente aos candidatos, às candidatas e aos respectivos partidos políticos, não sendo legítima a transferência de responsabilidade a terceiros (nesse sentido: TRE/RS – PCE n. 060237477, Relatora Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Publicação: DJE, Tomo 273, 16.12.2022; TRE-RS – PCE n. 0603167-16, Relatora: Desembargadora Eleitoral Elaine Maria Canto da Fonseca, Julgamento: 19.6.2023, Publicação: DJE, Edição n. 111/23, em 22.6.2023).

Com efeito, o § 10 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe que: “O pagamento dos gastos eleitorais contraídos pelas candidatas ou pelos candidatos será de sua responsabilidade”.

A unidade técnica entende que, por falta de comprovação dos gastos com recursos do Fundo Partidário, o montante de R$ 3.922,32 deve ser devolvido ao Tesouro Nacional, de acordo com o art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Entretanto, quando se trata de créditos de impulsionamento de conteúdo de internet, a ausência de comprovação da utilização de recursos do Fundo Partidário acarreta o dever de o candidato transferir ao partido político a referida importância, a ser depositada na conta “Fundo Partidário” da agremiação, consoante disposição do art. 35, § 2º, inc. II, e do art. 50, III, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Conclusões

A soma das irregularidades representa R$ 8.922,32 (R$ 5.000,00 + R$ 3.922,32), equivalente a 1,78% do total de recursos recebidos pela candidata em sua campanha (R$ 500.000,00), enquadrando-se no parâmetro fixado na jurisprudência desta Justiça Especializada, de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade, para formar juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade (inferior a 10% da arrecadação financeira).

Portanto, em linha com o entendimento da Procuraria Regional Eleitoral (ID 45563785), impõe-se a aprovação com ressalvas das contas, na forma do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ressalto que deixo de determinar o recolhimento ao erário de R$ 5.000,00, relativos ao apontamento de dívida de campanha, nos termos da fundamentação.

Ante o exposto, VOTO pela aprovação das contas com ressalvas referentes ao pleito de 2022 apresentadas por MARIA DA GLORIA MENEGOTTO, determinando a transferência do valor de R$ 3.922,32 (três mil novecentos e vinte e dois reais e trinta e dois centavos) para a conta bancária vinculada ao “Fundo Partidário” da agremiação pela qual concorreu, órgão estadual do União Brasil (UNIÃO), conforme art. 35, § 2º, inc. II, e art. 50, III, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19, relativamente  à ausência de comprovação de utilização de recursos do Fundo Partidário.

Com o trânsito em julgado, anotações de estilo e satisfação de obrigações, arquivem-se os autos com baixa na instância pertinente.