PCE - 0602302-90.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/07/2024 00:00 a 25/07/2024 23:59

VOTO

Trata-se de processo de prestação de contas referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha de MARIA TEREZA TAVARES FUJII, candidata a deputada federal nas Eleições Gerais de 2022.

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI) apontou falhas na contabilidade consubstanciadas em recebimento de recursos de origem não identificada e ausência de devida comprovação de gastos com recursos do FEFC.

Passo à análise das falhas relatadas.

I – Dos recursos de origem não identificada.

No parecer conclusivo, houve a identificação de omissões na prestação de contas da candidata, relativamente a gastos não declarados, consoante o seguinte fragmento, litteris (ID 45571542):

3.1. Foram identificadas as seguintes omissões relativas às despesas constantes da prestação de contas em exame e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, obtidas mediante o confronto com notas fiscais eletrônicas (notas em anexo no ID 45463116) de gastos eleitorais, revelando indícios de omissão de gastos eleitorais, infringindo o que dispõe o art. 53, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.607/19:

A prestadora manifestou-se juridicamente ID 45515291, todavia permanecem tecnicamente as falhas, eis que as notas fiscais citadas foram emitidas em nome da candidata, não se enquadrando no art. 43 da Resolução TSE n. 23.607/19, uma vez que os gastos com a finalidade de apoiar candidata ou candidato de sua preferência até o valor de R$1.064,10 deve ser emitido em nome da eleitora ou do eleitor. Quanto a justificativa de que parte das notas tratam-se de gastos com Fundo de Caixa, cabe destacar que não foram seguidos os requisitos do art. 39 da Resolução TSE n. 23.607/19. Por fim quanto a justificativa de que as notas foram pagas pela candidata em razão da demora na disponibilização dos recursos oriundos do FEFC pelo Partido, tal justificativa não elide a falha da ausência de trânsito prévio por conta bancária de campanha.

Assim, por não comprovação da origem dos recursos utilizados na campanha, considera-se irregular o montante de R$ 5.274,92, passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme o art. 14 e o art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Este Colegiado já formou jurisprudência no sentido de que a simples emissão de nota fiscal contra o CNPJ de campanha gera a presunção de existência da despesa eleitoral, que somente pode ser afastada caso haja provas de seu efetivo cancelamento, retificação ou estorno.

Nessa linha, o prestador de contas, verificando a existência da nota fiscal e não reconhecendo o dispêndio, deve promover seu cancelamento junto ao estabelecimento emissor, consoante os procedimentos previstos no art. 92, § 6°, da Resolução TSE n. 23.607/19, sob pena de ser caracterizada a omissão de registro de despesas em infringência ao disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

É dizer, segundo este Regional, as despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos gastos de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal da concorrente, caracterizando o recurso como de origem não identificada.

Nesse trilhar, trago à colação precedente desta Corte:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. VEREADORA. OMISSÃO DE GASTOS ELEITORAIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. SAQUE ELETRÔNICO DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. CONFIABILIDADE CONTÁBIL. MACULADA. RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. RECOLHIMENTO DOS VALORES AO TESOURO NACIONAL. VALOR NOMINAL DAS IRREGULARIDADES. DIMINUTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO. PROVIMENTO PARCIAL.

(...).

2. Detectadas 07 (sete) notas fiscais emitidas contra o CNPJ de campanha, sem que os recursos para quitação da despesa tenham transitado pelas contas bancárias da candidata, indicando omissão de gasto eleitoral. Os gastos não contabilizados afrontam o art. 53, inc. I, als. “g” e “i”, da Resolução TSE n. 23.607/19. Nesse trilhar, a Corte Superior entende que a omissão em tela viola as regras de regência e macula a confiabilidade do ajuste contábil.

3. As despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação da dívida de campanha, cujo trânsito ocorreu de modo paralelo à contabilidade formal da candidata, caracterizando o recurso como de origem não identificada, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

(...).

(TRE-RS, REl 06006545520206210094, Relator: Des. Francisco José Moesch, Data de Julgamento: 03.02.2022.) (Grifei.)

 

A esse respeito, destaca-se que o TSE já decidiu que “gastos não declarados que tenham sido informados por fornecedores por meio do Sistema de Registro de Informações Voluntárias, e/ou constem de notas fiscais oriundas das Secretarias das Fazendas Estaduais e Municipais, (...) constituem omissão de despesas” (TSE, Prestação de Contas n. 97795, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, DJE, Tomo 241, Data: 16.12.2019, p. 73).

No tocante às alegações da candidata de que algumas das despesas se referem a gastos custeados por eleitores apoiadores de sua candidatura; que outras com gasolina decorrem de equívoco dos contratados para fornecimento de transporte, ao informarem no estabelecimento o CNPJ da candidata; que outras constituem Fundo de Caixa, de acordo com o art. 39 da Resolução TSE n. 23.607/19; e que o gasto com ALESSANDRO ALVES DA SILVEIRA se trata de doação da candidata, com emissão de recibo eleitoral (ID 45515291), não merecem acolhimento, em face exatamente do entendimento de que a emissão de nota fiscal com o CNPJ de campanha atrai a presunção de gasto pela candidatura.

Calha mencionar que a unidade técnica apontou que “quanto à justificativa de que parte das notas trata-se de gastos com Fundo de Caixa, cabe destacar que não foram seguidos os requisitos do art. 39 da Resolução TSE 23.607/2019” (ID 45571542), de sorte que, sem o preenchimento dos requisitos, não é possível seu acatamento.

Destarte, no presente caso, ressalvado meu posicionamento pessoal, e conferindo primazia do princípio da colegialidade, deve ser considerado como recurso de origem não identificada o montante de R$ 5.274,92, equivalente aos gastos representados por notas fiscais emitidas contra o CNPJ de campanha e quitados com valores desconhecidos, devendo ser determinado, portanto, seu recolhimento ao erário, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

II – Da falta de comprovação do correto uso de recursos do FEFC.

A SAI, em seu parecer conclusivo, indicou que não foram satisfatoriamente comprovados diversos gastos custeados com recursos do FEFC, verbis (ID 45486949):

4.1.1. Foram identificadas as seguintes inconsistências nas despesas pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), contrariando o que dispõem os arts. 35, 53, inc. II, al. "c", e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19:

 

A – Não foi apresentando documento fiscal comprovando a despesa conforme art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

A1 – Não foi apresentando contrato de locação do imóvel comprovando a despesa conforme art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

B – A documentação apresentada não possui descrição detalhada da operação, sendo necessário a descrição qualitativa e quantitativa dos serviços prestados e ou documento adicional de forma a comprovar a prestação efetiva do serviço em conformidade com art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

B1 – Não foi apresentado o documento comprovando a propriedade do veículo.

C – A documentação de comprovação dos gastos com pessoal não apresenta a integralidade dos detalhes previstos no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23607/19, tais como locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado.

C1 – Local de trabalho não especificado;

C2 – Horas trabalhados não informadas;

C3 – Atividades executadas não especificadas;

C4 – Justificativa do preço pago não informada.

A candidata manifestou-se juridicamente no ID 45468140. Até a presente data não foram apresentados esclarecimentos e documentos que alterem as falhas apontadas.

Assim, por não comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, considera-se irregular o montante de R$ 94.840,79, passível de devolução ao Tesouro Nacional, conforme o art. 79, § 1º da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Após aquele laudo pericial, foram juntados novos documentos e emitido novo parecer conclusivo, assim lavrado (ID 45571542):

Quanto aos apontamentos do item 4.1.1 do parecer conclusivo a candidata apresentou esclarecimentos e documentos (ID 45515290 ao ID 45515348) sanando parcialmente as falhas, mantidas as seguintes irregularidades:

a) Quanto ao gasto com o fornecedor VILA REAL PADARIA E RESTAURANTE a prestadora apresentou o documento fiscal (ID 45515339) e consignou que “o item em referência diz respeito à contratação de alimentação”. Examinado a nota apresentada, verifica-se tratar de refeição no valor de R$ 1.689,38, não sendo possível identificar a quantidade de refeições, a finalidade do gasto e sua vinculação com a campanha eleitoral.

b) Quanto ao gasto com o fornecedor GELEI COMERCIO DE BEBIDAS a prestadora apresentou o documento fiscal (ID 45515341) e consignou que “O item em referência diz respeito à realização de despesas diversas a especificar (alimentação, gelo e bebidas)”. Examinado a nota apresentada, verifica-se que foram adquiridas bebidas alcoólicas no montante de R$ 252,00 (22 Latas de SKOL no valor de R$ 88,00 e 41 Latas de AMSTEL no valor de R$ 164,00), não sendo compatível custear esta espécie de gasto com recursos públicos.

c) Quanto ao gasto com o fornecedor CHEVROPEÇAS – MARTINEZ E SILVA LTDA a prestadora juntou o documento fiscal (ID 45515340), o contrato de locação de veículo GM/Astra ano 2001/2001 e o certificado de registro e licenciamento de veículo em nome do locador Barto Olivan Rosa de Farias. Examinado a nota apresentada, verifica-se que foi adquirido radiador e reservatório de água do radiador no montante de R$ 600,00. Destaca-se que a manutenção de veículo não consta do “rol” dos gastos passíveis com recursos públicos do artigo 35 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, por não comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, considera-se irregular o montante de R$ 2.541,38, passível de devolução ao Tesouro Nacional, conforme o art. 79, §1º da Resolução TSE n. 23.607/19.

[...]

CONCLUSÃO

[...]

4) Aplicação irregular dos recursos públicos - As irregularidades na comprovação da aplicação dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, apontadas no item 4.1.1, montam em R$ 2.541,38 e estão sujeitas à devolução ao Erário na forma do art. 79, § 1º da Resolução TSE n. 23.607/19.

Finalizada a análise técnica das contas, altera-se o total das irregularidades identificadas no parecer conclusivo para R$ 7.816,30 as quais representam 3,38% do montante de recursos recebidos R$ 231.075,33. Assim, como resultado desta Análise dos documentos apresentados após o Parecer Conclusivo, mantém-se a recomendação pela desaprovação das contas exarada no parecer conclusivo (ID 45486949), em observância ao art. 72 da Resolução TSE n.  23.607/19.

 

Deveras, devem ser glosadas as três despesas efetuadas com recursos do FEFC nos exatos termos da manifestação da área técnica.

O dispêndio com o fornecedor VILA REAL PADARIA E RESTAURANTE, na monta de R$ 1.689,38, representado pelo documento fiscal sob ID 45515339, cuja descrição consta como sendo “refeição”, não pode, de fato, ter sua regularidade considerada demonstrada, porquanto, ausentes outros elementos de prova ou esclarecimentos, não é possível a aferição de seu vínculo com a campanha eleitoral, nem mesmo economicidade.

Outrossim, a despesa com GELEI COMERCIO DE BEBIDAS, CNPJ n. 07.505.771/0001-80, no valor total de R$ 513,46 (ID 45515341), refere-se, em parte, à aquisição de bebidas alcoólicas, de maneira que a compra de tais produtos, no valor de R$ 252,00, deve ser julgada irregular, pois não poderia ter sido satisfeita com verbas de campanha, máxime por recursos públicos. Nesse sentido, colaciono o julgado:

ELEIÇÕES 2022. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL NÃO ELEITO. DECLARAÇÃO DE GASTO COM COMBUSTÍVEL, SEM REGISTRO DE LOCAÇÃO OU CESSÃO DE VEÍCULOS. IRREGULARIDADE GRAVE. PAGAMENTO DE BEBIDA ALCOÓLICA COM RECURSOS DO FEFC. DESAPROVAÇÃO. 1. A omissão de despesa com locação/cessão de veículos, constatada a partir dos valores despendidos e declarados com combustíveis, configura falha grave, que compromete a aferição da regularidade, especialmente em face do montante do gasto realizado com combustíveis no valor de R$ 3.000,00, que corresponde a 42,38% do total arrecadado na campanha. 2. Aquisição de bebidas alcoólicas pagas com recursos do FEFC configura irregularidade e demanda o recolhimento do valor ao Tesouro Nacional. 3. Desaprovação das contas, com determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

(TRE-PR - PCE: 06027016020226160000 CURITIBA - PR 060270160, Relator: Des. Jose Rodrigo Sade, Data de Julgamento: 15/05/2023, Data de Publicação: 19/05/2023)

 

Por fim, o dispêndio com CHEVROPEÇAS – MARTINEZ E SILVA LTDA, na quantia de R$ 600,00, relativo à compra de radiador e reservatório de água do radiador, mostra-se irregular, uma vez que não são considerados gastos eleitorais e não podem ser pagos com recursos da campanha os custos com “manutenção de veículo automotor usado pela candidata ou pelo candidato na campanha”, consoante dispõe o art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Destarte, em face das irregularidades acima, impõe-se o ressarcimento ao erário, na soma de R$ 2.541,38, com fundamento no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

III – Do Julgamento das Contas.

Assim, as falhas apuradas na análise da contabilidade totalizam R$ 7.816,30 (R$ 5.274,92 + R$ 2.541,38), equivalentes a 3,38% do total arrecadado (R$ 231.075,33), não comprometendo a confiabilidade do ajuste contábil, de sorte que, em conformidade com a jurisprudência pacífica desta Corte, mostra-se cabível a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, para que as contas sejam aprovadas com ressalvas.

 

Ante o exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas de MARIA TEREZA TAVARES FUJII, relativas ao pleito de 2022, com esteio no art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, e pela determinação do recolhimento de R$ 7.816,30 ao Tesouro Nacional, sendo R$ 5.274,92 a título de recursos de origem não identificada e R$ 2.541,38 por ausência de comprovação do regular uso de recursos do FEFC.