ED no(a) PCE - 0602969-76.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/07/2024 00:00 a 18/07/2024 23:59

VOTO

 

Da Admissibilidade

Os embargos são tempestivos. O acórdão foi publicado no Diário da Justiça Eletrônico do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul - DJE/TRE-RS em 26.06.2024 (ID 45648464), tendo sido a peça protocolada em 25.06.2024.

Tendo o embargante sustentado a existência de contradições na decisão aclarada, a interposição é adequada, de forma a comportar conhecimento por estarem preenchidos, também, os demais pressupostos de admissibilidade.

Do Mérito

No mérito, os embargos são opostos contra o acórdão que, por unanimidade, desaprovou a prestação de contas apresentada pelo ora embargante e determinou o recolhimento de R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais) ao Tesouro Nacional.

A ementa do acórdão embargado está assim redigida:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO NÃO ELEITO. DEPUTADO ESTADUAL. FUNDO PARTIDÁRIO – FP. GASTOS COM PESSOAL. ATIVIDADE DE MILITÂNCIA E MOBILIZAÇÃO DE RUA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DOS DISPÊNDIOS. IRREGULARIDADE RECONHECIDA. FALHA DE ELEVADO PERCENTUAL. INAPLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022.

2. Inconsistências em gastos com pessoal custeados com recursos do Fundo Partidário – FP. Identificadas irregularidades relacionadas à contratação de despesas com “Atividades de militância e mobilização de rua” e no pagamento de valores discrepantes daqueles normalmente praticados no mercado. Dispêndios que não estão devidamente comprovados e não atendem ao previsto no § 12 do art. 35 e no art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, que exigem o detalhamento das despesas com pessoal, com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

3. As justificativas sobre a remuneração dos contratados não devem ser aceitas em razão de os termos dos contratos firmados com os fornecedores não conterem qualquer indicativo que ampare as alegações do prestador de contas. A remuneração contratada diz respeito tão somente ao serviço de entrega de material gráfico a eleitores, com valores bem acima do que usualmente se observa para contratação de panfletagem nos processos de prestação de contas em trâmite nesta Corte. Disparidade de valores representa afronta ao disposto no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, já que a documentação juntada aos autos, relativa às despesas com pessoal, não detalhou os locais de trabalho e eventual especificação de atividades executadas que fosse capaz de justificar os preços contratados.

4. A falha representa 42,89% do montante recebido pelo candidato, de maneira a inviabilizar a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, impondo a desaprovação das contas.

5. Desaprovação. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

 

O embargante sustenta que a decisão é contraditória, alegando que os contratos e os documentos acostados aos autos cumprem integralmente os comandos insculpidos na Resolução TSE n. 23.607/19; que os valores pagos de forma diferenciada entre os prestadores de serviços se justificam pelos diferentes locais nos quais os serviços foram prestados e que os documentos deveriam ser analisados à luz do art. 60, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Como se extrai da leitura das razões dos embargos, não se verifica a indicação objetiva de qualquer contradição interna na decisão, pois as questões trazidas perpassam a reanálise da prova constante nos autos.

Outrossim, não há contradição ou necessidade de aclaramento nos pontos indicados pelo embargante.

O voto enfrenta todos os documentos e alegações apresentados pelo embargante, confrontando-os com o conjunto probatório dos autos e com as disposições da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em relação à justificativa de “terem sido os valores pagos de forma diferenciada entre os prestadores de serviços em razão do local onde os serviços foram prestados”, o acórdão expressamente indica que, no contexto das contas, a alegação se mostra implausível e não está corroborada por outros elementos apresentados nos autos, tais como prova dos gastos extraordinários com deslocamento ou pernoite, motivados pela dificuldade de acesso dos locais abordados.

Cabe o destaque das seguintes passagens do acórdão, que bem elucidam os temas em análise:

As irregularidades identificadas pela Procuradoria Regional Eleitoral (ID 45499321) estão relacionadas à contratação de despesas com “Atividades de militância e mobilização de rua” e ao pagamento de valores discrepantes daqueles normalmente praticados no mercado. Nessa linha, a manifestação apontou a irregularidade das despesas realizadas com Loreci Pereira (R$ 7.200,00) e Mário Luiz Cardoso (R$ 6.300,00), contratados para atividades de panfletagem (ID 45273365 e 45273360), contratos para os quais não haveria justificativa para o preço pago. Esses dispêndios, no montante de R$ 13.500,00, os quais representam 43% dos gastos de campanha, não estariam devidamente comprovados, e não atenderiam ao previsto no § 12 do art. 35 e no art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Os dispositivos invocados exigem o detalhamento das despesas com pessoal, com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado. No caso de contratados que emitam documentos fiscais, estes devem indicar o nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

Em sua defesa, após o novo prazo que lhe foi concedido para manifestação, o prestador de contas peticionou trazendo esclarecimentos (ID 45503494) e sustentando que

Os pagamentos realizados à Loreci Pereira e a Mário Luiz Cardoso, respectivamente nos valores de R$ 7.200,00 e R$ 6.300,00, para atividades de panfletagem se deram em razão dos mesmos realizarem seus serviços na área rural do município de Rosário do Sul, cuja área total é de 4.343,656 km², com muitos locais de difícil acesso e com estradas em péssimo estado, o que na maioria das vezes requeria a permanência dos mesmos naqueles locais, aliado ao fato de serem grandes conhecedores do interior do Município.

Contudo, entendo que não cabe acolher tais justificativas, pois, como apontado no parecer do Ministério Público Eleitoral, é questionável que o candidato invista recursos de maior monta para entrega de panfletos no meio rural, cuja baixa densidade demográfica significa atingir um pequeno número de eleitores.

As justificativas sobre a remuneração dos contratados não devem ser aceitas em razão de os termos dos contratos firmados com os fornecedores não conterem qualquer indicativo que ampare as alegações do prestador de contas. Ademais, a remuneração contratada diz respeito tão somente ao serviço de entrega de material gráfico a eleitores, com carga horária de 22 horas semanais, no montante de R$ 2.500,00 por semana em relação à Loreci (ID 45273365) e de R$ 2.100,00 por semana para Mário (ID 45273360), valores bem acima do que usualmente se observa para contratação de panfletagem nos processos de prestação de contas em trâmite nesta Corte.

As pactuações são muito semelhantes, se não iguais àquelas firmadas com GLADIMIR SANTELLANO, remunerado com R$ 1.100,00 por semana (ID 45273359), e ALDOIR BORGES MACIEL, que recebeu R$ 400,00 por semana (ID 45273358).

Tal disparidade de valores representa afronta ao disposto no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, já que a documentação juntada aos autos, relativa a despesas com pessoal, não detalhou os locais de trabalho e eventual especificação de atividades executadas que fossem capaz de justificar os preços contratados.

Nesse sentido, menciono julgado relativo às Eleições 2022 semelhante ao caso que ora se examina:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. DEPUTADO FEDERAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. ALTO PERCENTUAL. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.
1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022.

2. Ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. Identificadas omissões de informações que a legislação de regência indica como obrigatórias. Ademais, em se tratando de prestação de contas eleitorais, não basta que as despesas sejam respaldadas por documentos que, individual ou unilateralmente, apontem para a regularidade da contratação. Necessário que o conjunto se mostre coeso, que os valores envolvidos sejam razoáveis e consentâneos aos praticados no período eleitoral pelos candidatos em situações similares e, ainda, que haja coerência, ainda que mínima, entre os pagamentos realizados aos diferentes contratados para o mesmo serviço. No caso dos autos, há gritantes discrepâncias, sem que as razões trazidas pela defesa possam mitigá-las. Documentos incapazes de comprovar as alegadas prestações de serviços eleitorais, ainda que no referente à especificação das atividades apresentem duas categorias: “panfletagem” e “assessoria de campanha eleitoral”. Determinado recolhimento da quantia irregular ao erário.
3. A irregularidade representa 29,70% do total de recursos declarados pelo prestador, o que impede que se entenda o juízo de aprovação com ressalvas como razoável ou proporcional.

4. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº060234794, Acórdão, Des. Afif Jorge Simoes Neto, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 28/09/2023.) (Grifei.)

Concluo, portanto, que a regularidade dos gastos em questão não pode ser reconhecida, em razão da violação ao disposto no art. 35, § 12, e art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, considero não superadas as irregularidades, restando sem comprovação as despesas eleitorais com a utilização de recursos oriundos do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos – FP, no valor total R$ 13.500,00, sendo impositiva a determinação de recolhimento deste montante ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução supramencionada.

 

Logo, como demonstrado acima, os temas alegados como contraditórios pelo embargante foram adequadamente enfrentados na decisão, inclusive em relação à determinação de devolução de valores, que resulta de imposição normativa, consoante previsto no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Considerando que o embargante busca se valer do recurso integrativo para buscar revaloração do material probatório, e por não se constatar a existência de qualquer vício na decisão, suas alegações devem ser rejeitadas.

Por fim, o embargante postula o prequestionamento dos §§ 2º e 4º do art. 30 da Lei n. 9.504/97, que assim prescrevem:

Art. 30. A Justiça Eleitoral verificará a regularidade das contas de campanha, decidindo:(Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009)

[…].

§ 2º Erros formais e materiais corrigidos não autorizam a rejeição das contas e a cominação de sanção a candidato ou partido.

[…].

§ 4º Havendo indício de irregularidade na prestação de contas, a Justiça Eleitoral poderá requisitar do candidato as informações adicionais necessárias, bem como determinar diligências para a complementação dos dados ou o saneamento das falhas. (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

 

O dispositivo invocado não socorre o embargante, uma vez que, conforme exposto no acórdão embargado, as irregularidades identificadas, envolvendo a comprovação do uso de recursos públicos, são substanciais e relevantes no conjunto das contas. Além disso, o prestador restou especificamente intimado para apresentação de informações adicionais, vindo a se manifestar oportunamente (ID 45503494), porém não logrou oferecer alegações ou documentos idôneos para o saneamento das falhas.

Quanto ao mais, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil, consideram-se “incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento”.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo conhecimento e pela rejeição dos embargos de declaração.