PCE - 0603411-42.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/07/2024 00:00 a 11/07/2024 23:59

VOTO

Cuida-se de prestação de contas apresentada por FERNANDO RODRIGUES CANTES, candidato que alcançou a suplência para o cargo de deputado estadual pelo Partido Social Democrático (PSD), referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às Eleições Gerais de 2022.

Passo à análise das falhas apontadas pela unidade técnica.

Da aplicação irregular dos Recursos do FEFC destinados à campanha de pessoa negra

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI) apontou que o prestador, que se autodeclara da cor preta, realizou transferência de recursos do FEFC destinados ao custeio de campanha de pessoa negra para o candidato Nereu Crispim (homem de cor branca), sem a demonstração de que a doação tenha beneficiado o doador, infringindo o disposto no art. 17, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Art. 17. O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) será disponibilizado pelo Tesouro Nacional ao Tribunal Superior Eleitoral e distribuído aos diretórios nacionais dos partidos políticos na forma disciplinada pelo Tribunal Superior Eleitoral (Lei nº 9.504/1997, art. 16-C, § 2º) .

[…]

§ 6º A verba do Fundo Especial de Financiamento das Campanhas (FEFC) destinada ao custeio das campanhas femininas e de pessoas negras deve ser aplicada exclusivamente nestas campanhas, sendo ilícito o seu emprego no financiamento de outras campanhas não contempladas nas cotas a que se destinam. (Redação dada pela Resolução nº 23.665/2021)

 

No caso, verifica-se que o prestador recebeu a quantia de R$ 50.000,00 em recursos do FEFC e emitiu um cheque no valor de R$ 49.000,00, constando ele próprio, enquanto pessoa física, como beneficiário. Na sequência, o valor foi depositado, utilizando o CNPJ de campanha do concorrente, na conta do candidato a deputado federal Nereu Crispim.

A operação pode ser aferida no sistema Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais desta Justiça Especializada (Conta bancária de Fernando – https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2022/2040602022/RS/210001696165/extratos. Conta bancária de Nereu – https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2022/2040602022/RS/210001613987/extratos. Acesso em 06.03.2024).

Visando sanar a demanda, o prestador apresentou tese indicando que “foi efetuado acordo entre vários candidatos que efetuariam contratações em parceria para que se conseguisse melhor preço no volume contratado, fazendo com que os valores fossem canalizados para o Deputado Federal Nereu Crispim que possuia uma melhor estrutura e que este efetuaria a contratação e pagamento contabilizando para cada candidato as suas propagandas e os seus benefícios” (ID 45571936).

Com efeito, o relatório da unidade de auditoria pôde aferir que parte do valor doado, R$ 15.390,20, foi utilizado pelo beneficiário em prol da campanha do prestador; todavia, restaram R$ 33.609,80 sem demonstração de uso em favor do doador, montante que deve ser recolhido ao erário.

Registro que a alocação direcionada de recursos destinados a candidaturas de indivíduos de ascendência negra ou parda constitui medida de política pública orientada para a correção da carência de representatividade inerente a esse segmento minoritário.

Por consequência, resta proibida a utilização desses recursos com o intuito de promover a campanha de candidato que não seja identificado como negro ou pardo, exceto nos casos em que esses valores sejam empregados para cobrir despesas compartilhadas, desde que haja prova documental de que tal emprego seja benéfico ao candidato enquadrado como beneficiário das cotas, em conformidade com as disposições delineadas pelo já citado art. 17 em seu § 7º:

Art. 17 (…)

§ 7º O disposto no § 6º deste artigo não impede: o pagamento de despesas comuns com candidatos do gênero masculino e de pessoas não negras; a transferência ao órgão partidário de verbas destinadas ao custeio da sua cota-parte em despesas coletivas, desde que haja benefício para campanhas femininas e de pessoas negras. (Redação dada pela Resolução nº 23.665/2021) (Grifei.)

 

É o entendimento firmado nesta Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). AUSÊNCIA OU INSUFICIÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DESPESA. INOBSERVÂNCIA DO ART. 38 DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. VERBA DESTINADA AO CUSTEIO DA CAMPANHA DE PESSOA NEGRA. CONFIGURADO DESVIO DE FINALIDADE. ALTO PERCENTUAL DAS IRREGULARIDADES. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. 1. Prestação de contas apresentada por candidata não eleita ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022. Aplicações irregulares de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). 2. Ausência ou insuficiência de comprovação de despesa, nos termos do art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. Débitos bancários sem identificação do fornecedor beneficiário do pagamento ou com divergência entre tais informações. Inobservância do art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19. A realização de gastos com recursos do FEFC mediante a utilização de forma de pagamento vedada importa em utilização indevida de recursos públicos, ensejando o recolhimento ao Tesouro Nacional nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19. 3. Recebimento de recursos do FEFC, cuja origem é de candidata que se declara negra, sem a indicação de benefício para sua campanha. Não atendimento aos §§ 6º e 7º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19. Configurado desvio de finalidade, devendo o valor repassado irregularmente ser recolhido ao Tesouro Nacional. 4. A soma das irregularidades identificadas corresponde a 41,83% da receita total declarada pela candidata, tornando imperativa a desaprovação das contas. 5. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional. (TRE-RS. PCE n. 0603392-36.2022.6.21.0000. Relator Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira. Julgado em 28.11.2023. Publicado em 30.11.2023 - DJE/TRE-RS, edição n. 218/2023)

 

A corroborar tal entendimento, transcrevo ementas de arestos dos Tribunais Regionais Eleitorais do Maranhão, Curitiba e Fortaleza, por mim grifadas:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2022. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DEPUTADO ESTADUAL. DESCUMPRIMENTO DO PRAZO PARA ENVIO DOS RELATÓRIOS FINANCEIROS. DIVERGÊNCIA DE INFORMAÇÕES DE DESPESAS NAS PRESTAÇÕES DE CONTAS PARCIAIS E FINAIS. DESPESAS REALIZADAS EM DATA ANTERIOR ÀQUELA PREVISTA PARA ENTREGA DAS CONTAS PARCIAIS. IRREGULARIDADES QUE NÃO COMPROMETEM A FISCALIZAÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL. AUSÊNCIA DE NOTA FISCAL REFERENTE AOS SERVIÇOS DE CONTABILIDADE. DESNECESSIDADE. TRANSFERÊNCIA DE RECURSOS DO FEFC. CANDIDATO DE PARTIDO DIVERSO. VEDAÇÃO. ART. 17, § 2º, DA RESOLUÇÃO TSE Nº 23.607/2019. TRANSFERÊNCIA DE RECURSOS DO FEFC DE CANDIDATO AUTODECLARADO NEGRO PARA CANDIDATO BRANCO. VEDAÇÃO. ART. 17, § 6º, DA RESOLUÇÃO TSE Nº 23.607/2019. IRREGULARIDADES GRAVES. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICAÇÃO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS DAS CONTAS. RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL.

(...)

7. O repasse de recursos do FEFC por candidato autodeclarado negro/pardo a candidato autodeclarado branco, fora do permissivo legal do art. 17, § 7º, da Resolução TSE nº 23.607/19, configura desvio de finalidade dos recursos destinados ao financiamento de tais campanhas (“cota racial”), sendo falha de natureza grave, caracterizando gasto irregular de recursos. 8. Irregularidades correspondentes a 0,77% do total de despesas efetuadas, de forma que aplicáveis os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a fim de afastar a desaprovação e aprovar as contas com ressalvas. 9. Contas aprovadas com ressalvas. Recolhimento ao erário de valores oriundos do FEFC. (TRE-MA - PCE: 06017771720226100000 SÃO LUÍS - MA, Relator: Des. Andre Bogea Pereira Santos, Data de Julgamento: 07/12/2022, Data de Publicação: 10/12/2022)

 

ELEIÇÕES 2022. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DEPUTADO FEDERAL. ATRASO NA ENTREGA DE RELATÓRIOS FINANCEIROS DE CAMPANHA. OMISSÃO DE RECEITAS. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. REPASSE IRREGULAR DE VERBA RECEBIDA DO FEFC DESTINADO A CANDIDATO NEGRO. DEVOLUÇÃO AO TESOURO NACIONAL. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO FEFC PARA PAGAMENTO DE TARIFAS BANCÁRIAS. AUSÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL. OMISSÃO NA PRESTAÇÃO DE CONTAS PARCIAL. INFRAÇÃO DE NATUREZA GRAVE. IRREGULARIDADES NAS DESPESAS REALIZADAS ATRAVÉS DE OUTROS RECURSOS. OMISSÃO DE DESPESAS COM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESNECESSIDADE DE REGISTRO NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. INDICADOR DE AUSÊNCIA DE CAPACIDADE OPERACIONAL DE PRESTADOR DE SERVIÇO. CIÊNCIA DA PRE. IRREGULARIDADES QUE ULTRAPASSAM O LIMITE DE 10% DOS RECURSOS MOVIMENTADOS NA CAMPANHA. INAPLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DESAPROVAÇÃO. 1. O atraso no envio dos relatórios financeiros implica a aposição de mera ressalva quando não se trata de valor significativo e nem impacta a transparência e a fiscalização das contas, além de ser analisada em conjunto com as demais inconsistências. 2. A omissão de despesa de campanha é, em princípio, falha de natureza grave, na medida em que pode encobrir algumas ilicitudes. 3. O uso de recursos financeiros sem o prévio trânsito pelas contas bancárias de campanha impede a aferição da origem dos recursos utilizados, o que caracteriza recurso de origem não identificada (RONI), que deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do artigo 32, § 2º, VI, da Resolução TSE nº 23.607/2019. 4.Identificada a transferência de recursos do Fundo Especial de Campanha (FEFC) da prestação de contas de candidato negro para candidato não pertencente a mesma cota, sem a indicação de benefício para a campanha daquele candidato, contrariando o disposto nos §§ 6º e 7º da Resolução TSE nº 23.607/2019, configura irregularidade, devendo o valor repassado ser recolhido ao Tesouro Nacional, conforme o § 9º desse artigo. 5. A legislação proíbe o pagamento de encargos financeiros ou de multas com recursos públicos advindos do Fundo Partidário ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha. 5.1. Os recursos provenientes do FEFC foram utilizados para o pagamento de tarifas bancárias, encargo não previsto nas vedações estabelecidas no artigo 37 da Resolução TSE nº 23.607/2019, assim não há que se falar em irregularidade. 6. A omissão de movimentação financeira na prestação de contas parcial é infração de natureza grave, e deve ser ponderada em conjunto com as demais irregularidades na prestação de contas. 7. As despesas irregularmente quitadas por meio da conta “outros recursos” configura uma infração na prestação de contas, mas, em não havendo uso de verba pública, é incabível a determinação de devolução dos valores, em virtude da ausência de previsão legal. 8. Não há obrigatoriedade para o prestador registrar gastos com advogado na sua prestação de contas. Precedente do TSE. 9. Indicador relativo à ausência de capacidade operacional de prestador de serviço, obtidos mediante cruzamento de informações, não enseja, por si só, irregularidade na prestação de contas. 10. Irregularidades de natureza grave que, em conjunto, atingem percentual que ultrapassa o limite de 10% dos recursos movimentados na campanha, o que impossibilita a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e enseja a desaprovação das contas. Precedentes do TSE. 11. Contas desaprovadas, com determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. (TRE-PR - PCE: 06030879020226160000 CURITIBA - PR 060308790, Relator: Des. Julio Jacob Junior, Data de Julgamento: 05/09/2023, Data de Publicação: 12/09/2023)

 

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO CEARÁ ELEIÇÕES 2022. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPUTADA FEDERAL. NÃO COMPROVAÇÃO DE DESPESAS COM RECURSOS DO FEFC. VALORES PROVENIENTES DO FEFC E DESTINADO ÀS COTAS RACIAIS TRANSFERIDOS PARA CANDIDATA BRANCA. AUSÊNCIA DE DESPESAS COMUNS. IRREGULARIDADES GRAVES. DEVOLUÇÃO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. CONTAS DESAPROVADAS. 1. Trata–se de Prestação de Contas de Campanha apresentada pela candidata ao cargo de Deputada Federal, Luzilane de Sousa Silva, referente às eleições de 2022. 2. De plano, convém ressaltar que a candidata mesmo devidamente intimada, por duas vezes, para sanar as irregularidades detectadas quedou–se inerte. 3. Sem maiores delongas, verifica–se que a Secretaria de Auditoria opinou pela desaprovação das presentes contas em razão da identificação de irregularidades graves. 4. No tocante à primeira irregularidade, intempestividade da apresentação de relatórios financeiros, foi consignado pela Secretaria de Auditoria que tal falha “caracteriza uma impropriedade formal, que, no tocante ao aspecto técnico, não comprometeu por si só a regularidade das contas, cabendo ressalva”. Este Regional, já em julgamento de processos referentes ao pleito de 2020, definiu que não é esta irregularidade apta a avocar a desaprovação das contas quando não impede a sua fiscalização, caso dos autos. 5. Já em relação à segunda irregularidade, não apresentação dos extratos das contas bancárias referentes ao Fundo Partidário, Fundo Especial de Financiamento de Campanha e Outros Recursos, é cediço ser dever do candidato instruir o seu processo de prestação de contas com toda a documentação necessária, dentre esta os extratos bancários. 6. Contudo, a gravidade da não apresentação dos extratos bancários pelo candidato vem sendo relativizada quando possível a averiguação da movimentação financeira mediante a análise dos extratos eletrônicos. Caso dos autos. 7. A terceira irregularidade identificada foi a não apresentação dos documentos fiscais, contratos e recibos que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), no valor total de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). 8. verifica–se nos autos que não foram apresentados quaisquer documentos idôneos para comprovação dos gastos com recursos públicos no valor total de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), conforme alertado pela Secretaria de Auditoria deste Regional. Referida irregularidade é de natureza grave uma vez que macula a regularidade das contas, conforme precedentes do Tribunal Superior Eleitoral. 9. Por fim, foi identificada a quarta irregularidade de transferência no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha da prestação de contas da candidata negra para a candidata Maria Maguida Lacerda de Mesquita, que conforme se verifica em seu registro de candidatura, Processo nº 0601131–18.2022.6.06.0000, é autodeclarada branca, sem a indicação de benefício para a campanha da candidata negra, contrariando o disposto nos §§ 6º e 7º do Art. 17 da Resolução TSE nº 23.607/2019. 10. Os recursos do FEFC destinados às campanhas femininas e de pessoas negras são exclusivos para aplicação nestas campanhas, sendo ilícito o emprego destes recursos nas campanhas de pessoas não contempladas nas cotas a que se destinam. 11. Impende destacar, por importante, que a norma possibilita o emprego do recurso recebido no pagamento de uma despesa comum de candidato negro com um candidato não negro, contudo este não é o caso. 12. Ressalte–se que referida irregularidade configura desvio de finalidade nos termos do § 8º, devendo, inclusive, o valor repassado irregularmente ser recolhido ao Tesouro Nacional, conforme o § 9º. Precedentes deste Regional. 13. Por fim, merece destaque que tendo em vista a gravidade das irregularidades detectadas, bem como totalizar o montante de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), representando 100% (cem por cento) dos recursos arrecadados na campanha, não há o que se falar em aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade ao caso, nos termos dos precedentes do Tribunal Superior Eleitoral. 14. Assim, conforme destacado pela Secretaria de Auditoria deste Regional, deve ser recolhido ao Tesouro Nacional o valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) dos recursos oriundos do FEFC não comprovados e repassados indevidamente para campanhas de candidatos não negros. 15. Diante do exposto, considerando que a candidata não cumpriu as exigências legais atinentes ao caso, restando irregularidades que impediram a escorreita fiscalização das contas de campanha e macularam a regularidade destas, a desaprovação das presentes contas é medida que se impõe, nos termos do art. 74, inciso III, da Resolução TSE nº 23.67/2019. 16. Contas desaprovadas. Recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. (TRE-CE - PCE: 06024684220226060000 FORTALEZA - CE, Relator: Des. RAIMUNDO DEUSDETH RODRIGUES JUNIOR, Data de Julgamento: 16/05/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 101, Data: 19/05/2023)

 

Dessa maneira, na ausência de emprego dos recursos em despesas de caráter compartilhado, e na falta de evidência que ateste a vantagem conferida ao candidato doador, a doação deve ser considerada de natureza irregular, acarretando a obrigação de ressarcimento do montante correspondente aos cofres públicos, de maneira conjunta e solidária entre o doador e o candidato beneficiário da doação, conforme estabelecido pelo § 9º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

§ 9º Na hipótese de repasse de recursos do FEFC em desacordo com as regras dispostas neste artigo, configura-se a aplicação irregular dos recursos, devendo o valor repassado irregularmente ser recolhido ao Tesouro Nacional pelo órgão ou candidata ou candidato que realizou o repasse tido por irregular, respondendo solidariamente pela devolução a pessoa recebedora, na medida dos recursos que houver utilizado.

 

Portanto, na esteira do parecer da SAI, reconheço a irregularidade, devendo o valor de R$ 33.609,80 ser recolhido ao Tesouro Nacional.

 

Da aplicação irregular de recursos do FEFC para pagamento de despesas de pessoal

A SAI aponta irregularidade na aplicação de recursos do FEFC em razão do pagamento de despesa com pessoal em desacordo com os termos do art. 53, inc. II, e art. 60, c/c o art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19.

O desembolso em apreço foi efetuado em favor do provedor de serviços Pedro Conceição Riegel, no montante de R$ 1.000,00, carecendo o contrato de prestação de serviço de adequada descrição das empreitadas efetuadas, bem como contendo lacunas e inexistindo assinaturas das partes contratantes (ID 45255419).

Saliento que a constatação de pagamentos destituídos de fundamento em instrumentos contratuais ou em registros fiscais apropriados obstaculiza a capacidade de discernir a correção dos serviços fornecidos.

Além disso, a omissão do detalhamento concernente às circunstâncias laborais, tais como o local das atividades, horas trabalhadas, atividades executadas e justificativa do preço contratado, inviabiliza a fiscalização da correta aplicação dos recursos públicos derivados do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

A jurisprudência desta Corte, em casos análogos, é pelo recolhimento da quantia malversada ao erário:

RESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). APRESENTAÇÃO PARCIAL DE CONTRATOS DE MILITÂNCIA. AUSÊNCIA DE DOCUMENTO FISCAL DE DESPESA. ALTO PERCENTUAL DAS IRREGULARIDADES. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. 1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022. 2. Irregularidades na aplicação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). 2.1. Apresentação parcial de contratos de militância, em desacordo com o art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19. A ausência das informações relativas às condições de trabalho, como local das atividades, horas trabalhadas, tarefas executadas e justificativa do preço contratado impossibilita a fiscalização da correta utilização dos valores. 2.2. Pagamento realizado com verbas da conta FEFC sem efetiva comprovação do gasto eleitoral. Ausência de documento fiscal de despesa, em violação ao art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19. 3. O total das irregularidades representa 44,60% dos recursos recebidos pelo candidato e extrapola os parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça especializada para aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, de modo a formar um juízo de aprovação com ressalvas dos registros contábeis (abaixo de R$ 1.064,10 e inferior a 10% da arrecadação financeira). 4. Desaprovação. Determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional.(TRE-RS. PCE n. 0602803-44.2022.6.21.0000. Desa. Eleitoral Patrícia da Silveira Oliveira. Julgado em 28.11.2023. Publicado em 30.11.2023 - DJE/TRE-RS, edição n. 218/2023)

 

Portanto, reconheço como irregular a aludida despesa de R$ 1.000,00, valor que deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, as irregularidades totalizam R$ 34.609,80 (R$ 33.609,80 + R$ 1.000,00), que corresponde a 52,3% do montante de recursos recebidos pelo candidato (R$ 66.089,98), soma que supera em valor nominal e percentual os parâmetros utilizados por esta Corte para, aplicados os pressupostos de razoabilidade e proporcionalidade, mitigar o juízo de desaprovação das contas.

Gizo, por fim, que o valor glosado deverá ser objeto de determinação de recolhimento de forma solidária entre os candidatos Fernando Rodrigues Cantes e Nereu Crispim, por força do disposto no art. 17, § 9º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação das contas de FERNANDO RODRIGUES CANTES, com fundamento no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e determino o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 34.609,80, a título de recursos malversados do FEFC.