REl - 0600623-39.2020.6.21.0028 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/07/2024 às 09:30

VOTO

Inicialmente, passo ao exame da matéria preliminar.

1. PRELIMINARES

1.1 Pedido de execução imediata da sentença e litigância de má-fé por parte do PDT de Muliterno

No recurso interposto pelo PDT de Muliterno/RS e o candidato a vice-prefeito não eleito Fabiano Pitton, foi requerida a execução imediata da decisão para o afastamento dos candidatos Adair Barilli e Flávio Pitton dos cargos eletivos de prefeito e vice-prefeito com fundamento em precedentes do TSE publicados nos anos de 2004 e 2006.

Em contrarrazões, os recorridos Adair Barilli, Flávio Pitton, Vinícius Mognom Rugini, Rodrigo Mognon e Vitassir Brollo apontaram que o § 2° do art. 257 do Código Eleitoral, incluído pela Lei n. 13.165, de 2015, dispõe que o recurso deve ser recebido pelo Tribunal competente com efeito suspensivo, e que a execução da decisão somente pode ser realizada com o trânsito em julgado. Além disso, requereram a aplicação da pena de litigância de má-fé entendendo que o pedido de execução imediata formulado pelos autores da ação se enquadra na hipótese legal de deduzir pretensão contra texto expresso de lei (art. 80, inc. I, do CPC), uma vez que os julgados citados são anteriores à inclusão do § 2° do art. 257 do Código Eleitoral.

Apesar de o requerimento de efeito suspensivo ter sido tacitamente acolhido nesta Corte, por ser automático e decorrente da previsão legal, merece ser ressaltado que, segundo o TSE, “o efeito suspensivo automático previsto neste parágrafo limita-se à cassação de registro, ao afastamento do titular ou à perda de mandato eletivo, não alcançando, portanto, a inelegibilidade decorrente da condenação” (julgamento dos acórdãos nos ED-RO-El n. 060083352 de 30.3.2023, e AgR-RO-El n. 060880963 de 10.11.2020).

Assim, nada obstante a sentença ainda não tenha sido executada, apenas anoto que o entendimento jurisprudencial do TSE é no sentido de que o efeito suspensivo alcança somente a penalidade de cassação do mandato dos candidatos.

Quanto à alegação de litigância de má-fé, penso que a mera dedução de pretensão com fundamento em jurisprudência superada não caracteriza propriamente uma hipótese de litigância de má-fé a atrair a fixação de multa, ainda que o pedido tenha sido deduzido contra disposição expressa de artigo de lei, cabendo ao julgado a aplicação da legislação sem depender das indicações das partes, em consonância com os aforismos da mihi factum, dabo tibi ius e iura novit curia.

Também aponto que a execução da sentença não é condicionada ao trânsito em julgado devido à inexistência de disposição legal que estabeleça tal exigência. Depois do julgamento do recurso ordinário, vige a regra da execução imediata prevista no § 1° do art. 257 do Código Eleitoral e na ADI n. 5.525, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da expressão “após o trânsito em julgado” prevista no § 3º do art. 224 do Código Eleitoral.

Julgado o recurso, o cumprimento do acórdão deve ser realizado após sua publicação, conforme entendimento jurisprudencial sedimentado no TSE e neste Tribunal (TRE-RS, ED no(a) REl n. 060047228, Rel. Des. Fed. Luis Alberto Dazevedo Aurvalle, DJe 17/11/2022; TSE, RESPe n. 21155/MA, Rel. Min. Sérgio Silveira Banhos, DJe 05/11/2019).

De se observar que atualmente o TSE dispensa até mesmo a publicação para a execução do julgado, determinando o cumprimento de suas decisões logo após o julgamento, independentemente de publicação.

Aliás, o TSE, no RESPE n. 21155/MA decidido por unanimidade, o Ministro Sérgio Banhos foi categórico ao assentar que “a duração certa dos mandatos eletivos não permite, por si só, acolher a exigência de decisão definitiva para execução dos pronunciamentos da Justiça Eleitoral, sob pena de manifesta ineficácia de suas próprias decisões”.

Com esses fundamentos, rejeito a alegação de litigância de má-fé.

 

1.2 Nulidade e ilicitude da gravação ambiental de áudio

Os recorrentes Adair Barilli, Flávio Pitton, Vinícius Mognom Rugini, Rodrigo Mognon, Vitassir Brollo e Luciano Pelissaro suscitaram a ilicitude da gravação ambiental de áudio, e requereram o seu desentranhamento do feito.

Foi atacada a forma de obtenção da prova e afirmado que a gravação é clandestina, requerendo-se a declaração da nulidade das demais provas colhidas ao longo da instrução sob o argumento de que seriam derivadas de prova ilícita e, por isto, não poderiam amparar a sentença em face da teoria dos frutos da árvore envenenada.

Contextualizando o cenário político em que foi realizada a gravação de áudio, os autores narram que Adair Barilli e Flávio Pitton foram eleitos, respectivamente, prefeito e vice-prefeito de Muliterno/RS nas Eleições de 2020 pela coligação Com a União a Gente Faz (PTB-PP-MDB), com apenas 3 votos de diferença dos segundos colocados, Fernando dos Santos e Fabiano Pitton, que concorreram pelo PDT, em uma eleição acirrada de 976 votos contra 979 votos entre as chapas majoritárias.

Após o pleito, em 25.11.2020, o PDT de Muliterno e os candidatos não eleitos Fernando e Fabiano ajuizaram a presente ação sustentando terem obtido acesso - por intermédio de eleitores cooptados pelos investigados e informações que passaram a circular em grupos de conversas de WhatsApp - a diversas provas e à gravação ambiental de áudio de conversa realizada entre a então Secretária de Administração Municipal, Juliana Vieira (que gravou o diálogo), e o candidato Adair Barilli, na Prefeitura, cujo tema era a compra do voto de Juliana, de seu pai, e a obrigatoriedade de Juliana divulgar propaganda eleitoral em razão de ter sido investida no cargo em comissão.

Com a apresentação de outros elementos de prova diversos da gravação, os autores afirmaram ter sido praticado um esquema sofisticado para compra de votos e da abstenção de votos, violação de sigilo do voto (filmagem dos votos pelos eleitores), transporte de eleitores, caixa 2 e abuso de poder econômico visando influenciar o resultado das eleições e garantir o êxito no pleito.

Na inicial, aponta-se que a gravação ambiental de áudio foi realizada pela servidora pública municipal Juliana nas dependências da Prefeitura de Muliterno durante o seu expediente de trabalho e alguns dias antes da data da eleição.

A preliminar de ilicitude da gravação ambiental de áudio foi rejeitada em primeira instância, porque “(…) não foi obtida via interceptação, mas sim gravação por um dos envolvidos no diálogo, o que afasta a necessidade da prévia autorização judicial, mormente no caso dos autos em que a conversa foi captada por um dois interlocutores em ambiente público, ou seja, nos recintos da prefeitura municipal, segundo consta. Igualmente não se trata de conversa cujo conteúdo deva estar sob a tutela da intimidade ou privacidade, nos termos do art. 5º, inc. X, da CF”.

A ex-Secretária Municipal Juliana Vieira - também ouvida como testemunha - disse que a gravação de áudio foi realizada em sua sala de Secretária de Administração, na sede da Prefeitura de Muliterno, porque sofria intimidações e chantagens por parte do candidato Adair Barilli, cuja voz seria a do interlocutor da conversar, o qual teria providenciado, junto ao Prefeito de Muliterno/RS Adriano Luiz Pelissaro, a sua investidura no cargo de Secretária Municipal de Administração em outubro de 2020, em troca do seu voto. As ameaças se referiam à perda do cargo, caso não angariasse mais eleitores, adesivasse seu veículo e divulgasse a propaganda dos candidatos em sua residência.

A matéria foi recentemente analisada pelo Supremo Tribunal Federal que decidiu, em 29.4.2024, ao julgar o Tema 979 da repercussão geral, o seguinte: “No processo eleitoral, é ilícita a prova colhida por meio de gravação ambiental clandestina, sem autorização judicial e com violação à privacidade e à intimidade dos interlocutores, ainda que realizada por um dos participantes, sem o conhecimento dos demais. - A exceção à regra da ilicitude da gravação ambiental feita sem o conhecimento de um dos interlocutores e sem autorização judicial ocorre na hipótese de registro de fato ocorrido em local público desprovido de qualquer controle de acesso, pois, nesse caso, não há violação à intimidade ou quebra da expectativa de privacidade” (RE 1040515, Min. Dias Toffoli, DJe 07/05/2024).

Embora tenha sido consignado pelo STF, em sede de modulação de efeitos da decisão, que a tese fixada deverá ser aplicada a partir das Eleições de 2022, consta do voto do Relator, Ministro Dias Toffoli, a sinalização de que, nos termos da jurisprudência firmada pelo TSE, embora para as Eleições de 2016 em diante a regra seja a da licitude da gravação ambiental feita por um dos interlocutores, sem o conhecimento dos demais, ainda que em ambiente privado, cabe ao órgão julgador aquilatar as circunstâncias do caso concreto, a fim de verificar a admissibilidade da prova.

No caso em tela, foi assumido pela testemunha Juliana e pelos autores que o áudio foi captado na sala da Secretaria Municipal de Administração, razão pela qual considero que efetivamente há ilicitude, pois não houve consentimento do outro interlocutor ou autorização judicial, e a gravação foi realizada em ambiente que apresentava real expectativa de privacidade: o interior de sala dentro do prédio da prefeitura, caracterizando-se a prova como ilícita.

Conforme já decidiu o TRE de Minas Gerais: “Embora a sede Prefeitura seja um bem público, não é um bem de uso comum do povo, mas, sim, um bem público de uso especial. Não se pode presumir que o interior do gabinete do Prefeito seja de acesso do público em geral, uma vez que se trata de local com controle de acesso e de uso restrito” (TRE-MG, RE n. 06008412520206130211, Rel. Des. Patricia Henriques Ribeiro, DJe 18/04/2022).

No conteúdo do áudio e da degravação juntada aos autos, observa-se que a conversa foi reservada e não foi realizada em lugar com acesso franqueado ao público, mas teve o propósito de coagir a eleitora Juliana Vieira a praticar atos de campanha devido ao cargo que ocupava em razão do apoio aos candidatos.

Considero que o entendimento que deve prevalecer é o de que tal gravação é inválida, razão pela qual reputo como ilícita a prova em áudio juntada aos autos, na forma como obtida, a qual é independente das demais provas produzidas, conforme adiante será mais aprofundado.

Portanto, acolho a preliminar de ilicitude da gravação ambiental de áudio.

Destaco.

 

1.3 Nulidade e ilicitude das capturas de tela (print scream), de imagens e áudios do aplicativo WhatsApp – Grupo de WhatsApp denominado “Os Guerreiros do 14”

Os recorrentes Adair Barilli, Flávio Pitton, Vinícius Mognom Rugini, Rodrigo Mognon, Vitassir Brollo e Luciano Pelissaro suscitaram a ilicitude das capturas de tela (print scream), de imagens e áudios do aplicativo WhatsApp apresentados com a inicial e requereram o desentranhamento dessas provas.

A preliminar foi rejeitada pelo juízo a quo com base na conclusão de que “não há nos autos comprovação de que as conversas e mensagens foram obtidas pelos autores de maneira ilícita”, e que o grupo, com mais de 40 integrantes, “obviamente não poderia manter o sigilo pretendido por muito tempo, pois evidente a possibilidade de vazamento das conversas e de outros dados e questões discutidas pelos seus integrantes”, razão pela qual “não pode ser considerada prova ilícita a obtenção desses dados por terceira pessoa” (ID 45562592).

Reproduzo, ainda, os seguintes fundamentos da sentença:

Como já decidido nos autos, não há nenhum indicativo, elemento de prova, ou indícios, de que a parte autora tenha participado, de alguma forma, da captação das conversas, áudios, vídeos e fotos que instruem a inicial, a ensejar a declaração de nulidade pela ilicitude na obtenção desta prova.

 

A prova, assim, não é ilícita.

 

Como bem já asseverado na decisão ID 86557780:

 

“as conversas, os áudios e vídeos juntados aos autos, não foram obtidos via interceptação da parte autora, meio de prova no qual terceiro, geralmente estranho aos interlocutores, capta o conteúdo de diálogos, sendo que tal modo de produção probatória é efetivamente sujeito à reserva judicial, por força do art. 5º, inc. XII, da Constituição Federal. No caso dos autos, isso não ocorreu, ou ao menos nenhuma prova os demandados apresentaram para sustentar a ilicitude da prova neste formato. No caso, compreende-se que a questão ganha contornos bastante delicados porque a parte ré afirma que os representantes não faziam parte do grupo de whatsapp de onde vazaram os conteúdos, tampouco eram seus interlocutores, de forma que a garantia da inviolabilidade do sigilo de dados das comunicações, prerrogativa de índole constitucional, e de indiscutível fundamentalidade ao Estado Democrático de Direito, somente de fato estaria ferida acaso os autores tivessem participado da interceptação, o que não é o caso dos autos, ante a ausência de provas nesse sentido. Ter acesso a um elemento de prova, não significa que tal prova tenha sido obtida na clandestinidade ou na ilegalidade. A prova, integrante da inicial, pode sim ter chegado às mãos dos autores de forma legal e voluntária, possivelmente por um dos integrantes do grupo criado para a interlocução da prática dos ilícitos.

 

No recurso, os réus rebatem a sentença, sustentando não haver como comprovar que os investigantes obtiveram a prova de forma ilícita, e que pressupor a ocorrência de vazamento permite que haja violação de qualquer forma de obtenção da prova, bastando que na sequência se apresente argumento generalista, tendo havido uma inversão do critério de valoração probatória por imposição do dever de produzir uma prova negativa e diabólica.

O argumento não procede, porque na própria inicial os autores declararam terem obtido os documentos por intermédio dos eleitores envolvidos nas conversas e informações que passaram a circular em grupos de WhatsApp, ou seja, que as conversas foram fornecidas espontaneamente pelos integrantes do grupo e interlocutores, não se tratando de anonimato.

Entendo que, no âmbito do processo cível eleitoral, as capturas de tela (print scream) podem ser consideradas como evidências, uma prova documental, desde que sua autenticidade e integridade possam ser comprovadas no curso da instrução, circunstância que foi demonstrada na tramitação processual.

Isso não significa que essas provas devam ser exclusivamente consideradas para fins de condenação, e sim que, aprioristicamente, sua autoria e autenticidade não necessitam ser obrigatoriamente demonstradas, pois essas medidas podem ocorrer durante a instrução, caso a prova seja impugnada, com o respeito ao devido processo legal, conforme estipulado nos arts. 428, inc. I, e 429, inc. II, do CPC.

Neste feito os documentos foram contestados, tendo sido assegurado o exercício das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. E os envolvidos não somente puderam impugnar a prova, como demonstraram a integralidade da captura de tela de uma das conversas de WhatsApp juntadas com a inicial quando apresentaram suas alegações finais (ID 45562586, p. 32).

Embora a defesa tenha indicado outra intenção e finalidade ao diálogo - diferente das referidas na petição inicial -, a autenticidade do documento foi demonstrada nos autos.

Nessa medida, não há nulidade na consideração também dessa prova para o desencadeamento da ação e deferimento de medidas cautelares. Além disso, no contexto das demais provas que instruíram a inicial, essas provas são independentes e delas desvinculadas.

Quanto à alegação de nulidade na obtenção da prova relativamente ao grupo de WhatsApp denominado “Os Guerreiros do 14”, do qual faziam parte todos os investigados, à exceção de Luciano Pelissaro, junto de diversos apoiadores da campanha dos candidatos Adair e Flávio, no total de cerca de 40 pessoas, observa-se no conteúdo nas imagens (prints) uma troca de mensagens sobre quantias em dinheiro na sede da empresa de Vinícius Rugini (“Vini Rugini”): Rugini Comércio de Batatas Eireli - CNPJ n. 14.875.426/0001-01, conhecida como “Batateira”, e transporte de eleitores realizada em área de reserva indígena.

Merece relevo a circunstância de que a imagem do perfil do grupo trazia uma foto representativa de um líder indígena, a demonstrar que havia um especial enfoque no eleitorado indígena durante o pleito (ID 45561818 e ID 45561820), com destaque desta Relatora, em vermelho:

 

 

Essa prova documental não está certificada e nem foi acompanhada de ata notarial, e os investigados afirmam que os investigantes não participaram das conversas de WhatsApp juntadas ao feito, não integravam o grupo de WhatsApp “Os Guerreiros do 14”, nem informaram como obtiveram a prova, que seria ilícita, fundada no anonimato, e consistente em montagens e descontextualizações. Entretanto, no próprio print juntado com a inicial consta a informação de que a captura de tela foi realizada por um integrante do grupo, conforme acima destaquei em vermelho, na imagem da conversa.

Acrescento aos argumentos já apresentados que, quanto ao questionamento sobre a idoneidade do método utilizado para a obtenção da prova, deve prevalecer o entendimento do STF de que a prova é admissível porque: “A divulgação de mensagem em grupo do aplicativo WhatsApp tem dinâmica similar à observada em outras plataformas de mídia social. Isso porque, ao divulgar mensagem nesse tipo de ambiente virtual, o participante sabe, antecipadamente, que ela poderá ser copiada ou encaminhada, alcançando pessoas que não integram o grupo em que originalmente veiculada, mormente quando inexistente qualquer tipo de solicitação de confidencialidade” (STF, MS n. 37325, Rel. Min. Rosa Weber, DJe 20/09/2021).

O acórdão acima mantém uma decisão no sentido de que as mensagens enviadas em grupos do WhatsApp, por sua natureza, possibilitam relacionamentos horizontais e não hierárquicos entre os participantes, equiparando-se à formação de redes sociais; não estão protegidas pelo sigilo, pois mesmo em grupos com número limitado de pessoas as comunicações são consideradas públicas, e não há violação à garantia de inviolabilidade das comunicações telemáticas e telefônicas.

Neste caso concreto é adequado que essa diretriz seja aplicada para considerar que as mensagens e declarações feitas em grupos do WhatsApp realmente estão sujeitas a serem compartilhadas, replicadas e divulgadas em outros grupos, para outros usuários individualmente e até mesmo em outras plataformas de redes sociais.

Tomando por base a premissa de que o usuário que faz uma manifestação em um grupo com vários integrantes não está protegido pela garantia de sigilo telefônico ou telemático, tenho que o método de obtenção da prova merece ser reputado válido, ainda que ela seja indiciária, devendo o seu conteúdo e autenticidade serem valorados de acordo com o conjunto probatório.

Reitero que não se está a dizer que o valor da prova possa ser compreendido de plano como verdadeiro e suficiente para a caracterização do ilícito. A questão é que, por se tratar de grupo de WhatsApp, é plenamente verossímil a lógica de que as mensagens foram repassadas pelos próprios integrantes.

Tendo presente que estamos diante de um processo cível eleitoral, e não de um processo criminal, e que os princípios constitucionais em conflito no feito não envolvem apenas o direito à privacidade e à liberdade de informação, como também os princípios constitucionais do Direito Eleitoral de livre exercício do voto, de sigilo do voto, de liberdade de escolha dos eleitores, de normalidade e legitimidade das eleições, considero que a prova é lícita porque, no conflito entre a privacidade e os demais valores e princípios envolvidos é necessária a realização de um juízo de ponderação, prevalecendo o interesse público na lisura do pleito.

Na inicial os autores demonstraram, ainda que de forma indiciária, que o grupo de WhatsApp do qual faziam parte os candidatos se direcionava à captação ilícita de votos de indígenas e ao transporte desses no dia da eleição, procurando alcançar um eleitorado que pertence a um grupo minoritário e que possui uma importante parcela do eleitorado de Muliterno/RS.

A Terra Indígena, ou Área Indígena, Monte Caseiros, possui pouco mais de mil hectares, está localizada nos municípios de Ibiraiaras e Muliterno/RS, na região nordeste do Estado do Rio Grande do Sul, onde situa-se uma comunidade da etnia Kaingang dividida em três aldeias: Santo Antônio, Vila Nova e Santa Catarina. Contava com o total de cerca de 727 pessoas de acordo com os dados do IBGE em 2022 (https://terrasindigenas.org.br/pt-br/terras-indigenas/4069#demografia).

E sobre a relevância das infrações narradas na inicial, consigno que este Tribunal tem acompanhado os desafios enfrentados nos processos eleitorais para assegurar permanentemente a inclusão dos povos indígenas no cenário eleitoral e o exercício do voto por essas populações, a fim de auxiliar na concretização dos direitos de autonomia e autogoverno reconhecidos aos povos originários pelo direito internacional e pela Constituição Federal de 1988 (https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2023/Abril/abril-indigena-tre-rs-auxilia-nas-eleicoes-para-cacique-na-terra-indigena-guarita).

Ao direcionar esforços para captar votos de uma população em situação de vulnerabilidade social, tem-se um desrespeito flagrante aos direitos fundamentais dessa comunidade, com violação das normas que buscam garantir a lisura do processo eleitoral e a liberdade do exercício do voto.

Portanto, seguindo os parâmetros fixados pelo STJ no sentido de que é necessário avaliar as peculiaridades concretas para fins de decidir qual dos direitos em conflito deverá prevalecer, concluo que os investigantes tinham interesse jurídico em utilizar o conteúdo das conversas do grupo de WhatsApp “Os Guerreiros do 14” como prova nesta ação judicial.

Analisando idêntica questão, o TRE do Maranhão concluiu da mesma forma: “Não merece prosperar a alegação de que os prints de WhatsApp seriam provas ilícitas pois obtidas à revelia das partes envolvidas, pois a presunção é de que as conversas que instruíram a representação foram disponibilizadas por pessoa integrante do grupo, inexistindo qualquer indício de que foram conseguidas de forma forçada ou ilegal. Com isso, não há que se falar em quebra da privacidade ou violação de sigilo de dados, uma vez que o responsável pelo fornecimento dos prints também seria um interlocutor no grupo de conversa, divulgando, desse modo, uma conversa da qual fazia parte” (TRE-MA, REl n. 06000312220206100021, Rel. Des. Cristiano Simas de Sousa, DJe 31/01/2022).

Com esses fundamentos, rejeito a preliminar de ilicitude das capturas de tela (print scream), de imagens e áudios do aplicativo WhatsApp quanto ao Grupo de WhatsApp “Os Guerreiros do 14”.

Destaco.

 

1.4 Nulidade e ilicitude das capturas de tela (print scream), de imagens e áudios do aplicativo WhatsApp – Conversas entre dois interlocutores

A partir do entendimento jurisprudencial antes transcrito, e das conclusões já alcançadas, aplico idêntico raciocínio quanto ao questionamento sobre o método de obtenção da prova referente às conversas de WhatsApp realizadas entre dois interlocutores - os investigados e outros cabos eleitorais -, pois o material foi repassado aos investigantes por uma das pessoas envolvidas nos diálogos, fato comprovado durante a instrução.

É imperioso ressaltar que, assim como ocorrido quanto às capturas de tela do grupo de WhatsApp, as conversas de WhatsApp realizadas entre dois interlocutores são independentes das demais provas acostadas à inicial, e inclusive autônomas em relação às capturas de tela do grupo de WhastApp “Os Guerreiros do 14”. Oportuno assinalar ter sido determinada a apreensão de aparelhos de telefonia celular, a qual resultou positiva em relação aos investigados Vinícius Mognon Rugini e Vitassir Brollo (ID 4551958 e ID 45561956), e que a extração de dados confirmou as conversas contidas nas imagens e nos áudios trazidos na petição inicial.

São diálogos ocorridos em outubro e em datas muito próximas ao pleito, na semana anterior à eleição ou na véspera e dia da votação, que tratam de compra de filmadoras para que eleitores gravassem o voto que havia sido negociado, captação ilícita de sufrágio, dados de eleitores, transporte de eleitores. Reproduzo exemplos (ID 45561879, p. 40):

 

 

Quanto a essas provas também entendo que o direito à privacidade não prevalece diante da evidência de ofensa a princípios e valores do Estado Democrático de Direito, segundo os quais o processo eleitoral deve ser conduzido de acordo com a Constituição e as leis, respeitando os direitos fundamentais, sem malferir a igualdade de oportunidade entre os candidatos, o livre exercício do voto, o sigilo do voto e a legitimidade do pleito.

Na hipótese dos autos não vejo ser possível se manter sigilo absoluto das conversas, devendo essas provas ficarem sujeitas à análise durante a instrução, dentro do devido processo legal, respeitando o contraditório e a ampla defesa.

Não houve exigência alguma de produção de prova diabólica ou impossível, pois foi demonstrado que um dos interlocutores forneceu a prova e foi oportunizado aos investigados, no curso da instrução, contestar seu conteúdo, inclusive com a oitiva do interlocutor da conversa retratada na captura de tela, como se vê dos depoimentos de Renê Zauza e Tainise Batistelo de Oliveira.

Tendo em vista a gravidade dos ilícitos, evidenciados também nos demais indícios independentes de prova, que instruíram a inicial e que não se relacionam nem têm origem nas mensagens de WhatsApp, o interesse público na lisura do pleito, que em Muliterno/RS foi definido em apertada diferença de somente 3 votos, além do interesse jurídico dos investigantes na propositura da ação, não acolho a preliminar de nulidade.

Por fim, afasto a alegação de nulidade das provas suscitada sob a argumentação de que, no âmbito do inquérito policial que tramita em paralelo à presente ação, teria sido concluído que os elementos que acompanharam a inicial não seriam aptos à formação do juízo condenatório, afirmativa que não condiz com a realidade.

Nesse ponto do recurso os investigados pretendem que seja realizada a consulta ao inquérito policial em questão, autuado como IP n. 0600036-80.2021.6.21.0028 no PJe de 1° grau, e pedem que se considere um documento, de ID 110066884, sem indicar se a prova foi compartilhada nesta ação, procedimento incabível. O documento policial referido no recurso não se localiza neste feito, sendo de todo equivocada a afirmação de que “o juízo eleitoral singular deferiu o apensamento do inquérito policial para servir como prova emprestada”.

Não houve apensamento algum. A decisão do ID 45562058 deferiu o compartilhamento das provas já colhidas no Inquérito Policial n. 2020.012086-DPF/PFO/RS, as quais inclusive estão acostadas nos elementos do inquérito juntados pelos demandantes com a manifestação do ID 45562038.

Descabe a pretensão de que se julgue esta ação com base em consulta ao expediente policial. A prova compartilhada, produzida em um processo específico e posteriormente utilizada em outro processo, para o qual é emprestada, não autoriza a parte a requerer que seja realizada uma consulta e coleta de provas diretamente do processo em que foram produzidas, sem a respectiva juntada aos autos e oportunização do contraditório.

Ademais, observa-se que o inquérito policial ainda se encontra na fase de diligências e não foi relatado. O documento referido no recurso é apenas uma Informação de Polícia Judiciária sobre os dados contidos em um pen drive fornecido à Polícia Federal pelo candidato a prefeito Fernando dos Santos.

Este é um processo judicial cível, e o inquérito é um expediente administrativo criminal, extrajudicial, não havendo nulidade alguma porque o procedimento criminal visa apurar os fatos sob a ótica de tipificação penal, como ocorre com os delitos de compra de votos ou corrupção eleitoral (art. 299, CE), falsidade ideológica eleitoral por uso de caixa 2 para o financiamento da campanha (art. 350, CE) e transporte ilegal de eleitores (art. 11, inc. III, c/c os arts. 5º e 10, da Lei n. 6.091/74).

Dessa feita, na ponderação do conflito entre o direito à intimidade e à privacidade (art. 5º, inc. X, da CF/88) e valores fundamentais do Estado de Direito envolvidos nas condutas aventadas na inicial (art. 1º, inc. X; art. 14, da CF/88), afasto a preliminar de ilicitude na obtenção da prova, por violação ao sigilo das comunicações, no que concerne às capturas de tela de conversas de WhatsApp entre dois interlocutores.

Rejeito, igualmente, as alegações de que essas provas foram obtidas por meio ilícito, e a arguição de ofensa aos princípios da inviolabilidade da vida privada e do sigilo das comunicações, pois não verifico ofensa ao art. 5°, incs. XII, LVI, da Constituição Federal e ao art. 157 do Código de Processo Penal.

Destaco.

 

1.5 Aplicabilidade da teoria dos frutos da árvore envenenada quanto ao testemunho de Juliana Vieira

A ex-secretária municipal Juliana Vieira, que forneceu a gravação ambiental de áudio considerada como prova ilícita, foi ouvida como testemunha durante a instrução, e seu depoimento deve igualmente ser alcançado pela declaração de nulidade da prova obtida por derivação.

Juliana Vieira declarou, em juízo, que gravou a conversa porque se sentia ameaçada e pressionada, e que essas condutas eram praticadas durante o horário de trabalho, na prefeitura, confirmando a compra do seu voto em troca do cargo público e do voto de sua família ao custo de R$ 2.000,00 por voto. Transcrevo trechos de seu depoimento, colhidos da longa transcrição contida na sentença, no qual a testemunha afirma ter sido exigido que se filmasse o voto na cabine de votação:

Na gravação ambiental o candidato a prefeito Adair Barilli refere-se à compra do voto de Juliana e de seu pai, e reporta-se à necessidade de Juliana conseguir mais votos para a campanha em razão do cargo por ela ocupado na prefeitura, ao seu dever de fazer propaganda porque o “salário que tu ganha, né, por exemplo, é poucos que ganham” (ID 45562014 e ID 45561814):

4min57seg - Adair Barilli: você por exemplo tem família aí que tu devia trazer dez voto, vocês deixam lá né... eles cobram né... daí a Juliana quantos voto tem? E aí tem que ir lá, tem que comprar o pai dela […]

5min30seg - Adair Barilli: E mesmo, vamo fala, também não vamo... o salário que tu ganha né por exemplo é poucos que ganham né

Juliana: Mas só esse privilégio, só tive só esses mês só porque eu...[…]

7min22seg - Adair Barilli: ...contando empate nos índio tá, só que lá embaixo Juliana tu vai ver essa vez o que que vai acontecer. […]

7min47seg - Adair Barilli: Temo uma... casa por casa, pessoa por pessoa, quem já é declarado, então eu falo... hoje por exemplo eu não tô mais investindo em família nenhuma […]

9min21seg - Juliana: Não, não, porque tipo... meus deus do céu eu... tipo aqueles voto sô eu que controlo sabe né aqueles voto lá, e eu pra tu ter uma ideia aquela de Passo Fundo vai vir segunda, ela ia vim só sexta agora vai vim segunda […]

9min51seg - Juliana: Até pedi pro Cuco se dá, quando ela vim, porque ela vem por Caseiros, se dá pra mandar um carro ir busca e leva ela lá no pai

Adair Barilli: Tá

Juliana: Pode ser né

Adair Barilli: Sim

 

Ocorre que, nos termos da jurisprudência do TSE, “é ilícito, por derivação, o depoimento da testemunha que fez a gravação ambiental tida por ilegal” (AgR-REspe n. 661-19/BA, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 29.9.2015, DJe de 5.11.2015) e "[...] as provas testemunhais produzidas em juízo, e advindas da prova já considerada ilícita - gravação ambiental clandestina -, são ilícitas por derivação, aplicando-se ao caso a teoria dos frutos da árvore envenenada" (REspe n. 190-90/BA, rel. Min. Luciana Lóssio, julgado em 10.5.2016, DJe de 21.6.2016).

Assim, declaro como ilícita a prova relativa ao testemunho de Juliana Vieira.

Contudo, na apreciação da legalidade da decisão judicial que recebeu a ação e deferiu medidas cautelares, verifico que houve fundamentação detalhada sobre a necessidade da apreensão dos aparelhos celulares e quebras de sigilos bancários amparada em provas independentes que não derivam, direta ou indiretamente, da fonte considerada ilícita: a gravação de áudio realizada por Juliana.

Com a inicial foram apresentadas provas autônomas. Além das capturas de telas e áudios de WhatsApp, foram juntadas filmagens de eleitores não identificados inserindo o voto na urna eletrônica (cabine de votação), certidão demonstrando que o candidato Adair Barilli realizou financiamento bancário no valor de R$ 930.000,00 em 02.10.2020, no início da campanha, constando como avalistas Claudino Pitton e Neiva Pelissaro Pitton, tios do candidato a vice-prefeito Flávio Pitton (ID 45561825, p. 3), e um extrato bancário da alegada compra do voto do eleitor de apelido Thintio, identificado como Idelso Antunes de Moraes. O juízo a quo fundamentou o recebimento da ação e determinação das cautelares nessas demais provas carreadas ao feito, as quais são totalmente independentes da gravação ambiental.

A essência das alegações da petição inicial quanto à prática de abuso de poder e captação ilícita de sufrágio, aliada a indícios suficientes de prova e à pequena margem de diferença de votos que definiu o resultado eleitoral, revelou a importância de uma investigação rigorosa para garantir a lisura do processo democrático e a igualdade entre os candidatos, e atendem ao disposto no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90.

Não é necessário que a inicial esteja acompanhada de prova cabal do abuso para o desencadeamento da ação, e no próprio rito da AIJE há um prazo para realizar diligências, ouvir terceiros e requisitar documentos que elucidem os indícios de prova das infrações.

As medidas cautelares não exigem a mesma solidez das provas aptas para a condenação, dependendo somente de elementos indiciários confiáveis, e o requisito legal de presença de indícios da prática abusiva e da captação ilícita de sufrágio restaram atendidos.

Os fatos são por demais graves e ao receber a inicial se mostrava plausível a hipótese de que os dados bancários e telemáticos interessassem ao feito, o que torna legítima a decisão de busca e apreensão, a qual considero razoável e proporcional.

Alcanço, com isso, a conclusão de que havia elementos suficientes de prova para a decretação das medidas cautelares, pois demonstrada a possibilidade de ofensa aos bens jurídicos tutelados pela AIJE, de assegurar a igualdade entre os candidatos, proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício de mandato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do poder de autoridade (art. 14, § 9º, CF).

Com base nas ponderações até então expostas, considero que a prova relativa a capturas de tela (print) de conversas, imagens e áudios de aplicativo WhatsApp que acompanham a inicial e foram juntadas no curso do feito (ID 45561883, ID 45562038), são elementos autônomos e desvinculadas da gravação ambiental de áudio.

Além disso, considero que eventual decretação de nulidade das capturas de tela e áudios de WhatsApp não atrairia, a meu ver, a aplicação da teoria dos frutos da árvore envenenada, ou da ilicitude das demais provas por derivação, afora o testemunho de Juliana Vieira.

O art. 157, § 1°, do CPP, invocado no recurso dos investigados, admite as provas que não possuem o nexo de causalidade com a eventualmente considerada ilícita, na hipótese em que os demais elementos probatórios não estiverem vinculados àquele cuja ilicitude seja alegada, circunstância que verifico presente às exceção do depoimento de Juliana (STJ, RHC n. 46222, Rel. Ministro Felix Fischer, DJe 24/02/2015).

O financiamento bancário em valor expressivo, o extrato sugerindo a compra de voto, os vídeos de eleitores votando, o forte vínculo entre os investigados, e o contexto político de pouquíssima diferença entre os candidatos que disputaram o pleito são fontes independentes da prova obtida por intermédio do WhastApp e a elas desvinculadas, não havendo relação de causalidade.

Os candidatos Adair Barilli (PTB) e Flávio Pitton (PP) concorreram pela coligação formada entre PTB, PP e MDB, e eram apoiados pela situação, o então Prefeito de Muliterno/RS Adriano Luiz Pelissaro, o qual exercia um cargo de vogal na direção executiva do MDB de Muliterno. O investigado Luciano Pelissaro era presidente do PP, e o candidato Adair Barilli atuava como vice-presidente do PTB. Vitassir Brollo, era presidente do PTB. Vinícius Mognom Rugini foi apontado como integrando do PTB, e de fato exerceu o cargo de tesoureiro-geral do diretório municipal do PTB. Rodrigo Mognon, de apelido “Alemão”, apoiador de campanha, seria um dos administradores do grupo de WhatsApp e movimentaria valores utilizados nos ilícitos, situação que somente poderia ser mais aprofundada no curso da instrução.

A estreita relação entre os investigados, demonstrada pelos cargos ocupados nos partidos da coligação, sugeria a possibilidade de coordenação de práticas ilícitas em benefício da candidatura, o que demonstra que a busca e apreensão e quebras de sigilo eram indispensáveis à instrução para a busca da verdade dos fatos.

Com esses fundamentos, tendo presente que o objetivo, aqui, é garantir a efetivação dos princípios democráticos e o respeito à integridade do processo eleitoral, acolho a preliminar de ilicitude da prova por derivação e aplicação da teoria dos frutos da árvore envenenada tão somente quanto ao depoimento judicial de Juliana Vieira.

Resta prejudicada, por consequência, a preliminar de desrespeito ao devido processo legal por ausência de juntada de prova relativa à mídia de gravação de conversa ambiental de áudio.

 

1.6 Ausência de degravação dos áudios do aplicativo WhatsApp áudio

Os investigados sustentam violação ao art. 320 do CPC porque a petição inicial não estava instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação relativos às degravações dos áudios de conversas de WhatsApp, e se insurgem contra a determinação do juízo para que o cartório eleitoral realizasse a degravação, arguindo a quebra da paridade de armas.

A preliminar foi afastada na sentença sob os seguintes fundamentos: “a degravação dos elementos de prova, no caso dos áudios que instruem a inicial, não é uma obrigação legal: “os próprios áudios são a prova, cuja degravação não é exigida por lei. Seja como for, o fato do pedido de degravação ter sido acolhido pelo juízo não torna a prova ilícita, tampouco faz surgir alguma espécie de vício processual. Distante também de configurar alguma ofensa à ampla defesa dos réus”.

Embora o art. 47 da Resolução TSE n. 23.608/19 disponha sobre a necessidade de juntada da cópia da transcrição do conteúdo de mídia em áudio ou vídeo que acompanhe a inicial, verifico que, após a juntada da degravação realizada pelo próprio cartório foi reaberto o prazo para contestação (ID 45562020), oportunizando-se contraditório substancial sobre a prova.

Ainda que desatendido o requisito formal, o entendimento de que os áudios em si são considerados prova não merece reparos, e o fato de o pedido de degravação ter sido acolhido pelo juízo para que o cartório realizasse a transcrição não torna a prova ilícita nem configura qualquer vício ou desequilíbrio processual, pois a ampla defesa foi preservada.

Diferentemente seria esse o entendimento caso os investigados tivessem igualmente solicitado uma degravação de áudio e o juízo de primeiro grau indeferisse o pedido, hipótese em que até poderia ser considerada a existência de tratamento desigual entre as partes. Não é disso que se trata. A insurgência não demonstra prejuízo pois questiona somente a formalidade de juntada da prova. Nesse sentido o precedente do TRE do Paraná no RE n. 44335, Rel. Gilberto Ferreira, DJ 23/07/2018.

Portanto, o acolhimento do pedido de degravação pelo juízo não implicou em ilegalidade nem afetou a admissibilidade da prova ou a paridade de armas, pois garantido o contraditório após a juntada da prova, sendo impositiva a manutenção do afastamento dessa preliminar.

 

1.7 Nulidade da perícia técnica (extração de dados) realizada nos aparelhos de telefone celular

As preliminares que atacam a extração de dados dos celulares de Vinícius Mognon Rugini e Vitassir Brollo realizada pelo Núcleo Técnico-Científico da Delegacia de Polícia Federal em Passo Fundo/RS foram perfeitamente enfrentadas e rejeitadas durante a instrução e na sentença, não merecendo reparos a decisão recorrida.

Conforme devidamente explicado no primeiro grau, o procedimento não se tratou de uma perícia propriamente dia, com análise valorativa do conteúdo dos aparelhos telefônicos. Foi mera transposição, em mídia e texto, do que estava nos aparelhos apreendidos, a partir de software legítimo, o qual, ainda que fabricado no exterior, transpõe os dados na mesma língua em que realizados, não havendo se falar em uso de estrangeirismo que tenha impedido ou prejudicado a defesa.

Daí porque, quanto à apresentação de quesitos, a prova era infactível, pois não houve exame do teor dos dados pela Polícia Federal. Não seria possível a resposta a qualquer dúvida ou questionamento. Em verdade, a insurgência deve-se ao fato de que o conteúdo dos dados confirmou os fatos narrados na inicial, aprofundando a produção de provas em desfavor dos investigados.

Além disso, a quesitação é inútil e desnecessária em se tratando de mera extração de dados armazenados em dispositivo telefônico apreendido por determinação judicial, razão pela qual o indeferimento alinha-se com o princípio da celeridade processual, evitando-se atrasos desnecessários no andamento do processo.

A cadeia de custódia da prova foi respeitada (ID 45562483), os aparelhos estavam na posse dos investigados, ou seja, o acesso aos dados contidos nos aparelhos celulares pela Polícia Federal somente foi efetuado após autorização judicial, e o material teve guarda em cartório, envio de forma lacrada pelos Correios e recebimento pela autoridade policial, sendo posteriormente devolvidos ao juízo.

A extração de dados retrata o conteúdo do aparelho tal como apreendido, e identifica nomes e números conforme armazenados, com o que entendo que há higidez e suficiência da prova. Apesar de competir às partes indicar as provas que desejam produzir, o juiz é o destinatário final, cabendo a ele aferir a necessidade ou não de sua realização.

No ponto, verifico que Luciano Pelissaro afirmou apenas genericamente que o resultado da extração não traz a devida segurança para com seu conteúdo, e que não há indicação do perito responsável pela feitura, o que se trata de uma inverdade, pois o Laudo do ID 45562483 (p. 30) é firmado por perito criminal federal. A prova tem total credibilidade, foi realizada por órgão oficial.

Insta considerar que o acesso dos réus aos telefones celulares para comparar e confrontar com o conteúdo das extrações é uma questão delicada, tendo o magistrado ponderado, nas circunstâncias específicas do caso, que haveria risco potencial de comprometimento da cadeia de custódia da prova, e que sua integridade é fundamental para garantir um julgamento justo.

A matéria foi enfrentada em decisão de embargos de declaração, e o julgador entendeu necessária apenas a obtenção dos relatórios das informações armazenadas nos dispositivos, como conversas, mensagens e arquivos, sem a necessidade de análises técnicas complexas, pois o objetivo era elucidar os fatos retratados nas provas e em capturas de tela de telefones celulares, e coletar elementos de informação sobre as infrações (ID 45562571):

Acolho os embargos declaratórios,(petição 116873951) para esclarecer que o pedido de acesso aos celulares foi indeferido uma vez que os referidos celulares já foram devidamente periciados pela Polícia Federal. Desse modo, não há como franquear o acesso às partes sob pena de colocar em risco a integridade dos dados que ali ainda constam. Ademais, estando os dados extraídos pela perícia oficial anexos aos autos (em HD), é neles que o juízo vai se basear para proferir a decisão, pois, como já dito, trata-se de análise feita por órgão oficial, devidamente submetida à apreciação das partes, e, eventual impugnação apresentada, também será objeto de análise no momento oportuno: o julgamento de mérito da demanda.

 

2. Quanto aos arquivos contendo os áudios das vozes trocadas, estão disponíveis no Cartório Eleitoral, podendo o HD ser retirado em carga pelas partes, visto que há cópia no Cartório Eleitoral para eventual confrontação. A retirada do material poderá ser solicitada à Chefe do Cartório, durante o prazo para apresentação das alegações finais, mediante assinatura de termo de retirada do material.

 

3. Desse modo, a fim de possibilitar às partes o acesso ao HD, determino que o prazo para as alegações finais seja reaberto e exercido de forma sucessiva, e não comum, iniciando-se pela parte autora, após, à defesa dos réus e por fim ao Ministério Público. Como o prazo será sucessivo, o Cartório expedirá intimações distintas para cada parte. Do autor e réu via DJE e ao Ministério Público, via Sistema, porém com data certa.

 

Em ações cassatórias eleitorais, a rapidez na resolução dos litígios é fundamental para assegurar a efetividade do sistema eleitoral, garantindo-se que os resultados das eleições sejam legítimos e confiáveis. A extração de dados é um meio de prova relevante para a produção de elementos probatórios mais seguros e concretos das infrações, e a perícia técnica envolve uma análise mais detalhada e especializada dos dados coletados, demandando muito mais tempo.

E se assim não bastasse, os quesitos foram dispensáveis porque, de acordo com o resultado da extração do conteúdo dos celulares apreendidos, as perguntas apresentadas pela defesa no ID 45562304 foram respondidas em sua essência, e diversos questionamentos não interferem no mérito da ação são irrelevantes.

Os celulares eram de Vinícius e Vitassir e foram apreendidos na posse dos investigados, sendo desarrazoado, por exemplo, o questionamento apresentado sobre se nas conversas por eles mantidas em seus telefones haveria montagem ou adulteração.

Os demais quesitos indagaram se era possível identificar quem digitou mensagens e áudios, a autoria de vozes de áudios e filmagens e identificação das pessoas nelas envolvidas, a localização geográfica daqueles que usavam os celulares, os sistemas e programas utilizados para acessar os arquivos, e a origem da fonte de uma fotografia.

Conforme esclareceu o Núcleo Técnico-Científico da Delegacia de Polícia Federal em Passo Fundo/RS, um dos celulares foi identificado pelo número e nome de “Vinícius Rugini”, tendo sido extraídos os dados do dispositivo; e o outro, que estava na posse de Vitassir, foi identificado pelo número tendo sido extraída a agenda de contatos e as mensagens armazenadas na memória interna, tão somente.

Ainda, consta no laudo da Polícia Federal a identificação do programa computacional utilizado para a extração dos dados, e que “os relatórios e arquivos resultantes do procedimento de extração automatizada, inclusive arquivos apagados que puderam ser recuperados, estão organizados nas mídias anexas. Os diferentes tipos de relatórios disponibilizados contêm basicamente a mesma informação. Contudo, certos formatos são mais adequados para determinados tipos de tarefas” (ID 45562483). O documento esclarece que há relatório no formato PDF e HTML, e no formato UFED Reader (UFDR), que gera relatórios personalizados, sendo somente este o que necessita do programa Cellebrite Reader, cujo instalador consta da mídia.

Nos relatórios, são apontados o interlocutor da conversa, pelo nome ou número do telefone do proprietário do aparelho celular, e o número de telefone ou nome do interlocutor, quando salvo na agenda dos dispositivos, datas e horários, título de grupos de WhatsApp, sendo plenamente possível identificar quem digitou mensagens e incluiu áudios, a autoria de vozes em áudios, e identificação das pessoas nelas envolvidas.

A defesa refere que também apresentaria como quesito a origem da fonte de uma fotografia (imagem de maço de dinheiro), mas em alegações finais e no recurso apresentou essa informação, a qual entendo ser totalmente despicienda para o exame do mérito, tal qual a indagação sobre a localização geográfica daqueles que utilizavam os celulares.

As informações apresentadas pela Polícia Federal são suficientes para a formação de juízo de valor sobre as provas, especialmente quando respeitada a cadeia de custódia.

Portanto, correto o entendimento do magistrado, até porque era impossível a realização de quesitos em face da perícia ter sido limitada à extração de dados, e os quesitos apresentados eram desnecessários para o julgamento do feito, não se evidenciando prejuízo em razão do seu indeferimento.

Quanto à perícia, os requeridos reportam-se a diversas preliminares arguidas e enfrentadas em primeiro grau, afirmando que a sentença não analisou a matéria. Requerem, no recurso, que seja considerada a petição do ID 113494300 (ID 45562542 do PJe de 1o grau), apresentada antes da fase de alegações finais, tomando essa petição como razões de reforma.

Nesse ponto houve violação ao princípio da dialeticidade recursal previsto no art. 514, II, do CPC, pois o recurso não ataca os argumentos da decisão interlocutória que as enfrentou, e da sentença ao mantê-los. A afirmativa recursal de que “a sentença, por sua vez, não permitiu examinar minudentemente esses argumentos apresentados, importando essa conduta do juízo em nulidade absoluta”, e de que “todos esses argumentos, aos quais se reporta na petição do ID 113494300 para evitar tautologia, possuem a consistência para anular o processado, ante o nítido cerceamento ao direito de defesa”, não se prestam a fazer as vezes de um recurso.

Todas as prefaciais referidas no recurso foram rejeitadas na sentença, em fundadas razões, e os argumentos da decisão recorrida são sólidos, coesos, merecendo serem mantidos porque sequer foram atacados. Por parte dos réus não houve fundamentação e argumentação lógica dirigida a evidenciar o equívoco da decisão, um pressuposto intrínseco de admissibilidade de qualquer apelo.

Meramente expressar descontentamento e o desejo de interpor recurso não é suficiente para atender ao pressuposto da dialeticidade. É essencial contestar de forma abrangente as bases que justificam a decisão judicial, e a ausência de recursos contra as decisões interlocutórias prolatadas no processo eleitoral não exime o recorrente de atacar os fundamentos da sentença e apresentar as razões de reforma, refutando o raciocínio do julgador. É inadmissível, no recurso, a pretensão de indicar apenas uma peça processual anterior à sentença para que seja tomada como razões recursais. Quanto a esse tópico o apelo sequer merecia ser conhecido.

De qualquer sorte, mantenho o afastamento de todas essas preliminares, na forma em que decidido em primeira instância, com alguns acréscimos.

O primeiro é o de que a decisão judicial que autoriza a quebra do sigilo de dados armazenados em telefone celular não necessita conter limitação temporal da diligência, diferentemente do que ocorre na interceptação do fluxo das comunicações telemáticas em curso, as quais estão sujeitas ao limite de 15 dias, prorrogáveis, nos termos da Lei n. 9.296/96.

O segundo é o de que a decisão nomeou a Delegacia da Polícia Federal, não nomeou um profissional específico como perito para realizar o procedimento, havendo total desnecessidade de oitiva daqueles que realizaram a perícia quer porque não foram apresentadas fundadas razões para questionar a higidez da coleta realizada com equipamento forense, quer pela suficiência das informações sobre a forma como a extração é realizada, contida no laudo da Polícia Federal do ID 45562493 e ID 45562483, p. 25-31, prestado pela perícia criminal.

Aliás, quanto à insurgência contra o uso do equipamento Cellebrite UFED Touch, associado ao aplicativo UFED Physical Analizer para a extração de dados, deve ser chancelada a utilização dos sistemas escolhidos pela própria autoridade policial para a coleta da prova, merecendo transcrição o seguinte trecho de decisão do STJ da lavra do Ministro Joel Ilan Paciornik, nos autos do HC n. 679066 (DJ 25/05/2022):

(...)

6. Não se pode reputar como ilícita a retirada dos dados armazenados no aparelho celular do recorrente pela utilização do equipamento chamado Ufed Touch, produzida pela empresa israelense Cellebrite, sob o argumento de que não teria havido decisão judicial específica permitindo a utilização do método requerido pela autoridade policial. O referido equipamento ficou muito conhecido após a sua utilização pela Polícia Federal para extrair todos os dados de aparelhos celulares apreendidos na operação Lava Jato. Com ele, os investigadores fazem uma verdadeira limpa nos aparelhos, mesmo os bloqueados por senha ou criptografados. Até mesmo o conteúdo que foi apagado pelo usuário ou está na nuvem do aparelho é recuperado, o que aumenta o receio dos investigados. No presente caso, se mostrou totalmente válida a obtenção dos dados do aparelho celular do recorrente. Em primeiro lugar, porque ao atender na íntegra o pedido solicitado pela autoridade policial, o magistrado, implicitamente, autorizou o uso do aparelho Ufed Touch requerido pela autoridade policial em sua representação. Em segundo lugar, porque não cabe ao juiz, até por falta de conhecimento técnico adequado, dizer qual o método ou aparelho que deverá ser utilizado para o atingimento da finalidade principal da decisão judicial, cabendo aos órgãos de investigação decidir qualquer a melhor técnica que deverá ser implementada para dar cumprimento ao mandamento judicial.

(STJ - HC: 679066 PE 2021/0213715-8, Relator: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Publicação: DJ 25/05/2022.)(Grifei.)

 

O terceiro é o de que o pedido de prova pericial não precisava constar da petição inicial, pois o rito da AIJE prevê, no art. 22, inc. VI, da LC n. 64/90, a realização de diligências a requerimento das partes, ou mesmo de ofício, pelo julgador, inclusive requisição de documentos (inc. VIII).

Nesse norte, correta a bem-lançada decisão do magistrado a quo no ID 45562094 referindo: “(…) no próprio pedido de tutela antecipada, a parte autora já formula pedido de perícia, senão de forma expressa, com estas palavras, mas sim calcada na finalidade do ato de apreensão, ao postular, no item 10 dos pedidos finais que constam na petição inicial, a “a) Busca e apreensão dos aparelhos celulares de todos os integrantes do grupo de Whatsapp “Os Guerreiros do 14” (print dos membros e lista com nomes e endereços em anexo), visando obter a integralidade das conversas trocadas pelos integrantes deste grupo criminoso, formado especificamente para prática de atos de abuso de poder e crimes eleitorais, devido ao risco concreto e iminente das conversas serem apagadas;”.

Com esses fundamentos, mantenho o afastamento da preliminar.

 

1.8 Nulidade por ausência de intimação para manifestação sobre documentos novos juntados no processo

Os recorrentes afirmam que: “Ao longo do processo foram juntados diversos documentos que não acompanharam a inicial, inclusive foi determinada a juntada do inquérito policial, assim como extratos bancários e outros documentos” e que “sequer foi oportunizado aos recorrentes/requeridos se manifestarem sobre ditos documentos, restando impossibilitados de apresentarem qualquer contraprova desses documentos”.

A nulidade não se confirma.

Examinei detidamente os autos e, conforme bem explicitado na sentença, as partes demandadas foram devidamente intimadas para se manifestar sobre todas as provas do feito, procedimento que, no rito da AIJE, se dá na fase de alegações finais, não se evidenciando qualquer prejuízo. Ao longo do processo foi oportunizado o contraditório e a ampla defesa, com todos os prazos processuais observados.

A juntada de prova não caracterizou ampliação objetiva da demanda.

Os dados parciais do inquérito policial foram juntados aos autos durante a instrução, pois apenas após o ajuizamento da ação foi autorizado o compartilhamento de provas. De igual modo, como soi ocorrer, após a contestação foi apresentado o resultado das quebras de sigilo bancário e de dados.

Quanto à legalidade do compartilhamento da prova até então produzida no inquérito policial, transcrevo trecho do acórdão desta Corte no mandado de segurança MS n. 0600090-33.2021.6.21.0000, impetrado com o fim de obstar a juntada:

(...)

Nessa senda, é remansosa a jurisprudência do TSE quanto à admissão de prova emprestada, proveniente de expedientes criminais, em AIJEs, quando reputada necessária ao esclarecimento dos fatos pelo julgador, conforme ilustra o seguinte julgado:

 

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). ABUSO DE PODER ECONÔMICO E POLÍTICO (ART. 22 DA LC 64/90). CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO (ART. 41-A DA LEI 9.504/97).

 

[...].

 

INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. INQUÉRITO. AUTORIZAÇÃO. COMPARTILHAMENTO. LICITUDE.

 

8. Admite-se, em AIJE, uso de prova emprestada legalmente produzida em procedimento investigatório criminal. Precedentes.

 

9. No caso, é lícito o compartilhamento de provas, incluídas as interceptações telefônicas, destacando-se que: a) o juízo competente autorizou a produção dessa prova; b) o Parquet requereu que o conteúdo do inquérito instruísse esta AIJE, o que foi deferido na íntegra pelo magistrado; c) os agravantes tiveram acesso às provas em todas as fases do processo; d) o decisum autorizativo, embora juntado pelo Ministério Público em segundo grau, era preexistente.

 

[...].

 

22. Agravo regimental desprovido.

 

(AgR-REspe nº 16-35/SC, rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 22.3.2018, DJe de 17.4.2018)

Portanto, a decisão do Magistrado quanto ao ponto não constitui ato ilegal ou abusivo.

(…)

(TRE-RS, MS n. 0600090-33.2021.6.21.0000, Rel. Des. El. Miguel Antonio Silveira Ramos, DJe 01.12.2021)

 

Os extratos bancários foram juntados em 14.12.2020 (ID 45561981), e em 18.12.2020 (ID 45562002), antes mesmo da contestação ofertada em 20.01.2021 (ID 45562010), e depois foram complementados em 30.7.2021 e 02.8.2021. Foram juntados documentos bancários também em complementação no ID 45562377, de 13.09.2021, e no ID 45562483, de 29.3.2022, foi acostada a prova emprestada do inquérito policial instaurado para apurar os mesmos fatos.

Após a juntada dessas provas, ocorrida em 29.3.2022, ficou pendente apenas a extração de dados dos celulares, procedimento concluído em 28.02.2023, quase um ano depois. Ou seja, houve tempo mais que suficiente para a análise dos documentos.

Em 27.3.2023 foi aberta a fase de alegações finais (ID 45562552), tendo os investigados inclusive embargado de declaração em 29.03.2023, afirmando que suas impugnações quanto à extração de dados ainda não havia sido decidida, e sem nada tratar sobre a prova relativa aos inquéritos e extratos bancários (ID 45562555).

A fase de alegações finais foi reaberta em 30.3.2023, e os investigados novamente embargaram de declaração invocando omissões quanto à contestação à extração de dados em 03.4.2023 (ID 45562560). Esses embargos foram rejeitados e, em 12.6.2023, foi novamente reaberta a fase de alegações finais (ID 45562566).

Novos embargos foram opostos pela defesa em 14.6.2023, restando novamente reaberta a fase de alegações finais em 22.6.2023 (ID 45562572), a qual também foi reaberta em 07.7.2023 (ID 45562581), com retirada das mídias pela defesa em 11.7.2023, e entrega de alegações finais em 12.7.2023.

Não se evidencia a ausência de ciência dos atos do processo. Ao longo do feito, até a entrega de alegações finais, houve longo transcurso temporal para manifestação sobre toda a prova. Essa fase foi diversas vezes reaberta para a defesa, motivo pelo qual a preliminar de nulidade não procede, uma vez que não houve prejuízo algum.

Portanto, não há ofensa ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal, devendo ser rejeitada a preliminar.

 

1.9 Julgamento extra petita

Os recorrentes afirmam que a inicial é genérica e não indica os eleitores que tiveram seus votos comprados e em favor de quem, invocam precedentes que tratam do tipo penal do art. 299 do Código Eleitoral, relativo a compra de votos. Sustentam que “na sentença o julgador buscou áudios, textos, transferências bancárias, enfim, pinçou diversas informações isoladas que não apresentam correlação, para fins de concluir que tudo se trata de compra de votos, mas sem efetuar o devido cotejo e confirmação da suposição que utilizou”.

Além disso, asseveram que “a sentença considerou a suposta compra de votos com diversas pessoas, porém, não se apurou se essas pessoas efetivamente eram eleitoras do município de Muliterno, se efetivamente houve o pagamento ou a oferta, nem os áudios e mensagem foram confirmadas”.

A matéria diz respeito ao mérito e com esse será analisada, pois o julgamento extra petita refere-se a uma situação em que o juiz profere uma decisão que ultrapassa os limites do que foi pedido pelas partes no processo, não sendo esse o argumento recursal, pois o que os réus atacam nesse ponto é a suficiência das provas para a condenação.

 

1.10 Nulidade das testemunhas arroladas pelo Ministério Público Eleitoral

Os investigados reiteram a preliminar de que na inicial não constou o rol de testemunhas, estando preclusa a questão quando da petição de arrolamento apresentada pelos investigantes, e de que o Ministério Público Eleitoral, quando intimado, não poderia arrolar as mesmas testemunhas indicadas pelos autores.

Alegam que o juízo deferiu que essas testemunhas fossem ouvidas após as testemunhas dos réus e violação ao art. 22 da LC n. 64/90, afirmando que a invocação do art. 179, incs. I e II do CPC, não tem o condão de contornar a exigência legal de rol de testemunhas na inicial.

A questão foi suscitada em primeiro grau, ocasião em que o Ministério Público Eleitoral assim se manifestou: “(…) considerando que o Ministério Púbico Eleitoral possui atribuição constitucional para a promoção da defesa da ordem jurídica e do regime democrático, e por ser a primeira vez que está se manifestando nos autos, vem requerer a produção de provas para contribuir na elucidação dos fatos investigados, no sentido de ser deferida a coleta da prova testemunhal, com o rol de testemunhas arrolado pela parte autora e antes rejeitado pelo Juízo”.

O juiz rejeitou a alegação de nulidade, deferindo a prova requerida porque o Ministério Público Eleitoral atua no feito como custus iuris, nos seguintes termos (ID 45562058):

(…)

Por fim, quanto ao pedido de inquirição de testemunhas formulado pelo Ministério Público (evento nº 87059162), é caso de deferimento. Isto porque na presente AIJE o Ministério Público atua como custus legis, de forma que o Parquet assume uma postura no sentido de empregar esforços pela busca da verdade e elucidação dos fatos, o que compreende o direito de produzir provas, requerer as medidas processuais pertinentes e recorrer, tudo nos termos do inciso II do art. 179 do Código de Processo Civil. E a tempestividade do pedido é notório, porque, nos termos do inciso II da mesma norma processual, o Ministério Público terá vista dos autos depois das partes, sendo intimado de todos os atos do processo. Por isso, por terem sido arroladas pelo Ministério Público como fiscal da lei, suas testemunhas serão inquiridas após o depoimento das testemunhas dos demandados, em audiência que a seguir será especificada.

(…)

 

A decisão foi objeto do mandado de segurança MS n. 0600090-33.2021.6.21.0000, que tramitou neste Tribunal, ocasião em que esta Corte entendeu pela legalidade do ato. Transcrevo trechos do acórdão:

(…)

Quanto ao ponto, não vislumbro flagrante ilegalidade ou abusividade na decisão que deferiu o rol de testemunhas oferecido pelo Ministério Público Eleitoral para oitiva após as testemunhas arroladas pelos réus.

 

Ora, a atuação do Ministério Público, na hipótese, ocorre como custos iuris, qualidade na qual terá vista dos autos depois das partes, podendo juntar documentos, certidões, produzir provas e requerer qualquer medida que entender necessária para o descobrimento da verdade, consoante preconizado no art. 179, incs. I e II, do CPC, ainda que consistam em providências sobre as quais as partes tenham agido com desídia ou omissão.

 

Assim, a despeito da coincidência e em relação ao rol de testemunhas inicialmente pretendido pelos demandantes, as oitivas pretendidas pelo Ministério Público Eleitoral, como fiscal da ordem jurídica, não representam testemunhas de acusação, representando, sim, em “depoimentos que serão colhidos para a melhor formação de convencimento tanto do Parquet como do próprio juízo” (TSE - RMS: 2141 - BA, Relator: LUIZ FUX, DJE de 12/09/2016).

 

Por isso, a finalidade da intervenção ministerial em que pugna pela produção probatória é zelar pelo interesse público imparcial na busca da verdade dos fatos, o que não se confunde com o interesse de qualquer das partes, razão pela qual não é ilícita a oitivas das testemunhas indicadas pelo Ministério Público após aquelas arroladas pela parte autora e pelos réus.

 

Constato, assim, que o Juiz apontado como coator agiu em conformidade com o tratamento conferido pelo arcabouço jurídico ao Ministério Público Eleitoral como fiscal da ordem jurídica, não havendo excesso, teratologia ou ilegalidade na decisão.

(…)

(TRE-RS, MS n. 0600090-33.2021.6.21.0000, Rel. Des. El. Miguel Antonio Silveira Ramos, DJe 01.12.2021)

 

A irresignação não merece acolhida, pois não há violação ao princípio do devido processo legal.

De fato, no rito estabelecido no art. 22 da Lei n. 64/90, após a fase de inquirição das testemunhas arroladas (inc. V), está previsto que, “encerrado o prazo da dilação probatória, as partes, inclusive o Ministério Público, poderão apresentar alegações no prazo comum de 2 (dois) dias” (inc. X), sendo esse o momento disposto em lei para a primeira manifestação do Ministério Público Eleitoral, na sua qualidade constitucional de defensor da ordem jurídica e do regime democrática (art. 127, CF).

No que diz respeito à alegação de violação ao art. 22 da LC n. 64/90 devido à oitiva das testemunhas do Ministério Público Eleitoral após as testemunhas dos demandados, cabe salientar que o órgão não atua como parte, e que a ordem de oitiva das testemunhas é uma questão de procedimento e não necessariamente invalida o processo. Com o mesmo entendimento, o julgado do TSE:

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO CONTRA ATO JUDICIAL. EXCEPCIONALIDADE. TERATOLOGIA NÃO DEMONSTRADA. 1. Na linha da jurisprudência desta Corte Superior, o mandado de segurança não é sucedâneo recursal, de modo que a impugnação de ato judicial por essa via tem caráter excepcional, cabível somente diante de situação que revele teratologia. 2. No caso, o acórdão recorrido ressaltou que a oitiva das testemunhas se deu em razão de pedido do Ministério Público Eleitoral - o qual atuou na condição de fiscal da lei - e a partir de diligência ordenada pelo juízo competente, nos termos do art. 5º, §§ 2º e 3º, da Lei Complementar nº 64/90. Teratologia não demonstrada. 3. “A decretação de nulidade de ato processual sob a alegação de cerceamento de defesa pressupõe a efetiva demonstração de prejuízo, nos termos do art. 219 do Código Eleitoral” (ED-AgR-AI nº 148-52, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe de 4.2.2014), o que não se verificou na espécie. Agravo regimental a que se nega provimento.

(TSE - AgR-RMS: 7248 MA, Relator: Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Data de Julgamento: 05/05/2015, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 103, Data: 02/06/2015, Página 43/44.)

 

Não verifico prejuízo concreto devido ao deferimento de que as testemunhas do Ministério Público Eleitoral fossem ouvidas após as dos demandados, e não foi requerida a reinquirição de testemunhas já inquiridas com fundamento em cerceamento. Entendo que o juiz fundamentou corretamente o deferimento da prova, respeitando o devido processo legal.

No que concerne à alegação de que as audiências para a produção da prova oral foram realizadas sem aguardar a conclusão da prova pericial, igualmente não identifico qualquer nulidade valendo-me novamente das judiciosas razões do acórdão deste Tribunal no mandado de segurança MS n. 0600090-33.2021.6.21.0000:

(…)

Narra a peça inicial que o juízo originário da AIJE determinou a realização de prova pericial, bem como, ao mesmo tempo, já fixou data de audiência para a produção da prova oral, em violação às regras processuais, pelas quais a coleta da prova oral somente poderia acontecer após a realização de prova pericial, porquanto, da prova técnica, podem advir questões que necessitem ser elucidadas em audiência.

 

Sobre o tema, novamente, colho as razões deduzidas pelo ilustre Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes quando apreciou os embargos declaratórios opostos contra a decisão que deferiu parcialmente a pretensão liminar (ID 41765083), adotando-as como razões de decidir:

 

Na hipótese, os embargantes limitam-se à alegação genérica de cerceamento de defesa por violação ao art. 361 do CPC, o qual estabelece que a audiência seguirá, preferencialmente, a ordem estipulada em seus incisos.

 

O termo “preferencialmente” não é destituído de sentido, de modo que, se inviável ou impertinente a ordem prescrita, poderá o magistrado, motivadamente, alterá-la, somente havendo nulidade se comprovado prejuízo concreto para alguma das partes.

 

Conforme menciona a doutrina de José Herval Sampaio Jr. (Comentários ao código de processo civil. Coord. Araken de Assis...[et. al.]. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, epub):

 

O art. 361 do novo texto não trouxe nenhuma mudança significativa ao Processo Civil, uma vez que possui dispositivo equivalente no CPC/73: o art. 452. A única alteração feita foi o acréscimo da palavra “preferencialmente” ao caput, enfatizando a interpretação da falta de obrigatoriedade em seguir a ordem elencada nos incisos seguintes, o que é bem salutar.

 

Assim, a ordem de produção de provas retratada no artigo é mais um norte, ou seja, um caminho a ser seguido pelo magistrado do que propriamente uma obrigação, oportunizando, assim, que, dentro da lógica processual, o magistrado possa adequar as peculiaridades de cada demanda durante a audiência no tocante à produção de provas orais. Procura-se, assim, evitar o tumulto e dar praticidade ao processo, de forma que a produção das primeiras provas possa completar ou até mesmo dispensar a produção das demais e também com tal abertura se verifique que em um eventual caso concreto, por exemplo, a ouvida primeiro das testemunhas do demandado contribua para a reconstituição dos fatos que mais se aproxime da verdade real e isso é o mais importante.

 

A referida previsão do CPC guarda harmonia com as disposições contidas nos incisos V e VI da Lei Complementar n. 64/90, este último que, inclusive, estabelece que o juiz proceda “a todas as diligências que determinar, ex officio ou a requerimento das partes” após a audiência de inquirição das testemunhas.

 

Ademais, pode o julgador, inclusive, dispensar a presença dos peritos em audiência, determinando a entrega dos esclarecimentos requeridos por escrito, no prazo que assinalar, ou mesmo, após o resultado da perícia, proceder a reinquirições de testemunhas ou novas oitivas, conforme se mostre necessário à apuração dos fatos.

(…)

(TRE-RS, MS n. 0600090-33.2021.6.21.0000, Rel. Des. El. Miguel Antonio Silveira Ramos, DJe 01.12.2021)

 

Quanto à alegação de que o Ministério Público Eleitoral estaria se associando aos autores, é importante destacar que a atuação do órgão como fiscal da ordem jurídica tem a função de colaborar com o Poder Judiciário na busca da verdade e na correta aplicação da lei. A apresentação de rol de testemunhas pelo Ministério Público Eleitoral, nesse contexto, visa contribuir para a elucidação dos fatos investigados, não representando uma vinculação com os autores dado se tratar de órgão independente.

Além disso, o pedido de produção de provas pelo Ministério Público Eleitoral foi tempestivo, não sendo cabível limitar as pessoas arroladas àquelas que não haviam sido arroladas anteriormente pelos autores.

Dessa forma, não há violação ao princípio do devido processo legal, pois o deferimento de oitiva das testemunhas do Ministério Público Eleitoral está de acordo com as normas processuais aplicáveis e visa garantir a ampla e efetiva busca pela verdade no processo eleitoral.

A ausência de ilegalidade nas decisões interlocutórias que indeferiram essas preliminares, reiteradas no recurso da defesa, foi também confirmada pelo Ministro Sérgio Silveira Banhos ao negar seguimento ao recurso ordinário interposto pelos investigados contra o acórdão deste Tribunal no mandado de segurança MS n. 0600090-33.2021.6.21.0000. Na decisão, o Ministro referiu que “(…) a coincidência entre o rol de testemunhas apresentado pelo Ministério Público Eleitoral e aquele indicado pelos autores da ação de investigação judicial não enseja o reconhecimento da prova como parte da acusação e, por conseguinte, a necessidade de alterar a ordem de oitiva das testemunhas como pretendido pelos recorrentes”

No que pertine à realização de perícia após a produção da prova oral também não se evidencia nulidade, na forma das razões do mandado de segurança MS n. 0600090-33.2021.6.21.0000, segundo a qual cabe ao juiz a incumbência de “alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade a tutela do direito”:

Sobre a questão, observo que o art. 22, V, VI, VII, da Lei Complementar 64/90 estabelece que, após a audiência de inquirição das testemunhas, o juiz procederá a todas as diligências que determinar, ex officio ou a requerimento das partes, podendo, ainda, ouvir terceiros, referidos pelas partes, ou testemunhas, como conhecedores dos fatos e circunstâncias que possam influir na decisão do feito.

 

A douta Procuradoria-Geral Eleitoral, em seu parecer, assinalou que “não ha ilicitude evidente na realização de perícia após a produção da prova oral. O art. 361 do CPC estabelece que a audiência seguira, preferencialmente, a ordem estipulada em seus incisos. O termo ‘preferencialmente’ impede que se atribua caráter impreterível a ordem de realização das provas. Isso se confirma com a leitura do art. 139, VI, do CPC, que confia ao juiz a incumbência de ‘alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade a tutela do direito’” (ID 157500760).

(...)

(TSE, RMS n. 0600090-33.2021.6.21.0000, Rel. Min. Sergio Silveira Banhos, decisão monocrática, DJe 30.06.2022).

 

Com esses fundamentos, mantenho a rejeição da preliminar.

 

2. MÉRITO

A magistrada sentenciante concluiu pela comprovação da prática de abuso de poder econômico, captação ilícita de sufrágio mediante entrega de dinheiro e promessa de cargo público em comissão em troca do voto, e transporte ilegal de eleitores, e violação do sigilo do voto. Transcrevo as conclusões da decisão (ID 45562592):

(…)

A prova produzida no presente feito bem demonstrou que o pleito de 2020 em Muliterno foi marcado pela distribuição de dinheiro a eleitores, sendo fatos graves a ponto de ferir a normalidade e legitimidade do pleito eleitoral, contaminando a regularidade das eleições.

 

(…)

 

Todo o arcabouço probatório produzido durante o processo bem demonstrou as práticas ilícitas pelos réus, cada um com sua função.

 

Luciano Pelissaro, como presidente do PP -11, fazia acerto para a compra de votos e realizava transferência bancária de valores aos eleitores comprados. Exigia que os votos fossem filmados e recebia as filmagens. Ofertava valores em troca de votos.

 

Vinícius Rugini, integrante do Diretório Municipal do PTB- 14, operava financeiramente o esquema ilícito praticado na sede de sua empresa, BATATEIRA. Autorizava e validava a compra de votos. Criou o grupo de WhatsApp “Guerreiros do 14”. Fez transferências bancárias para eleitores, captadores de votos e terceiros que tinham relação com eleitores.

 

Rodrigo Mognon financiou a campanha, realizava saques e transferências bancárias para eleitores e captadores de votos.

 

Vitacir Brollo, presidente do PTB -14, também era operador financeiro do esquema, realizava saques e transferências bancárias.

 

Assim sendo, ao contrário do que foi sustentado pela defesa, considerando a análise probatória trazida na inicial e colhida ao longo da fase de instrução, tenho que restou comprovado o abuso do poder econômico por meio da compra de votos e pedido de filmagens de votos mediante recebimento de dinheiro.

 

A prova produzida no presente feito bem demonstrou que o pleito de 2020 em Muliterno foi marcado pela distribuição de dinheiro a eleitores, sendo fatos graves a ponto de ferir a normalidade e legitimidade do pleito eleitoral, contaminando a regularidade das eleições. Assim, não há outro caminho a trilhar que não seja a procedência da presente Ação.

 

Ainda, entendo que todos os réus devem sofrer as sanções legais pela prática de suas condutas, uma vez que tiveram participação direta na contaminação da regularidade das eleições.

(…)

 

Passo ao exame do pedido de reforma da sentença quanto aos fatos considerados comprovados.

 

2.1 Abuso de poder mediante transporte de eleitores indígenas no dia do pleito

A sentença concluiu comprovados os fatos que aparecem nas capturas de tela do aplicativo WhatsApp em mensagens trocadas no Grupo “Os Guerreiros do 14” entre os investigados, à exceção de Luciano Pelissaro, as quais se reportam à entrega de dinheiro na área indígena, e transporte de eleitores na data da eleição.

De acordo com a decisão recorrida: “Entre as diversas mensagens há ‘Caiu Dindim’ e ‘Área dinheiro’. ‘Área’ seria a reserva indígena. Evidenciado, pois, o abuso do poder econômico na expressão ‘Caiu Dindim’ bem como a captação ilícita de sufrágio na expressão ‘Área dinheiro’” (ID 45561818).

Nas razões de reforma, os demandados sustentam que os requerentes “mediante o uso de hacker, ou outro expediente ilícito, invadiram os celulares de alguma pessoa, e retiraram as informações que desejaram e partir delas efetuaram as montagens”, descontextualizando o conteúdo das conversas.

Todavia, já antecipei que a autenticidade das conversas que tratam de “dindim” e transporte de eleitores na área indígena de Muliterno/RS foi demonstrada pelos próprios investigados ao longo da instrução, merecendo ser colacionada a imagem por eles acostada às alegações finais e ao recurso, a qual retrata a integralidade do diálogo e aponta ter sido realizado na noite da véspera da eleição, 14.11.2020 (ID 45562586, p. 32-34 e ID 45562614, 43-46):

 

 

Além disso, as testemunhas Felipe Mognon, Ricardo Silvestri, Maciel Ton e Rodrigo Bertuzzi confirmaram a veracidade das frases escritas na madrugada e manhã do dia da eleição, 15.11.2020, contidas na captura de tela do grupo de WhatsApp colacionadas à inicial e já reproduzidas quando do enfrentamento da preliminar de ilicitude (item “c”), cujo texto cumpre transcrever:

Vini Rugini: Precisamos de 5 carros na aldeia. Pra fazer uns puxes de elitores (04:27)

Felipe: Vamo qe vamo pessoal (05:27)

Darlei Vassoler: Boraaaaaa (05:43)

Sidimar Aibel 1: -

Vini Rugini: Jobson tá vindo ra aldeia. Gui teles tá vindo de passo fundo depois vai pra aldeia ajudar no puxe (06:34)

Vini Rugini: Magina só indo pra aldeia de saveiro (06:35)

Darlei Vassoler: Precisa da fiat strada (06:35)

Darlei Vassoler: Ta disponível (06:36)

Boraaaaaa (05:43)

Azeite: To indo pra PF pegar eleitor. Se precisa pegar alguém lá ou por aqui estou a disposição (06:45)

Manuel Marini: Venham pra aldeia (06:59)

 

Em face dessas circunstâncias, entendo que perdeu o objeto a alegação de que as capturas de tela consistiriam em uma montagem descontextualizada, uma vez que foi integralmente comprovada a veracidade da prova.

A defesa dos demandados baseia-se na alegação de que as mensagens trocadas no grupo de WhatsApp não configuram atos ilícitos, mas sim uma crítica à conduta dos adversários políticos. Afirmam que Etelvino Deon, de alcunha “Teve”, havia saído da casa do candidato não eleito como prefeito Fernando, razão pela qual Felipe Mognon teria escrito que o grupo de oposição estava com o dinheiro e comprando votos na área indígena. A divulgação de uma imagem de um maço de dinheiro pelo interlocutor “Cesar Julica” teria o propósito de criticar, e não de cometer qualquer infração eleitoral.

Também alegam que não foi especificamente identificado nenhum eleitor que teria sido transportado ou que tenha recebido pagamentos em troca do voto.

Contudo, tais alegações não encontram respaldo nos elementos fáticos e probatórios dos autos. A expressão “puxar eleitor”, conforme confirmado pela testemunha Felipe Mognon em juízo, é visivelmente entendida, no contexto dos autos, como referência ao transporte ilegal de eleitores, prática vedada pela legislação eleitoral vigente. A própria natureza das mensagens e a relevância de Felipe Mognon na campanha eleitoral, aliadas às suas declarações em audiência, denotam uma contradição entre o alegado e o efetivamente praticado (ID 45562146).

Em audiência Felipe Mognon afirmou ser filiado ao MDB, trabalhou como coordenador de esportes na administração municipal, e que fez campanha eleitoral para o candidato Adair auxiliando o contador do partido, administrando o sistema de registro de candidaturas Candex, e adesivando veículos com propaganda eleitoral a pedido de seu tio Eloir Mognon, representante da coligação Com União a Gente Faz, pela qual concorriam Adair e Flávio (ID 45562146).

Como se observa, Felipe não era uma figura de somenos importância na campanha. E ainda que a criação do grupo “Os Guerreiros do 14” tivesse como objetivo declarado o monitoramento da coligação adversária para prevenir a compra de votos e o transporte ilegal de eleitores, quando questionado Felipe confirmou as frases de Vinícius Rugini no grupo de WhatsApp: “Precisamos de 5 carros na aldeia. Pra fazer uns puxes de eleitores”. Indagado se “fez ‘puxe’ de eleitores nessa oportunidade?”, Felipe respondeu que “não, porque eu trabalhava na sessão eleitoral”. Perguntado sobre o que quis dizer com a sua resposta ao pedido de Vinícius, Felipe disse que respondeu “Vamo que vamo” para dar “apoio moral” (ID 45562156).

A confirmação de frases como “Precisamos de 5 carros na aldeia. Pra fazer uns puxes de eleitores” escritas por parte de Vinícius Rugini, e a subsequente resposta afirmativa de Felipe Mognon, mesmo que alegadamente em tom de “apoio moral”, são provas de que as atividades discutidas no grupo, na data da eleição, estavam alinhadas com a prática ilícita.

A seguir, o advogado dos investigados pergunta a Felipe Mognon a razão dos seus comentários “caiu dindin” e “área dinheiro”, e Felipe narra que “na verdade, se pegar toda a íntegra da conversa foi uma situação em que um senhor sai da casa do Fernando, e eu escrevi lá que o senhor saiu da casa do Fernando e está indo em direção à aldeia, porque ele passou aqui pela minha casa, e aí mais alguns do grupo falaram, né, que tinham passado nas residências dele, e aí eu citei que possivelmente teria caído ‘dindin’ para fazer algum, algum trâmite na área indígena”. Ato contínuo, o advogado de defesa lê a conversa da captura de tela para Felipe, ele confirma o que está escrito, afirmando que o sentido do que escreveu no grupo é que poderia haver uma pessoa a fazer ‘brique’ na área indígena.

A palavra “brique” foi apontada pela defesa como o termo utilizado para se reportar a fazer qualquer tipo de negócio. Essa terminologia é utilizada no interior do Rio Grande do Sul para se referir ao ato de venda do voto em troca de alguma vantagem ao eleitor, geralmente envolvendo a negociação em dinheiro.

Ricardo Silvestri, de alcunha “Azeite”, afirmou em juízo que a criação do grupo foi destinada a monitorar os adversários a fim de que não comprassem votos, especialmente na área indígena, e que não bloqueassem estradas, mas disse que a expressão “puxe” referida no grupo de WhatsApp “Os Guerreiros do 14” foi utilizada com o sentido de “se puxe”, o que seria uma espécie de gíria criada pelos investigados “para a galera se puxar”, “se dedicar”.

Todavia, do panorama exposto e demais provas que a seguir serão analisadas vê-se que essa justificativa é ilógica e desarrazoada, por inverossímil. A tese de que o “puxe” de eleitores tratado na conversa se referia aos adversários não se confirma.

Em matéria de eleições, a expressão “puxar eleitor” refere-se comumente ao transporte ilegal de eleitores. Cito, a propósito, excerto do acórdão deste Tribunal no recurso eleitoral REl n. 67507: “A defesa alega que puxar eleitores não seria transportá-los e sim ‘puxar voto ao candidato’. Sinceramente, a tese não faz o menor sentido, pois no interior puxar pessoas significa dar carona, levar, transportar” (TRE-RS - RE 67507 RS, Rel. Des. Fed. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, DJe 06.6.2013). De igual modo, o excerto do acórdão do TRE-SC: “(...) que o carro havia sido apreendido puxando eleitores e que estava tentando liberar o carro e resolver a situação (...)” (TRE-SC, RC n. 0600105-86.2019.6.24.0000, Rel. Juiz Jaime Pedro Bunn, DJe 31.03.2020). Cito, ainda, trecho de acórdão do TRE-TO: “(…) afirmou que tem um ônibus locado para a Prefeitura para transporte escolar e que durante o período eleitoral ‘puxou’ eleitores, sendo que chegou a receber R$ 400,00 (quatrocentos reais) diretamente da Prefeitura para ‘puxar’ eleitores para os comícios (...)” (TRE-TO, RE n. 109720, Rel. Zacarias Leonardo, DJe 10.09.2013).

Quanto à sua fala no grupo de WhastApp: “To indo pra PF pegar eleitor. Se precisa pegar alguém lá ou por aqui estou à disposição”, a testemunha Ricardo Silvestri argumentou: “Fui buscar minha tia, irmã do meu pai, né, Henriqueta, Henriqueta Helena Rodrigues, que ela é viúva, né, então mora sozinha, fui buscar ela porque ela vota aqui conosco, que ela morou tempo aqui porque a minha nona dependia dos cuidados dela”.

A testemunha Ricardo negou que tenha transportado mais alguém para votar no dia do pleito, referiu que Rodrigo Mognon é uma das pessoas mais bem sucedidas da cidade, possuindo imóveis, e que este faz empréstimos de dinheiro (ID 45562187).

Entretanto, não se mostra crível a justificativa de Ricardo Silvestre para a oferta de carona para a eleição, pois na conversa do grupo de WhatsApp, logo após Vinícius pedir carros para fazer “puxe” de eleitores, a testemunha foi enfática ao dizer que estava indo para outra cidade, Passo Fundo para “pegar eleitor”, nada mencionando sobre sua tia e colocando o seu veículo à disposição para a prática ilícita.

Na audiência judicial a testemunha Maciel Tonin, vigilante na Cooperativa Sicredi, afirmou que o grupo de WhatsApp “Os Guerreiros do 14” foi criado 2 dias antes do pleito e extinto no dia da eleição, e que era destinado para trocar informações sobre possível compra de votos ou transporte de eleitores pelo partido opositor. Referiu que foi postada no grupo uma foto de maço de dinheiro para dizer que adversários estavam entregando dinheiro na área indígena. Disse que conhece Luciano Pelissaro de vista, mas que lhe faz o favor de frequentemente realizar transferências eletrônicas de dinheiro (ID 45562098).

Rodrigo Bertuzzi, vice-presidente do PP e dono do Mercado Bertuzzi, em juízo declarou que estava no grupo de WhatsApp e que viu a imagem de maço de dinheiro nele postada. Referiu não ser amigo de Luciano Pelissaro, o qual é apenas seu conhecido, mas que lhe fez vários empréstimos de dinheiro porque Luciano estava construindo uma casa. Declarou ter ouviu dizer que Etelvino Odeon, apoiador do PDT, estava transportando eleitores no dia da eleição (ID 45562098).

A testemunha Sidimar Aibel informou que fazia parte do grupo de Whatsapp “Guerreiros do 14”, mas disse não ter conhecimento sobre compra de votos e transporte de eleitores. Referiu ter visto o cidadão de nome Marciano, com uma van do PDT, “descarregando gente” no dia da eleição (ID 45562098).

As demais testemunhas não contribuíram para a elucidação dos fatos ora analisados.

O resultado da extração de dados do telefone celular pertencente a Vinícius Rugini contraria frontalmente os testemunhos no sentido de que não houve transporte de eleitores. Há diversos diálogos em que o tema principal da conversa era o transporte do eleitorado indígena no dia da eleição.

Passo a examinar e transcrever as conversas conforme arquivos contidos no HD externo que foi disponibilizado às partes, no endereço: F:\Laudo_069_2022_NUTEC_DPF_PFO_RS (Reg 2022_0091)\item 01\Relatorios\chats\WhatsApp_Native).

Em 02.11.2020, há menos de duas semanas antes da eleição, Luciano Pelissaro fala para Vinícius Rugini que eles e Rodrigo precisam conversar “para ver sobre os índios” junto com os candidatos Adair e Flávio Pitton (Tete), a fim de definir estratégias (Chat-3279.txt):

Chat-3279.txt

(…)

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 02/11/2020 22:48:43(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Estive pensando eu com meus botões e quarta feira vamos sentar eu, vc, Rodrigo, Adair e Tete uma meia hora para ver sobre os índios

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 02/11/2020 22:49:16(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

A princípio esses para definir a estratégia, vc vai me entender no dia

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 02/11/2020 22:50:38(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ok

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 02/11/2020 22:51:57(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Temos que ver o levantamento das proporções dos votos Pra saber de quarta em diante as medidas a serem tomadas

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 02/11/2020 22:53:07(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Sim, mas nos índios tem campo para trabalho e amanhã já teremos o levantamento dos votos

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(...)

 

Em conversa do dia 13.11.2020 Vinícius fala com Sidi Barilli sobre fazer pressão no eleitorado indígena e diz que o então prefeito, Adriano Pelissaro, apoiador dos candidatos Adair e Flávio, irá na aldeia “trocar uma ideia” (Chat-186.txt):

Chat-186.txt:

(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 05:25:46(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Viemos dos índios agora

Lá tá tudo quieto.

Sem barreiras. Acesso livre.

Não tinha ninguém dos branco lá.

Porém um carro dos índio que são 14, vieram atrás de nós. Mas tudo certo.

Os indio disseram que tá quieto.

Só Onelio que foi lá de tarde.

Mas não tinha movimentação

Bão tinha acampamento de ninguém

Não tinha branco girando

E pra nos favorecer, única movimentação que teve, foi esse carro que nos mandou parar e era dos nosso.

Isso quer dizer que os nosso tão de plantão.

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 05:45:17(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Amanhã estamos mobilizando o povo pra descer em peso da meia tarde em diante

Vamos descer com uns 20 carros

Foi mandado fazer bandeiras

amos levar pra eles.

Final do dia vamo lá meter uma pressão

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 05:45:17(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Vamos lá também

Convide mais alguém e vamos lá

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From: 555499130581@s.whatsapp.net Sidi Barilli

Timestamp: 13/11/2020 08:08:22(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ficam tudo Loko lá embaixo..ainda mais se tive música junto ...

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From: 555499130581@s.whatsapp.net Sidi Barilli

Timestamp: 13/11/2020 08:10:46(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Não te prometo ir prq prefeito disse q era pra passar ali fim da tarde pra trocar uma idéia

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(...)

 

A pressão no eleitorado indígena, realizada na noite da véspera da eleição, para que votassem nos investigados, foi informada por Vinícius Rugini também ao interlocutor Alemão Sheleder, conforme conversa do arquivo chat-165.txt. Na madrugada da véspera eleição, 14.11.2020, Ailton Cezar de Oliveira conversa com Vinícius Rugini sobre o transporte do eleitorado indígena no dia da eleição (Chat-281.txt):

Chat-281.txt

(…)

From: 555499872915@s.whatsapp.net Ailton De Oliveira Novo

Timestamp: 14/11/2020 03:52:03(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Cheguei agora dos índios

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From: 555499872915@s.whatsapp.net Ailton De Oliveira Novo

Timestamp: 14/11/2020 03:52:11(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Amanhã tem carreata

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From: 555499872915@s.whatsapp.net Ailton De Oliveira Novo

Timestamp: 14/11/2020 03:52:15(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Tem que descer ??

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(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 07:26:04(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Vai descer na área de manhã/meio dia pra dar uma movimentada na área?

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 07:26:30(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Tenho umas 20 bandeiras, eu podia deixar pra vc levar antes da carreata

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 07:26:33(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ficam bem loco

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 07:27:04(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

E você descendo, talves ajuda puxar mais uns piá pra fazer movimento lá 

Vc tem teus capanga

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(…)

 

Esse fato não apenas viola os princípios de igualdade de condições na disputa eleitoral, mas também demonstra uma troca de favores que compromete a integridade do processo eleitoral. E não houve nenhuma manifestação dos demandados sobre as provas colhidas na extração de dados dos telefones celulares apreendidos.

Acrescento que em juízo a informante Tainise Batistelo de Oliveira confirmou ter observado as investidas de Luciano Pelissaro envolvendo o eleitorado indígena:

(...)

Ministério Público: - Boa tarde, Tainise, tudo bom?

Testemunha: - Boa tarde, tudo bem e o senhor?

Ministério Público: - Tainise, me explica um pouquinho mais essa questão dos vídeos, aí. Você votou e daí o que que você viu mesmo que te chamou atenção?

 

Testemunha: - Assim, tipo a gente vota na escola, né. E daí eu votei e eu tava subindo pra ir pra casa e, como a cidade é pequena, todo mundo tava falando que: “Ai porque o Adair tem begue de dinheiro, isso aqui, não sei o que”. E, tipo, na realidade, todo mundo tava apavorado, porque não era o que o município queria. E daí, eu, tipo pra mim tanto faz, sabe, o que vai acontecer, se vai mudar (...)

 

(…)

Juiz: - Sim, pode repetir toda a tua resposta aí de novo.

Testemunha: - Daí eu tava subindo, eu vou encurtar um pouco, tava subindo pra ir pra casa e vi o Luciano sentado num banco da praça fumando um cigarro, que ele nem é fumante, com uma lista, tá, com uma lista da área indígena. E lá ele tava procurando e conversava e tinha dois, três índios em redor, e eu olhei e disse: “Meu Deus, que que tá acontecendo, né”. E lá ia aquela movimentação e aí peguei abri meu celular, primeiro grupo que tinha conversa, sei lá, enfim, eu peguei e gravei, só que não apareceu, sabe, só que daí foi, porque se eu não encaminhasse eu não ia salvar, sabe, e eu queria ver como é que tinha ficado, porque vai saber de repente. Peguei e foi o vídeo, né. Aí quando eu apaguei do grupo, assim, o Luciano já me mandou, assim, tipo uma mensagem “ai tô famoso”, debochando, sabe, porque eu tinha tentado filmar ele, só que ao mesmo tempo me deu tipo um arrependimento, porque porque que eu ia tá fazendo isso, né, mesma coisa que o advogado falou, se eu não tinha interesse. Só que eu realmente, no momento, eu queria mesmo ver se era o que ele tava fazendo e, sim, ele tava com uma lista procurando os indígenas pra comprar voto. Isso eu posso afirmar de certeza, porque eu vi, ninguém me contou, eu vi. É isso. Não sei se tem mais alguma pergunta.

(…)

Advogado do Autor: - Tá, uma pergunta, já que você mencionou a questão dos indígenas. A quantidade de eleitores indígenas em Muliterno é expressiva? Testemunha: - É.

Advogado do Autor: - Você poderia dizer que os indígenas decidem a eleição? Testemunha: - Sim, sim.

(...)

Advogado do Réu: - Me diz uma coisa, você faz referência que participou de um grupo do 12 né?

Testemunha: - Isso, dos jovens.

Advogado do Réu: - Certo. Nesse grupo do 12, o candidato Fernando fazia parte?

Testemunha: - Eu não lembro, na verdade, porque eu nunca cheguei a entrar, assim, e olhar quem tava, todo mundo, sabe, porque eu tava lá como simpatizante mesmo e como ninguém conversava, ninguém tipo falava, talvez pudesse até ter outro grupo do PDT, mas que eu não participava, sabe, que conversasse, que falasse (…)

Advogado do Réu: - A senhora não sabe se, não sabe se o Fernando tava ou não no grupo?

Testemunha: - É, eu não sei, porque, tipo assim, quando eu entrei no grupo, eu não fui olhar um por um quem estava.

Advogado do Réu: - Ok, me diz uma coisa, a senhora falou antes, no seu depoimento, que o Luciano ele teria uma lista de eleitores na mão, é isso?

Testemunha: - Sim, representava que era uma lista com o nome das pessoas e ele tava procurando essas pessoas.

Advogado do Réu: - A senhora chegou perto e viu essa lista?

Testemunha: - Não, não exatamente. Eu cheguei acho questão de uns dois metros.

Advogado do Réu: - A senhora viu os nomes dessa lista?

Testemunha: - Uns 2 metros. Eu cheguei perto mais ou menos uns 2 metros e vi ele pedindo: “ah e o Fulano”. E ele olhava no papel e dizia: “Ah o Fulano, esse aqui e esse aqui”.

Advogado do Réu: - Tá mas a senhora chegou a ver a lista? Algum nome da lista?

Testemunha: - Não pude ler, porque como que eu ia chegar em cima pra ver, pra ler os nome que ele tava falando, mas eu interpretei muito bem.

Advogado do Réu: - Isso a senhora interpretou? Entendi.

Testemunha: - Isso.

Advogado do Réu: - O índio que estava próximo a ele, como a senhora referiu, ele era um candidato a vereador?

Testemunha: - Ah não sei.

Advogado do Réu: - A senhora não conhece o índio que tava perto dele? Testemunha: - Não, não, não conheço, porque pra mim os indígenas são quase todos iguais. Não faço a mínima ideia quem era.

 

A gravação de vídeo realizada por Tainise Batistelo, em que aparece Luciano Pelissaro na praça da cidade com uma folha branca de papel, está juntada ao ID 45562040. Apesar de os réus afirmarem que seu depoimento não possui credibilidade porque Tainise estaria comprometida com a campanha dos autores da ação, verifica-se que suas declarações estão em sintonia com as demais provas colhidas.

A legislação eleitoral brasileira é clara ao proibir a utilização de bens materiais ou econômicos para influenciar o eleitorado. O conjunto de mensagens analisadas e a fragilidade das justificativas apresentadas demonstram uma clara intenção de organizar o transporte de eleitores na data da eleição, uma vantagem fornecida para a captação de votos e dirigida especialmente para o eleitorado indígena, mas não somente a eles, conforme será adiante analisado.

Quanto às razões de reforma, a exigência de prova do ato de promessa, oferta ou compra do voto em troca de vantagem ao eleitor não é um requisito para a condenação por abuso de poder econômico. Conforme entende o TSE “(...) o abuso de poder econômico ocorre pelo uso exorbitante de recursos patrimoniais, sejam eles públicos ou privados, de forma a comprometer a isonomia da disputa eleitoral e a legitimidade do pleito em benefício de determinada candidatura" (AgR–REspe 1057–17/TO, Rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 13.12.2019).

Para a configuração da infração não se exige a identificação nominal do eleitor ou eleitores corrompidos, atingidos com a influência do abuso do poder econômico, pois conforme entende o TSE “a sua configuração requer a análise pelo critério qualitativo, materializado em evidências e indícios concretos de que se procedera ao aviltamento da vontade livre, autônoma e independente do cidadão-eleitor de escolher seus representantes” (AgR-Respe 1170/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 13.02.2017).

Entendo que foram cumpridos todos os requisitos exigidos pelo TSE quanto à caracterização de abuso do poder econômico: a) gravidade das condutas reputadas como ilegais, de modo a abalar a normalidade e a legitimidade das eleições; e b) efetivo benefício ao candidato (embora não se exija a comprovação da participação direta ou indireta do candidato ou seu conhecimento) (TSE, RO-El n. 352379/PR, Relator Min. Herman Benjamin, DJe 18.02.2021).

No caso em tela, o transporte de eleitores visava principalmente o eleitorado indígena, uma população vulnerável, e os atos foram preparados com antecedência, nas semanas antes da eleição, tendo sido realizado o transporte na data da eleição, situação que demonstrava a elevada gravidade das circunstâncias. Em 2020, os indígenas foram os mais afetados pela crise financeira causada pela pandemia de acordo com estudos da FGV (https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/10/14/pandemia-indigenas-mercado-trabalho.htm).

Esses critérios são considerados na doutrina de Rodrigo López Zilio para a aferição da gravidade das circunstâncias ao apontar que deve ser levada em conta a “hipossuficiência econômica do eleitor, que tende ao voto de gratidão”, “a condição cultural do eleitor, que importa em maior dificuldade de compreensão dos fatos expostos, com a ausência de um juízo crítico mínimo”:

Em síntese, a gravidade das circunstâncias dos ilícitos praticados consiste na diretriz para a configuração da potencialidade lesiva do ato abusivo, permanecendo ainda hígidos os critérios já adotados usualmente pelo TSE, sendo relevante perquirir como circunstâncias do fato, v.g., o momento em que o ilícito foi praticado – na medida em que a maior proximidade da eleição traz maior lesividade ao ato, pois a possibilidade de reversão do prejuízo é consideravelmente menor –, o meio pelo qual o ilícito foi praticado (v.g., a repercussão diversa dos meios de comunicação social), a hipossuficiência econômica do eleitor – que tende ao voto de gratidão –, a condição cultural do eleitor – que importa em maior dificuldade de compreensão dos fatos expostos, com a ausência de um juízo crítico mínimo. Em resumo, a distinção de nomenclatura (potencialidade lesiva, desvinculada do critério aritmético, ou gravidade das circunstâncias) é menos relevante do que a demonstração concreta de que o bem jurídico tutelado pela AIJE e AIME (in casu, legitimidade e normalidade das eleições) foi vulnerado.

(ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. Juspodivm, 9. ed., 2023, p. 708)

 

Agrego à prova já examinada as concretas evidências de que alimentos também eram fornecidos a eleitores indígenas com a finalidade de obtenção de voto, inclusive por meio de vales, conforme conversa entre Vinícius Rugini e João Maranhão que consta do arquivo Chat-3136.txt:

Chat-3136.txt:

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 09/11/2020 01:32:13(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Precisamos dos nomes pra ver se estão tudo certo na lista dos eleitores

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 09/11/2020 01:32:29(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Se tiver tudo ok, vamos pra cima

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From: 555496945166@s.whatsapp.net João MARANHÃO

Timestamp: 09/11/2020 10:15:10(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ops bom dia eu queria ir lá fazer um churrasquinho pra agradar eles q nem eu fiz da outra vez.

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 09/11/2020 10:19:35(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Blz Vamos ajeitar

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 09/11/2020 10:19:41(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Tenho carne aqui

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From: 555496945166@s.whatsapp.net João MARANHÃO

Timestamp: 09/11/2020 10:22:46(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Más tem q ser essa semana

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From: 555496945166@s.whatsapp.net João MARANHÃO

Timestamp: 09/11/2020 10:22:56(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ir lá

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 09/11/2020 10:27:04(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Sim

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Com essas razões, considero que há provas suficientes para a condenação, merecendo ser mantida a sentença nesse ponto.

 

2.2 Abuso de poder econômico vinculado a estabelecimentos comerciais

O cenário posto nos autos demonstra que a realização de transporte de eleitores logicamente envolveu gastos com combustível e necessidade de financiamento da campanha devido à expressão econômica do benefício, tendo sido apontado que os extratos das contas bancárias dos demandados apresentam despesas exorbitantes em postos de gasolina no período de campanha, fato que foi considerado pela julgadora a quo.

Luciano Pelissaro realizou junto ao Auto Posto Muliterno pagamentos de combustível de R$ 2.500,00 (02.10.2020) e R$ 1.000,00 (06.10.2020), e ao Auto Posto Avenida pagamento de R$ 400,00 no dia 04.10.2020. Vitassir Brollo pagou ao Auto Posto Muliterno R$ 2.000,00 em 10.10.2020. Vinícius Mognon Rugini realizou ao Auto Posto Muliterno pagamentos de R$ 5.000,00 (10.10.2020), R$ 1.000,00 (15.10.2020), R$ 3.500,00 (22.10.2020).

Há um elevado número de conversas sobre entrega de dinheiro a eleitores, sendo evidente o vínculo entre as conversas e as movimentações bancárias, as quais não foram minimamente esclarecidas.

A justificativa apresentada pelos investigados quanto a esses fatos é de que a movimentação de valores ocorreu devido à atividade negocial que cada um desenvolve, associada à tese defensiva de que para a condenação é necessária a identificação de eleitores beneficiados.

Os interlocutores das conversas de WhatsApp com os demandados, Rodrigo Mognon e Rodrigo Bertuzzi, foram ouvidos como testemunhas compromissas e não souberam explicar as transações bancárias realizadas com os candidatos investigados. Apenas disseram que recebem e trocam cheques, além de emprestar valores quando solicitado, mas não apresentaram nenhum motivo razoável para essas negociações.

Quanto ao abuso de poder econômico por meio de compras ou recebimento de valores procedentes do Mercado Bertuzzi, Mercado Munhon e do Mercado Comercial Brollo, destinada à compra de votos, os investigantes narram que as operações financeiras entre os demandados e os proprietários desses estabelecimentos era destinada ao fornecimento de cestas básicas em troca de votos, e que isso “esquentava dinheiro que passava no Caixa do mercado para financiar a campanha”.

De fato, entre o final de outubro e início de novembro de 2020, Rodrigo Mognon (Alemão), que participava dos grupos de WhatsApp com conversas sobre transporte de eleitores e compra de votos (chat-338.txt), transferiu valores para sua conta corrente, e outras contas bancárias mantidas em seu nome e de terceiros, também em montante que ultrapassa R$ 100.000,00.

Luciano Pelissaro, de igual modo, realizou inúmeras transações bancárias nos meses de outubro e novembro, emitindo cheques e transferindo valores para correligionários tais como Maciel Tonin, Rodrigo Bertuzzi e Fábio Júnior Brollo, estes últimos, donos de mercados. Foi alegado pela defesa que os fatos se devem ao pagamento de boletos bancários e à construção de uma casa, mas nenhuma prova dessas justificativas foi juntada aos autos.

Em juízo, a testemunha Maciel Tonin, vigilante na Cooperativa Sicredi, afirmou que conhece Luciano Pelissaro de vista, mas que lhe faz o favor de frequentemente realizar transferências eletrônicas de dinheiro. Sem apresentar qualquer motivo para essas transações, informou que Luciano deixa dinheiro em sua porta, que deposita o valor em sua conta bancária pessoal e depois faz a transferência do valor para Luciano (ID 45562098).

A testemunha Rodrigo Bertuzzi, vice-presidente do PP e dono do Mercado Bertuzzi, na audiência judicial referiu não ser amigo de Luciano Pelissaro, o qual é apenas seu conhecido, mas que faz vários empréstimos de dinheiro para Luciano há muito tempo, toda a semana, o qual lhe entrega cheques, inclusive no período de campanha. Justificou os empréstimos porque Luciano estava construindo uma casa, e negou cobrar juros. Referiu não ter controle sobre os valores que empresta a Luciano, mas que emprestava dinheiro a ele há 3 ou 4 anos. O montante devido, na data da audiência, seria de cerca de R$ 20 mil (ID 45562098).

No recurso, o demandado Luciano refere que está sendo punido por movimentar sua conta bancária em período eleitoral, e que os cheques emitidos consistiam movimentação corriqueira, pois para não usar dinheiro em espécie realizava o pagamento de boletos com cheques no Brollo supermercados, que possui lotérica e é representante da caixa e Banrisul, e no Supermercado Bertuzzi, credenciado do Sicredi.

Afora essas alegações, não foram apresentadas provas concretas para justificar as operações bancárias envolvendo a constante transição de recursos entre os investigados nos meses de outubro e novembro de 2020, exatamente no período em que realizadas as tratativas de compra de votos e transporte de eleitores. Não foram apresentados os comprovantes de despesas e boletos que teriam motivado a circulação de valores entre os réus.

A prova dos autos demonstra que, após a campanha, em 23.11.2020, houve compra do voto do eleitor Abrão Rodrigues Pereira, e que o pagamento foi realizado por intermédio do Mercado Munhom, de propriedade da testemunha Alissom Munhom, conforme conversa entre Vinícius Ruggini e Jocelaine Sales. O valor foi entregue no Mercado Munhom por Alissom Munhom, também ouvido como testemunha, a demonstrar o envolvimento do comércio local no financiamento de atos de abuso de poder:

Chat-137.txt

(…)

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From: 555499606418@s.whatsapp.net Jocelaine Sales

Timestamp: 23/11/2020 12:24:07(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

oi bom dia vini e a jocelaine viu tu vai ta na batateira mei dia porai eu ia passar la pra pegar o resto do dinheiro do Abrão

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From: 555499606418@s.whatsapp.net Jocelaine Sales

Timestamp: 23/11/2020 12:24:27(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

posso?

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 23/11/2020 12:32:17(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

pode ser as 12:45?

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 23/11/2020 12:32:24(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

entre 12:30 e 12:45

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 23/11/2020 12:32:30(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

que não estou lá hoje de manhã

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 23/11/2020 12:32:32(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

e d etarde vou sair

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From: 555499606418@s.whatsapp.net Jocelaine Sales

Timestamp: 23/11/2020 12:34:01(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

sim pode ser passo la então

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 23/11/2020 12:46:45(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

ou,a utorizo o Alissom lhe entregar lá no mercado

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 23/11/2020 12:46:48(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Alissom Minhom

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 23/11/2020 12:46:51(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Mercado Munhom

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 23/11/2020 12:47:00(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

dai eu repasso pra ele

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(...)

 

É perceptível, da própria narrativa das conversas verificadas, os nomes dos eleitores são citados pelos demandados nos grupos de WhatsApp, sendo notório o liame entre os fatos e o benefício auferido pela chapa majoritária vencedora. Conforme conclusão da sentença, a negociação entre os proprietários dos estabelecimentos durante a campanha foi demonstrada por meio da extração de dados do aparelho celular de Vinícius Rugini.

No Chat-1401.txt, que traz conversa entre o candidato Adair Barilli e Vinícius, logo após o início da campanha, em 27.9.2020, este pede que Adair divida as despesas de mercado em 33%, uma vez que eram 3 mercados envolvidos nas negociações:

Na conversa do arquivo Chat-3077.txt entre Vinícius Rugini e Rodrigo Bertuzzi, proprietário do Mercado Bertuzzi, Vinícius trata de compras no estabelecimento e da necessidade de alinhamento dessa questão na Comissão do partido, além do valor necessário para a compra do voto de eleitores para votarem a favor do candidato para prefeito Adair Barilli:

Chat-3077.txt

(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 12/10/2020 13:02:16(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

deixa meio organizado as contas que amanhã passo ali

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 12/10/2020 13:02:16(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

dai estou organizando a cada 10 dias passar nos mercados pra saber quanto tá dando a cada 10 dias

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From: 555499245615@s.whatsapp.net Rodrigo Bertuzi

Timestamp: 12/10/2020 13:02:38(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

 

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 12/10/2020 13:02:59(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

e na proxima reunião da comissão, vamos alinahr também essa quetaão por que parece que o paulo entrou pra ajudar luciano

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 12/10/2020 13:03:10(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

e nãoe ntendi se ele ia autorizar algo nos mercados também

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From: 555499245615@s.whatsapp.net Rodrigo Bertuzi

Timestamp: 12/10/2020 13:03:22(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Acho que sim

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 09/11/2020 20:40:12(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

ali que sobe os valor

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 09/11/2020 20:40:21(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

pois pra prfeito tá ficando nos mil

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From: 555499245615@s.whatsapp.net Rodrigo Bertuzi

Timestamp: 09/11/2020 20:40:33(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pois é

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(...)

 

Idêntica negociação consta do arquivo Chat-3199.txt, na conversa realizada entre Fábio Júnior Brollo, proprietário do Mercado Comercial Brollo, e Vinícius Rugini, de 12.10.2020:

Já no arquivo Chat-3164 traz diálogo entre Vinícius e Alisson Munhon, proprietário do Mercado Munhon, do dia 09.11.2020, na qual o investigado solicita dinheiro “para trocar”, Alissom informa ter cheques e valores, e Vinícius afirma que irá até o local com o candidato Adair Barilli para fazer as contas no mercado:

Com isso denota-se que esses demandados, atuantes nos grupos de WhatsApp em que se tratava de transporte de eleitores, figuravam como financiadores da campanha.

Reitero que para a configuração do abuso de poder econômico, não se exige comprovação de compra de votos ou promessa direta ao eleitor. Segundo o TSE, o abuso ocorre pelo uso desproporcional de recursos para afetar a igualdade eleitoral e a legitimidade das eleições em favor de uma candidatura, o que se mostra evidente.

A ação de investigação judicial eleitoral tutela a integridade do pleito, conforme o art. 14, § 9°, da CF, não é preciso que se estabeleça uma relação direta entre essas movimentações financeiras e a efetiva prática de compra de votos quanto a eleitor especificado, sendo suficiente a demonstração de utilização do poder econômico tendente a influenciar o resultado do pleito, o que fica evidente no caderno probatório mesmo sem identificação de beneficiários.

Transcrevo, ainda, o conteúdo do art. 23 da LC n. 64/90, que considero na formação de minhas conclusões: “Art. 23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral”.

Anoto que a clandestinidade que envolve as infrações eleitorais, especialmente a prática de abuso de poder econômico, demonstra que deve ser atribuída sensível valoração às extrações de dados de aparelhos celulares.

Nesse prisma, a demonstrar o investimento de recursos financeiros na campanha para repasse a eleitores, em conformação a atos de abuso de poder, e a gravidade dos fatos tendo-se presente que a eleição de Muliterno/RS foi definida por 3 votos, tem-se a conversa do arquivo Chat-209.txt, realizada entre Vinícius Rugini e Leonardo Vicarri.

Nela o eleitor Leonardo Vicarri escreve: “Vini seguinte, Dudu comentou a respeito de irmos votar aí”, e pergunta ao investigado: “Gostaria de saber oq oferecem pra nós ?”. Vinícius diz que o valor do voto é R$ 1.500,00, acerta o pagamento de 3 votos por R$ 1.500,00 mais despesas com o transporte para votarem, dizendo “Vc de longe por causa ds despesa”, e pede o número dos títulos de eleitor.

Chat-209.txt

(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 04/11/2020 10:50:33(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

É aquilo que falei ao Edurado

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From: 554791899332@s.whatsapp.net Leonardo Vicarri

Timestamp: 04/11/2020 10:52:29(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

2 pila ?

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 04/11/2020 10:52:41(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

1 e meia

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 04/11/2020 10:52:44(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

1 e meio

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 04/11/2020 10:53:02(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

É o que tá sendo feito com pessoal de fora

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 04/11/2020 10:53:20(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

E quem falar que é mais, tá mentindo

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(…)

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From: 554791899332@s.whatsapp.net Leonardo Vicarri

Timestamp: 07/11/2020 13:25:51(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Mas podemos fazer o seguinte, coloca 1000 pra nós subir e os 4 alcança ai

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From: 554791899332@s.whatsapp.net Leonardo Vicarri

Timestamp: 07/11/2020 13:25:55(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Já que prefere assim

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 07/11/2020 13:26:34(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ok

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 07/11/2020 13:27:12(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Preciso consultar os títulos

Nome completo e data de nascimento

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 07/11/2020 13:27:22(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ou vc mesmo consulta e manda print

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 07/11/2020 13:27:51(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

https://www.tse.jus.br/eleitor/titulo-e-local-de-votacao/copy_of_consulta-por-nome

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From: 554791899332@s.whatsapp.net Leonardo Vicarri

Timestamp: 07/11/2020 13:28:07(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Taa, te mando o print de todos

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(…)

 

A prova coligida nos autos é robusta e assemelha-se, em grande medida, ao precedente do TSE já invocado, envolvendo a condenação por prática de abuso de poder econômico devido à apreensão de valores, realização de transferências bancárias e existência de anotações de campanha sem apresentação de justificativas plausíveis quanto à procedência dos recursos e às operações realizadas:

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PRELIMINARES. DA NULIDADE DO FEITO PELA REUNIÃO EXTEMPORÂNEA DAS AÇÕES ELEITORAIS. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO CONJUNTO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. INÉPCIA DA INICIAL. INEXISTÊNCIA. JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. AFASTADA. SOBRESTAMENTO DO RECURSO ELEITORAL DO PMDB DE PUGMIL/TO. PREJUDICADO. MÉRITO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. NÃO COMPROVAÇÃO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO E ARRECAÇÃO E GASTO ILÍCITO DE RECURSOS EM CAMPANHA ELEITORAL. CONFIGURADOS. GRAVIDADE DAS CONDUTAS. CASSAÇÃO DOS MANDATOS. DECLARAÇÃO DE INELEGIBILIDADE. NOVAS ELEIÇÕES. DETERMINAÇÃO. PRELIMINARES DA NULIDADE DO FEITO PELA REUNIÃO EXTEMPORÂNEA DAS AÇÕES ELEITORAIS

 

(…) a apreensão, às vésperas do pleito, de elevado valor em espécie, após denúncias do crime de corrupção eleitoral (art. 299 do Código Eleitoral), com anotações de campanha e recibos de transferências bancárias, sem que os agravantes tenham apresentado justificativas e provas consistentes quanto à origem e ao destino desses recursos, leva ao abuso de poder econômico e ao ”caixa dois", com gravidade suficiente para macular a legitimidade do pleito, ainda mais em se tratando de município pequeno, que (…) teve 1.710 votos válidos e diferença de apenas 148 em favor dos vencedores da disputa (…).

(TSE, AgR–REspe 1057–17/TO, Rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 13/12/2019).

 

Entendo que, sem sombra de dúvidas, os critérios para identificar a prática de abuso de poder econômico foram atendidos, especialmente considerando-se a gravidade dos fatos verificados e o inequívoco comprometimento da normalidade do pleito decorrente do benefício desigual auferido pelos candidatos com financiamento exorbitante da campanha efetuado de modo ilícito.

Essa conclusão não resta alterada por não ter sido comprovado que o valor de R$ 930.000,00, objeto de financiamento realizado pelo candidato Adair Barilli em 02.10.2020, foi aplicado na campanha eleitoral, porque o extrato bancário juntado à contestação demonstrou que o montante era objeto de aplicação financeira em dezembro de 2020, não tendo havido saque do valor (ID 45561967).

As testemunhas Edineia Benedetti, gerente do Sicredi, e Diogo Kramer, advogado do candidato, referiram que Adair teria afirmado que o financiamento seria utilizado para aquisição de terras na Região de Bom Jesus e Vacaria, no RS (ID 45562129), mas essa circunstância em nada mitiga os ilícitos constatados. As teses recursais são precárias e frágeis para a reforma da sentença.

Considero importante ressaltar que embora os candidatos Adair Barilli e Flávio Pitton tenham declarado em sua prestação de contas de campanha apenas o recebimento de recursos e a realização de gastos no valor de R$ 9.000,00, não houve condenação dos investigados pela prática de caixa 2 durante a campanha, e que o recurso dos investigantes não postula a condenação por essa infração, pois limitou-se a pedir a execução imediata da sentença, a majoração da multa para o grau máximo e a sua fixação de forma individualizada (ID 45562612).

Embora a conduta descrita no art. 30-A da Lei n. 9.504/97 esteja aparentemente bem delineada no caderno probatório, sequer houve debate, no curso da instrução, entre a prestação de contas de campanha dos candidatos e a movimentação de valores verificadas nas provas colhidas, não cabendo aqui examinar a prática do ilícito uma vez que o recurso quanto ao juízo de mérito é exclusivo da defesa.

Essa circunstância não impede a análise dos fatos sob o viés do abuso de poder econômico e o resultado da extração de conteúdo dos celulares apreendidos comprova que os demandados conversavam entre si e abertamente sobre o investimento de valores na campanha para a entrega a eleitores em troca do voto.

No diálogo do arquivo chat-3279.txt, realizado entre Luciano Pelissaro e Vinícius Rugini, dois importantes articuladores das infrações, os investigados tratam da compra de votos para que eleitores votem em Adair, das combinações que realizam diretamente com o candidato, do investimento de recursos na campanha, da formação de maços de dinheiro, todas essas condutas realizadas desde outubro até as vésperas do pleito:

Chat-3279.txt

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 06/10/2020 02:00:27(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Se pagar tem que adesivar, senão engana

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 06/10/2020 02:00:47(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Certo

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(...)

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 06/10/2020 02:11:23(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Jando vota, Mundica $$$_

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 11/10/2020 00:23:21(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Os assuntos tratatos exigem sigilo

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 05:00:16(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Abra o olho bróder.

Qualquer diferença nos indecisos, Um atrapalho na urna de São Miguel , Algum filho da puta que tem raiva do noso grupo pega dinheio e vota contra.

E 1 milhão bem administrado na última semana, levamos uma rasteira que nem vimos da onde que vem o golpe.

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 05:01:19(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

O que quero dizer que eles podem fazer uma análise e ver que eles tem chance, eles investem pra ganhar.

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(...)

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 30/10/2020 10:40:40(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Mas eu, particularmente, não acredito que façam

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 30/10/2020 10:41:10(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pq aí, o único problema nosso, seria investir dinheiro novamente

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(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 12:43:49(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Uns estão esperando pelos outros dentro do grupo

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 12:44:23(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

E Adair tá sempre falando que pessoal tenque se envolver mais, que tenque trabalhar mais...e estão desapontado ele

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 09:35:24(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Vamos separar o dinheiro de tarde?

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 09:35:33(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Fazer os maços

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(…)

 

Como se vê, na conversa acima os demandados Vinícius e Luciano tratam de investimento de dinheiro na campanha para pagamento de eleitores. E nas conversas entre Vinícius e Ailton já referidas (Chat-281.txt), o demandado trata de diversos atos destinadas à promoção da candidatura de Adair e Flávio, dá ordens ao cabo eleitoral Ailton, o qual informa os valores a serem pagos a eleitores cooptados (Alegrete -4.500, Bruna – 3.000.00, Patricia – 2.000.00).

Nos diálogos obtidos através da extração de dados de celular, Ailton Cezar de Oliveira trata com Vinícius Rugini sobre a compra de voto de eleitores, compra de micro câmeras para filmagem de votos, e entrega de alimentos na área indígena de Muliterno/RS. Nelas Vinícius diz que Vitassir realizará os pagamentos (Chat-281.txt). As transações bancárias registradas nos extratos de Vitassir Brollo (“Cuco”) demonstram ao menos duas transferências para que Ailton realizasse compra de votos, nos dias 04.11.2020 (R$ 5.000,00), e 12.11.2020 (R$ 1.500,00), conforme adiante será examinado.

Nos extratos de Vinícus Rugini há uma quantidade expressiva de cheques debitados, especialmente nos meses de outubro e novembro de 2020, no total de mais de R$ 100.000,00, sem apresentação de justificativas plausíveis para tamanha movimentação.

São também elucidativas as conversas em que Ailton Cezar de Oliveira tratava da compra de filmadoras, intermediava a compra de votos de eleitores e o pagamento de eleitores para a abstenção do voto, além da entrega de alimentos e bandeiras de propaganda na área indígena de Muliterno/RS na antevéspera do pleito, sob a supervisão de Vinícius Rugini:

Chat-281.txt:

(...)

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 10/11/2020 12:55:14(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Bertuzzi lhe encomendou 10 chaveiro que filma?

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 11/11/2020 13:03:24(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Os controles ficou certo?

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From: 555499872915@s.whatsapp.net Ailton De Oliveira Novo

Timestamp: 11/11/2020 14:30:10(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pia os controle fiz o pedido

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From: 555499872915@s.whatsapp.net Ailton De Oliveira Novo

Timestamp: 11/11/2020 14:30:23(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Mas ficou para chegar sexta

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 02:10:26(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Se programe pra resolver das filmadora

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(...)

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From: 555499872915@s.whatsapp.net Ailton De Oliveira Novo

Timestamp: 13/11/2020 12:35:38(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Alegrete4.500

Bruna3.000.00Patricia 2.000.00

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 12:35:46(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ok

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 13:22:22(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

1500 pra não vir votar, pode ser

Porém após apurarem as urnas

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(...)

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From: 555499872915@s.whatsapp.net Ailton De Oliveira Novo

Timestamp: 17/11/2020 17:41:49(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Faltou 4.000.00 para os votos de gentil

2.000.00 para a filmagem

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(...)

 

Os comprovantes bancários dos IDs 45562294 e 45562295 demonstram que Vitassir Brollo, conhecido como “Cuco”, transferiu para a conta bancária de Ailton R$ 5.000,00 em 04.11.2020, e R$ 1.500,00 em 12.11.2020, valores compatíveis com a quantia que Douglas afirma ter recebido em troca do voto.

Os investigados alegam que o pagamento de Vitassir (“Cuco”) a Ailton foi realizado em razão da existência de um negócio envolvendo um veículo corolla, fato que consta dos depoimentos das testemunhas Sidimar Aibel (ID 89258250), servidor municipal, e Rodrigo Bertuzzi, vice-presidente do PP e dono do Mercado Bertuzzi (ID 45562098). Ambos disseram terem escutado comentários sobre a negociação de um automóvel entre Ailton e Vitassir, mas não houve prova concreta desse fato. E a prova dos autos contraria frontalmente essa versão de negociação de automóvel, a qual não guarda a menor verossimilhança com o contexto dos diálogos acima, a prova documental e a testemunhal.

No diálogo Vinícius trata com Ailton sobre a compra de filmadoras e compra de votos, com informação sobre nomes, valores e dados de conta bancária. Os extratos bancários juntados ao feito após as medidas cautelares demonstram que Vitassir Brollo realmente realizou duas transferências bancárias para Ailton.

Além disso, no arquivo Chat-3077.txt envolvendo conversa de WhatsApp entre Vinícius Rugini e Rodrigo Bertuzzi, Vinícius afirma que “Adair andou liberando dinheiro pro alton sidi e ailton”, “mas adair disse que ele deve prestação de conta do que levou, que até sexta ele disse que tem que vir com os nomes” (09/11/2020 20:38:56).

Portanto, igualmente comprovada a prática de abuso econômico também nesse ponto, devendo ser mantida a sentença.

 

2.3 Abuso de poder econômico mediante investidura de eleitores em cargos públicos e filmagem do voto de eleitores

No grupo de WhatsApp “Comissão Eleição”, do qual faziam parte os candidatos Adair Barilli e Flávio Pitton (Tete), as testemunhas Rodrigo Bertuzzi, vice-presidente do PP e proprietário do Mercado Bertuzzi, e Rodrigo Mognom (Alemão), o então Prefeito de Muliterno/RS, Adriano Luiz Pelissaro, também ouvido como testemunha, os investigados Luciano Pelissaro e Vinícius Rugini, entre outros integrantes, verificou-se que eleitores mencionados na conversa foram investidos em cargos públicos em troca de votos.

Merecem ser transcritas as mensagens trocadas entre os investigados sobre terem comprado votos em troca do cargo em comissão, e estarem trocando cargos públicos por votos e exigindo adesivagem e divulgação de propaganda eleitoral, além de estarem propondo “montar um controle para ajudar os vereadores para que não façam acerto com os mesmos eleitores”:

Chat-338.txt

(...)

 

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 11/10/2020 22:22:20(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

E esse pessoal que entrou a pouco na prefeitura e tão encima do muro, vão teque se declarar e adesivar carro e casa.

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 11/10/2020 22:22:32(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Se não não tem lógica.

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 11/10/2020 22:25:59(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Eu tenho esses

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 11/10/2020 22:26:42(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Eu ainda insisto que precisa ter um pessoal adesivando casas

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 11/10/2020 22:27:22(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Tipo casa da Leandra, Texera, Bejo, Joares, Bananinha...

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 11/10/2020 22:28:15(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ivo, Geraldo, Mãe do Gringo..

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 11/10/2020 22:28:15(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Amanhã de manhã vou falar com mais de 10 pessoas falando dos adesivos.

E de tarde Felipe vai passar nos que eu falei e que autorizaram.

(…)

 

A promessa de cargos públicos em troca de votos, ou a efetiva investidura, igualmente caracterizam abuso de poder econômico em face da manifesta expressão financeira do benefício concedido ao eleitor, e do inequívoco desequilíbrio entre os candidatos causado por esse tipo de infração, circunstância que malfere a normalidade e legitimidade do pleito.

Além disso, observa-se a conformação de prática de abuso de poder político em benefício da campanha dos candidatos quanto aos fatos verificados nas conversas de WhatsApp, pois a investidura de eleitores em cargos em comissão em troca do voto somente foi possível com o assentimento do então Prefeito de Muliterno/RS, Adriano Luiz Pelissaro.

A prova é contundente e merece ser mantida a sentença neste ponto.

 

2.4 Captação ilícita de sufrágio de Douglas Lopes Teixeira, Tainise Batistelo de Oliveira, Renê Zauza e Patrícia Barilli

Por outro lado, a legislação impede a condenação dos investigados por prática de captação ilícita de sufrágio em relação ao voto do eleitor Douglas Lopes Teixeira, o qual foi ouvido em audiência judicial sob compromisso, e também prestou depoimento policial, narrando que na tarde de sábado, véspera da eleição, Luciano Pelissaro foi até a sua residência e negociou a compra do seu voto e de sua esposa em troca de R$ 1.500,00 cada, sob a condição de que votassem em Adair e Fernando e fizessem a prova da combinação através da filmagem da urna.

Em juízo, Douglas disse que conversou sobre a compra dos votos com o candidato Adair Barilli, na prefeitura, e com Vitassir Brollo (Cuco), e que Vitassir “disse que era pra eu ficar tranquilo que o Luciano ia entrar em contato comigo, que já tinham conversado sobre o meu voto”. Declarou que, posteriormente, o valor total de R$ 3.000,00, em espécie, lhe foi entregue por Luciano, o qual foi até a sua residência acompanhado de Vinícius Rugini e Rodrigo Mognon, e que não gravou o voto: “Eu me esqueci, eu larguei o telefone na mesinha, naquela que antes de entrar pra votar, eu larguei o telefone ali”.

De acordo com o art. 368-A do Código Eleitoral, o testemunho exclusivo do eleitor supostamente corrompido não se presta a comprovar a prática de captação ilícita de sufrágio, quando desacompanhado de outras provas, sendo esse o caso dos autos.

Idêntico raciocínio aplica-se quanto às captações ilícitas do sufrágio da eleitora Tainise Batistelo de Oliveira em troca de R$ 1.500,00 para votar nos cargos de prefeito e vereador, e do eleitor Renê Zauza, também ouvido como informante.

Quanto à prática de abuso de poder econômico por aquisição e entrega de câmeras filmadoras a eleitores corrompidos, micro-câmeras em formato de caneta e chaveiro, a fim de que comprovassem o voto nos candidatos Adair Barilli e Flávio Pitton, embora o tema tenha sido tratado nas conversas de WhatsApp do celular de Vinícius Rugini com Luciano Pelissaro e Ailton Cezar de Oliveira, entendo que não houve prova suficiente da prática do ilícito.

Com a inicial foram apresentadas capturas de tela e áudios de conversas de WhatsApp entre Luciano Pelissaro e Renê Zauza (ID 45561821), as quais tratam de compra de votos e compra de microcâmeras em formato de chaveiro para filmagem de votos (ID 45561823). Também foram juntados vídeos de eleitores não identificados votando, na cabine de votação, mas não é possível vincular as filmagens a uma prévia negociação de valores em troca do voto, sendo a prova inconclusiva.

Há diálogos entre Vinícius e Luciano Pelissaro sobre a compra de filmadoras, obtidos por meio das extrações de dados dos celulares apreendidos (Chat-3279.txt), e no arquivo Chat-186.txt contendo diálogo de WhatsApp entre Vinícius Rugini e Sidinei Barilli, Sidinei diz o nome de eleitores a Vinícius e o investigado responde “Esse só filmado Barilli” (12.11.2020 21:14:43). Noutro ponto dessa conversa, Sidinei afirma: “Até falei com o Adair ontem ele me falou algo mas daí só se filmar” (13/11/2020 10:47:24).

De acordo com os dados colhidos no celular de Vinícius, parece ter havido a exigência de filmagem do voto dos eleitores em torno de atos de captação ilícita de sufrágio, mas as pessoas não estão devidamente identificadas e entendo ser frágil a prova para que se estabeleça um juízo condenatório. As gravações juntadas aos autos não têm autoria identificada e podem ter sido realizadas pelos apoiadores de campanha dos candidatos.

Destarte, afasto a condenação dos investigados por prática de captação ilícita de sufrágio dos eleitores Douglas Lopes Teixeira, Tainise Batistelo de Oliveira e Renê Zauza, e fixação da penalidade de multa.

Da mesma forma, tendo em conta que os demais eleitores referidos nos diálogos mantidos pelos investigados não foram ouvidos em juízo, considero que não há provas suficientes para o estabelecimento de juízo condenatório no que se refere à sanção por captação ilícita de sufrágio, sendo a mesma conclusão aplicável à eleitora Patrícia Barilli, devido à precariedade da prova.

A confirmação infração demanda identificação do eleitor e não é possível verificar, de forma clara, as tratativas que envolveram a negociação pelo voto, embora seja cristalino o ingresso de valores, de forma proporcional, no favorecimento da campanha dos investigados, circunstância confirmada inclusive pelo trânsito de recursos registrado nos extratos bancários.

Assim, a sentença merece ser reformada nesse ponto, afastando-se a condenação por prática de captação ilícita de sufrágio.

Como consequência, entendo prejudicado o pedido de majoração da multa prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, de 1.000 UFIRs para o máximo de 50.000 UFIRs, de forma individualizada para todos os demandados.

 

3. Responsabilização pessoal dos investigados

Dispõe o art. 22, inc. XIV, da LC 64/90 que “julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar”.

Conforme antes narrado, os atos foram praticados com envolvimento direto dos investigados, inclusive dos candidatos Adair Barilli e Flávio Pitton. Essas condutas graves são incompatíveis com os princípios democráticos e configuram abuso de poder econômico, uma vez que foi atingida a integridade do processo eleitoral com comprometimento da equidade entre os candidatos e da legitimidade do pleito.

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral “no que se refere à responsabilidade de candidato pela prática de atos de abuso de poder, a comprovação da sua participação indireta nos fatos, mediante anuência, é apta a atrair a imposição de inelegibilidade, como se infere do acórdão proferido no ED–RO–El 2244–91, rel. Min. Edson Fachin, DJE de 2.5.2022.21” (AREspEl n. 06002364120206060028, Rel. Min. Sérgio Silveira Banhos, j. 23/03/2023).

O grupo de WhatsApp “Comissão eleição”, do qual faziam parte os candidatos a prefeito e vice, Adair Barilli, Flávio Pitton (Tete), as testemunhas Rodrigo Bertuzzi, Elton Deon, Altemir Marini (“Tito” Marini), e Rodrigo Mognon (Alemão), Adriano Luiz Pelissaro, à época Prefeito de Muliterno/RS, e também ouvido como testemunha, o representante da coligação dos candidatos, Eloir Mognon, e os demandados Luciano Pelissaro e Vinícius Rugini, entre outros integrantes, revelou que os réus planejavam as ações a serem tomadas na campanha de forma coletiva, sob as ordens dos candidatos, e que Rodrigo Mognon, Luciano e Vinícius tinham influência no modo de condução da campanha, mas agiam sob subordinação dos candidatos (arquivo Chat-338.txt).

Conforme já ressaltado, nesse grupo de WhatsApp “Comissão eleição” eram tratadas as condutas narradas forma coletiva, e por intermédio dessa ferramenta eram informados nomes de eleitores para colocar em listas (Chat-338.txt), demonstrando-se que os candidatos Adair Barilli e Flávio Pitton (Tete) estavam atuantes na campanha, coordenando e anuindo com as práticas ilícitas, que eram efetuadas em massa.

Quando da criação desse grupo de WhatsApp, em 18/09/2020, Vinícius afirma: “Candidatos a prefeito e vice, entendo que deveriam participar”. Refere: “Afinal tudo o que vai ser tratado na comissão é a respeito deles”. A seguir, explica como funcionará a divisão de tarefas: “Comissão delega funções e tarefas para as pessoas certas dentro de cada partido.

Cada partido tem um nome certo pra trata de um caso específico”.

Em relação à propaganda eleitoral, colhe-se no grupo a fala de Rodrigo Mognom de que: “Se não colocar propaganda é adversário” (17/10/2020 00:26:12), e: “Ontem o ‘Teve’ me falou que na última semana vai se acampar na ‘área’ e que já tinha até o local aonde nele vai ficar” (30/10/2020 19:40:24).

Tal conversa demonstra que Rodrigo Mognom estava colaborando com informações a fim de contribuir com as condutas direcionadas às práticas ilícitas na área indígena. Também é possível verificar sua participação na campanha quanto ao uso de bandeiras de propaganda eleitoral na área indígena, pois ao ser informado de que os eleitores indígenas haviam solicitado esse tipo de propaganda, Rodrigo Mognon escreve: “Haaaa bão, tudo certo daí” (02/11/2020 22:41:56).

Após essas combinações, na antevéspera e véspera do pleito, dias 13 e 14.11.2024, são realizadas nesse grupo as tratativas para a compra de votos e transporte do eleitorado indígena, com indicação do local em que devem ser comprados os votos, e orientação do candidato a vice-prefeito Flávio Pitton, de que precisava de “caneta” nos índios. Após a vitória dos demandados, o representante da coligação, Eloir Mognon, tio da testemunha Felipe Mognon (que se disse administrador do sistema de candidaturas Candex), agradece a todos pelo empenho na campanha, e Vinícius Rugini diz “Preciso que me ajudem lembrar quem que ajudou puxar gente que devo ajudar com gasolina”:

Chat-338.txt

(…)

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From: 555499717357@s.whatsapp.net Tito Marini

Timestamp: 23/10/2020 10:17:31(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Votos de fora posição do Adair

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From: 555499717357@s.whatsapp.net Tito Marini

Timestamp: 23/10/2020 10:17:50(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pessoal pra trabalha no dia 14

-----------------------------

From: 555499717357@s.whatsapp.net Tito Marini

Timestamp: 23/10/2020 10:18:08(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Precisamos marcar reunião

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(…)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 17:34:40(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Estao na área indigena

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 17:37:07(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Tem uns 10 dos nosso lá

Mas o certo alguém de frente dos nosso teria que descer

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 17:37:21(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Eu não posso

To organziando as coisas pra de noite

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 08:54:20(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Rudi garbin vai de caminhão ma carreata nos índio

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(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 08:54:49(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ele queria saber de horário

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 08:55:07(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Eu disse descer lá pelas 9

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 14/11/2020 10:46:01(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Isso

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 15:29:26(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Venham aqui de tarde

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 15:29:37(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Precisamos andar em sintonia

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 15:29:50(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Aqui no salão de festa da casa do Fernando

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 15:30:02(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Não entrem pela porta ds frete

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 15:30:30(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Estacionem os carros na rua lateral

Rua de terra

Tem um portão de ferro

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(...)

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From: 555499626708@s.whatsapp.net Tete Pitton

Timestamp: 15/11/2020 09:49:54(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Presisa de caneta nos índios

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(...)

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From: 555499468651@s.whatsapp.net Junior Zanella

Timestamp: 15/11/2020 16:49:01(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Banheiro da praça

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From: 555499468651@s.whatsapp.net Junior Zanella

Timestamp: 15/11/2020 16:49:08(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pessoal tá comprando voto lá

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From: 555499468651@s.whatsapp.net Junior Zanella

Timestamp: 15/11/2020 16:49:29(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Manda uma gurizada desembarcar pro ali

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From: 555496880244@s.whatsapp.net Eloir Mognon

Timestamp: 16/11/2020 00:14:22(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Valeu pessoal, pelo trabalho, pela dedicação. Levamos um susto. Mas vencemos. Grande abraço.

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 16/11/2020 20:23:21(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Preciso que me ajudem lembrar quem que ajudou puxar gente que devo ajudar com gasolina.

Uns foi ajudado porque pediram e tem gente que tem vergonha de pedir, porém merece ajuda igual aos outros.

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 16/11/2020 20:24:09(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

E me digam quem que vocês ajudaram pra não correr risco de eu pagar de novo

-----------------------------

(...)

 

Na manhã do dia da eleição, 15.11.2020, Vinícius Rugini afirma para Andressa Mognon: “Adair precisava do luan e seu marido”. e pede a ela ajuda: “Pra puxar umas famílias de índios que não tem carro”. Ao responder, Andressa pede para colocá-los no “grupo” (Chat-162.txt):

Chat-162.txt

(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 07:39:55(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Bom dia andreza

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 07:40:20(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Adair precisava do luan e seu marido

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 07:40:28(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Lá no indios agora cedo

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 07:41:17(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pra puxar umas famílias de índios que não tem carro

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 07:41:39(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pois se deixar os nindios3 lá o pessola do pdt vai encima

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(...)

-----------------------------

From: 555499482708@s.whatsapp.net Andressa Mognom

Timestamp: 15/11/2020 07:43:14(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ta ja passo recado

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From: 555499482708@s.whatsapp.net Andressa Mognom

Timestamp: 15/11/2020 07:43:54(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ok

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From: 555499482708@s.whatsapp.net Andressa Mognom

Timestamp: 15/11/2020 07:44:43(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Desce agora la

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From: 555499482708@s.whatsapp.net Andressa Mognom

Timestamp: 15/11/2020 07:47:35(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Já vão indo

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From: 555499482708@s.whatsapp.net Andressa Mognom

Timestamp: 15/11/2020 07:59:02(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Vai o Luan de carro nosso e o Eze de clio branco, placa de PF pro pessoal sabe la embaixo

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(...)

-----------------------------

From: 555499482708@s.whatsapp.net Andressa Mognom

Timestamp: 15/11/2020 07:59:39(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Quize coloca ele no grupo

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 07:59:45(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Blz

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From: 555499482708@s.whatsapp.net Andressa Mognom

Timestamp: 15/11/2020 07:59:47(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Meu cunhando Eze

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(…)

 

Há também diálogo em que Vinícius Rugini trata com Ailton Cezar de Oliveira sobre a entrega de alimentos e bandeiras de propaganda na área indígena de Muliterno/RS, na antevéspera do pleito:

Chat-281.txt:

(...)

-----------------------------

From: 555499872915@s.whatsapp.net Ailton De Oliveira Novo

Timestamp: 13/11/2020 20:24:27(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Desço nos índios??

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(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/11/2020 20:28:42(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Só se vc quer ter contigo alguma coisa de pao linguiça coca carvão

Que dai se vc se inturmar já tem coisa junto

-----------------------------

(…)

E do contexto do caderno probatório verifica-se uma pulverizada atuação desses apoiadores da campanha dos candidatos para a prática de abuso de poder econômico relativa a diversos eleitores, com posterior indicação dos nomes para controle, o que se mostrou pouco eficiente. Veja-se, por exemplo, o descontrole das tratativas com eleitores verificado na conversa do chat-3236.txt realizada entre Amarildo Astolfi e Vinícius Rugini 5 dias antes da eleição:

Chat-3236.txt

(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 03/11/2020 14:56:36(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Eleitores de fora são preparado

Esperam chegar essa época pra ficar jogando pra todos os lados

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 03/11/2020 14:56:43(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Vender voto pra vários

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 03/11/2020 14:57:15(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ou até mesmo vender voto de gente que nem tá na lista dos eleitores de Muliterno

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 03/11/2020 14:57:26(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

É golpe e golpe

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From: 555496556248@s.whatsapp.net Amarildo Astolfi

Timestamp: 03/11/2020 15:53:55(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Sim isso tentaram fazer comigo na eleição que o Maurílio ganhou

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From: 555496556248@s.whatsapp.net Amarildo Astolfi

Timestamp: 09/11/2020 15:17:24(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Opa Vini, falei com a Tere sobre oque te falei do Rodrigo, ela disse que é fofoca da oposição, fica gelo...

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(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 10/11/2020 09:57:46(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Teria que saber o nome

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From: 555496556248@s.whatsapp.net Amarildo Astolfi

Timestamp: 10/11/2020 09:59:31(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pra saber os nomes só indo lá, não sei se ele sabe o nome certo deles, diz que é uns parente

-----------------------------

(...)

Da análise das provas apresentadas, e da inconsistência da tese defensiva contida nos depoimentos colhidos em audiência, evidencia-se a existência de um agir organizado com o propósito de influenciar o resultado das eleições por meio do transporte de eleitores indígenas, o que configura abuso de poder econômico.

As conversas indicam a coordenação de atividades logísticas e a mobilização de pessoas e recursos para o transporte de eleitores, bem como a menção explícita à necessidade de “caneta” nos índios feita pelo candidato a vice-prefeito no dia da eleição, Flávio Pitton, um termo que remete a controle, incentivo ou recompensa.

A comunicação subsequente à eleição, onde Vinícius solicita ajuda para lembrar quem contribuiu com o transporte de eleitores a fim de recompensá-los com gasolina, reforça a percepção de que houve uma operação planejada para a destinação de recursos financeiros a fim de que fosse realizado o transporte de eleitores para votar.

Nas conversas do chat-286.txt, do grupo de WhatsApp “PTB (assuntos internos)”, também verifica-se a posição de acompanhamento de Adair sobre os atos de seus apoiadores, pois também nesse grupo eram indicados os nomes de eleitores corrompidos, e quanto aos procedimentos da campanha o candidato tinha a palavra final, conforme fala de Vinícius Rugini: “mas estou vendo que vai teque ter uma palavra final do Adair nessa lida” (18/10/2020 12:52:04):

Chat-286.txt

(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/10/2020 23:48:48(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

O Joel girardelo

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 13/10/2020 23:48:58(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

É nosso ou tá pendente?

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From: 555496093154@s.whatsapp.net Adair Barilli

Timestamp: 14/10/2020 00:00:40(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Prometeu apoio

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 18/10/2020 12:51:00(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

e luciano disse que voto d efora cada um que tem suas influencias tenquqe trabalhar

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 18/10/2020 12:51:07(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

vamos ver como vai ser a conversa amanhã

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 18/10/2020 12:52:04(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

mas estou vendo que vai teque ter uma palavra final do Adair nessa lida

-----------------------------

(...)

 

O caderno probatório deixa nítido que os candidatos eram de tudo informados, tinham ciência sobre o agir de seus apoiadores e consentimento. No chat-3279.txt, Vinícius Rugini conversa com Luciano Pelissaro sobre a necessidade de reuniões com Adair Barilli e Flávio Pitton (Tete) acerca da campanha:

Chat-3279.txt

(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 12:43:49(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Uns estão esperando pelos outros dentro do grupo

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 12:44:23(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

E Adair tá sempre falando que pessoal tenque se envolver mais, que tenque trabalhar mais...e estão desapontado ele

-----------------------------

(…)

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 11/11/2020 02:25:39(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Peleando com os eleitores

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 11/11/2020 14:52:17(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Confirmado 13:30 ali

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 11/11/2020 14:52:27(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Avisei adair e cuco e tete

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Nessa mesma conversa Luciano e Vinícius tratam da entrega de valores a diversos eleitores, dentre eles Idelso Antunes de Morais e Abrão Rodrigues Pereira, dos acertos com Vitassir Brollo (“Cuco”), e da prestação de contas que deve ser feita ao candidato Adair e ao partido Progressistas. Nesse diálogo, Luciano Pelissaro e Vinícius Rugini deixam claro que era tão alta a movimentação de valores na campanha em razão da entrega de dinheiro a eleitores, e que havia a possibilidade de eleitores venderem o voto e receberem duas vezes o valor:

Chat-3279.txt:

(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 12:40:47(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Andressa a Costa

Do Roberto astolfi me chamou

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 12:40:50(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Qué brique

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 12:41:01(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Na lista não tem ninguém cuidando

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(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 14/11/2020 12:43:49(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ok

Vou mandar dar continuidade contigo

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(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 10:34:15(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Edimara Cristina do nascimento

Axo que é muié de um dos Astolfi

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 10:34:31(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ta na sua lista

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 10:34:40(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Mas vc dá continuidade

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 10:34:53(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ou Pazin pode finalizar com ela?

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 15/11/2020 10:40:50(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Amarildo faz

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(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 13:03:26(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pelo amor de Deus Luciano

Me diga que vai pagar tudo hoje e me diga que pagou quase tudo

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 13:03:42(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Não tenho mais dinheiro

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 15:24:04(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Tenho só mais 37 mil

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 15/11/2020 18:34:12(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Quando tu subir, preciso pagar o tintio

-----------------------------

From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 15/11/2020 18:49:52(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Preciso pagar o Tintii

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 15/11/2020 18:57:09(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pode pagar 2

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 15/11/2020 19:00:14(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Eu pago 2 mil pra ele

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 16/11/2020 11:18:32(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Temos que ir com os números por urna

-----------------------------

(…)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 16/11/2020 11:21:23(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ficou pras 9 horas no adair

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 16/11/2020 14:44:36(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Tenho 1.600 aqui em $$$

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 16/11/2020 15:50:28(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Sicredi

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 16/11/2020 15:50:28(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

267899conta

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 16/11/2020 15:50:29(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

IDELSO ANTUNES DE MORAIS

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 16/11/2020 15:57:47(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ok

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 17/11/2020 02:49:36(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Quando acertar Tintio me avisa

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 17/11/2020 20:53:19(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

quando que conseguimos saber quem são os eleitores que não vieram votar?

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 17/11/2020 20:54:20(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

O Ailton e mandou um vide de voto filmado domingo

eu pensei comigo que devia ser d ealgum de todos aqueles eleitores que ele estava puxando

mas ele não me disse de qume era o voto

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 17/11/2020 20:54:39(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

hoje tá me cobrando 2 mil do voto filamdo, que disse que é da charize, muié do bira

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 17/11/2020 20:54:51(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

e que tem mais 4 votos de gentil pra acertar

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 17/11/2020 20:55:11(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Mas não comente com ele

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 17/11/2020 20:55:53(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Que vou ver com o Cuco pois desde começo esse negócio não fluiu

Sempre esteve embacado esse assunto

-----------------------------

(...)

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 17/11/2020 22:23:27(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

falou eles?

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 17/11/2020 22:23:33(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

chegou a contabilizar?

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 17/11/2020 22:23:45(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

que o Adair vai querer saber da parte do PP como ficou

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 17/11/2020 22:23:53(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

e o Samuel vai vir com a parte deles

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(...)

-----------------------------

From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 18/11/2020 10:53:08(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Mas sou eu que tenho a lista....

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 18/11/2020 10:53:30(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

A dele não nós serve

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 18/11/2020 10:53:53(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pq teve gente que pegou 2 vezes

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 18/11/2020 11:01:46(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

mas dai paga aqui, ou desçe lá?

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 18/11/2020 11:02:54(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Eis o problema. O pessoal acha que se descermos lá, haverá muitos que virão pegar novamente. Os que já pegaram vão vir de novo..

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 18/11/2020 11:03:35(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

E temos outro problema. O Nemias não quer que seja na casa do Samuel, e os do PP também não..

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(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 18/11/2020 12:45:14(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

13 hs no Adair?

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 18/11/2020 12:45:32(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Ok

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(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 19/11/2020 12:29:19(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Avisou o adair.pra ir ali as 10 hs?

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(...)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 20/11/2020 21:11:01(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

o nome dele e Abrão rodrigues Pereira

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 20/11/2020 21:11:09(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Veja se ese nome recebeu

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 20/11/2020 21:11:20(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

E a jocelaine disse que faltou só esse

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(...)

 

Ressalto que a gravação de vídeo fornecida pela agência bancária do Sicredi (ID 45561978) demonstra que uma funcionária da empresa de propriedade de Vinícius (Rugini Comércio de Batatas Eireli – CNPJ n. 14.875.426/0001-01) realizou a operação de depósito de R$ 2.000,00 para o eleitor Idelso Antunes de Moraes, de apelido “Thintio” ou “Tintio”, cujo comprovante foi juntado ao ID 45561823.

No recurso os demandados afirmam que Idelso Antunes de Moraes vende sacos de batata reciclados, e que Vinícius adquire sacos de Idelso. Ocorre que o fato não foi comprovado durante a instrução, e nem foi demonstrado que o depósito em questão teve relação com sacos de batatas.

Durante a instrução foi ouvida a testemunha Manuel Marini da Rocha, funcionário da empresa de Vinícius Ruggini, o qual declarou que a empresa não “botou dinheiro na campanha”. A testemunha, que fazia parte do Grupo de Whatsapp “Guerreiros do 14”, disse não poder confirmar se o depósito Idelso Antunes de Moraes é decorrente da venda de sacos de batata, pois a negociação em questão teria sido realizada por Vinícius Rugini (ID 45562159).

Em suma, o que se vê das provas coligidas é um cenário de consciência e permissão dos candidatos para que se praticasse a captação ilícita de sufrágio generalizada de eleitores, em benefício de sua campanha, situação que caracteriza a ciência sobre os ilícitos, bem como a anuência, e a jurisprudência do TSE admite que a infração seja caracterizada por ação de terceiros quando demonstrado que o candidato, ao menos, com ela anuiu.

Os candidatos não somente tomavam ciência das tratativas sobre compra de votos, como assentiam com as práticas ilícitas ali tratadas com palavras, emojis de palmas ou de mãos dadas, e decidiam, com última palavra, a forma de agir dos cabos eleitorais:

Chat-338.txt

(…)

-----------------------------

From: 555496093154@s.whatsapp.net Adair Barilli

Timestamp: 16/10/2020 22:36:07(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

 

-----------------------------

From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 16/10/2020 23:55:01(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

 

-----------------------------

(…)

-----------------------------

From: 555499717357@s.whatsapp.net Tito Marini

Timestamp: 23/10/2020 10:17:31(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Votos de fora posição do Adair

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From: 555499717357@s.whatsapp.net Tito Marini

Timestamp: 23/10/2020 10:17:50(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Pessoal pra trabalha no dia 14

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From: 555499717357@s.whatsapp.net Tito Marini

Timestamp: 23/10/2020 10:18:08(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Precisamos marcar reunião

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 13:34:59(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

contratei Ivanir Pires

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 13:36:01(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Vai descer nos Indio todos os dias ver quem que tá girando lá ver qual os comentário ver se tem alguém deles trabalhando lá dentro ver os movimento daquela gente

-----------------------------

From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 13:36:07(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

ficou bem facero

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 13:36:30(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

e queira ou não, alguma coisa ele traz lá de baixo ‍

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From: 555496880244@s.whatsapp.net Eloir Mognon

Timestamp: 30/10/2020 13:47:00(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Blz

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From: 555496093154@s.whatsapp.net Adair Barilli

Timestamp: 30/10/2020 13:47:19(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

 

-----------------------------

From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 30/10/2020 14:12:28(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Kaiser pode ir junto

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 30/10/2020 14:13:42(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

E Julica também,se entenderem necessário

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 30/10/2020 14:34:50(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Eu vejo que se pelo menos tiver gente nossa lá marcando presença já é uma grande coisa

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(…)

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From: 5554999768647@s.whatsapp.net Vinícius Rugini (owner)

Timestamp: 03/11/2020 15:02:16(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Será que conseguimos montar um controle para ajudar os vereadores para que não façam acerto com os os mesmos elitores?

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 03/11/2020 18:16:08(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Nós na campanha

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(…)

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From: 555499891186@s.whatsapp.net Luciano Pelissaro Whatz

Timestamp: 10/11/2020 23:25:20(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Isabel e Débora Freitas só se for voto filmado

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(…)

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From: 555496093154@s.whatsapp.net Adair Barilli

Timestamp: 05/11/2020 12:09:40(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Opa ela sempre falou que vota

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From: 555496093154@s.whatsapp.net Adair Barilli

Timestamp: 05/11/2020 12:12:53(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Se alguém tiver influência seria bom investigar

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From: 555499626708@s.whatsapp.net Tete Pitton

Timestamp: 05/11/2020 16:42:47(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Não vamos perder tempo com isso

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From: 555499626708@s.whatsapp.net Tete Pitton

Timestamp: 05/11/2020 16:43:49(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Já temos gente suficiente enganado

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(…)

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From: 555499626708@s.whatsapp.net Tete Pitton

Timestamp: 15/11/2020 09:49:54(UTC+0)

Source App: WhatsApp

Body:

Presisa de caneta nos índios

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(...)

 

Os atos de abuso de poder foram realizados com o conhecimento e anuência dos integrantes do grupo de WhastApp e, em específico, dos candidatos Adair Barilli e Flávio Pitton (Tete). Há uma coerência entre as diversas fontes de evidência que reforça a credibilidade sobre o envolvimento de todos os investigados que integravam os grupos e conversas de WhatsApp na prática de abuso de poder.

O benefício para as candidaturas de Adair Barilli e Flávio Pitton é manifesto, assim como sua aquiescência, pois participavam dos grupos onde eram realizadas as conversas envolvendo atos de abuso de poder econômico. Não é possível concluir que Adair e Flávio desconheciam as negociatas, pois não se identifica posição de inocência desconhecimento sobre o agir de seus cabos eleitorais quanto à prática de captação ilícita de sufrágio.

De acordo com a Corte Superior Eleitoral “(...) de outra forma, a regra inserta na legislação eleitoral não teria eficácia se fosse permitido que terceiros comprometessem a vontade do eleitor, a mando ou com a anuência do candidato” (TSE, REspe n. 49871, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE 05/08/2014).

Do vasto conjunto probatório entendo que merece ser mantida a sentença também nesse ponto, pois as razões recursais de Adair Barilli, Flávio Pitton, Vinícius Mognon Rugini, Rodrigo Mognon, Vitassir Brollo, e Luciano Pelissaro são insuficientes para reformar a sentença nesse ponto e afastar a conclusão da prática de captação ilícita de sufrágio quanto ao eleitor Douglas Lopes Teixeira, na forma do art. 41-A da Lei n. 9.504/97, com a ciência dos candidatos Adair Barilli e Flávio Pitton.

Os candidatos Adair Barilli e Flávio Pitton tiveram, além de conivência, envolvimento em práticas de abuso de poder econômico, coordenação de atividades logísticas para transporte de eleitores indígenas, e benefício com a investidura de eleitores em cargos em comissão em troca de votos. Houve participação ativa nas conversas de WhatsApp indicando conhecimento e consentimento das ações de seus apoiadores. Ambos coordenavam as estratégias para influenciar o voto de eleitores por intermédio de abuso de poder econômico, com regular engajamento nos atos.

Com base na prova produzida, a necessidade de manutenção da condenação dos candidatos se fundamenta em sua participação direta e consciente em práticas que configuram abuso de poder econômico e comprometimento da integridade do processo eleitoral. Suas condutas, evidenciadas nas conversas, depoimentos e ações descritas nos documentos juntados aos autos, reforçam a importância de responsabilizá-los para preservar a lisura e legitimidade do pleito eleitoral, garantindo a igualdade de condições na disputa eleitoral e a proteção dos princípios democráticos.

Vinícius Mognon Rugini e Rodrigo Mognon igualmente tiveram participação direta em ações destinadas ao favorecimento ilegal, das candidaturas de Adair e Flávio, incluindo ordens para pagamento a eleitores cooptados e envolvimento em transações financeiras caracterizadoras de abuso de poder econômico. Ademais, também efetuaram coordenação de atividades logísticas para transporte de eleitores, e movimentação de valores significativos em benefício da campanha dos candidatos. Ambos foram responsáveis pela mobilização de recursos financeiros para influenciar o resultado das eleições, conforme diálogos que indicam sua participação ativa na organização e execução de ações ilícitas visando obter vantagens eleitorais ilícitas.

Vinícius Mognon Rugini teve papel central na organização e execução de práticas ilícitas que comprometeram a integridade do processo eleitoral, violando os princípios democráticos, a equidade entre os candidatos e a legitimidade do pleito.

Vinícius Rugini e Rodrigo Mognon são integrantes do grupo de WhatsApp "Comissão eleição", juntamente com outros membros como Rodrigo Bertuzzi, Elton Deon, Altemir Marini (Tito Marini), Adriano Luiz Pelissaro, representante da coligação dos candidatos, Eloir Mognon, e os demandados Luciano Pelissaro, Adair Barilli, Fabiano Pitton (Tete) e Vinícius Rugini. Todos tiveram um agir organizado para influenciar o resultado das eleições por meio do transporte de eleitores indígenas e circulação de valores exorbitantes em benefício da campanha dos candidatos Adair e Flávio, configurando abuso de poder econômico e comprometendo a integridade do processo eleitoral.

Este grupo planejava ações coletivas na campanha sob as ordens dos candidatos, indicando que Rodrigo Mognon, Luciano e Vinícius tinham influência na condução da campanha, mas agiam sob subordinação dos candidatos.

Vitassir Brollo e Luciano Pelissaro realizaram transferências bancárias para a compra de votos, envolveram-se em negociações financeiras visando a cooptação de eleitores por meio de abuso de poder econômico, incluindo a entrega de valores em troca de apoio eleitoral, o que compromete a integridade do processo eleitoral e viola os princípios democráticos. Os diálogos juntados aos autos revelam a participação de Vitassir Brollo e Luciano Pelissaro em discussões sobre entrega de dinheiro a eleitores coordenação de atividades logísticas para transporte de eleitores e ingresso de valores em benefício da campanha dos candidatos, evidenciando seu envolvimento direto em ações que comprometem a lisura do processo eleitoral.

Luciano Pelissaro é citado em diálogos que indicam seu envolvimento direto nas decisões sobre a forma de agir dos cabos eleitorais, demonstrando sua participação ativa e conhecimento das práticas ilegais.

As provas apresentadas, como conversas de WhatsApp, transações bancárias e testemunhos, corroboram a participação ativa de todos os investigados em ações que visavam influenciar o resultado das eleições de forma ilegal e antiética por meio de abuso de poder econômico.

Há provas robustas para amparar o juízo condenatório e as razões recursais são insuficientes para afastar a condenação, pois os candidatos não somente tomavam ciência das tratativas sobre compra de votos, como assentiam com as práticas ilícitas ali tratadas com palavras, emojis de palmas ou de mãos dadas, e decidiam, com última palavra, a forma de agir dos cabos eleitorais:

Concluo pela manutenção da condenação de todos os investigados pela prática de abuso de poder econômico por intermédio de uma extensa e vultosa movimentação de valores entre suas contas bancárias, em datas próximas ao pleito, através de transferências de valores e emissão de cheques, com participação de proprietários de estabelecimentos comerciais, a qual se alinha às conversas de WhatsApp obtidas com autorização judicial.

 

4. Sanções de cassação do diploma e de declaração de inelegibilidade em razão da prática de abuso de poder

De acordo com o TSE, “a declaração de inelegibilidade prevista no art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/1990 exige prova segura de que o representado na AIJE realizou o ilícito ou, ao menos, de que concordou com a sua prática” (RO-El n. 00022468820146030000, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE 08/09/2022).

Nos termos das razões até aqui expostas, merece ser mantida a condenação dos demandados à sanção de inelegibilidade nos 8 (oito) anos subsequentes à Eleição de 2020, na forma declarada na sentença, além da cassação do diploma dos candidatos Adair e Flávio, diretamente beneficiados pela interferência do poder econômico.

As práticas verificadas nos autos não apenas comprometem a legitimidade das eleições, mas também minam a confiança da sociedade no sistema democrático e nas instituições responsáveis pela organização e fiscalização do processo eleitoral. E a gravidade desse tema não se limita apenas aos atos ilícitos em si, mas também às consequências mais amplas que têm para a democracia e para a coesão social.

Considerada a proximidade do pleito para prefeito, a execução do acórdão deve se dar pela realização de uma eleição indireta, e não por meio de nova eleição direta. Deve o Presidente da Câmara de Vereadores de Muliterno/RS assumir interinamente o cargo de prefeito e convocar a eleição indireta na forma do art. 224, § 4º, inc. I, do Código Eleitoral.

Essa é a diretriz da jurisprudência do TSE, segundo a qual, havendo dupla vacância dos cargos de prefeito e vice-prefeito e restando poucos meses para o fim do mandato, a eleição suplementar deve ser realizada na modalidade indireta:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO DE TRE. DECISÀO REGIONAL CASSOU OS DIPLOMAS DOS ELEITOS ANTES DO INÍCIO DO PRIMEIRO BIÊNIO. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. SEGURANÇA DENEGADA.

Conquanto a jurisprudência do TSE tenha decidido que a vacância “é situação jurídica, e não de fato, e é consequência automática da cassação dos diplomas” ( MS nº 219-82/BA, rel. Mm. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 2.6.2015), o que levaria à realização de eleições diretas no município (a cassação ocorreu ainda no primeiro biênio do mandato), o princípio da razoabilidade recomenda que não sejam realizadas eleições diretas suplementares em data próxima às eleições ordinárias municipais, pois recursos públicos seriam gastos para o exercício de mandato de poucos meses. Precedentes do TSE. Segurança denegada. Mantida a realização de eleição indireta no Município de Brusque/SC. Prejudicado o agravo regimental. Ação cautelar e regimental prejudicados. Comunicação imediata ao Regional. (Mandado de Segurança 23.451, ReI. Min. Gilmar Mendes, julgado em 24.5.2016)

 

Assim, consoante o entendimento do TSE, na hipótese de dupla vacância dos cargos de prefeito e vice-prefeito e estando em curso o último ano do mandato, a eleição deve ser realizada na modalidade indireta.

Para finalizar, considerando que o processo já foi sentenciado e que os bens apreendidos não podem ficar indisponíveis por prazo indeterminado, autorizo a restituição dos aparelhos de telefonia celular apreendidos nos IDs 4551958 e 45561956 para Vinícius Mognon Rugini e Vitassir Brollo.

 

Ante o exposto, acolho a preliminar de ilicitude da gravação ambiental de áudio e declaro como ilícita, por derivação, a prova relativa ao testemunho de Juliana Vieira, rejeito as demais preliminares e, no mérito, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) de MULITERNO e FABIANO PITTON, e pelo parcial provimento dos recursos interpostos por ADAIR BARILLI, FLÁVIO PITTON, VINÍCIUS MOGNON RUGINI, RODRIGO MOGNON e VITASSIR BROLLO, conjuntamente, e por LUCIANO PELISSARO, a fim de reformar em parte a sentença condenatória para afastar a condenação por prática de captação ilícita de sufrágio e a fixação de multa, permanecendo hígidas as demais sanções relativas à cassação dos diplomas de prefeito e vice-prefeito e à declaração da inelegibilidade de todos os demandados por prática de abuso de poder econômico, e determino a realização de nova eleição no Município de Muliterno/RS, na modalidade indireta (art. 224, § 4º, inc. I, do Código Eleitoral).

Considero prequestionada toda a matéria invocada nos autos, a fim de facilitar o acesso à instância recursal.

Autorizo a restituição dos aparelhos de telefonia celular apreendidos nos IDs 4551958 e 45561956 para Vinícius Mognon Rugini e Vitassir Brollo, devendo o cumprimento ser realizado em primeira instância, pelo cartório eleitoral.

Após a publicação do acórdão, comunique-se esta decisão à respectiva Zona Eleitoral, para cumprimento e registro das sanções nos sistemas pertinentes, devendo imediatamente assumir o cargo de prefeito o Presidente da Câmara Municipal de Vereadores de Muliterno/RS, forma interina, até a convocação de eleições indiretas.

Após o trânsito em julgado, anotações de estilo e cumprimento das obrigações impostas, arquivem-se os autos com baixa na distribuição na instância pertinente.