PCE - 0602829-42.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/06/2024 00:00 a 20/06/2024 23:59

VOTO

Cuida-se de analisar as contas prestadas por JOSE ITAMAR ALVES, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, relativas às Eleições de 2022.

A unidade técnica aponta duas falhas na contabilidade: a) atraso de 03 (três) dias na abertura da conta bancária destinada ao recebimento de doações para campanha; e b) aplicação irregular de R$ 9.700,00, recursos procedentes do Fundo Especial de Financiamento de campanha (FEFC), em razão de ausência de cláusulas essenciais nos contratos firmados entre o candidato e as militantes Khelen Caroline (R$ 5.800,00), Josiel Leite (R$ 1.500,00) e Tayssa Ticiane (R$ 1.600,00), em desacordo com os arts. 35, § 12, 53, II, c e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19 (itens 1.1 e 4.1 do parecer conclusivo, ID 45553082).

Passo à análise das irregularidades:

a) Atraso na abertura da conta bancária destinada ao recebimento de doações para campanha

O órgão técnico desta Corte, após exame da contabilidade, consignou impropriedade relativa ao atraso de 03 (três) dias na abertura da conta bancária destinada ao recebimento de doações para campanha, conforme parecer conclusivo que consta dos autos.

Muito embora o candidato tenha extrapolado o prazo de 10 dias contados da concessão do CNPJ para a abertura de conta bancária, em desatendimento ao disposto no art. 8º, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, a conta foi aberta em 08.8.2022, ou seja, com diminuto atraso.

Acrescente-se, de igual forma, a justificativa apresentada pelo candidato em sua manifestação (ID 45447130):

O candidato entregou a documentação para abertura de conta no dia 03/08 na Caixa Federal Ag 0473 de sua cidade (Estrela/ RS), conforme orientação da agência pediu para deixar a documentação devida e esperar a análise das documentações e a abertura da conta bancária, entretanto a agência pequena no interior do estado, não sabia do regramento quanto a abertura de contas eleitorais e alegou a demora por conta de alta demanda no período. Contudo o atraso na abertura da conta bancária não gerou nenhuma prejucialidade a sua prestação de contas uma vez que o candidato só recebeu recurso financeiro a partir do dia 26/08/2022 e apenas na conta FEFC, esta que não tem prazo para abertura.

Assim, ainda que mantidas as falhas ocorridas na direção do parecer conclusivo, o qual aponta que neste caso específico, em face de suas peculiaridades, “as impropriedades descritas [atraso na abertura de contas] não afetaram a identificação da origem das receitas e destinação das despesas comprovadas pela movimentação bancária” (ID 45553082, item 1, in fine, p. 3), em observância aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, entendo que essas faltas merecem apenas o registro de ressalvas nas contas.

 

b) Contratos de prestação de serviços de pessoal em desacordo com os arts. 35, § 12, 53, inc. II, al. “c” e 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19

Inicialmente, apontou-se R$ 218.310,00 em falhas na formalização contratual dos serviços de militantes com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), conforme tabela constante no item 4.1 do relatório de exame de contas (ID 45445440).

O candidato, devidamente intimado, retificou as contas e apresentou o detalhamento das contratações na nota explicativa de ID 45448425.

Contudo, no referido documento, não há explicação sobre a contratação de Khelen Caroline (R$ 5.800,00), Josiel Leite (R$ 1.500,00) e Tayssa Ticiane (R$ 1.600,00), remanescendo, portanto, R$ 9.700,00 em aplicação irregular dos recursos públicos do FEFC, de acordo com a tabela do item 4.1 do parecer conclusivo, ID 45553082 (vide ainda nota explicativa de ID 45448425).

Com efeito, compulsando os autos, verifico a padronização dos contratos inquinados contendo cláusulas genéricas sem a correspondente explicitação das razões de distinção salarial entre as militantes Khellen, Josiel e Tayssa, na medida em que não constam o local de trabalho, o quantitativo de horas trabalhadas e a descrição das atividades executadas, em desatenção às exigências dos arts. 35, § 12, 53, inc. II, al. “c” e 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19 (contratos e comprovantes de pagamentos, ID 45197621, 45197712, 45197727, 45197676, 45197820, 45197747, 45197698, 45197713, 45197663, 45197636 e 45197728).

No mesmo sentido, ao confrontar a escrita contábil, a Procuradoria Regional Eleitoral sublinha precisamente que, em virtude da padronização contratual com cláusulas genéricas, não é possível aferir a razão da distinção remuneratória ajustada entre as prestadoras de serviço (ID 45558684):

Da análise dos contratos de prestação de serviço acostados aos autos identifica-se que não restou obedecida a regra em questão, visto que, de fato, não constam dos documentos o local de trabalho dos militantes e as horas trabalhadas. Por outro lado, dos contratos juntados consta, na cláusula I, que o seu objeto é “a prestação de serviços de assistente para a campanha eleitoral 2022, do CONTRATANTE”. Trata-se de cláusula genérica, aplicada em todas as avenças, mesmo havendo disparidade entre os valores pagos para Khellen Caroline e para os demais prestadores, sem que tenha sido apresentada a justificativa dos preços.

Dessa forma, a adoção, desprovida de qualquer justificativa, de procedimento contábil consistente em cláusulas contratuais sem especificação sobre a divisão das atividades realizadas pelos prestadores de serviço e sem a apresentação da formalização contratual adequada com a especificação do quantitativo de horas trabalhadas e de local de trabalho, compromete a fiscalização desta Justiça Especializada sobre a correta utilização dos recursos públicos do FEFC e viola o art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A propósito, esta Colenda Corte reafirma a observância obrigatória do art. 35, § 12º, da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme precedente de relatoria da Excelentíssima Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CARGO DE DEPUTADA FEDERAL. 3ª SUPLENTE. IMPROPRIEDADES. ABERTURA EXTEMPORÂNEA DE CONTA BANCÁRIA. NÃO APRESENTADOS OS EXTRATOS DAS CONTAS BANCÁRIAS. OMISSÃO DE GASTOS. NOTA FISCAL NÃO CANCELADA. ATUALIZAÇÃO JURISPRUDENCIAL DO TSE NÃO APLICÁVEL À HIPÓTESE. NÃO COMPROVADOS GASTOS REALIZADOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). COMBUSTÍVEIS. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO. FACEBOOK. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTO FISCAL IDÔNEO. DESPESAS COM PESSOAL. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

(...)

4. Ausência de documentação apta a comprovar gastos realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). (...)

4.4. Inobservância do § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, referente às despesas com pessoal. Apresentados contratos firmados com os prestadores de serviço que revelam inconsistências que não podem ser superadas. Determinada a devolução do somatório irregular ao Tesouro Nacional (art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

(...)

6. Desaprovação. Determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

(TRE/RS – PCE nº 060237477, Relatora Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Publicação: DJE, Tomo 273, 16/12/2022.) (Grifou-se.)

Portanto, à vista da ausência das informações de que tratam os arts. 35, § 12, 53, inc. II, c e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, fator que culmina na impossibilidade de fiscalização sobre o conteúdo e os requisitos legais dessa prestação de serviço de pessoal, considera-se irregular a utilização de recursos originados do FEFC na quantia de R$ 9.700,00 (nove mil e setecentos reais), valor que deve ser recolhida ao Tesouro Nacional consoante dispõe o § 1° do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Conclusões:

Por conseguinte, a irregularidade representa R$ 9.700,00, equivalente a 3,2% do total de recursos recebidos pelo candidato em sua campanha, e enquadra-se em parâmetro fixado na jurisprudência desta Justiça Especializada, de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade para formar juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade (inferior a 10% da arrecadação financeira).

Consigno ainda a ressalva relativa ao atraso de 03 (três) dias na abertura da conta bancária destinada ao recebimento de doações para campanha.

Logo, em linha com o entendimento da Procuraria Regional Eleitoral, impõe-se a aprovação com ressalvas das contas, na forma do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, nos termos da fundamentação.

 

Ante o exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas relativas ao pleito de 2022 apresentadas por JOSE ITAMAR ALVES, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, e determino o recolhimento, com juros e com correção monetária, ao Tesouro Nacional de R$ 9.700,00 (nove mil e setecentos reais), referente à aplicação irregular de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

Com o trânsito em julgado, anotações de estilo e satisfação de obrigações, arquivem-se os autos com baixa na instância pertinente.