PCE - 0602856-25.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/06/2024 00:00 a 20/06/2024 23:59

VOTO

Eminentes Colegas.

RENE NEDI DE SOUZA RIBEIRO, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual nas Eleições 2022, apresentou sua prestação de contas, a qual é disciplinada pela Resolução TSE n. 23.607/19.

Após o regular processamento da contabilidade, a Secretaria de Auditoria Interna deste Tribunal apontou irregularidades, relativas à utilização de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, consistentes na realização de pagamentos por cheques não cruzados; ausência de nota fiscal, referente à contratação de impulsionamento de conteúdo; e realização de despesas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, recomendando a desaprovação das contas e o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

As irregularidades relacionadas à utilização dos recursos do FEFC estão indicadas na tabela que segue (ID 45539600):

Passo à análise dos apontamentos.

 

1. Dos pagamentos efetuados em desacordo com o art. 38, inc. I, da Resolução TSE 23.607/19

Foi apontado, tanto no Relatório de Exame quanto no Parecer Técnico Conclusivo, que o candidato realizou pagamentos referentes à militância e à mobilização de rua, mediante cheques nominais aos contratados, porém não cruzados.

O cheque nominal cruzado, como se sabe, deve ser obrigatoriamente depositado em conta bancária, situação que permite a rastreabilidade do recurso, tanto que, após a compensação, o nome do beneficiário é devidamente identificado no extrato bancário, viabilizando a fiscalização pela Justiça Eleitoral.

Tal identificação dos beneficiários dos pagamento não foi possível no caso dos autos.

Além dos pagamentos relacionados na tabela acima, que somam R$ 22.750,12, o prestador emitiu o cheque n. 000011, no valor de R$ 1.500,00, nominal a Artur Siqueira Rodrigues, mas o serviço teria sido prestado por Deodato Valentin Salbego Benvegnu, conforme documentação juntada aos autos.

O art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19 é taxativo quanto à obrigatoriedade da efetuação dos pagamentos por meio de cheque nominal cruzado ou transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ da beneficiária ou do beneficiário.

No caso em exame, não foram apresentados outros documentos aptos a sanar a falha, pois o prestador deixou precluir a oportunidade que lhe fora concedida.

Assim, não há como atestar, tecnicamente, que os pagamentos tenham de fato ocorrido para pessoas ou empresas contratadas em prol da campanha eleitoral.

Na hipótese, este Tribunal Regional sufragou o entendimento de que os pagamentos por meio de recursos públicos devem ser demonstrados por documentos que permitam a rastreabilidade dos valores e a vinculação do crédito com o fornecedor declarado, sob pena de recolhimento do equivalente ao Tesouro Nacional, conforme ementa de julgado da relatoria do eminente Desembargador Eleitoral Francisco José Moesch, a qual reproduzo:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATOS. PREFEITO E VICE. DESAPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTO ELEITORAL. DESPESAS EM DESACORDO COM A REGRA PREVISTA NO ART. 38, INC. I, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. PAGAMENTO DE GASTO ELEITORAL COM RECURSO PRIVADO, EM DESACORDO COM A NORMA DE REGÊNCIA. ALTO PERCENTUAL. MANTIDO O DEVER DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas relativas às eleições de 2020, com fundamento no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, determinando o recolhimento do montante irregular ao Tesouro Nacional.

2. Ausência de comprovação de gasto eleitoral. Detectada a emissão de nota fiscal, não declarada à Justiça Eleitoral, contra o CNPJ do candidato. O lançamento de nota fiscal sem a correspondente contabilização na prestação de contas revela indícios de omissão de gastos eleitorais, em violação ao art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19. A omissão de despesa paga com verbas que não transitaram nas contas específicas de campanha configura utilização de recurso de origem não identificada, impondo o dever de recolhimento aos cofres do Tesouro Nacional, consoante o previsto no art. 32, § 1º, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. Comprovação de despesa com recursos do FEFC, em desacordo com o art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. Na espécie, não foi possível verificar se o sacador do documento de crédito foi aquele apontado como fornecedor dos bens ou serviços, de modo a comprovar o ciclo do gasto em todas as suas fases. Ademais, os documentos unilaterais, como é o caso dos recibos e do contrato de prestação de serviços acostados aos autos, não devem ser considerados isoladamente para suprir a ausência do cheque nominal e cruzado. Nessa linha, esta Corte sufragou o entendimento de que os pagamentos por meio de recursos públicos devem ser demonstrados por documentos que permitam a rastreabilidade dos valores e a vinculação do crédito com o fornecedor declarado, sob pena de recolhimento do equivalente ao Tesouro Nacional.

4. Pagamento de gasto eleitoral com recursos privados, em desacordo com o art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. Despesas pagas com o manejo de recursos privados e a utilização de cheque nominal, porém não cruzado. A alegação de que a exigência da norma impediria a contratação de “pessoas mais humildes” para as atividades em campanha não enseja a mitigação da regra, pois a sua finalidade é impor que a movimentação dos recursos ocorra por meio do sistema bancário, garantindo maior transparência às transações.

5. A totalidade das falhas apontadas representa, aproximadamente, 20,34% das receitas declaradas pelos candidatos, comprometendo o controle e a fiscalização dos recursos utilizados na campanha. Mantidas a desaprovação das contas e a ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional.

6. Desprovimento.

(Recurso Eleitoral n 060051796, ACÓRDÃO de 07/12/2021, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE ) (Grifei.)

 

Não tendo sido possível identificar, de modo seguro, as respectivas contrapartes dos pagamentos dos cheques, bem como não tendo o prestador se preocupado em esclarecer os fatos, é de se entender que os gastos, no valor de R$ 24.250,12, não foram devidamente comprovados. Logo, a quantia deve ser restituída ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Quanto à realização de seis pagamentos a DLOCAL BRASIL INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTOS, no valor total de R$ 5.988,00, referente a impulsionamento de conteúdo junto à rede social Facebook, o órgão técnico apontou irregularidade por ausência de apresentação das correspondentes notas fiscais.

Em relação a tal apontamento, a Procuradoria Regional Eleitoral bem observou que, “além de não terem sido juntadas as notas fiscais aos autos, tampouco encontram-se disponíveis no Divulgacand” (ID 45550654).

Desse modo, não tendo sido comprovado o gasto, deve ser determinado o recolhimento de R$ 5.988,00 ao Tesouro Nacional.

A última falha apontada pelo órgão técnico diz respeito ao pagamento no valor de R$ 1.200,00 feito à empresa COMERCIO DE COMBUSTÍVEIS ROHENKOHL LTDA, referente à aquisição de combustíveis, sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia.

O candidato foi devidamente intimado e deixou de retificar as contas e apresentar esclarecimentos, fato que torna a matéria incontroversa.

De qualquer forma, analisando-se a documentação apresentada, verifica-se no Demonstrativo de Receitas e Despesas (ID 45237776) que os campos destinados a informações referentes à cessão ou à locação de veículos, publicidade por carros de som e despesas com geradores de energia estão zerados, ao passo que o campo destinado ao registro de combustíveis e lubrificantes apresenta a despesa de R$ 1.200,00.

Ocorre que, de acordo com as regras já citadas do § 11 do art. 35, o candidato poderia ter se valido de veículo próprio ou de familiar até o terceiro grau para uso pessoal na campanha – desde que registrado nas contas – sem necessidade de cessão do bem, mas, nesse caso, o respectivo combustível não poderia ser pago com recursos financeiros da campanha eleitoral (art. o art. 60, § 4º, inc. III).

Poderia, por outro lado, utilizar recursos de campanha no custeio de combustíveis para abastecimento de veículo locado ou cedido, realização de publicidade com carro de som ou para uso em geradores de energia, situações não verificadas no caso concreto.

De qualquer sorte, o prestador não se movimentou no sentido de, ao menos, tentar sanar a falha, tendo permanecido inerte após a regular intimação acerca do relatório exarado pelo Órgão Técnico, restando nítida, portanto, a configuração da irregularidade, devendo a glosa ser mantida, tudo em conformidade com o já decidido por este Tribunal, em precedente de minha relatoria:

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO NÃO ELEITO. DEPUTADO ESTADUAL. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL. PANFLETAGEM. EQUIPE DE MOBILIZAÇÃO DE RUA. RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC) E DO FUNDO PARTIDÁRIO (FP). FALTA DE DETALHAMENTO. INOBSERVÂNCIA DO ART. 35, § 12, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. FALHA FORMAL. NÃO PREJUDICADA A FISCALIZAÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL. PAGAMENTO DE GASTOS COM COMBUSTÍVEIS COM VERBA DO FUNDO PARTIDÁRIO. AUSENTE INSTRUMENTO DE CESSÃO DE VEÍCULO. IRREGULARIDADE CARACTERIZADA. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas de candidato não eleito ao cargo de deputado estadual referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições de 2022.

(...)

3. Emprego de verbas do Fundo Partidário para pagamento de gastos com combustíveis sem o correspondente registro de locação, cessão de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia. Descumprimento ao art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19. Documentos apresentados inábeis para comprovar a cessão temporária de veículos em favor do prestador, pois ausente o instrumento de cessão. Irregularidade caracterizada. Determinação de recolhimento dos valores irregulares ao Tesouro Nacional.

4. A irregularidade não superada representa 8,61% do total das receitas declaradas na campanha, sendo adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas, na linha do que vem decidindo este Tribunal Regional e o Tribunal Superior Eleitoral.

5. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060303034, Acórdão, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 123, Data: 10/07/2023)

 

Mantida a glosa, cabível a determinação do recolhimento de R$ 1.200,00 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em arremate, as falhas, no valor de R$ 31.438,12, que representam o expressivo percentual de 42,88% do montante recebido pela campanha (R$ 73.307,68), implicam na desaprovação das contas.

Assim, acolho integralmente o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral para desaprovar as contas e determinar o recolhimento da quantia de R$ 31.438,12 ao Tesouro Nacional.

 

ANTE O EXPOSTO, voto por desaprovar as contas de campanha de RENE NEDI DE SOUZA RIBEIRO, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual nas Eleições 2022, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, impondo a determinação de recolhimento do valor de R$ 31.438,12 (trinta e um mil quatrocentos e trinta e oito reais e doze centavos) ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.

É o voto.